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Reducciones: la concentración forzada de las poblaciones indígenas en el Virreinato del Perú – SAITO et. al. (tempo)
SAITO, Akira; LAURO, Claudia Rosas. Reducciones: la concentración forzada de las poblaciones indígenas en el Virreinato del Perú. Lima: Fondo Editorial Pontificia Universidad Católica del Perú, 2017. 682 p.p. (Colección Estudios Andinos). Resenha de: IBÁNEZ-BONILLO, Pablo. Reduções: experiências de aldeamento indígena no Vice-Reino do Peru. Tempo, v.24 no.3, Niterói set./dez. 2018.
Em 1569, a coroa castelhana empreendeu uma empresa sem precedentes na história do colonialismo europeu: repentinamente forçou toda uma sociedade conquistada a mudar sua forma de vida.” Com essas palavras, inicia-se a contribuição de Jeremy Ravi Mumford no trabalho coletivo que Akira Saito e Claudia Rosas Lauro editaram sob o título Reducciones. La concentración forzada en las poblaciones indígenas en el Virreinato del Perú.
O texto de Mumford analisa a política de reduções ordenada pelo vice-rei Francisco de Toledo no Peru e no Alto Peru entre 1569 e 1575. Como os próprios editores indicam na introdução, apesar da importância desse projeto de concentração das populações indígenas, são poucos os trabalhos dedicados até o momento a realizar um balanço geral. O volume resenhado tenta compensar esse vazio historiográfico com a contribuição de dez especialistas sobre as reduções toledanas.
Não é esse, porém, o único aporte do livro, já que também incorpora ao diálogo as missões jesuíticas estabelecidas nas fronteiras do Vice-Reino do Peru. A historiografia ainda não tem explorado em profundidade as conexões entre as reduções toledanas e as missões religiosas, mesmo sendo os dois projetos produto de uma mesma estratégia colonial pelo confinamento dos ameríndios. A inclusão de cinco textos sobre as missões jesuíticas facilita o diálogo no volume.
O conjunto de textos é organizado em oito capítulos. No capítulo inicial, Mumford e Luis Miguel Glave apresentam as linhas mestras do projeto do vice-rei Toledo. Os outros sete capítulos são dedicados a distintas regiões do Vice-Reino do Peru – desde Lima (capítulo 2) até as terras fronteiriças da Amazônia (capítulo 6), passando pela costa norte, pela serra (capítulos 3-5), pelo Paraguai e pelo Chile (capítulos 7-8). Os editores escolheram essa abordagem geográfica, como explicam na introdução, para não limitar as possíveis comparações e conexões temáticas que o leitor venha a estabelecer.
Na mesma introdução, indica-se que um dos objetivos do trabalho é “clarificar a formação e o desenvolvimento das reduções sobre o terreno”. Assim, editores e autores pretendem tomar distância em relação às abordagens tradicionais, que têm priorizado o plano ideal das reduções e seu desenho metropolitano. Em lugar disso, os autores convidados a participar desta coletânea focam na execução dos projetos de aldeamento e no funcionamento cotidiano de reduções toledanas e missões jesuíticas.
Essa aproximação enfatiza a importância do protagonismo dos diversos agentes coloniais, assim como os processos de negociação estabelecidos entre eles. Nessa linha, as populações indígenas são tratadas como um ator histórico proativo, tanto na escolha dos lugares de redução quanto no desenvolvimento dos projetos urbanos. Os diferentes textos dedicam especial atenção a elementos como religião, identidade coletiva, estrutura das chefias ou padrões de movimento das populações nativas.
Os autores consideram essas dinâmicas indígenas um elemento-chave na configuração das reduções, dado que os projetos iniciais tiveram de ser adaptados à realidade local. Mas, longe de oferecerem uma visão essencialista da cultura e da identidade, os diferentes estudos deste volume evidenciam as transformações experimentadas pelas comunidades nativas durante o intenso diálogo com os agentes coloniais. Dessa maneira, missões jesuíticas e reduções são apresentadas como espaços de negociação, superando as visões anteriores de imposição arbitrária.
Neste sentido, a inclusão da palavra forzada no título do livro não faz justiça ao esforço de enfatizar a agência indígena e sua intervenção decisiva na aplicação dos projetos de redução. Do mesmo modo, sente-se falta de um capítulo de síntese sobre as missões jesuíticas, similar ao dedicado a la política toledana, ou a inclusão de outros espaços geográficos, como as regiões de Mainas ou Nueva Granada, que ajudariam a oferecer uma imagem mais completa e poliédrica da realidade do Vice-Reino.
Isso, porém, são detalhes para completar uma análise que já é suficientemente profunda e estimulante. No conjunto, os quinze textos oferecem uma panorâmica geral da aplicação negociada das políticas de redução, mostrando o sucesso (relativo) dos distintos projetos estudados. Embora os historiadores tenham enfatizado o aparente fracasso do projeto reducional, os autores demonstram a profunda marca que missões e reduções deixaram na paisagem. Cada um dos casos, obviamente, oferece itinerários próprios, e cada autor explora perspectivas originais.
No capítulo dedicado a Lima y sus valles, por exemplo, Tetsuya Amino analisa os movimentos das populações indígenas entre suas terras de origem e os bairros aos quais foram reduzidos na capital do Vice-Reino. Amino organiza esses movimentos com base em suas pesquisas sobre um milagre acontecido no cercado de Lima. A oscilação contínua das populações, assim como sua capacidade de obter o reconhecimento colonial de suas reivindicações, é um bom exemplo da tensa negociação do período.
O artigo de Teresa Vergara Ormeño (“Un espacio integrado: Lima y los pueblos de indios de su comarca”) supera os limites da capital para estudar os movimentos entre a cidade e os espaços indígenas dos arredores de Lima.
Os dois artigos sobre a capital peruana oferecem uma visão coerente e complexa da Ciudad de los Reyes (Lima), onde pela primeira vez foram aplicadas as políticas de redução e que, portanto, teve um papel importante como modelo e laboratório para o resto do Vice-Reino.
A seção sobre a Costa Norte inclui o artigo de Parker VanValkenburgh acerca das experiências de redução nos vales de Zaña e Chamán. Esse texto – junto com o posterior, de Steven A. Wernke – é um dos mais inovadores da coletânea pelo seu uso do material arqueológico para a análise das transformações num espaço geográfico que vai além da redução. Assim, o autor combina fontes documentais e materiais a fim de estudar a agência indígena na transformação da paisagem e na aplicação do plano de redução.
Alejandro Diez Hurtado completa a seção com um texto intitulado “De la reducción al pueblo: procesos de conformación de grupos y territorios a raíz de la creación de Catacaos, Sechura y Colán en la costa de Piura (norte del Perú)”. Nele, estuda o longo processo de redução dessas três aldeias, focalizando a análise nas variações demográficas, onomásticas e espaciais. Tais transformações, porém, não conseguem ocultar uma forte continuidade que o autor se esforça em visibilizar. Trata-se, por certo, de uma observação recorrente nos demais estudos deste volume.
A mesma vontade de problematizar a redução como processo social se encontra nas seções posteriores. Em seu texto sobre as reduções em Huaylas, Marina Zuloaga Rada se propõe a entender as múltiplas transformações geradas pela negociação entre os atores locais e as autoridades coloniais. Objetivo semelhante apresenta o texto de Nozomi Mizota, intitulado “Pervivencia y cambios de las reducciones en la región de Huamanga, siglo XVII”.
A seguir, encontram-se dois dos textos mais interessantes do volume. O já mencionado artigo de Wernke combina de novo história e arqueologia em uma bem-sucedida demonstração das possibilidades metodológicas dessa abordagem. Dessa maneira, consegue estudar “La producción y desestabilización del dominio colonial en el proceso reduccional en el Valle del Colca, Perú”. Seu texto ilustra de maneira bem clara as resistências práticas dos indígenas frente às aspirações ideais da dominação colonial.
O texto de S. Elizabeth Penry (“Pleitos coloniales: ‘historizando’ las fuentes sobre pueblos de indígenas en los Andes”) merece especial atenção pela reflexão sobre as fontes documentais e o contexto de sua produção. Trata-se de uma crítica fundamental que aparece de forma latente em outros momentos do livro, mas que é explorada com maior profundidade neste artigo, onde entre outros aspectos se estuda a iniciativa indígena na criação de novas reduções.
Sem transição explícita, o livro passa a estudar, nas seções seguintes, as missões jesuíticas nos espaços periféricos da Amazônia, do Paraguai e do Chile. É possível reconhecer nesses textos muitos dos temas e das ideias que nos artigos anteriores se dedicam às reduções toledanas, comprovando, assim, que o diálogo prévio entre os autores – integrados num projeto de pesquisa de vários anos – tem sido fecundo, e não uma simples troca de perspectivas.
As mesmas preocupações sobre as agências locais e as negociações aparecem, por exemplo, no texto de Roberto Tomichá Charupá. Nele se estudam as políticas de aldeamento em Chiquitos nos séculos XVII e XVIII, usando-se como fonte os padrões de população e a onomástica local. A capacidade dos atores indígenas de adaptar o projeto missionário “a sus propias coordenadas culturales y simbólicas” provocou resultados inesperados e singulares. “De allí que la nueva cultura haya sido tal vez una versión única y creativa del misterio cristiano”.
A organização social das reduções é outro tema recorrente no livro e recebe especial atenção nos estudos sobre as missões, concentrados na parte final do volume. Akira Saito estuda a complexidade das parcialidades indígenas, argumentando que elas não necessariamente existiam em sua forma colonial antes da chegada dos jesuítas, os quais contribuíram para sua criação. A ação dos missionários, contudo, não implicou uma homogeneização cultural dos povos indígenas. Como indica o autor, “cada reducción era una síntesis única formada bajo circunstancias particulares”.
A figura do “cacique” foi uma das que se viram fortemente influenciadas pelos projetos missionários, como demonstra Guillermo Wilde no seu texto “Cacicazgo, territorialidad y memoria en las reducciones jesuíticas del Paraguay”. Wilde estuda o dinamismo sociopolítico das missões a partir do cacicado e sua influência na produção de memórias territoriais. Na mesma linha se situa o estudo de Kazuhisa Takeda, sobre as transformações dos cacicados e os processos etnogenéticos nas missões dos guaranis.
O livro termina com a contribuição de Rodrigo Moreno Jeria sobre a missão jesuítica no arquipélago de Chiloé (Chile), um espaço tão afastado de Lima que o próprio autor se refere a ele como “fim do mundo”. Seu texto é especialmente valioso por ser o único que estuda um fracasso evidente dos missionários, como assinalam os editores, mas também é relevante pela sistematização que oferece das estratégias missionárias usadas em diferentes etapas e regiões do arquipélago.
Em conjunto, o volume resenhado oferece um balanço muito completo que atualiza o estudo das reduções tanto no nível temático quanto metodológico. O leitor interessado no período colonial da América hispânica encontrará neste volume uma excelente plataforma para conhecer os mais recentes aportes sobre a construção negociada do universo colonial. Assim, a maioria dos textos situa o foco sobre as populações indígenas em uma aproximação etno-histórica.
O volume é também relevante para os pesquisadores interessados nos projetos de concentração indígena na América portuguesa. Apesar de não incluir trabalhos sobre essa região, o livro aqui resenhado é uma excelente oportunidade para aprofundar no diálogo entre os dois impérios ibéricos. Não é à toa que as duas Coroas aplicaram uma política similar de reassentamento urbano como meio de controlar e civilizar as populações indígenas – política que alcançou novas conexões durante o período da monarquia ibérica (1580-1640).
Tanto no Brasil quanto, em especial, no Estado de Maranhão e Grão-Pará, essa política se traduziu numa primeira fase de concentração humana nos aldeamentos, onde os indígenas foram instruídos na religião católica e na língua portuguesa, ao mesmo tempo que contribuíram com seu trabalho para o desenvolvimento da sociedade colonial. As principais ordens religiosas tomaram conta desses aldeamentos, não obstante a administração civil também tenha sido uma realidade em determinados momentos.
A historiografia brasileira tem estudado os aldeamentos em várias dimensões, destacando nos últimos anos o estudo da intermediação cultural dos missionários, como nos trabalhos de Paula Montero, Cristina Pompa, Adone Agnolin, Almir Diniz Carvalho ou Karl Arenz. A agência indígena na gestão das relações com o entorno colonial tem sido outro tema central das pesquisas realizadas nos últimos anos, e não resulta difícil imaginar as possibilidades comparativas com base nos trabalhos de John Monteiro, Maria Regina Celestino de Almeida ou Elisa Frühauf Garcia, que apresentou um dossiê sobre as missões na América Ibérica nesta mesma revista (2013). Outro exemplo dos diálogos possíveis entre as experiências missionais das Américas espanhola e portuguesa é a coletânea editada por Guillermo Wilde sob o título Saberes de la conversión. Jesuitas, indígenas e imperios coloniales en las fronteras de la cristiandad (2011).
Por outro lado, e para além do marco das missões jesuíticas, a aplicação do Diretório pombalino marcou o início, em meados do século XVIII, de outro projeto de redução que encontra pontos de comparação com as políticas da coroa espanhola no Peru. Nos dois casos, fixou-se uma regulamentação para ordenar o dia a dia das vilas, dirigidas por uma administração que incluía autoridades indígenas e europeias. Mesmo com tempos e dinâmicas próprias, a comparação entre os dois processos parece uma empresa promissora que talvez se anime com o trabalho resenhado.
Referências
GARCIA, Elisa Frühauf (Org.) Dossiê – Missões na América Ibérica: dimensões políticas e religiosas. Revista Tempo, v. 19, n. 35, p. 1-95, jul./dez. 2013. [ Links ]
WILDE, Guillermo (Ed.). Saberes de la conversión: jesuitas, indígenas e imperios coloniales en las fronteras de la cristiandad. Buenos Aires: Editorial SB, 2011. [ Links ]
Pablo Ibáñez-Bonillo – Pós-doutorando na Universidade Federal do Pará (UFPA) – Belém(PA) – Brasil. E-mail: panamsb@hotmail.com.