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Books and Periodicals in Brazil 1768-1930: a Transatlantic Perspective | Ana Cláudia Suriani da Silva e Sandra Guardini Vasconcelos
Publicado na Inglaterra no final de 2014, Books and Periodicals in Brazil 1768- 1930: a Transatlantic Perspective é o primeiro volume dedicado ao Brasil a integrar a série “Studies in Hispanic and Lusophone Culture”. É o nono livro a ser publicado nesta série, voltada prioritariamente para os estudos literários. As organizadoras, Ana Cláudia Suriani da Silva e Sandra Guardini Vasconcelos, são, respectivamente, professora (lecturer) de estudos brasileiros na University College London e professora titular de língua e literatura inglesa na Universidade de São Paulo. A julgar pelas temáticas abordadas e os nomes envolvidos, o livro parece ser fruto, direto ou indireto, do projeto de cooperação internacional “A circulação transatlântica dos impressos – a globalização da cultura no século XIX”, coordenado por Márcia Abreu e Jean-Yves Mollier. Sendo assim, suscita comparação com outro volume editado em 2014, A circulação transatlântica dos impressos – conexões, organizado por Márcia Abreu e Marisa Midori Deaecto, e publicado por meio digital pela Unicamp.1 Por questões de espaço, no entanto, a presente resenha irá tratar unicamente do livro em língua inglesa, que talvez seja de acesso mais difícil para pesquisadores no Brasil.
Na introdução, as organizadoras ressaltam que não há publicação recente em língua inglesa voltada exclusivamente para a temática dos livros e impressos brasileiros. Apesar da grande quantidade de estudos realizados nessa área nos últimos trinta anos, quem não lê português (ou, pelo menos, francês) fica restrito praticamente ao Books in Brazil: a History of the Publishing Trade, de Laurence Hallewell, publicado originalmente em 1982, antes de ganhar fama em sua edição brasileira de 1985. De fato, existe uma discrepância muito grande entre o chamado ”estado da arte” do campo, no Brasil, e sua percepção por estudiosos estrangeiros. Nesse sentido, é oportuna a iniciativa de dedicar um volume da série “Studies in Hispanic and Lusophone Culture” ao assunto. Infelizmente, o presente volume preenche essa lacuna apenas em parte e de modo bastante desigual.
A circulação dos impressos é assunto fascinante e complexo não somente por sua capacidade de atravessar fronteiras geográficas, mas também disciplinares. Por ser um ponto de cruzamento entre saberes literários (escrita e autoria), artísticos (design e ilustração), tecnológicos (impressão e fabricação), sociológicos (sociabilidade e práticas de leitura), econômicos (comércio e mercado), políticos (censura e propaganda), assim como entre os aspectos propriamente editoriais e jornalísticos, trata-se de uma área que requer conhecimentos múltiplos e abordagens fortemente transdisciplinares. Um livro que busca apresentar o público estrangeiro à “pletora de materiais – teses, livros, artigos e números especiais de periódicos”,2 dedicados ao assunto nos últimos anos teria obrigação de tentar abordar, minimamente que fosse, cada um desses saberes, oferecendo um corte transversal do campo de estudos e fornecendo pistas para que o leitor pudesse buscar se aprofundar. Embora o volume em questão cumpra bem a promessa de oferecer uma perspectiva transatlântica – e, portanto, transcultural –, ele tropeça no desafio de elaborar um painel transdisciplinar do seu objeto de estudos. Sua visão da história dos impressos é voltada prioritariamente para um entendimento literário, com alguma atenção para práticas de leitura, sociabilidades e, em muito menor grau, questões políticas. As dimensões material (papel e tipografia), tecnológica (máquinas) e trabalhista (operários e empresas) – tão importantes no século que viu nascer a indústria gráfica – são praticamente ignoradas, assim como o são as facetas artísticas e gráficas de projeto e construção do impresso, que não recebem nenhuma consideração.
Mais grave ainda, o volume não cumpre a promessa, subentendida em seu título, de oferecer um panorama representativo da história dos livros e dos periódicos no período em foco. Como falar dos periódicos dessa época sem mencionar uma única vez Semana Ilustrada ou Revista Ilustrada; Careta, Fon-Fon ou O Malho? Apesar de a capa do livro estampar uma imagem retirada do famoso semanário de Henrique Fleiüss, nem a Semana, nem as produções do concorrente Angelo Agostini são referidas ao longo dos quatorze ensaios que o compõem. Igualmente omitidos da discussão estão figuras essenciais como Raphael Bordallo Pinheiro, Julião Machado e Correia Dias, candidatos mais do que óbvios a um estudo que se propõe ”transatlântico”. Francisco de Paula Brito, um dos maiores editores brasileiros do século XIX, ganha apenas duas menções passageiras – uma como autor3 e a segunda numa tabela, listado entre outros editores4 – e não há nenhuma a Benjamim Costallat, o editor-escritor que provocou um terremoto no meio editorial brasileiro à época em que o furacão de Monteiro Lobato ainda não passava de um vendaval. Hipólito da Costa, José da Silva Lisboa, Sisson, Lombaerts, Weiszflog, Rui Barbosa, Rodrigo Octavio, Edmundo Bittencourt, Humberto de Campos, Pimenta de Mello, J. Carlos, Raul Pederneiras, entre muitos e muitos outros são nomes cuja importância para a imprensa e os impressos o livro parece ignorar.
As omissões se estendem para um número significativo de estudiosos que têm se debruçado sobre aspectos da história dos impressos em anos recentes. Não há nenhuma referência (nem na bibliografia) aos escritos de Cláudia de Oliveira, Gilberto Maringoni, Isabel Lustosa, Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, Marcelo Balaban, Marize Malta, Mônica Pimenta Velloso, Paulo Knauss, Rafael Cardoso (autor desta resenha), Renata Santos, Vera Lins – responsáveis conjuntamente por quase duas dezenas de livros sobre a história dos impressos, ao longo da última década – e muitos outros que ainda não tiveram ocasião de publicar um livro, mas cujos trabalhos estão amplamente disponíveis em forma de artigos. Esse fato evidencia uma preocupante tendência a tomar o grupo do qual se participa como único parâmetro e divulgá-lo no exterior como representante do Brasil como um todo. Feita essa crítica, deve-se elogiar o esforço das organizadoras para constituir uma rede, à medida que os autores representam instituições de São Paulo (9), Rio de Janeiro (3), Rio Grande do Sul (2), Minas Gerais (1) e Paraná (1), além de duas do exterior.
O volume começa com uma introdução, assinada pelas organizadoras, que busca situar a problemática do livro e da leitura em um país conhecido historicamente por suas taxas altas de analfabetismo e pouca atenção à cultura letrada. Essa tarefa é cumprida de modo sucinto (4 páginas), passando rapidamente para um apanhado do conteúdo, capítulo a capítulo. O caráter um tanto apressado da introdução é indicativo de certas falhas recorrentes ao longo do livro. É uma pena que, logo no início, o texto seja prejudicado por uma tradução bastante deficiente. Ao que indicam os agradecimentos, os ensaios foram vertidos para o inglês, e posteriormente revisados, por grupo grande de pessoas. A falta de uniformidade da linguagem, de um capítulo para outro, sugere que não foi feito esforço suficiente de padronização editorial. A maioria dos ensaios evidencia domínio bom ou muito bom da escrita inglesa (capítulos 4, 5, 7, 9, 10, 11, 12, 13, 14); outros, uma fluidez ainda razoável (capítulos 1, 2, 6). Os demais, porém, trazem erros que dificultam a compreensão de pontos mais nuançados e deixam dúvidas sobre o sentido de citações brasileiras – que, no mais das vezes, não são dadas no original. Essa desatenção para com a qualidade da linguagem estende-se também à revisão editorial no sentido geral. Em certos pontos do livro ocorrem remissões a nomes, fatos ou dados faltantes. Em outros, opções de terminologia causam confusão desnecessária – e.g., a imprecisão de datas e nomenclatura que cerca o uso do termo ”Império” ou, ainda, a decisão incompreensível de creditar o nome da Fundação Biblioteca Nacional como “National Library of Rio de Janeiro”.
O primeiro capítulo, de Márcia Abreu, intitulado “Reading in Colonial Brazil”, tenta desfazer a impressão equivocada de que não se lia no Brasil colonial. A autora vem explorando o assunto de modo sistemático desde antes do seu O caminho dos livros (2003), e traça aqui a circulação de livros de Portugal para o Brasil por meio de pedidos de autorização à Mesa Censória, à Mesa do Desembargo do Paço e ao Santo Ofício. Embora acrescente pouco de novo para quem já conhece seus trabalhos anteriores (sendo versão atualizada de texto publicado em português, em 2002), a inclusão desse capítulo logo no início do volume ajuda a estabelecer algumas questões de fundo, suprindo sua falta na introdução. O argumento central – de que as pessoas no Brasil-Colônia liam sim, mas não necessariamente o que era preconizado pelas autoridades morais e intelectuais da época ou por estudiosos posteriores – continua instigante, mesmo que esteja menos bem elaborado aqui do que em outras produções da autora.
O segundo capítulo, “Booksellers in Rio de Janeiro: the Book Trade and Circulation of Ideas from 1808 to 1831”, de Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves e Tânia Maria Tavares Bessone da Cruz Ferreira, é contribuição exemplar da função que deveria servir esse volume. Ao consolidar informações oriundas de anos de pesquisa e expô-las de modo sistemático, o ensaio traça um panorama geral do comércio livreiro visto por intermédio dos anúncios publicados na imprensa da época. Trata-se de apanhado seguro e sólido, capaz de abrir para o leitor estrangeiro uma visão equilibrada do assunto e apontar as principais discussões e referências da atualidade. Seu êxito em realizar esses propósitos contrasta com a ausência de ensaios que façam o mesmo para outros grandes temas: por exemplo, o comércio livreiro e o meio editorial durante o Segundo Reinado.
O terceiro capítulo, “Seditious Books and Ideas of Revolution in Brazil (1830-71)”, de Marisa Midori Deaecto e Lincoln Secco, promete uma discussão interessantíssima, mas fica no limite de aprofundar-se nela. Ao focar as personalidades de Libero Badaró e Álvares de Azevedo, mais importantes para o contexto paulista, o texto passa batido pela influência maior do ideário socialista no Brasil, que abarca a Revolução Praieira e outros movimentos de contestação. O Socialismo (1855), do general Abreu e Lima – talvez o exemplo mais notório de um livro com potencial sedicioso no período –, é descontado em três linhas. Além de ser prejudicado pela tradução, o ensaio embasa-se num arcabouço teórico e metodológico bastante frágil, com dependência excessiva sobre uma historiografia datada e certos momentos alarmantes em que arrisca conjecturas a partir de evidências como anotações anônimas a lápis em exemplares de livros encontrados em sebos. Há pouco sentido em incluir uma pesquisa de caráter tão exploratório num volume voltado para o público estrangeiro.
O capítulo 4, “Migratory Literary Forms: British Novels in Nineteenth-century Brazil”, de Sandra Guardini Vasconcelos, trata do impacto dos romances britânicos sobre o fazer literário no Brasil, demonstrando a insuficiência do modelo histórico que quer ver a França como matriz única ou primordial. Trata-se de outra contribuição sólida, que situa o leitor em relação a grandes temas como: surgimento do romance, repertório e cânone no Brasil, empréstimos e migrações, tomando cuidado sempre para relacionar esses fenômenos no campo literário com questões sociais maiores, como o lugar da mulher na sociedade patriarcal.
O capítulo 5, “The Library that Disappeared: the Rio de Janeiro British Subscription Library”, de Nelson Schapochnik, é de vivo interesse para especialistas no campo abrangido pelo livro. Com trinta páginas, trata-se do ensaio de mais fôlego do volume e destaca-se também como um dos poucos que traz quantidade de informações novas. Esse texto constitui um aporte valioso para a historiografia do campo, ao traçar a história da biblioteca que atendeu à comunidade britânica do Rio de Janeiro entre 1826 e 1892. O autor retoma, assim, e consolida o que já havia publicado sobre o mesmo assunto para o projeto temático “Caminhos dos Romance no Brasil séculos XVIII e XIX”.
O capítulo 6, “The History of a Pseudo-Dumas Novel: The Hand of the Dead”, de Paulo Motta Oliveira, trata de assunto interessante, porém de relevância apenas tangencial. A trajetória do romance A mão do finado, lançado pelo autor português Alfredo Hogan, em 1853, como sequência apócrifa ao Conde de Monte Cristo, é narrada em minúcia. Em meio à sua estranha carreira internacional, o livro teve aparições sucessivas no contexto brasileiro – algumas movidas pela ganância editorial da década de 1950. Além de sua incongruência com relação ao recorte do volume, o ensaio baseia-se em pesquisa ainda incompleta – suscitando conclusões “vagas e incertas”,5 no dizer do autor – e, portanto, a decisão de incluí-lo é temerária.
O capítulo 7, “Revista Nacional e Estrangeira (1839-40): a Foreign or a Brazilian Magazine?”, de Maria Eulália Ramicelli, aborda a questão crucial da relação entre ”nacional” e ”estrangeiro” na historiografia das revistas do século XIX. É difícil determinar o caráter nacional de muitos periódicos publicados durante o período em que cultura brasileira ainda era conceito em plena formação. Assim, várias revistas têm sido subestimadas por estudiosos de cepa nacionalista, por conta do seu recurso a textos e clichês importados ou por serem escritas em idiomas outros que o português. Apesar da relevância do tema, o ensaio se perde no desequilíbrio entre abstrações mal digeridas (e.g., ”classe dirigente”, “ideologia burguesa”) e uma compreensão nem sempre matizada do contexto político imediato dos anos finais da Regência.
O capítulo 8, “The Role of the Press in the Incorporation of Brazil into the Paris Fashion System”, de Ana Cláudia Suriani da Silva, volta suas atenções para o papel da imprensa em divulgar a moda no Brasil e elege o Correio das Modas como aquele que “estabeleceu o padrão para as revistas de moda”.6 Feita essa constatação, porém, a sequência do texto não se aprofunda na análise da revista, lamentavelmente. Prejudicado pela tradução problemática, o texto incorre numa série de afirmações confusas ou duvidosas – como, por exemplo, que “o Brasil fazia parte do sistema de moda parisiense antes que fosse consolidado”.7 Aliás, o próprio conceito de um ”sistema parisiense de moda” – pego de empréstimo a um estudo sobre o mundo da moda atual – assenta-se de maneira pouco confortável sobre o figurino do século XIX.
Uma pequena preciosidade do livro é o capítulo 9, “The Brazilian and the French Bas de Page”, de Lúcia Granja, pois recapitula a evolução da crônica jornalística, de modo comparativo entre Brasil e França. O texto retoma, assim, o importante trabalho de Marlyse Meyer sobre a história do folhetim, bem como as investigações anteriores da própria autora sobre esse tema. Juntando leitura detalhada de textos de época a um olhar atento para questões de diagramação da página, o ensaio oferece um apanhado instigante dos paralelos e das diferenças entre o que se fazia no Rio, sob influência francesa, e o que se passava na França. Afasta assim – sem grande alarde, mas com eficácia – a questão capciosa da cópia ou importação de modelos, e abre perspectivas para compreender melhor a natureza das inovações operadas no contexto brasileiro.
O capítulo 10, “How to be a Professional Writer in Nineteenth-century Brazil”, de Marisa Lajolo e Regina Zilberman, é a terceira contribuição de peso ao propósito de mapear o território brasileiro para o público estrangeiro. Trazendo uma discussão arejada das questões de direitos autorais e contratos editoriais, o ensaio traça um histórico da evolução das relações entre escritores, editores e legislação, calcado em leitura abrangente e pesquisa minuciosa. As autoras dão seguimento, assim, ao trabalho iniciado com seu importante O preço da leitura (2001). Um único problema de tradução, bastante grave, exemplifica as falhas de revisão do livro. Os estabelecimentos editoriais chamados de “tipografia”, no contexto brasileiro, são denominados reiteradamente de ”typography” e “typographer” – termos usados, em língua inglesa, exclusivamente para referir questões gráficas ligadas ao desenho e a fundição de tipos. O leitor monoglota terá dificuldade para entender, portanto, por que o autor brasileiro da época precisava conseguir “o acordo dos tipógrafos para publicar um livro”.8
O capítulo 11, “Print Technologies, World News and Narrative Form in Machado de Assis”, de Jussara Menezes Quadros, traz uma reflexão inteligente sobre o lugar do telégrafo e das incipientes agências de notícias na escrita de Machado. Contudo, a análise das “tecnologias de impressão”, prometida no título, fica limitada à sua influência indireta sobre formas narrativas. Trata-se mais de discutir as angústias e os entusiasmos provocados pela percepção de modernização das comunicações do que investigar qualquer impacto das novas tecnologias sobre os impressos. Embora não corresponda à intenção da autora, a presença do seu ensaio acaba por realçar a indiferença do volume com relação à materialidade dos objetos impressos. Tecnologia, aqui, é uma ideia literária, mais do que um fator concreto de transformação. O capítulo é o único que menciona – muito embora, não discuta – o advento da fotografia como inovação de relevância para os meios de comunicação no período.
O estudo de caso mais instigante do livro é o capítulo 12, “The Brazilian Book Market in Portugal”, de Patrícia de Jesus Palma. Comportando quantidade de informações desconhecidas, pelo menos daqueles estudiosos que miram seu olhar míope no Brasil como cultura insular, o ensaio oferece uma análise perspicaz e crítica do mercado para livros brasileiros em Portugal durante a segunda metade do século XIX. O foco é a figura de Ernesto Chardron, livreiro francês radicado no Porto, cuja atuação, em parceria com Camilo Castelo Branco, ajuda a desvendar alguns segredos da intrincada relação de chamego e despeito que une Portugal e Brasil. O ensaio contribui, com muito, para uma compreensão transcultural do meio editorial oitocentista.
O capítulo 13, “Popular Editions and Best-sellers at the End of the Nineteenth Century in Brazil”, de Alessandra El Far, é mais um ensaio a cumprir de modo exemplar a função que deveria servir esse volume. Partindo de pesquisas divulgadas em seus trabalhos anteriores – em especial, Páginas de sensação (2004) –, a autora pinta um quadro sucinto e animado das edições populares, dos romances de sensação e dos romances para homens que constituíram filão importantíssimo do mercado editorial brasileiro entre as décadas de 1880 e 1890. Bem fundamentado e escrito com vivacidade, o texto oferece ao leitor estrangeiro um estudo autorizado da primeira modernização do público leitor e das editoras, desfazendo velhos lugares comuns e iluminando práticas sociais correntes.
O capítulo 14, “The Brazilian Publishing Industry at the Beginning of the Twentieth Century: the Path of Monteiro Lobato”, de Cilza Bignotto e Milena Ribeiro Martins, parte do pressuposto batido e errôneo, atribuído a Hallewell, de que Monteiro Lobato “revolucionou a indústria editorial então estagnada do país”9 Lida na sequência do ensaio anterior, essa afirmação soa quase cômica. Mais uma vez, fez falta uma revisão editorial que assegurasse maior harmonia entre as partes do livro. De resto, sem grandes novidades em relação à polpuda bibliografia existente, o ensaio oferece um resumo da atuação editorial de Monteiro Lobato, assim como sua formação intelectual, destacando seus elos com o mercado argentino. O discurso nacionalista do grande editor é tomado, de modo acrítico, como virtude. Não se oferece ao leitor estrangeiro uma janela, ao menos, para entrever o lado mais obscuro do polemista que se deixou associar ao Integralismo, ao antissemitismo e a outras causas menos do que nobres.
Com esse último capítulo, voltado umbilicalmente para certo ufanismo paulista, o livro reafirma os limites de sua capacidade de dimensionar para o público estrangeiro a história dos impressos no Brasil. O saldo são cinco ensaios sólidos de fundo geral e quatro estudos de caso excepcionais. Se os cinco ensaios restantes tivessem sido substituídos por outros que abarcassem as temáticas faltantes – em especial, questões ligadas a materialidade e tecnologias – e incluíssem pelo menos alguns dos muitos autores ignorados – em especial, os que atuam no Rio de Janeiro –, aí, sim, teríamos um livro que poderia redefinir o “estado da arte” do campo.
Notas
1. Disponível em: http://www.circulacaodosimpressos.iel.unicamp.br/index.php?cd=3&lang=pt
2. p. 5.
3. p.80-81.
4. p.155.
5. p.130.
6. p. 157.
7. p.153.
8. p. 182.
9. p.245.
Rafael Cardoso – É escritor e historiador da arte, PhD pelo Courtauld Institute of Art (Londres), professor colaborador do programa de pós-graduação do Instituto de Artes, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Autor/organizador dos livros Impresso no Brasil, 1808-1930: Destaques da história gráfica no acervo da Biblioteca Nacional (Verso Brasil, 2009) e O design brasileiro antes do design: Aspectos sociais no Brasil, séculos XIX e XX.E-mail: rafaelcardoso.email@gmail.com
SILVA, Ana Cláudia Suriani da; VASCONCELOS, Sandra Guardini (Orgs.). Books and Periodicals in Brazil 1768-1930: a Transatlantic Perspective. Londres: Legenda; Modern Humanities Research Association and Maney Publishing, 2014. Resenha de: CARDOSO, Rafael. Impressões do Brasil. Revista Maracanan. Rio de Janeiro, v.12, n.14, p. 153-160, jan./jun. 2016. Acessar publicação original [DR]