Festas e Festividades na História | Em Tempo de Histórias | 2022

Festas juninas Imagens Ministerio do TurismoAgencia Brasil
Festas juninas | Imagens: Ministério do Turismo/Agência Brasil

As festas e festejos de muitos e diferentes tipos, encontrados em todas as sociedades, são práticas que constituem o cotidiano das pessoas e grupos enquanto linguagem e experiência, como podemos observar em registros histórico desde os períodos mais remotos. Através dessas manifestações, os sujeitos se comunicam e fazem circular suas percepções de mundo, constroem sociabilidades e experimentam sensibilidades. Nesta perspectiva, os estudos de festas e festejos dedicam-se a pensar também o implícito, o simbólico, os elementos que compõem imaginários de quem festeja e representações do que é festejado. Isso perpassa a historicização de quem festeja e de como e onde se festeja. Conforme Maria Clementina Cunha (2001), pensar as festividades não é algo que reduz aos eventos em si, mas das pessoas que festejam. As diferenças e antagonismos se encontram, pensados em termos de classes sociais, etnicidade e/ou relações de gênero. Isso significa que não há suspensão dos conflitos.

Nas palavras de Bakhtin (2013), trata-se da teatralização da vida ao reverso; é o mesmo mundo que se comemora, com a diferença de que isto acontece em modo festivo. Assim, numa mirada bakhtiniana, a festa revela inúmeras formas e manifestações, deixando transparecer os desejos e anseios dos sujeitos, inclusive – e sobretudo – aqueles que não emergem nos dias considerados normais. Assim, reunimos trabalhos que pensam essas comemorações numa concepção de história social da festa, que pode ser considerada um modo de fazer história social, como uma sinédoque da sociedade. Tratase assim, de uma aproximação de lente, para que a festa possa falar não apenas por si mesma, pelos eventos de sua extensão e duração, como também de tudo que recapitula, densifica e expõe, em linguagem que pode ir do lúdico ao fúnebre, do cívico ao revolucionário, do respeitoso ao irreverente, havendo interseções e oscilações entre a predominância de um polo ou outro desses binômios. Em alguns estudos de fôlego, como o de Ladurie (2002), isto resulta muito nítido. Leia Mais

Devoções, festas e sociabilidades / Revista Brasileira de História das Religiões / 2015

Caros leitores!

É com imensa satisfação que apresentamos o vigésimo primeiro número da Revista Brasileira de História das Religiões!

Nesta edição contamos com artigos em torno da temática “Devoções, festas e sociabilidades”, resultante do V Encontro do GT História das Religiões e das Religiosidades da Associação Nacional de História (GTHRR-ANPUH), realizado na Universidade Federal da Bahia (UFBA), de 01 a 04 de dezembro de 2014. Nosso especial agradecimento às coordenadoras do evento, professoras Edilece Souza Couto e Elizete da Silva, que tornaram possível mais um debate qualificado e relevante para a temática das religiões e religiosidades e, junto a isso, a consolidação progressiva do GTHRR. “

Devoções, festas e sociabilidades” foi o tema desta edição do encontro, que oportunizou produtivas discussões, agregando significativas contribuições às nossas pesquisas e à nossa atuação docente. O evento contou com duas conferências proferidas pelas prefessoras Dra. Patrícia Folgeman (UBA) e Dra. Solange Ramos de Andrade (UEM).

As mesas-redondas versaram sobre variadas manifestações religiosas, contando com a presença dos seguintes profissionais: Eliane Cristina Deckmann Fleck (UNISINOS), Marta Borin (UFSM), Renata Siuda-Ambroziak (Universidade de Varsóvia Polônia), Antonio Lindvaldo Souza (UFS), Jânio Roque Castro (UNEB), José Roberto Severino (FACOMUFBA), Cândido da Costa e Silva (UCSAL), Edilece Souza Couto (UFBA), Mauro Passos (UFMG), Francisco Cancela (UNEB), Maria Hilda Baqueiro Paraíso (UFBA), Milton Araújo Moura (UFBA), Artur César Isaia (UFSC), Ileana Hodge (Universidad de Cuba), Vanda Fortuna Serafim (UEM), Fabrício Lyrio (UFRB), Íris Verena Oliveira (UNEB), Marli Geralda Teixeira, Elizete da Silva (UEFS), Lyndon Araújo (UFMA), Vasni Almeida (UFT), Leonardo Ferreira de Jesus (Rede Estadual da Bahia), Marcos Diniz (UECE) e André Luis Mattedi Dias (UFBA).

Essa edição da RBHR propriamente dita compõe-se de trabalhos que evidenciam a proficuidade dos estudos temáticos. O texto que abre as discussões “Festas, Devoções e sociabilidades” é uma contribuição da historiadora Patrícia Folgeman e contempla, de modo emblemático, um esforço que perpassa os demais trabalhos, isto é, pensar a “religião” e suas interfaces com outros conceitos utilizados na historiografia como “religiosidade” e “religiosidade popular”, contemplanto o uso de imagens, a criação e circulação de discursos religiosos e as redes de relações sociais derivadas de grupos e instituições.

O texto de Renata Siuda- Ambroziak trata das devoções marianas oficiais em análise comparativa do Brasil e Polônia, especificamente das crenças e práticas em prol de Nossa Senhora Aparecida e Nossa Senhora do Monte Claro, evidenciando suas aproximações e singularidades. Ainda analisando as crenças e práticas em honra a Nossa Senhora, Marta Rosa Borin avalia as tensões e conflitos referentes à devoção mariana no Rio Grande do Sul no início do século XX. Sua abordagem avalia as devoções a Nossa Senhora Medianeira Mediadora de Todas as Graças e A Mãe Rainha e Vencedora Três Vezes Admirável de Schöenstatt e as tentativas de consolidação e hegemonia aventadas pelos propulsores de cada devoção.

Eliane Cristina D. Fleck atém-se a devoção e piedade dos índios Guarani manifestas na religiosidade das missões jeusítico-guaranis do século XVII, a partir da documentação das Cartas Ânuas, analisadas pela autora. Mauro Passos, por sua vez, avalia a plasticidade da tradição religiosa e da sociabilidade do Congado no interior de Minas Gerais, salientando as idiossincrasias entre a religião oficial e a religiosidade popular ante tais práticas. Um olhar para as práticas devocionais também é foco de análise de Edilece Souza Couto, que em seu artigo atenta para as irmandades e ordens terceiras existentes em Salvador / BA, analisando as transformações arquitetônicas e legais que incindiram sobre as práticas religiosas ali realizadas.

A cultura e a religiosidade indígena e afro-brasileira também estão contempladas nos artigos de Francisco Cancela, Artur Cesar Isaia e Vanda F. Serafim. Cancela apresenta resultados de sua pesquisa acerca dos rituais mágico-curativos realizados em Porto Seguro entre os séculos XVIII e XIX. O autor evidencia o quanto práticas qualificadas como bebedeiras, batuques e superstições pelas autoridades evidenciavam a criatividade de seus partícipes em afirmar, reiventar e ressignificar valores tidos como oficiais para manter elementos de sua cultura. Para tanto o autor evidencia os intercâmbiso culturais e a socibilidade interétnica que se estabeleceram em um contexto de políticas de políticas assimilacionistas empreendidas pelas lideranças luso-brasileiras. Artur Isaia, em análise acerca do papel e atuação dos intelectuais da umbanda, evidencia seu esforço em compreender e “nomear” (termo do autor) a realidade do país considerando a própria religião como um de seus elementos base, “a” religião nacional. Vanda Fortuna Serafim atém-se ao intelectual Raimiundo Nina Rodrigues para analisar como as crenças e as devoções afro-brasileiras foram lidas pelo autor. Em especial, a autora acompanha as digressões de Nina Rodrigues concernentes ào conceito de festa. Revista Brasileira de História das Religiões.

Encerram o eixo temático dois artigos que versam sobre práticas e discursos. Marcos José Diniz Silva dedica-se a analisar o jornal O Nordeste de matriz católica e a construção de representações e valorações negativas ao espiritismo nos anos 1920. Seu foco prende-se aos mecanismos de condenação da crença espírita em expansão no sertão do Ceará. Por sua vez, o texto de Elizete da Silva pontua o investimento educativo e social dedicado às mulheres pelas religiões protestantes.

A Revista conta ainda com dois artigos livres. Em A cura dos corpos e a libertação das almas, Marilane Machado analisa como os discursos da Teologia da Libertação reverberaram na Pastoral da Saúde de Florianópolis / SC, em um contexto de extrapolamento da ação de instituições hospitalares e religiosas para a atuação junto às comunidades. Ana Rosa Cloclet Silva e Laís da Silva Lourenço, com o texto Entre a política e a religião, atém-se aos discursos difusos pelo semanário O Justiceiro , editado pelos padres Diogo Antônio Feijó e Miguel Arcanjo entre 1834 e 1835. Seguem-se a estes artigos livres duas resenhas, a primeira, de Marcos José Diniz da Silva, que apresenta a obra Do outro lado. A história do sobrenatural e do espiritismo, de Mary Del Priore; e a de Diego Omar da Silveira, que evidencia as discussões existentes na obra Intelectuais e militância católica no Brasil, organizada por Cândido Moreira Rodrigues e Christiane Jalles de Paula.

Desejamos a todos uma boa leitura!

Vanda Serafim

Gizele Zanotto


SERAFIM, Vanda; ZANOTTO, Gizele. Apresentação. Revista Brasileira de História das Religiões. Maringá, v.7, n.21, jan. / abr., 2015. Acessar publicação original

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Festas, Cultura e Ambiente no Caribe / Revista Brasileira do Caribe / 2013

O Caribe surpreende pela sua capacidade de mostrar frequentemente ao mundo que a modernidade é um processo contraditório e que as desigualdades e injustiças vêm se perenizando no seu curso, para além do desenvolvimento tecnológico e das possibilidades que este abre em termos de educação, saúde, moradia e outros domínios da existência humana. A inquietude de sua gente diante da dominação colonial que ainda não conheceu o fim, a efervescência cultural verificada em diversas linguagens, os processos migratórios em várias migrações e suas intensas conexões com diversas outras regiões do mundo fazem do Caribe um desafio permanente de pesquisa e reflexão.

Este número se debruça diante da relação entre festa, cultura e ambiente. Seu primeiro artigo, de Giliard da Silva Prado, apresenta a relação entre as comemorações da Revolução Cubana e sua legitimação, a partir da análise dos discursos de seus líderes, focando principalmente as transformações verificadas neste processo ao longo de mais de cinco décadas.

O segundo artigo, de Milton Moura, bem como o terceiro, de Edgar Gutiérrez, abordam as festas populares no Caribe Colombiano, mais precisamente, em Cartagena de Indias. Milton Moura aborda sobretudo as transformações recentes ocorridas na Festa de Independência daquela cidade, enquanto Edgar Gutiérrez tece considerações mais amplas sobre o fazer festivo na Costa e sua importância na história desta porção do Caribe, abrangendo iniciativas de produção cultural neste âmbito. De forma complementar, o quarto texto, de Eduardo Hernández Fuentes, discorre sobre a dimensão festiva da Costa a partir da reflexão sobre o Projeto BordCaribe, relacionando este aspecto da sociedade caribenha a expressões artísticas contemporâneas.

De que é feito o Caribe? De praias e rotas de navegação? De fortalezas e praças de comércio? De tambores, guitarras e ritmos que alcançam sucesso em boa parte do mundo? Em que mesmo consiste esta região de história tão dramática, de natureza tão singular, em que vivem sociedades tão marcadas pelos trânsitos interétnicos e pela violência? O que faz como que esta parte da América atraia tanto os olhares e ouvidos da humanidade como uma região especialmente vigorosa na sua expressão?

Poder-se-ia perguntar, em tantos casos, onde termina a peleja política e onde começa a festa. A esta indagação, em vão se procuraria responder. As sociedades caribenhas, desde o início, têm suas expressões plásticas, musicais e coreográficas no núcleo de sua vitalidade diuturna. Por isso não se poderia pensar autenticamente em um tipo de arte desencarnada, assim como não se poderia falar em um tipo de festa que não tivesse, estampada em suas manifestações, sua dimensão política. Assim como o ambiente, que aparece sempre paradisíaco na propaganda turística e, por outro lado, se constitui como uma arena de conflitos, quando se coloca a perspectiva da escassez dos recursos naturais e a questão ético-biológica da sustentabilidade.

O Caribe surpreende pela sua capacidade de mostrar frequentemente ao mundo que a modernidade é um processo contraditório e que as desigualdades e injustiças vêm se perenizando no seu curso, para além do desenvolvimento tecnológico e das possibilidades que este abre em termos de educação, saúde, moradia e outros domínios da existência humana. A inquietude de sua gente diante da dominação colonial que ainda não conheceu o fim, a efervescência cultural verificada em diversas linguagens, os processos migratórios em várias migrações e suas intensas conexões com diversas outras regiões do mundo fazem do Caribe um desafio permanente de pesquisa e reflexão.

Este número se debruça diante da relação entre festa, cultura e ambiente. Seu primeiro artigo, de Giliard da Silva Prado, apresenta a relação entre as comemorações da Revolução Cubana e sua legitimação, a partir da análise dos discursos de seus líderes, focando principalmente as transformações verificadas neste processo ao longo de mais de cinco décadas.

O segundo artigo, de Milton Moura, bem como o terceiro, de Edgar Gutiérrez, abordam as festas populares no Caribe Colombiano, mais precisamente, em Cartagena de Indias. Milton Moura aborda sobretudo as transformações recentes ocorridas na Festa de Independência daquela cidade, enquanto Edgar Gutiérrez tece considerações mais amplas sobre o fazer festivo na Costa e sua importância na história desta porção do Caribe, abrangendo iniciativas de produção cultural neste âmbito. De forma complementar, o quarto texto, de Eduardo Hernández Fuentes, discorre sobre a dimensão festiva da Costa a partir da reflexão sobre o Projeto BordCaribe, relacionando este aspecto da sociedade caribenha a expressões artísticas contemporâneas.

O quinto artigo, de Joseania Miranda Freitas, coloca a importância dos museus como estratégia de dinamização cultural e de reflexão sobre o patrimônio cultural a partir de pesquisas e intervenções no Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia, em Salvador, destacando a importância da formação dos estudantes para a percepção do valor das coleções presentes nos museus aos efeitos de uma educação etno-cultural.

O sexto artigo, de Dernival Venâncio Ramos Júnior, toma como problema a construção da nacionalidade moderna na América Latina, enfocando o drama colombiano. O autor sublinha as dificuldades que as elites andinas, que capitanearam o estabelecimento dos estados nacionais ao longo da cordilheira, encontraram no sentido de forjar um projeto propriamente nacional, que pudesse incluir e integrar diferentes territórios e grupos étnicos. Destaca-se o papel dos intelectuais neste processo.

Olga Cabrera e Rickley Leandro Marques construíram o sétimo artigo a partir de pesquisas realizadas em Santana dos Pretos, no Maranhão, Brasil, e no Palenque de San Basílio, em Cartagena de Indias, na perspectiva de uma educação etno-histórico-ambiental. Consideram a importância da percepção da dimensão transnacional manifesta nas culturas negras da Diáspora para uma reflexão sobre os rumos e modelos da educação, justamente em áreas tão empobrecidas em que a dominação colonial perdura de formas renovadas.

O oitavo artigo, de Gilberto Javier Cabrera Trimiño, enfoca as práticas da agricultura urbana em Ciudad Habana, Cuba. Esta estratégia foi estimulada para a produção de alimentos para as populações urbanas, levando em conta os saberes destas populações em termos ambientais como um recurso fundamental para enfrentar o drama da segurança alimentar.

A perspectiva de gênero se mostra cada vez mais relevante na análise das sociedades caribenhas. Sonia Catasús Cervera, no nono artigo, mostra que o modo como se dá o desenvolvimento econômico e social tem influxos sobre o comportamento reprodutivo da população, como se pode verificar pelas modificações na taxa de nupcialidade e na idade média para o enlace matrimonial, bem como na taxa de divórcio. O estudo parte da comparação entre os quadros de Cuba e República Dominicana, destacando a especificidade do Oriente Cubano.

Por fim, o décimo artigo, de Isabel Ibarra, apresenta as transformações na sociedade cubana contemporânea a partir da análise realizada pela autora das cartas de cubanos à ONG Puente Familiar con Cuba.

A partir destas miradas múltiplas, temos mais uma oportunidade de nos voltarmos reflexivamente sobre o Caribe e continuar desdobrando nosso papel de pesquisadores, artistas, pensadores e profissionais envolvidos em políticas públicas, no sentido de buscar estratégias de desenvolvimento que não somente respeitem o legado etno-histórico destas sociedades; mais do que isto, trata-se de pensar estratégias que considerem o próprio patrimônio cultural caribenho como uma base fecunda a partir da qual se possa pensar caminhos de construção da prosperidade, da paz e da liberdade. O Caribe anseia por isto.

Milton Moura – Universidade Federal de Bahia. Salvador de Bahia, Br.


MOURA, Milton. Festas, Cultura e Ambiente no Caribe. Revista Brasileira do Caribe, São Luís, v.14, n.27, p.7-10, jul./dez., 2013. Acessar publicação original [IF].

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Festas / Revista Brasileira de História / 2011

Neste ano de 2011 a Revista Brasileira de História completou 30 anos. Criada em 1981 com o objetivo de se constituir em um canal de divulgação da produção dos professores e historiadores brasileiros, teve o intuito inicial de suprir o vazio deixado pelo fim da publicação dos Anais dos Simpósios da Anpuh, em 1978, e veio ao encontro das conquistas no campo científico e da necessidade de sua divulgação. De acordo com a apresentação da professora Alice Canabrava, sua primeira editora, uma parte do periódico deveria dar publicidade a artigos originais sobre pesquisas de História ou de seu interesse. A atualização permanente com respeito à bibliografia histórica seria objeto de outra seção. Foi considerada, de início, especialmente a produção dos periódicos consagrados à História, nacionais e estrangeiros, no sentido de proporcionar aos professores e pesquisadores uma contribuição que viesse suprir a carência das bibliotecas universitárias. Essa informação bibliográfica deveria ser ampliada para divulgar também comentários de obras históricas. Finalmente, o “Noticiário” deveria tornar mais conhecida a atividade dos Núcleos Regionais, “dar maior publicidade aos conclaves de História realizados no país e no exterior e a outros assuntos de interesse para os que militam no campo da História” (RBH, v.1, n.1, 1981, p.9).

Com periodicidade semestral, a RBH já alcançou a publicação de 62 números. A partir do número 59, a Revista iniciou uma nova etapa, passando a ser somente digital e a oferecer uma versão em inglês. Essas inovações visam ampliar o escopo de circulação do periódico, permitindo o acesso à nossa produção de um público não conhecedor da língua portuguesa, bem como agilizar a consulta dos volumes novos e antigos. Um balanço dos acessos aos números mais recentes da RBH na internet nos mostra a dimensão e a repercussão que nossa produção pode alcançar através da web. Nos últimos dez números, a quantidade de acessos por mês foi superior a 20 mil (mais de 240 mil / ano), uma abrangência impensável para os impressos, confirmando a grande importância da internet na disseminação dos conteúdos da Revista e fazendo da web um instrumento precioso para a divulgação da historiografia produzida no Brasil e sobre o Brasil.

No segundo semestre de 2011 atingimos um novo marco importante. Com o objetivo de ampliar a internacionalização da produção acadêmica brasileira, a Capes decidiu apoiar dois periódicos por área, ao longo de cinco anos, com a intenção de convertê-los em referências. Em nossa área optou-se por edital interno em que poderiam concorrer todas as revistas classificadas entre Qualis A1 e B2. Responderam ao convite 12 revistas, então avaliadas por um comitê escolhido especificamente para esse fim. Entre as duas selecionadas, a Revista Brasileira de História foi escolhida por unanimidade. Essa aprovação não só representa o reconhecimento da importância do papel da RBH e da Anpuh, mas também nos permitirá alcançar um novo patamar, podendo ampliar o número de artigos publicados, produzir a edição trilíngue – em espanhol e inglês – e alcançar uma maior interação com a comunidade internacional de historiadores.

Neste número elegemos para o dossiê o tema “Festas”, que surgiu sem anúncio prévio e como resultado do grande interesse despertado para o número anterior, “Comemorações”. Em verdade, a grande oferta de mais de 110 textos focalizando celebrações, festejos e eventos vinculados à construção de memórias e identidades, já aprovados por pareceristas, nos levou a optar por abrir um novo dossiê. Como historiadores, sabemos que comemorar não é um ato sem maiores implicações, pois envolve escolhas e projetos e funciona para estabelecer laços identitários entre diferentes grupos sociais. E é exatamente porque permitem legitimar e atualizar identidades que as celebrações públicas ocupam um lugar central no universo contemporâneo.

Para este dossiê foram selecionados cinco artigos. Iniciamos com o texto de Petrônio José Domingues, “‘A redempção de nossa raça’: as comemorações da abolição da escravatura no Brasil”, que focaliza em São Paulo, nas primeiras décadas do século XX, como estratos da população negra saíam às ruas todo ano para comemorar o 13 de Maio – data da abolição –, por meio de romarias, missas, conferências cívicas, discursos solenes, festivais artístico-culturais, bailes, música, dança e teatro, quase sempre embalados por um clima de emoção e alegria. O segundo artigo, de Jocelito Zalla a Carla Menegat, trata da “História e Memória da Revolução Farroupilha” com o objetivo de apresentar um panorama das manifestações em torno dessa revolução, desde o próprio episódio até sua consolidação como mito fundador da identidade regional no Rio Grande do Sul. Isabel Bilhão, em “‘Trabalhadores do Brasil’: as comemorações do Primeiro de Maio em tempos de Estado Novo varguista”, analisa as mudanças e permanências em seus rituais comemorativos, bem como as estratégias de preparação, apresentação e legitimação de suas comemorações por parte do governo. Crislane Barbosa Azevedo no trabalho “Celebração do civismo e promoção da educação: o cotidiano ritualizado dos Grupos Escolares de Sergipe no início do século XX” busca compreender o funcionamento cotidiano de tais instituições por meio da identificação e análise dos diferentes eventos de caráter escolar e cívico. Lucileide Costa Cardoso em “Os discursos de celebração da ‘Revolução de 1964′” aborda aspectos desses discursos construídos pelos militares entre os anos de 1964 e 1999, através dos quais buscaram explicitar as motivações da articulação do Golpe de Estado, a estruturação do regime e o seu desfecho em 1985. O objetivo, portanto, é analisar as concepções de história, o sentido e o caráter das comemorações, estabelecendo regularidades que possam elucidar a estruturação do pensamento anticomunista e autoritário em disputa no campo da memória por uma determinada apropriação do passado.

A seção se avulsos apresenta sete artigos: Andre de Lemos Freixo, em “Um ‘arquiteto’ da historiografia brasileira: história e historiadores em José Honório Rodrigues”, analisa a história da historiografia brasileira segundo a perspectiva de José Honório Rodrigues (1913-1987), como parte dos esforços que na década de 1930 começaram a investir nos aspectos profissionais da História como disciplina no Brasil – enfatizando, por exemplo, a função central da metodologia histórica como diferencial frente às escritas amadoras. Juliana Pirola da Conceição e Maria de Fátima Sabino Dias no artigo “Ensino de História e consciência histórica latino-americana” apresentam a pesquisa desenvolvida sobre a contribuição dos conteúdos latino-americanos na grade curricular de ensino para a formação histórica dos jovens na escola. Letícia Borges Nedel em seu texto “Entre a beleza do morto e os excessos dos vivos: folclore e tradicionalismo no Brasil meridional” examina a participação gaúcha no autodenominado Movimento Folclórico Brasileiro, entre as décadas de 1940 e 1960. Cássia Rita Louro Palha em “Televisão e política: o mito Tancredo Neves entre a morte, o legado e a redenção” aborda a produção cultural da televisão brasileira, em especial da Rede Globo de Televisão e de seu telejornalístico Globo Repórter no desaguar da chamada ‘abertura política’, tendo como mote a veiculação da imagem política de Tancredo de Almeida Neves e os processos de construção simbólica que envolveram a sua mitificação. Carolina Amaral de Aguiar no artigo “Cinema e História: documentário de arquivo como lugar de memória” analisa o filme A espiral (1975), um documentário que focaliza a Unidade Popular no Chile com base em materiais pesquisados em arquivos. José Iran Ribeiro em “O fortalecimento do Estado Imperial através do recrutamento militar no contexto da Guerra dos Farrapos” analisa o significativo crescimento e atuação do Exército Imperial brasileiro e a capacidade das autoridades em recrutar efetivos necessários para o fortalecimento da autoridade imperial. Jorge Pimentel Cintra e Júnia Ferreira Furtado no texto “A Carte de l’Amérique Méridionale de Bourguignon d’Anville: eixo perspectivo de uma cartografia amazônica comparada” analisam do ponto de vista da cartografia alguns mapas da região amazônica de meados do século XVIII que visavam à produção de um documento que servisse de base para as negociações do Tratado de Madri.

Neste número publicamos também uma entrevista com Bartolomé Clavero, catedrático da Universidad de Sevilla com vasta obra na área de história do direito e das instituições. A entrevista foi coordenada por Ivan de Andrade Vellasco e realizada em abril de 2011.

Este número apresenta ainda duas resenhas. Tereza Maria Spyer Dulci escreve sobre o livro O dia em que adiaram o Carnaval: política externa e a construção do Brasil (Ed. Unesp, 2010), de Luís Cláudio Villafañe Santos, e Carlos Roberto Figueiredo Nogueira analisa Inventar a heresia? Discursos polêmicos e poderes antes da Inquisição (Ed. Unicamp, 2009), organizado por Monique Zerner.

Completam esta apresentação textos em homenagem a Maria Yedda Leite Linhares (titular da UFRJ) e Eni de Mesquita Samara (titular da USP), ambas destacadas professoras e historiadoras brasileiras, falecidas neste ano.

Mais uma vez convidamos nossos leitores a consultar o site da Anpuh e do SciELO e baixar nos computadores ou nos leitores digitais os artigos de seu interesse.

Marieta de Moraes Ferreira
dezembro de 2011


FERREIRA, Marieta de Moraes. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.31, n.62, dez., 2011. Acessar publicação original [DR]

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