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História e ativismo / Cadernos de História / 2015
Os movimentos de rua no Brasil foram cruciais para a definição do Dossiê Ativismo e História, em especial, os movimentos de junho de 2013. Cumprindo a função de provocar abordagens sob os mais peculiares olhares, foi possível selecionar textos de mérito acadêmico sobre variados objetos (minorias, elites, trabalhadores e marginalizados), perspectivas (ideológicas, Estado e sociedade) e períodos (séculos XVII, XX e XXI). Os artigos analisam manifestações políticas de ampla militância e de múltiplas demandas no Brasil e em Portugal: são experiências de conflitos coletivos entre marginalizados e elites, nações e rebeldes, trabalhadores e proprietários, colonizadores e escravos, ou são estratégias de alianças políticas ou lutas pelo poder. O elemento coletivo está presente em todos os casos analisados pelos autores, mesmo que manifestado em vivências particulares, as ações e estratégias foram motivadas pela política, na defesa de posições econômicas, territoriais, sociais e culturais.
Abre o Dossiê o artigo escrito por Adalberto Paz, Além do equador, entre “hordas de selvagens”: frentes de ocupação, trabalho e redes de contatos no extremo norte amazônico oitocentista. O texto trata do contestado franco-brasileiro no final do século XIX no Amapá. Nesse contexto, o autor analisa a trajetória de duas personalidades emblemáticas: Francisco Xavier da Veiga Cabral e Trajano Cypriano Bentes. O segundo artigo busca compreender as correspondências entre o Integralismo Lusitano, liderado por Antônio Sardinha, o Nacional Sindicalismo de Rolão Preto e a ditadura de Salazar. Com o título Integralismo Lusitano e Nacional Sindicalismo: movimentos de extrema-direita e contato com ditaduras em Portugal (1913-1932), o texto de Felipe Azevedo Cazapetta analisa os jogos de poder e de interesse entre os movimentos de extrema-direita e os regimes de ditadura em diferentes momentos da história de Portugal. O artigo seguinte trata das relações de poder entre militares, elite local e comunistas no 4º Batalhão de Sapadores de Aquidauana em Mato Grosso do Sul, no interior do Brasil. Este é o objeto de estudo de Vitor Wagner Neto de Oliveira, no artigo Articulações comunistas em Mato Grosso (1935).
Os dois artigos subsequentes analisam experiências recentes da história do Brasil, reflexos das mudanças políticas e sociais ocorridas no país e exemplos do dinamismo dos movimentos sociais. Entre a história e o luto: o ativismo de familiares de vítimas da ditadura militar no Brasil e O Movimento Lésbico em Fortaleza – LAMCE: trajetória e ações de luta, escritos, respectivamente, por Mayara Paiva de Souza e Cláudia Freitas de Oliveira, ambos tratam do início do século XXI e refletem aspectos importantes da história do tempo presente. Mayara Souza aborda a luta pela memória travada por mães em busca de seus filhos mortos no Regime Militar de 1964. Cláudia Oliveira trata em seu artigo sobre as bases, articulações e ações políticas do movimento ativista surgido em Fortaleza, em abril de 2004, denominado LAMCE, Liberdade do Amor entre Mulheres no Ceará.
A temática “trabalho” fecha o Dossiê Ativismo e História, presente em quatro artigos dessa edição. Essa série inicia-se com o texto Revolta indígena no Engenho de Santana na Capitania de Ilhéus: o Atlântico Açucareiro e o trabalho indígena (1602), de Maria Hilda Baqueiro Paraíso. A autora destaca o elemento coletivo nos casos das rebeliões de indígenas escravizados no Engenho de Santana na Bahia durante o século XVI, isso sob o prisma da resistência política, marcada por “relações étnicas conturbadas, prenhes de negociação e de confrontos simbólicos e físicos”. O artigo seguinte, Uma perspectiva teórica para a interação entre sujeito e estrutura nos estudos sobre o movimento operário, de Cézar Augusto Bubolz Queirós, busca abordar teoricamente as relações no mundo do trabalho. O penúltimo artigo, intitulado “Informar” para “formar” – reflexões sobre a imprensa e militância no mundo do trabalho brasileiro, na Primeira República, analisa os jornais militantes do movimento operário nas primeiras décadas do século XX no Brasil. Nesse sentido, Isabel Aparecida Bilhão estuda o caso da imprensa de Porto Alegre e procura mostrar o processo de naturalização através da repetição do discurso. O artigo Instituições para a acção colectiva numa perspectiva histórica: mutualismo nos subúrbios industriais lisboetas (1890-1930) conclui o Dossiê. Nesse estudo, a autora Joana Dias Pereira salienta a receptividade e grandiosidade da associação de socorro mútuo português, considerando o legado corporativo das associações mutualistas como modelo de transição do capitalismo pré-industrial para o industrial.
A partir dos pressupostos da interação ensino e pesquisa, da interdisciplinaridade e da socialização do conhecimento, esperamos que este número possa representar uma contribuição relevante para a comunidade acadêmica.
Agradecemos mais uma vez as professoras Daniella Lopes e Priscila Campello e sua equipe do Setor de Revisão, ao trabalho gráfico de Leandro Abreu, e aos funcionários do Centro de Memória e de Pesquisa Histórica da PUC Minas que tornaram possível essa publicação.
Mário Cléber Martins Lanna Júnior – Professor Doutor
Marcelo de Araújo Rehfeld Cedro – Professor Doutor
LANNA JÚNIOR, Mário Cléber Martins; CEDRO, Marcelo de Araújo Rehfeld. Editorial. Cadernos de História. Belo Horizonte, v.16, n.24, 2015. Acessar publicação original [DR]
50 anos do golpe civil-militar no Brasil / Cadernos de História / 2014
É com enorme satisfação que publicamos esta edição temática de Cadernos de História com a apresentação do Dossiê 50 anos do golpe civil-militar no Brasil. Os artigos que compõem este número da revista alinham-se às intensas discussões retomadas no meio acadêmico – e também fora dele – do autoritário e sombrio período da história brasileira. Por conta dessa efeméride, diversificadas releituras daquela conjuntura foram realizadas e registradas em inúmeras publicações, conferências, palestras, seminários, produções e exibições cinematográficas, depoimentos memorialísticos e documentos revelados. O presente dossiê é parte desse movimento de direito e dever da memória coletiva, a contribuição dos Cadernos de História para a reflexão crítica sobre a história brasileira recente.
O comício proferido pelo presidente João Goulart, realizado no dia 13 de março de 1964, foi um fato marcante nos desdobramentos do cenário de crise política e de tensão social anterior ao golpe civil-militar. Ao priorizar a realidade carioca daquela conjuntura, o artigo “O Comício da Central: o Rio de Janeiro de Jango”, de Demian Bezerra de Melo, apresenta os bastidores do evento, suas iniciativas de realização, as lideranças e os movimentos organizadores, os dias antecedentes, as repercussões da imprensa local e as reações do poder público estadual diante da surpreendente aglomeração de aproximadamente 200 mil pessoas no entorno da Central do Brasil. Esse episódio alarmou ainda mais os setores conservadores da sociedade brasileira provocando contraofensivas que integraram o conjunto de ações para a deflagração do golpe civil-militar.
Os respectivos artigos de Rodrigo José da Costa e Paulo Giovanni Antonino Nunes, “Do comício que não houve à marcha da vitória” e “Golpe civil-militar e repressão no imediato pós-golpe”, analisam as forças políticas e sociais atuantes naquele período, a repressão do poder público aos movimentos opositores e as repercussões da deposição de Jango percebidas nos Estados de Alagoas, Paraíba e Minas Gerais.
A repressão do regime militar é ilustrada no artigo de Carla Reis Longhi, “Vigilância e visibilidade – estratégias da ditadura civil-militar”, no qual a historiadora realiza ampla pesquisa no acervo do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (DEOPS) do Estado de São Paulo. Prontuários, atestados, encaminhamentos, solicitações de busca e matérias jornalísticas eram alguns dos documentos que compunham o material arquivado pela instituição no propósito de coletar informações sobre supostos suspeitos e transgressores ao governo militar. Nesta perspectiva, alinha-se o artigo “Os intelectuais da Escola Superior de Guerra e a vitória do ocidente”, escrito por Luiz Claudio Duarte, em que o autor investiga as narrativas reproduzidas pela intelectualidade civil e militar envolvida com a Escola Superior de Guerra, instituição brasileira coadunada aos pressupostos da Doutrina de Segurança Nacional e ao ideário internacional da Guerra Fria.
O artigo “Vida em abundância, saúde para todos”, de Marilane Machado, analisa a ação de instituições leigas de orientação religiosa, as Pastorais Católicas, que exerceram importante papel de resistência. Em oposição aos setores conservadores do alto clero, a Pastoral da Saúde denunciava as desigualdades socioeconômicas intensificadas pelo regime militar, configurando-se em movimentos sociais alinhados à Teoria da Libertação latino-americana. Marilane Machado analisa a realidade catarinense dos anos 1980, através do envolvimento da Pastoral Católica com o Centro de Estudos em Saúde de Florianópolis, no sentido de pleitear junto ao poder público local a ampliação do direito à saúde aos menos favorecidos socialmente.
Integram ainda o Dossiê, os artigos “50 anos do Golpe Militar / 35 anos da Lei de Anistia” e “Brasil: 1964-2014, uma comemoração possível”, de autoria das pesquisadoras Heloísa Amélia Greco e Maria Aparecida de Aquino. Ambos discutem acerca da transição política pactuada no Brasil, ao destacarem que a Lei da Anistia, promulgada em 1979, representou a construção do esquecimento no país em relação às arbitrariedades praticadas durante o regime militar, tanto por parte das lideranças do regime quanto pelos grupos guerrilheiros opositores. Neste sentido, Greco e Aquino dialogam com a memória e sugerem releituras críticas acerca dessa legislação, com o propósito de revelar e condenar atos praticados pelos torturadores.
Nessa ótica, entendemos que os Cadernos de História contribui para a comunidade acadêmica e para as propostas de pesquisa e de ensino ao integrar as oportunas releituras deste passado recente da história nacional, apresentando discussões instigantes e abrangentes sobre a temática do golpe civil-militar.
Mário Cléber Martins Lanna Júnior – Professor Doutor. Editor Gerente dos Cadernos de História da PUC Minas.
LANNA JÚNIOR, Mário Cléber Martins. Editorial. Cadernos de História. Belo Horizonte, v.15, n.22, 2014. Acessar publicação original [DR]