Posts com a Tag ‘Família’
Chiloé: genealogía, familia y sociedad | Pablo A. Pérez
Pablo Antonio Pérez | Imagem: Cristián Cofré León
Hace ya varios años que el trabajo de investigación de Pablo A. Pérez viene llamando la atención de los estudiosos de la historia y genealogía del archipiélago de Chiloé y sus áreas de influencia cultural. No en vano, la sesentena de artículos publicados en distintas revistas especializadas en Chile, Argentina, Perú, España, Estados Unidos, entre otros países, dan cuenta de la labor minuciosa y erudita del investigador. La reciente aparición del libro autoeditado Chiloé: genealogía, familia y sociedad, viene a ser una síntesis de largos años de trabajo, presentándonos un análisis histórico-sociológico de la formación de la sociedad chiloensis, fruto del acabado estudio de los antiguos linajes, el desarrollo de los núcleos familiares y las costumbres isleñas entre los siglos XVII y XX.
La obra en cuestión, prologada por el Dr. Jorge del Real Westphal, presidente del Instituto Chileno de Investigaciones Genealógicas, está compuesta de dos partes. La primera, titulada “Genealogía”, hace un repaso de los fundamentos y principios de esta diciplina en su valor como un campo de saber autónomo y discute el lugar que se le ha asignado de simple “ciencia auxiliar” así como los prejuicios que subyacen sobre ella “como un conocimiento para nostálgicos, mentirosos y clasistas” (39), en lo que al autor denomina “rehabilitación de la genealogía como diciplina científica”, evidenciando su vocación interdisciplinaria capaz de traspasar su habitual afiliación con la heráldica y la diplomática, vinculándola con otras diciplinas como la historia, la antropología, la demografía e incluso la biología y genética. Leia Mais
Da direita Moderna à Direita Tradicional | Cesar Ranqueta Júnior
Cesar Ranqueta Júnior | Imagem: Unipampa
De autoria de Cesar Ranqueta Jr, o livro Da direita Moderna a Direita tradicional, publicado em 2019, tem duas ambições. A primeira delas é reconstituir historicamente o conceito de Direita, sistematizando argumentos e compilando autores que são ícones para sua fundamentação no mundo ocidental. A segunda é, a partir de uma análise dessa corrente de pensamento no Brasil, apresentar suas fragilidades, incongruências, antinomias e propor, a partir dessas análises, uma fundamentação teórica a ser seguida.
O interesse do autor por essa questão tem como base uma dupla crítica que é por demais razoável em uma sociedade cada vez mais polarizada e marcada por uma naturalização de conceitos do campo da política. A primeira é a recusa aos autores filiados ao pensamento de direita, assim como às suas ideias nos círculos especializados de debate, implicando em seu desmerecimento. A segunda está na forma pela qual esses pensadores tendem a ser adjetivados: “fascistas” e “anacrônicos”. Para Ranqueta, esta última é uma clássica estratégia da esquerda em desmerecer seu maior rival ideológico. Para nós, trata-se de um problema de metodológica científica. Leia Mais
A carta da Condessa: família, mulheres e educação no Brasil do século XIX | Samuel Albuquerque
Certas obras voltadas para o campo histórico comumente utilizam fontes epistolares como suporte para a pesquisa de biografias e trajetórias de vida de determinadas personagens. Avançando sobre esta proposta, o livro A carta da Condessa, escrito por Samuel Albuquerque1, amplia as perspectivas de análise histórica da fonte epistolar, uma vez que ela permite conhecer melhor os agentes históricos que se correspondem, mas também contribui na compreensão da conjuntura e do cotidiano na qual a carta e seus autores estavam inseridos.
Tomando esse caminho, o autor consegue compor um livro rico em detalhes por envolver a atuação de mulheres como preceptoras no Brasil durante o século XIX, e sensível aos olhares do leitor que é levado ao deleite do cotidiano feminino Oitocentista, bem como seus desafios, (des)afetos e deslocamentos pelo Atlântico. Leia Mais
As ruínas da tradição: a Casa da Torre de Garcia d’Ávila/ família e propriedade no nordeste colonial | Ângelo Emílio da Silva Pessoa
O livro que ora se resenha em sua segunda edição é fruto da tese de doutoramento de Ângelo Emílio da Silva Pessoa defendida junto ao departamento de história da USP. Graduado em licenciatura Plena em história pela Universidade Federal da Paraíba (1988) e doutorado em história social pela Universidade de São Paulo (2003). Foi professor Adjunto da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus de Nova Andradina entre (2006 e 2008). Atualmente é professor Associado I do Departamento de História do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal da Paraíba, estando vinculado ao quadro permanente do PPGHUFPB.
O trabalho está didaticamente bem dividido em três partes que o compõe e o interligam num diálogo dinâmico; tradição é o primeiro capítulo e nele explora a historicidade da Casa da Torre, “Propriedade” é o título que ilustra o segundo capítulo e estuda aspectos da geo-história ao delimitar a extensão da propriedade ou da sesmaria que, via de regra, era de “perder de vista” e, muitas vezes, incomensurável, sobretudo, porque os limites eram, em muitos casos, imaginários e ou simplesmente abstratos. Ainda neste capítulo ao se estudar a noção de propriedade o autor revela sua enorme capacidade de intelectual decolonial para analisar a situação e a relação do senhor de terras Garcia d’Ávila com os índios, ora de amizades, mas na maior parte das vezes de conflito chegando a revelar massacres cometidos pelo grande fazendeiro expansionista em busca de novos pastos para a sua boiada, que foi o grosso dos seus negócios. O terceiro e último capítulo fecha o livro e dá o desfecho no que foi estudado intitulando-se “família”, busca analisar questões de economia ao longo das gerações que carregam o sobrenome, especificamente a pecuária, carro chefe da Casa da Torre, mas também pequenos engenhos, exploração de salitre, prata, produção de couro, e demais artífices. Leia Mais
Famiglia Novecento. Vita familiare, rivoluzione e dittature 1900-1950 – GINSBORG (BC)
GINSBORG, Paul. Famiglia Novecento. Vita familiare, rivoluzione e dittature 1900-1950. Torino: Einaudi, 2013. 678p. Resenha de: PERILLO, Ernesto. Il Bollettino di Clio, n.13, p.120-123, lug., 2020.
La famiglia esiste? La ricerca storica (e non solo) aiuta a dare una risposta: si incarica di dirci se la famiglia sia sempre esistita, come si sia formata, come si sia trasformata nel tempo e nelle diverse società.
Nei libri di storia generale, e non parlo solo dei manuali scolastici, la famiglia non c’è. Un po’ come, se è lecito il paragone, le donne e il genere (con cui peraltro la famiglia condivide ampi legami). Solo qualche rapida descrizio ne in alcuni momenti e periodi, senza che sia possibile per studentesse e studenti comprendere la dimensione storica della famiglia, le connessioni e le interdipend enze con i contesti sociali, economici, culturali, le trasformazioni nel tempo, le cesure essenziali, le lunghe durate di ruoli, relazioni, funzioni. La famiglia è un presupposto, si dà per scontata.
Ma nulla è più importante, lo sappiamo, che mettere in discussione i presupposti implic iti che reggono le nostre idee e i nostri pensieri. Le nostre visioni del mondo e della sua storia. Il libro di Paul Ginsborg aiuta a colmare questo vuoto.
Il progetto originario era quello di analizzare il tema della famiglia lungo tutto il Novecento, con uno spartiacque collocato dopo la fine del secondo conflitto mondia le, quando la sconfitta delle dittature e dei fascismi inaugurò anche per la famiglia una nuova epoca. La quantità di materia le accumulato e la ricchezza dei temi hanno orientato l’autore a prendere un’altra decisione: la pubblicazione di un volume relativo alla prima metà del secolo scorso. Un secondo libro avrebbe poi raccontato il seguito della storia fino agli ultimi anni del Novecento.
Un progetto ambizioso, dunque, importante e innovativo: tematizzare la famiglia non solo come oggetto dell’indagine storica ma come soggetto di questo racconto, scritto assumendo quel punto di vista.
La scelta nasce da lontano. Nel 1993, facendo un bilancio della storia della famiglia in età contemporanea (cfr. Famiglia, società civile e stato nella storia contemporanea: alcune considerazioni metodologiche, in “Meridiana”, 1997, n.17, pp. 179-208), Ginsborg denunciava già il sostanziale silenzio della storiografia sulla connessione tra famiglia e politica.
«C’è il rischio, dunque, che la storia della famiglia venga rinchiusa in un ghetto metodologico, in parte per sua stessa colpa, che rimanga uno «studio di area» invece di una parte essenziale di ogni ragionamento storiografico che tenti di legare le istituzio ni sociali, tra le quali la famiglia deve essere considerata la più importante, alle istituzio ni dello stato. La marginalizzazione della dimensione politica nella storia della famiglia comporta la marginalizzazione della famiglia dalla grande storia.» (p.180).
E nel suo libro L’Italia del tempo presente (Einaudi, 1998) il sottotitolo Famiglia, società civile, Stato evidenzia la volontà di assicurare alla famiglia un’attenzione specifica. In questo volume la connessione tra famiglia e storia politica è al centro, occupa tutta la scena.
La necessità è quella di non separare la storia della famiglia dalla storia politica, o la storia sociale da entrambe, ma di cercare come priorità metodologica la relazione tra di esse. E di raccontare, dunque, la storia del Novecento attraverso la lente della vita familiare per rileggere quel periodo.
Da qui, l’attenzione non solo alla politica per la famiglia (le diverse iniziative degli Stati in questo ambito), ma soprattutto alla politica della famiglia, tramite le molteplici e variegate interconnessioni tra individui, famiglia, società civile, Stato. Un rovesciamento di prospettiva che non solo mette in evidenza l’istituzio ne famiglia, ma modifica, arricchendolo, il significato di storia politica.
Il tempo, lo abbiamo detto, è quello della prima metà del Novecento. Sullo sfondo la grande guerra, le rivoluzioni, il primo dopoguerra e l’affermazione dei regimi dittatoriali. Anni di profonde trasformazio ni che l’autore attraversa esaminando in chiave comparativa la storia della famiglia in vari Stati-Nazione: la Russia, prima e dopo la rivoluzione sovietica; la Turchia, dall’Impe ro Ottomano alla Repubblica kemalista; l’Italia fascista; la Spagna prima e durante il regime franchista; la Germania, dalla Repubblica di Weimar al nazionalsocialismo; l’Unio ne sovietica staliniana. A ciascuno di questi stati è dedicato un capitolo (un centinaio di pagine circa) del libro.
Tre sono gli elementi metodologicame nte interessanti del volume di Ginsborg. Il primo è dato dalla pluralità dei temi messi in campo, delle angolature e delle tessere utilizzate per ricostruire il mosaico della famiglia: l’uso originale delle biografie di personaggi esemplari (Alexandra Kollontaj per la Russia rivoluzionaria, la scrittrice nazionalista Halide Edib per la Turchia del primo Novecento, Il futurista Filippo Marinetti per l’Italia fascista, la femminista Margarita Nelken per la Spagna e per la Germania Joseph Goebbels come modello archetipico della famiglia nazista); la ricostruzione della vita delle famiglie comuni, con particolare attenzione a quelle contadine e operaie; la focalizzazione sulle diseguaglianze di genere e le lotte delle femministe; il controllo spesso violento e repressivo della grandi dittature verso le famiglie e allo stesso tempo i sogni e le proposte rivoluzionarie e utopiche maturate in quegli anni; la legislazione e i codici che ne hanno definito ruoli, regole, diritti e doveri e le teorie politic he che ne hanno tentato letture e interpretazio ni complessive.
Con questa tavolozza l’autore disegna il suo racconto che procede ricostruendo ampi quadri descrittivi degli Stati esaminati, all’interno dei quali si possono cogliere la ricchezza e la complessità dell’universo familiare e il ruolo della famiglia come istituzione politica e civile, non riducibile alla sola dimensio ne privata.
La chiave comparativa è l’altra importante ossatura del libro: la prima metà del Novecento è un’epoca di grandi e radicali trasformazio ni che sconvolgono l’assetto geopolitico dell’Europa, le strutture economiche, le società e anche le mentalità collettive. Rivoluzioni e dittature sono messe a confronto con la vita familiare.
Si scoprono analogie: ad esempio il predominio della struttura patriarcale, tratto largamente dominante e trasversale ai differenti contesti; il sostegno, la difesa e la regolamentazione della famiglia riconosciuta dai diversi regimi assieme alla repressione di massa di determinate categorie di famiglie, su base etnica, razziale, nazionale, di classe, religiosa o politica, al là dei contenuti ideologici differenti che li caratterizzano; il ruolo della società civile che fu sostanzialmente soffocata dall’oppressione dei diversi regimi che eliminarono qualsiasi forma di pluralismo, dall’Impero ottomano, alla Russia rivoluzionaria, alla stessa esperienza degli anarchici spagnoli.
E anche significative differenze: per esempio comparando l’effettivo potere sulle famiglie è possibile allineare i diversi regimi lungo un continuum che va dal relativo lassismo di Mussolini in Italia al più alto controllo del nazisti che adottano una politica eugenetica contro i membri più deboli della loro stessa comunità nazionale. O relativamente ai rapporti di genere e al ripensamento stesso della vita familia re, particolarmente significativa è stata l’esperienza rivoluzionaria russa che si distingue per la lotta al patriarcato e i diversi tentativi di emancipazione femminile. Le proposte di Alexandra Kollontaj, unica donna a far parte del Consiglio dei commissari del popolo guidato da Lenin, di una grande società famiglia nella quale si superasse definitivamente il modello della famiglia, fallirono ma decisive e importanti furono le ricadute di quella riflessione sui codici di famiglia che ne derivarono così come fu essenziale l’aver affermato il ruolo centrale dei rapporti sessuali e sentimentali nella lotta per la liberazione.
Ma, mentre in Russia dopo la rivoluzione la famiglia borghese era da superare e abbattere, nella Turchia di Mustafa Kemal rappresentava una prospettiva rivoluzionaria: “applicare nel 1926 il Codice civile svizzero a una società prevalentemente rurale e musulmana fu un atto straordinario di rivoluzione dall’alto” (p. 614) Un ruolo particolare fu quello della Chiesa cattolica che di fronte alle dittature “non difese la vita familiare in sé, ma piuttosto la civiltà cattolica” (p.620). L’integralismo di Pio XI e Pio XII era più preoccupato di affermare il primato dell’ ecclesia che i valori del pluralismo, della libertà e della democrazia.
C’è inoltre un altro aspetto che qualifica questo libro di storia: i documenti iconogra fic i e la rappresentazione visuale della famiglia. Le complessive 135 illustrazioni ne sono parte integrante, fornendo ulteriori chiavi di lettura del tema assieme ai dipinti di alcuni grandi artisti della prima metà del Novecento – Archile Gorky, Pablo Picasso, Mario Sironi, Max Beckman, Kazimir Malevic e altri ancora – le cui opere sono presentate in 18 tavole fuori testo.
L’appendice statistica sugli aspetti demografici della storia della famiglia in chiave comparativa, curata dall’autore insieme a Giambattista Salinari, tematizza tre aspetti: la transizione demografica, le catastrofi demografiche e le politiche eugenetiche.
Nelle considerazioni finali, P. Ginsborg tirando le fila del suo lungo percorso di analisi mette in discussione la categoria di totalitarismo con cui tradizionalmente si legge la prima metà del secolo scorso: la storia delle famiglie mostra anche zone di antagonismo, certamente minoritarie e marginali, che però sono tracce di un ruolo che l’istituzio ne famiglia seppe agire pur di fronte a un potere dittatoriale e “totalitario”. Lo spazio privato della casa è stato anche il luogo di reti di solidarietà, di comportamenti e codici di opposizione e di resistenza. È la storia di Victor Klemperer, uno dei 198 ebrei rimasti a Dresda nel febbraio del 1945 (erano 1265 alla fine del 1941), il quale, grazie all’aiuto della moglie Eva Schlemmer, sopravvisse anche ai bombardamenti alleati della città: si strappa la stella gialla di David dal cappotto e con documenti falsi fugge verso la Baviera e la salvezza. O di Pepa López « madre cattolica e borghese che riuscì a salvare la sua famiglia dalle “orde rosse” a Malaga nel luglio 1936, travestendosi da venditrice di frutta e verdura (…)». (p. 612).
Non c’è solo una relazione diretta tra individui atomizzati e stato totalitario, in grado di controllare comportamenti, pensieri e azioni: se prendiamo in considerazione anche la famiglia e le storie delle famiglie il quadro si modifica e obbliga a valutazioni più articolate e complesse.
Il ruolo interpretato dalle famiglie nel nuovo contesto democratico che si affermerà dopo il 1945 sarà poi del tutto diverso. Ma questa, come si dice, è un’altra storia. Ancora da raccontare.
Ernesto Perillo Acessar publicação original
[IF]Storia della famiglia in Europa – BARBAGLI; KERTZER (BC)
BARBAGLI, Marzio; KERTZER, David I. (a cura di). Storia della famiglia in Europa. Roma: Il Novecento; Bari: Laterza, 2005. Resenha de: RABUITI, Saura. Il Bollettino di Clio, n.13, p.127-130, lug., 2020.
Questo volume sul Novecento, è l’ultimo dei tre volumi della Storia della famiglia in Europa, la fortunata opera curata da Marzio Barbagli e David I. Kertzer. Nel 2002 e nel 2003 erano usciti i due precedenti volumi: Dal Cinquecento alla Rivoluzione francese e Il lungo Ottocento.
Ogni volume è aperto da una corposa introduzione dei curatori e raccoglie dieci saggi, articolati in quattro sezioni (economia e organizzazione della famiglia; lo Stato, la religione, il diritto e la famiglia; forze demografiche; relazioni familiari) che individuano gli ambiti considerati dalla ricerca, da quelli economici a quelli demografici, culturali, giuridici e sociali.
In questo terzo volume sul Novecento è particolarmente approfondita l’analisi delle politiche familiari, sia nei regimi dittatoria li (Le politiche sulla famiglia dei grandi dittatori di Paul Ginsborg e Famiglie socialiste? di Alain Blum) che democratici (Politiche sociali e famiglie di Chiara Saraceno) che in tempo di guerra (La famiglia in Europa e le due guerre mondiali di Jay Winter). Forte è anche l’attenzione al ruolo delle donne in rapporto all’economia, al lavoro, alle politic he governative e ai legami intergenerazio na li (Trasformazione economica, lavoro delle donne e vita familiare di Angélique Janssens; I legami di parentela nella famiglia europea di Martine Segalen).
Il volume si chiude fotografando il passaggio, soprattutto nell’ultima parte del secolo, dalla famiglia alle famiglie, alla varietà delle forme di famiglia (La famiglia contemporanea: riproduzione sociale e realizzazione dell’individuo di François de Singly e Vincenzo Cicchelli; Angéliq ue Janssens; I legami di parentela nella famiglia europea di Martine Segalen).
Nel suo complesso l’opera indaga le trasformazioni della famiglia nel lungo arco temporale di cinquecento anni e nel vasto spazio di tutta l’Europa, “intesa come continente di circa 10 milioni di chilometri quadrati, delimitato a ovest dall’oceano Atlantico, a est dalla dorsale degli Urali e dal fiume Ural, a nord dal mare Artico e a sud dal mare Mediterraneo, il mar Nero e il mar Caspio. Un continente che all’inizio del Cinquecento aveva circa 81 milioni di abitanti e oggi ne ha 730 milioni” (p. V) L’intento dichiarato dai curatori non è solo quello di esaminare in una prospettiva comparata “i modi in cui le famiglie si formano, si trasformano, si dividono, la frequenza dei matrimoni e l’età a cui li si celebra, le regole di residenza dopo le nozze, le relazioni fra mariti e mogli, genitori e figli, la fecondità, la frequenza delle separazioni legali e dei divorzi.” È anche quello di cercare i nessi tra i cambiamenti nella sfera domestica e le trasformazioni economiche, sociali, politiche e soprattutto di arrivare a individuare “se, e in che misura, le società europee siano diventate più simili o più dissimili riguardo alle caratteristiche della vita domestica” (pp. V-VI) nell’arco dei cinque secoli considerati.
A questo interrogativo i curatori offrono una risposta conclusiva nelle quaranta pagine dell’Introduzione ai saggi che compongono questo terzo volume, là dove individ uano processi di convergenza e di divergenza fra le società europee. A conclusione del percorso di ricerca e in estrema sintesi, Barbagli e Kertzer ritengono infatti di poter affermare che “nei primi tre secoli [considerati] siano prevalse le tendenze alla divergenza” (p. 32), ovvero che siano cresciute, alla fine del Settecento, le differenze tra i vari paesi e regioni d’Europa (volume 1); che nell’Ottocento invece si siano registrate tendenze sia divergenti che convergenti e che siano continuate ad esistere, fra le diverse aree, differenze enormi (volume 2); che Il Novecento sia da considerarsi infine “il secolo della convergenza”, un secolo che ha visto “il mondo domestico dei vari paesi europei sempre più simile” (p. 38) Forti convergenze fra i paesi europei si sono avute per tutto il Novecento per quel che riguarda le strutture degli aggregati familiari.
Da questo punto di vista infatti nel corso del secolo si è affermata la famiglia nucleare e coniugale: è diminuito ovunque e continuativamente il numero medio di persone per famiglia e il numero di persone che dopo le nozze andava ad abitare con i genitori del marito o con parenti ed è cresciuto ovunque, soprattutto nella seconda metà del secolo, il numero di quelle che vivono sole, in conseguenza del più alto livello sia del reddito che della speranza di vita.
Ancora più forte, seppur assai discontinua, è stata poi la convergenza sul declino della fecondità, un processo che ha investito, con forti oscillazioni nei periodi bellici e postbellici, la popolazione europea di tutti gli strati sociali e fedi religiose, sia delle città che delle campagne. Altrettanto forte e discontinua è stata la tendenza all’aumento delle separazioni legali e dei divorzi, che nel corso del Novecento sono diventati un fenomeno di massa, mentre nei secoli precedenti avevano riguardato un numero molto limitato di coppie.
Meno netta e ancor meno lineare è stata la convergenza su altri aspetti quali ad esempio la nuzialità (rispetto alla quale l’Europa occidentale si differenzia ancora da quella orientale) o il divorzio o la convivenza more uxorio. In questo caso è l’Europa nord occidentale che si differenzia da quella mediterranea (vedi il saggio Una transizione prolungata: aspetti demografici della famiglia europea di Theo Engelen).
Nel corso del secolo, le somiglianze sono cresciute anche per quel che riguarda la divisione del lavoro e la distribuzione del potere all’interno delle famiglie (fra mariti e mogli, genitori e figli), il diritto di famiglia, le norme sul matrimonio, i rapporti patrimonia li fra i coniugi, le successioni, il divorzio, lo stato dei figli un tempo “illegittimi”.
La riduzione (e non certo l’azzeramento ) delle differenze tra aree geografiche e sociali dell’Europa non è il risultato di un processo lineare. Solo alcune delle trasformazioni che sottendono le convergenze sono state continue e lineari (ad esempio la semplificazione delle strutture familiari). Altre invece (come ad esempio il declino della fecondità) hanno oscillato fra accelerazioni, rallentamenti e anche inversioni di tendenza.
Le profonde trasformazioni della vita familiare che il Novecento ha conosciuto sono state a volte precedute mentre altre volte hanno fatto seguito a cambiamenti del diritto che (vedi Il diritto di famiglia in Europa di Paola Ronfani), all’inizio del secolo, in tutti i paesi, attribuiva in ambito domestico particolari poteri al marito (capofamiglia, con potestà maritale e patria potestà, col diritto di controllare e gestire il patrimonio familia re …). Queste trasformazioni hanno intaccato ma non eliminato diseguaglianze di genere e si sono accompagnate e intrecciate con due tendenze di convergenza generalizzabili in tutta Europa: l’aumento delle donne occupate in attività extradomestica retribuita e l’invecchiamento della popolazione.
Infine va ricordato che la riduzione delle differenze fra aree geografiche e sociali non ha riguardato tutti i molteplici aspetti del mondo familiare, neppure tutti quelli indagati nei saggi che compongono il terzo volume. La fine del secolo registra insomma ancora importanti differenze nella vita familiare dei vari paesi, alcune di antichissima origine altre più recenti.
Per quel che riguarda le prime, basti ricordare ad esempio che risalgono alla seconda metà del Cinquecento i diversi atteggiamenti, basati sul credo religioso, rispetto al divorzio, ancora meno frequente nei paesi mediterranei. (Alla fine del ‘900, il numero dei divorzi/separazio ni legali andava da 10 a 20 su ogni 100 matrimo ni in Italia, Spagna, Grecia, Portogallo mentre era superiore a 40 in molti paesi dell’Europa settentrionale e orientale).
Fra le differenze di origine più recente, basti ricordare ad esempio quelle riconducibili alle nettamente diverse politiche sociali e familiari perseguite dai paesi nord occidentali e da quelli del Mediterraneo. Italia, Spagna, Grecia, Portogallo poco sostengono il costo dei figli o la cura degli anziani e poco aiutano a concilia re lavoro e famiglia, scaricando i compiti di cura e di riproduzione sociale quasi esclusivamente sulla famiglia o per essere più precisi sul lavoro domestico non pagato delle donne. Non a caso, alla fine del secolo, la quota di donne con un lavoro retribuito era nei paesi mediterranei assai più bassa che nei paesi nord occidentali.
Dalla pubblicazione del volume sul Novecento sono trascorsi quindici anni, durante i quali la ricerca sulla famiglia ha continuato a rinnovarsi. I meriti dell’inte ra opera comunque rimangono tutti e stanno innanzitutto nella ricca e chiara sintesi che offre sul tema, in una prospettiva comparata, su un lungo arco temporale e un vasto spazio territoriale. Stanno anche nell’ approccio multidisciplinare che ha visto all’opera studiosi di storia, sociologia, antropologia, demografia, economia, diritto, ambiti tutti necessari per delineare il complesso e variegato quadro delle famiglie, oggi come ieri. Stanno infine – e penso ovviamente ad un suo possibile utilizzo a scuola- nel mostrare il ‘900 non solo come il secolo delle guerre mondiali, delle crisi economiche, delle dittature, dei totalitarismi, dei genocidi, ma anche come il secolo dei diritti civili e sociali, dell’avvento dello Stato di welfare, delle profonde trasformazioni della vita familia re che hanno modificato in particolare la condizione delle donne, i loro diritti e quelli del lavoro.
Saura Rabuiti
[IF]Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall – WILNER (TH-JM)
WILNER, Nina. Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall. New York: HarperCollins, 2016. 391p. Resenha de: SHIELDS, Trevor. Teaching History – A Journal of Methods, v.45, n.2, p.55-57, 2020.
On June 26, 1963, President John F. Kennedy, on a visit to West Berlin, eloquently lamented, “The [Berlin] Wall is…an offense not only against history but an offense against humanity, separating families, dividing husbands and wives and brothers and sisters, and dividing a people who wish to join together.” All too often, the humanity of those impacted by the events of the Cold War gets lost in the background of the larger narrative of communism versus democracy—the Soviet Union versus the United States. Nina Willner’s work, Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall (2016), successfully and vividly injects much needed humanity into the Cold War.
Written as primarily a family memoir, Forty Autumns tells the story of just one of the families divided by the Berlin Wall. Willner’s book chronicles the life of her mother, Hanna, and grandparents, Erna and Karl (Willner regularly only refers to Erna and Karl as Oma and Opa, or Grandma and Grandpa.) The book, which is divided into roughly four sections, begins with several maps of Europe during the Cold War. From there, one of the greatest features of the book appears, a family and historical chronology as Willner pairs the events of the Cold War physically right alongside their impact on her family. Seeing the history of the Cold War linked to the impacts of particular historical events on real people makes the vivid narrative of Forty Autumns difficult to put down. In 1946 the Soviets occupied East Germany and imposed Soviet law. That same year, Opa, who fought for the Germans during WWII, was forced to begin teaching Soviet doctrine to his many students in East Germany.
The Cold War had more physically terrifying consequences on the people of East Germany than being forced to learn and love communism. Not wanting to take any chances of people inciting dissent, many East Germans were thrown into prison with little idea why they had been arrested. The Hoheneck Castle, which was known around the world for its Gothic and Renaissance architecture, was converted to house women. In eloquent yet terrifying prose, Willner paints the picture: “There, skin to skin, in total darkness, with no room to sit, they were made to stand in knee-deep freezing water for days on end in dank, poorly ventilated chambers until they simply passed out” (72). The inhumanity of what happened at Hoheneck Castle, although known to historians, is often missing from more traditional narratives. Since Forty Autumns was written in such an accessible way, more people today will understand the realities of life behind the Iron Curtain.
Willner’s book could be used in the classroom in a variety of ways. The most obvious, though, would be to use the story of her family to both introduce and to potentially teach the entirety of the Cold War. This would be particularly doable since Willner interjected the major events of the Cold War throughout the many pages of Forty Autumns. On the family level, for example, East German authorities harassed Opa at the same time the Warsaw Pact was being formed and dissent was being silenced. Forty Autumns definitely brings to life the impact of many Cold War developments on both individuals and Germany as a whole.
While not all of Millner’s family lived to see Germany reunified in 1990, all the individuals discussed helped make true a few of President Ronald Reagan’s words: “What is right will always triumph” (324). Although much of Forty Autumns detailed the horrors of life under communism in East Germany, it ended on a positive note, with Willner’s extended family reuniting in a united Germany in 2013. Anyone interested in learning more about the Cold War or about one family’s brave attempt at enduring the unthinkable should give Forty Autumns a read. Beyond that, in a more contemporary moment where construction of a wall is regularly discussed as a way to make life better for so many, the history within Forty Autumns should be seen as a foreboding tale.
Trevor Shields – Minooka High School.
[IF]Family values: between neoliberalism and the new social conservatism – COOPER (REF)
COOPER, Melinda. Family values: between neoliberalism and the new social conservatism. New York: Zone Books, 2017. Resenha de: SANTOS, Rayani Mariano dos. A família no centro das disputas políticas nos Estados Unidos. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v.28 n.2 2020.
While neoliberals called for an ongoing reduction in budget allocations dedicated to welfare […] neoconservatives endorsed an expanding role for the state in the regulation of sexuality. Despite their differences, however, neoliberals and neoconservatives converged on the necessity of reinstalling the family as the foundation of social and economic order. (Melinda COOPER, 2017, p. 49).
O trecho acima sintetiza a centralidade da família na aliança formada nos anos 1970 entre neoconservadores e neoliberais nos Estados Unidos e faz parte do livro Family values: between neoliberalism and the new social conservatism, escrito por Melinda Cooper e publicado em 2017 pela editora Zone Books. Melinda Cooper concluiu seu doutorado em 2001 na Universidade Paris VIII e atualmente é professora na Universidade de Sydney, onde pesquisa financeirização, neoliberalismo e novos conservadorismos sociais. Leia Mais
Provas de liberdade: uma odisseia atlântica na era da emancipação | Rebeca J. Scott, Jean M. Hébrard
Fruto de uma extensa pesquisa realizada ao longo de sete anos por Rebecca J. Scott e Jean M. Hébrard, Provas de liberdade: uma odisseia atlântica na era da emancipação, traz a saga da família Vincent/Tinchant, apresentada ao longo de nove capítulos e um epílogo de tirar o fôlego. Desde já, saliento que não consigo ver de outro modo senão como excepcional o modo como estes experientes pesquisadores conseguiram seguir os rastros deixados por estes “sobreviventes do Atlântico”.
Logo no início do livro, os autores nos informam que não consideraram o itinerário dos Vincent/Tinchant como típico ou representativo, o que podemos constatar ao longo da leitura. O fio inicial para a investigação foi uma carta escrita por Édouard Tinchant, um fabricante de charutos residente da Bélgica, endereçada ao general Máximo Gómez, encontrada no Arquivo Nacional de Cuba, na qual ele solicita a autorização para pôr seu nome na marca de charutos que pretendia lançar e, para tanto, não se furtou em usar sua capacidade discursiva para relatar aspectos de sua vida familiar enfatizando uma conexão entre luta por direitos civis e igualdade racial no mundo atlântico do século XIX – a Guerra Civil e a Reconstrução dos Estados Unidos (1861-1877), a Revolução Francesa (1848) e a Revolução do Haiti (1791-1804). A trilha seguida por eles nos conduziu até o século XX abrindo uma janela para que pudéssemos ver os desdobramentos da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) na vida de pessoas que tinham “cor”, como Marie-José Tinchant. Leia Mais
A Família Chermont. Memória histórica e genealógica | Victorino Coutinho Chermont de Miranda
Trinta e quatro anos passados, em revisão revisada e ampliada, pelo autor, Victorino Coutinho Chermont de Miranda, em magnífico livro sobre a família Chermont torna a nos encantar com os estudos genealógicos.
O livro possui XIII capítulos, três Anexos, índice onomástico da família Chermont e índice onomástico de litógrafos, pintores, fotógrafos e ateliês fotográficos. São 355 páginas em bela impressão. Leia Mais
Familias en el Viejo y el Nuevo Mundo – CASTELÃO; COWEN (LH)
CASTELAO, Ofelia Rey; COWEN, Pablo (eds). Familias en el Viejo y el Nuevo Mundo. La Plata: Universidad Nacional de La Plata. Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, 2017, 471 pp. Resenha de: VILATA, María José. Ler história, 72, p. 235-238, 2018.
1 Tres cuestiones resultan fundamentales para dar cuenta del sentido, importancia e interés de esta publicación: adscripción, contenido y justificación científica. Vamos por partes. La primera tiene que ver con la inclusión de este volumen en la Colección de Monografías HisMundI, enmarcada en la Red Interuniversitaria de Historia del Mundo Ibérico: del Antiguo Régimen a las Independencias (Red y colección HisMundI), a partir de una iniciativa compartida entre historiadoras e historiadores de las universidades argentinas de La Plata, Rosario y Mar del Plata, y de las españolas de Cantabria y País Vasco. Precedido por un volumen anterior editado también en 2017,1 se trata del inicio de una andadura ambiciosa que pretende profundizar en los procesos históricos que definieron las sociedades ibéricas en época colonial a uno y otro lado del Atlántico, primando una perspectiva comparativa. Cada libro resultante se presenta en formato digital y acceso abierto, opción que, dada la complejidad y los costes implicados en los circuitos de distribución clásicos, resulta muy pertinente y de gran utilidad para compartir y difundir con inmediatez nuevo conocimiento científico.2
2 La segunda cuestión concierne a los contenidos. Estamos frente a una nueva y valiosa compilación de estudios, articulados a través del eje de la organización familiar como problema de investigación. Al inicio, en la presentación, Maria Marta Lobo de Araújo define con una precisa palabra la perspectiva que caracteriza el libro: “una mirada”. Es decir: sale a la luz pública un nuevo referente singular a añadir al avance y consolidación de esta muy importante trayectoria de investigación. Se presenta, pues, una obra que reúne tres tipos de aportaciones diferentes: primero, una justificación científica de la edición a manera de introducción (Ofelia Rey Castelao y Pablo Cowen); segundo, un interesante estado de la cuestión y de la bibliografía reciente sobre el tema, ejercicio complejo y siempre de gran valor, tanto para público en general, como y principalmente, para quienes compartimos esta línea de trabajo (Francisco García González y Francisco Javier Crespo Sánchez), y, tercero, trece trabajos de investigación inéditos, a cargo (por orden de aparición) de Rocío Sánchez Rubio, Isabel Testón Núñez, Alberto Angulo Morales, Francisco Andújar Castillo, Enrique Soria Mesa, María Luisa Candau Chacón, Ángela Atienza López, José Luis Betrán Moya, Fernando Suárez Golán, Bibiana Andreucci, Carlos María Birocco, Cristina Beatriz Fernández, Josefina Mallo, Osvaldo Otero y María Cecilia Rossi, cuyas variadas temáticas, enfoques, problemas y conclusiones se sintetizan en las páginas introductorias (pp. 10-20 y 36-41). La diversidad de los asuntos tratados en la recopilación se puede concretar, en síntesis, en cuestiones como movilidad social, formas de sociabilidad (correspondencia, sentimientos, objetos cotidianos), matrimonio, estrategias familiares, redes clientelares y de poder, composición étnica y social de la migración a Indias, transmisión de patrimonios y el papel de la mujer. El tratamiento de cada uno de los artículos pretende, por un lado, hilvanar las relaciones a uno y otro lado del Atlántico y, por otro, recordar que todos los contenidos se entrecruzan en los diferentes textos, a fin de avanzar en la delimitación de los problemas multifactoriales que subyacen en la investigación sobre la vida en familia. La finalidad implícita, por consiguiente, persigue abordar “de forma muy diversa procesos de funcionamiento, cambio, implantación y valorización de las familias del Viejo y del Nuevo Mundo, mostrando lógicas de supervivencia, redes de solidaridades y complicidades, pero también de afirmación y de pujanza social” (p. 20).
3 El tercer objetivo a enfatizar aquí tiene que ver con la justificación científica. Los editores han optado por un planteamiento a dos bandas que deriva de la misma propuesta de título del libro. En primer lugar, partimos de las familias del Viejo Mundo para adentrarnos en una “breve perspectiva historiográfica sobre España”. En este ámbito, Ofelia Rey Castelao presenta una breve, pero clarificadora síntesis donde se remarca la importancia de una trayectoria que partió de la demografía histórica, usando como guía y con intensidades desiguales los diferentes modelos europeos, en especial los siempre referenciales francés e inglés, para adentrarse, luego, a partir de la exploración de documentación considerablemente diversa, en sendas muy variadas que se han constituido en fundamento imprescindible de la construcción de la historia social ibérica a lo largo de los siglos xvi al xix.
4 A renglón seguido, viajamos hacia el Nuevo Mundo y, allí, Pablo Cowen sitúa los problemas sustanciales de lo que denomina como una “arqueología” de las formaciones familiares (actuales) en el Río de La Plata. Plantea reflexiones que surgen a partir de los datos y los análisis propuestos en relación al virreinato de más tardía fundación y organización, tarea que permite comprobar su validez como un interesante punto de referencia respecto a lo acontecido en América central y del sur en el tiempo largo que va desde las diversas fases de la colonización hasta el triunfo de las Independencias. Es significativa, en este sentido, la conflictiva coexistencia-confrontación, cuando menos, de dos modelos familiares: el tradicional colonial (en su infinita complejidad) y el que las nuevas leyes republicanas impulsaron y defendieron. La exploración de esta dualidad y sus implicaciones profundas se suma a una ya larga tradición de investigación que, en Argentina, reúne a varios grupos destacados3 que se agregan a las tareas en auge en el conjunto de América Latina y a los proyectos en intercambio y colaboración con grupos radicados en la península ibérica.
5 ¿Qué se desprende, en fin, de este volumen? ¿Cuáles son sus principales logros? Primero, se debe subrayar la aportación de nuevo conocimiento a partir de investigaciones que se incardinan en una iniciativa coordinada en equipos agrupados en redes, difundida en formato digital y acceso abierto a fin de facilitar la comunicación y el intercambio científico. Segundo, es preciso señalar que se ha añadido un peldaño más para avanzar en la reflexión sobre las estructuras articuladas bajo el polisémico concepto de “familia”, que sirve de puente para el análisis de la estática y la dinámica del conflicto social, a través de la indagación sobre los entramados privados y públicos en los que se desarrolla la vida de las personas en cualquier tiempo y lugar. Familia se consolida, en consecuencia, como fundamento imprescindible de la historia social, siempre en construcción, como recordó el maestro Pierre Vilar. Tercero, la heterogeneidad de las aportaciones invita a una consideración sobre perspectivas de futuro. No sólo “parece imperioso pasar de la historia de la familia a la historia de las familias” (p. 33), sino que quizás será necesario delimitar, en proyectos y publicaciones posteriores, los diferentes ámbitos que alberga el enorme caparazón protector que ofrece el concepto, tal y como se propone, por ejemplo, en la “panorámica temática” en cuatro bloques presentada en el estado de la cuestión.4
6 Y esto es así en tres sentidos principales: uno, en la diversidad de asuntos a tratar, ya comentada y puesta de manifiesto al exponer el contenido del libro; dos, en la necesidad de plantearlos teniendo en cuenta los factores diferenciales derivados de los entrecruzamientos de etnia y clase social, aspecto de crucial importancia en América Latina, y, tres, en la relevancia de la amplitud y heterogeneidad territorial que está implícita en una mirada a ambos lados del Atlántico, puesto que si bien es bien cierto que las dos metrópolis radicadas en la península definieron normas y pautas de conducta de forma incesante, todavía lo es más que, a medida que avanzaron y se normativizaron las variantes del asentamiento de norte a sur, la realidad americana devino incontestablemente diversa respecto al modelo de partida y, por ello, singular y autónoma en su organización propia.
Notas
1 Susana Truchuelo y Emir Reitano (eds), Las fronteras en el mundo atlántico (siglos XVI-XIX). La P (…)
2 El libro digital completo de esta reseña se encuentra disponible en: http://www.libros.fahce.unlp (…)
3 Resulta interesante destacar aquí los trabajos recientes reunidos por otro potente equipo investi (…)
4 Los ámbitos prioritarios de agrupación de las investigaciones se concretan, siguiendo la propuest (…)
María José Vilalta – Departament d’Història de l’Art i Història Social, Universitat de Lleida, Catalunya. E-mail: vilalta@hahs.udl.cat
Egressos do cativeiro: trabalho, família, aliança e mobilidade social: Porto Feliz, São Paulo, 1798-1850 | Roberto Guedes
Analisar as vivências de libertos e seus descendentes através de um conjunto variado de fontes, e conseguir reconstituir trajetórias de famílias com ascendência escrava numa área de produção agrícola para o mercado interno – e, por isso mesmo, representativa de regiões agrárias do Brasil escravista do século XIX – foi o que propôs Roberto Guedes em seu livro.
Este trabalho é resultado de sua tese de doutorado defendida na UFRJ em 2005, e tem como recorte espacial a vila de Porto Feliz, na capitania/província de São Paulo, no período de fins do século XVIII e início do XIX (especificamente a primeira metade do século XIX), e como tema central a mobilidade social. O autor procurou analisar as estratégias de ascensão social empreendidas por libertos e seus descendentes, tais como o trabalho, a estabilidade familiar, a inserção em redes de socialização, dentre outros. Para isso, utilizou como método de abordagem o proposto pela micro-história, realizando um trabalho intenso com diversos tipos de fontes, onde utilizou a técnica do cruzamento onomástico: listas nominativas de habitantes, registros paroquiais de batismo, casamento e óbito, inventários post-mortem, testamentos e prestação de contas de testamentos, notas cartoriais, licenças expedidas pela Câmara Municipal, processos crimes, etc. Assim, foi possível ao autor acompanhar por mais de quatro gerações as trajetórias de libertos e descendentes como, por exemplo, o caso da família Rocha.
Além do trabalho com as fontes, vale ressaltar o cuidado do autor em dialogar com a historiografia no decorrer do livro – como os trabalhos e pressupostos da historiadora Hebe Mattos (1995; 2000), referência nos debates propostos – importante não só para situar sua abordagem, apontar questões que está de acordo ou não, como também para comparar os dados levantados para Porto Feliz com os de outras localidades. Algumas questões importantes para a compreensão de seu livro são o fato do autor entender a sociedade de Porto Feliz como uma sociedade com traços de Antigo Regime e a escravidão como sendo parte integrante dela, ou seja, uma sociedade com traços estamentais e escravista, onde a mobilidade social é entendida não só pela mudança de posição na hierarquia social estamental, mas também pelo viés intragrupal e ainda “não deve ser confundida apenas com enriquecimento” (Guedes, 2008, p. 87). Antes, o mais importante era a manutenção e/ou a redefinição do lugar ocupado na hierarquia social, para o que a riqueza podia colaborar ou não. Desta maneira, Guedes procurou entender como se deu a trajetória de forros e descendentes, apresentando seu livro dividido em cinco capítulos, que se destacam pela riqueza de detalhes não só na forma de escrever, bem como através de quadros, gráficos, diagramas, que nos permitem perceber de forma ampla e precisa a vila de Porto Feliz e sua população.
Primeiramente, é apresentada a paisagem agrária da pequena Porto Feliz, que até 1797 era a freguesia de Araritaguaba, quando foi elevada a vila. Durante todo o século XVIII, este lugarejo foi fundamental na rota fluvial das monções quando se descobriu minas de ouro em Coxipó-Mirim e Cuiabá. Já nos primeiros anos do século XIX, o comércio das monções teve sua importância diminuída devido ao surgimento de outras rotas, o que coincidiu com o desenvolvimento da economia canavieira no oeste paulista, desenvolvimento que Porto Feliz acompanhou, se inserindo entre os municípios situados no “Quadrilátero do Açúcar”, área compreendida entre Sorocaba, Piracicaba, Mogi-Guaçú e Jundiaí.
Guedes mostra como o cultivo da cana-de-açúcar, voltado para o mercado externo à vila, estimulou o desenvolvimento de Porto Feliz, possibilitando o crescimento do “miolo urbano” com construção de algumas casas, instalação de vendas; influenciou também o aumento da população, principalmente da população escrava em função do tráfico de cativos para trabalhar nas lavouras; estimulou o mercado de animais e a criação de gado para alimentação e para moverem os engenhos, e também a produção de alimentos como milho, feijão, arroz, entre outros, destinados ao consumo próprio e comercializados na vila. Inicialmente, foram os pequenos escravistas que participaram plenamente da atividade açucareira, mas a partir de 1820-1824 os grandes produtores aumentaram sua participação e intensificaram a concentração da propriedade escrava. Para a montagem de um engenho era preciso cabedais, e o crédito foi fundamental para o financiamento, assim como o fato dos senhores de engenho se dedicarem a outras atividades como negócio de fazendas secas, lavouras, o comércio das monções, etc.
Ao verificar em seus dados levantados para Porto Feliz o exercício de outras atividades pelos principais da terra, Roberto Guedes estabelece um intenso diálogo com a historiografia, tendo o „trabalho‟ como questão importante. Assim, a partir do conceito de trabalho de Caio Prado Jr. no passado colonial/imperial no Brasil e da análise de outros estudos que seguem a mesma perspectiva, o autor matiza a idéia de que o defeito mecânico e a escravidão inviabilizaram o trabalho livre não só no sentido de ocupação de espaços nas esferas produtivas, mas também no de imputar estigma social a trabalhadores, em especial a forros e descendentes. Tendo como base estudos como os do historiador João Fragoso, comparando os dados levantados para outras localidades com Porto Feliz, Guedes constatou que as elites locais dedicavam-se a outras atividades como comércio e que não deixaram de ser estimados socialmente. Desta forma, podiam não ter uma ideologia negativa do trabalho e, por isso, afirma a importância de se analisar cada realidade local e temporal e “ressaltar as nuances que as noções de trabalho tiveram na colônia/império e entre distintos segmentos sociais” (Guedes, 2008, p. 76). Desta maneira, o autor concentra sua análise nos indivíduos que não eram membros da elite, especificamente forros e descendentes, analisando o trabalho como uma das estratégias, uma das várias formas de mobilidade social.
Para abordar este grupo, Guedes se baseou em concepções de Stuart Schwartz (1988) e Hebe Mattos, se fundamentando nas questões de que a escravidão impunha referenciais de hierarquia distinguindo social e juridicamente escravos, livres, forros e descendentes de escravos e que a transposição de uma categoria jurídica a outra e o posterior afastamento de um antepassado escravo pressupõem passos na hierarquia social, para o qual a cor da pele podia estar relacionada. Assim, o autor analisa através de listas nominativas e mapas de habitantes, o trabalho relacionado a cor/condição social, e verifica como a ocupação diferenciou forros e descendentes de escravos e ambos entre si, corroborando com evidências de que o trabalho propiciava mobilidade social expressas na cor.
É válido ressaltar a preocupação do autor em relação ao cuidado que se deve ter durante a análise desses documentos, no que diz respeito à questão de quem atribuiu ou auto- atribuiu a cor e de quem faz o registro, além da variação nas fontes, etc, pois nem sempre há consonância entre os termos utilizados por autoridades que elaboraram os mapas e os utilizados por recenseadores que fizeram as listas, mesmo que ambos se referissem a uma mesma cor/condição social. No geral, Guedes constatou, por exemplo, que a escravidão influenciou nas cores das pessoas em Porto Feliz e que o trabalho influenciou na oscilação da cor, o que era frequente. Em relação ao registro da cor, percebeu que o termo mulato pode ter tido um sentido pejorativo, e que ser caracterizado como branco marcava uma diferenciação fundamental em relação aos escravos e um distanciamento maior da escravidão em relação aos pardos. Enfim, na análise proposta pelo autor, a hierarquia e a posição social manifestas na cor eram fluidas e dependiam de circunstâncias sociais.
Vista pelo autor como o primeiro passo na hierarquia social, a alforria era onde os forros se diferenciavam dos escravos, por isso Guedes também procurou analisar como se dava essa passagem da escravidão para a liberdade, bem como alguns caminhos que conduziam à liberdade e seus momentos posteriores. O autor compreende a alforria como uma troca equitativa entre senhores e escravos, mas obviamente baseada na desigualdade, ou seja, uma relação de troca assentada na reciprocidade, sem esquecer que reciprocidade não é sinônimo de equivalência. Assim, nesta relação, do ponto de vista do escravo, o autor destaca a questão da submissão, que implica reconhecimento do poder senhorial, que juntamente com a obediência e os bons serviços prestados, podem ser vistos como estratégias de mobilidade social, uma vez que submissão não deve ser entendida apenas de forma unilateral, sendo necessário atentar para o interesse do submisso pela submissão, através das quais se podiam alcançar vantagens.
Outras formas de alforrias, de estratégias, destacadas pelo autor foram casos que, segundo ele, não eram frequentes, de ascensão social de cativas e/ou de seus filhos derivada de relações sexuais/afetivas com seus senhores, onde as ex-escravas e/ou seus filhos, além da liberdade, também herdaram alguns bens dos senhores. O matrimônio foi outro exemplo de forma de alforria, pois existiram casos de casamento de libertos(as) com escravas(os), onde a última foi alforriada. E uma vez inseridos na nova condição jurídico social, foi importante estabelecer relações sociais, as quais tinham sempre que ser reatualizadas para manutenção da nova posição, seja pelos forros ou seus descendentes.
É no último capítulo que percebemos a análise do autor por completo, pois através das trajetórias de algumas famílias ele comprova todas as suas hipóteses: a mobilidade social, seu tema central, relacionada conjuntamente ao trabalho, estabilidade familiar, mostrando a solidariedade intragrupal e a inserção em redes de sociabilidade, como as alianças com potentados locais, tudo isso associado à mudança no registro da cor da pele. Foram nessas trajetórias que o autor propôs aplicar o método da micro-história, e realizou o cruzamento de diversos tipos de fontes, analisando a mobilidade social dos egressos da escravidão, onde as trajetórias foram descritas passo a passo a fim de apreender tais estratégias.
Encontrando pontos em comum nessas trajetórias, o autor mostrou que o trabalho podia ser percebido de forma positiva e ainda poderia propiciar margens de autonomia e ascensão social para forros e descendentes, não só em termos materiais, mas também no que diz respeito à reputação, às questões de reconhecimento e atuação social. Sobre a família e a inserção em redes de sociabilidade, os vínculos se percebem, por exemplo, nas relações de compadrio, e mesmo os que conseguiram ascender à condição de escravistas, não implicava o afastamento em relação aos seus iguais. Estes mantinham as relações horizontais, já que não havia porque fechar portas em um mundo instável, apadrinhavam filhos ou eram testemunhas de casamentos de escravos ou forros, mas para apadrinhar seus filhos preferiam pessoas com títulos como donas, tenentes, capitães, etc. Assim, Guedes nos fala da “transformação” de alguns pardos em brancos, como alguns pardos conseguiram se inserir no mundo senhorial, mostrando os fatores associados à mobilidade social também como um processo geracional.
O livro de Roberto Guedes, portanto, mostra como a mobilidade social contribuía para a manutenção de hierarquias sociais, não estando acessível a todos, mas tornando possível a forros e seus descendentes atuarem numa sociedade caracterizada pela desigualdade. O trabalho de Guedes contribui para estudos sobre a escravidão que se voltam para substituir a ideia de “vítima” pela de “agente social”, ou seja, o escravo como um ser ativo na dinâmica da sociedade. Também é importante para estudos que buscam entender a participação social de libertos e seus descendentes, deixando de lado a visão de uma sociedade bipolarizada entre senhores e escravos, com aquele grupo incluído entre os vadios, os desclassificados sociais, com poucas chances de ascensão social; estudos que se voltam para a análise dos usos e significados sociais dos designativos de cor, bem como os que abordam a alforria, principalmente com enfoque para áreas rurais, o que pode servir também para estudos comparativos entre regiões urbanas e rurais.
Referências
MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: os significados da liberdade no sudeste escravista. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1995.
______. Escravidão e Cidadania no Brasil Monárquico. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.
SCHWARTZ, Stuart. Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550- 1835. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
Iara de Oliveira Maia – Mestre, licenciada e bacharel em História pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). E-mail: iaramaia_ufop@yahoo.com.br ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4762-4836
GUEDES, Roberto. Egressos do cativeiro: trabalho, família, aliança e mobilidade social: Porto Feliz, São Paulo, 1798-1850. Rio de Janeiro: Mauad X; FAPERJ, 2008. Resenha de: MAIA, Iara de Oliveira. Os significados da mobilidade social para forros e seus descendentes. Caminhos da História. Montes Claros, v.22, n.2, p.121-125, jul./dez.,2017. Acessar publicação original [DR]
L’économie de Dieu. Famille et marché entre christianisme, hébraïsme et islam / Gérard Denile
Sous un titre un brin paradoxal, Gérard Delille montre comment les trois grandes religions monothéistes issues du monde antique font système au sens structuraliste du terme, autrement dit comment elles entretiennent entre elles des rapports d’inversion qui sont corrélés à plusieurs niveaux de la réalité sociale. La parenté, au sens où l’entendent en général les anthropologues, sert de levier à l’auteur, lui-même historien, afin de brosser un large tableau du développement différentiel de l’Occident et du Moyen-Orient en fonction de la prédominance de telle ou telle religion. Au-delà de la parenté, l’argument mobilise de nombreux faits de nature théologique, juridique, dynastique, technique et, enfin, économique. Sa progression emprunte à différentes échelles d’analyse, allant de la micro-histoire, en se focalisant sur les communautés dont les archives recèlent de bonnes séries généalogiques – élément clé de la démonstration –, à la reprise critique des grandes synthèses historiques classiques. Au fond, bien que G. Delille s’en défende, son propos possède une indéniable tonalité wébérienne. Il renoue de même brillamment avec Karl Polanyi et sa fameuse thématique de l’émergence, en Occident à l’époque moderne, du marché comme domaine autonome, séparé de l’activité humaine.
La première partie du livre pose les jalons en mettant en relief ce qui différencie les règles matrimoniales dans les trois sphères respectives du judaïsme, de l’islam et du christianisme. Dans le judaïsme, le mariage entre oncle et nièce est préconisé, tandis que dans l’islam, c’est celui entre cousins germains patrilatéraux qui est érigé comme norme. Face à ces logiques d’endogamie s’oppose la règle que l’Église impose progressivement, à partir du haut Moyen Âge, à tout l’Occident chrétien. Ici, une exogamie très étendue, presque infinie, prévaut puisque est frappée d’interdit toute union en deçà du quatrième canon de parenté (extension considérable qui exclut comme conjoint potentiel jusqu’aux personnes issues des arrière-arrière-grands-parents).
Au total, on peut dresser le schéma suivant. À l’exogamie quasi absolue du christianisme s’oppose l’exogamie relative des systèmes juif et musulman. Ainsi que le rappelle G. Delille à la suite de nombreux auteurs, notamment à propos du mariage arabe, ces derniers exigent toujours un assez large degré d’exogamie pour « fonctionner » ; ils ne peuvent être entièrement endogames. Cela étant, leurs endogamies respectives les différencient dans la mesure où le mariage arabe renforce la patrilinéarité, là où les pratiques endogames des juifs (qui incluent le lévirat et le sororat) tendent à effacer l’opposition entre maternel et paternel. Les juifs se rapprochent à cet égard des chrétiens qui se situent du côté du cognatisme en matière de filiation.
La deuxième partie déplace l’argument sur le terrain de l’économie. Chez les musulmans, le système parental est signe de fermeture ; seule la guerre de conquête, synonyme de re-distribution à large échelle des richesses, y est un facteur de développement. Chez les juifs, l’alternance entre endogamie et exogamie parentale aussi bien que locale, associée au maintien de liens autant paternels que maternels, privilégie la constitution de réseaux aux ramifications étendues. Ceux-ci sont prédestinés à servir de support à des opérations commerciales à distance. Enfin, chez les chrétiens, l’exogamie forcée, mais aussi la monogamie et l’impossibilité d’adopter – ce qui revient à conférer à la filiation une sorte d’instabilité structurelle – se révèlent un atout considérable d’un point de vue psychosocial. Poussant à dépasser l’horizon de ses proches pour trouver un conjoint, intériorisant la fragilité des lignages, l’exogamie incite à une ouverture maximale d’un point de vue sociologique ; elle favorise, conceptuellement, la circulation au détriment de la thésaurisation. Assortie de l’interdiction, elle aussi d’origine théologique, du prêt d’usure, elle conduit en outre à rechercher d’abord dans le progrès technique la voie du développement des forces productives. Mais l’importance de la forme que prend la famille en Occident ne relève pas seulement d’un principe abstrait, d’une aspiration à exploiter l’ouverture et l’incertitude, autrement dit à « entreprendre » au sens contemporain du terme. Car si l’Église proscrit l’usure, elle tolère en revanche le prêt avec intérêt en cas de versement différé de la dot. Du coup, le mariage devient le lieu où s’articulent potentiellement circulation des femmes et spéculation monétaire.
Moins nourrie que les précédentes et plus classique dans ses assises théoriques, la troisième partie couronne la démonstration au niveau de l’exercice du pouvoir et de la construction de l’État. Elle oppose ainsi deux modèles, à savoir le despotisme oriental et la souveraineté royale prévalant en Europe (excluant un peu trop rapidement la question du politique dans le cas du judaïsme, alors qu’elle se pose aujourd’hui avec l’État d’Israël). D’un côté, il y a une absence de médiation entre l’État – incarné par un pouvoir centralisé, autocratique et, surtout, exclusivement patrilinéaire (le harem comme ruche procréative) – et les « sujets », que ces derniers soient des paysans attachés à la terre ou des marchands. État et société y vivent dans des sphères presque entièrement étanches, la première assurant le maintien de son existence matérielle et de son appareil militaire par le biais d’un tribut imposé à la seconde. De l’autre côté, le système politique de l’Europe occidentale repose au contraire sur une solidarité sociale assez large car fondée sur la reconnaissance des deux lignées, paternelle et maternelle, et l’exigence d’alliances les plus ouvertes possible. Une hiérarchie sociale existe mais à l’intérieur même de cette solidarité englobante. Là encore le mariage joue un rôle puisque, à travers le mécanisme de la dot, il autorise une légère hypergamie féminine.
L’économie de Dieu est un livre que nous attendions depuis longtemps. G. Delille y combine avec succès et générosité les démarches historiques et anthropologiques. Sa fresque embrasse des espaces, des temporalités et des thématiques extrêmement divers, qu’il parvient à relier avec une puissance heuristique peu commune aujourd’hui. Ce véritable tour de force rend malaisée la critique. Si nous devions toutefois en formuler une, elle porterait sur le primat accordé à la notion d’échange matrimonial.
Celle-ci a été forgée par Claude Lévi-Strauss dans le cadre de la théorie anthropologique, dont Marcel Mauss est l’initiateur, d’un lien social fondamental qui reposerait sur la force de la dette. L’auteur des Structures élémentaires de la parenté, non sans avoir mis entre parenthèses le mariage arabe, avait rangé l’Occident sous la rubrique d’« échange généralisé ». Ce faisant, il diluait tellement la notion d’échange qu’elle devenait synonyme de simple « circulation ». Or G. Delille, ici comme dans ses travaux antérieurs (dont d’ailleurs ce livre est également l’heureuse synthèse), utilise les notions d’échange et de réciprocité de façon, nous semble-t-il, trop rigide. On voit mal comment un dispositif, qui exclut la possibilité d’un « retour » du transfert de la femme concédée en mariage avant cinq générations, peut être globalement conçu sous le régime de la réciprocité, même différée. En l’espèce, et plus encore dans la perspective comparative adoptée ici d’un seul système, de nature transformationnelle, du mariage judéo-islamo-chrétien, il semble plus sage de se contenter du vocabulaire de l’endogamie et de l’exogamie, même si celui-ci apparaît moins « accrocheur » que celui de l’échange matrimonial. Au reste, il s’agit là d’une objection de fond qui n’entache aucunement l’admiration que nous portons à ce livre appelé à devenir rapidement un classique des sciences sociales. Un seul regret le concernant : un appareil de références extrêmement fastidieux à utiliser. L’absence de notes en bas de page, toutes rejetées en fin de volume, et de bibliographie générale se voit bien mal compensée par l’index, aussi exhaustif soit-il.
Emmanuel Désveaux
DENILE, Gérard. L’économie de Dieu. Famille et marché entre christianisme, hébraïsme et islam. Paris: Les Belles Lettres, 2015. 344p. Resenha de: DÉSVEAUX, Emmanuel. Resenha de: Annales. Histoire, Sciences Sociales. Paris, n.4, 2016. Acessar publicação original [IF].
A Casa Rosa do Leblon: vida e costumes de uma família do século XX | Miridan Bugyja Britto Falci
O livro A Casa Rosa do Leblon surge com lugar especial na historiografia carioca ao tomar o bairro como referência para a história da cidade. O livro mistura pesquisa e memória pessoal ao tratar a história da família da autora que se confunde com a história da casa que passou a abrigar a família a partir de 1954. Conforme a leitura revela, a família se instalou no Leblon depois de residirem no bairro do Grajaú, transferindo-se da Zona Norte para a Zona Sul. Sonhavam, inicialmente, com uma casa em Copacabana, mas numa época em que na região as casas desapareciam e davam lugar aos edifícios de apartamentos. A casa no Leblon, na rua Sambaíba 555, surgiu como alternativa. Seguramente, o ponto privilegiado do Alto Leblon foi decisivo. A Casa Rosa do Leblon era dominada por uma vista do mar das praias do Leblon, Ipanema e Arpoador, e das janelas dos quartos era o morro dos Dois Irmãos que impunha sua presença. Tudo isso antes da verticalização das edificações, que terminaram por encurtar os horizontes da vida na cidade.
Buscando contextualizar historicamente a trajetória da família e de seus membros que habitavam a casa que se torna o personagem principal do livro, Miridan Bugyja Britto Falci termina por construir aproximações que caracterizam a história da vida social de classe média na cidade, retratando as transformações sociais do Rio de Janeiro no século XX. Destaca-se que a originalidade do estudo está justamente nesse enfoque da história do bairro que é raramente explorado na historiografia carioca. Leia Mais
Nas memórias de Aurélia: cotidiano feminino no Rio de Janeiro do século XIX / Samuel Albuquerque
Samuel Albuquerque / Foto: Conectando Com Jota /
Ao dar visibilidade no cotidiano feminino no Rio de Janeiro do século XIX, Samuel Barros de Medeiros Albuquerque, professor da Universidade Federal de Sergipe, narrou neste livro as vivências e experiências da sergipana Aurélia Dias Rollemberg (1863-1952), futura Dona Sinhá, durante sua estada no Rio de Janeiro com sua família, e sua preceptora alemã, Marie Lassius.
Tais memórias, arquivadas em textos, são fonte de informações preciosas sobre o cotidiano feminino, incluindo o trabalho de governantas, bem como as experiências e práticas culturais de meninas, moças e senhoras na sociedade carioca.
Assim, fazendo uma breve descrição dos familiares de Aurélia, da chegada de Marie Lassius no Brasil e na casa da jovem, ainda em Sergipe, Albuquerque buscou investigar
o universo de preceptoras europeias que viveram entre os grandes centros e a periferia do Império do Brasil e, para tanto, enveredo pelo cotidiano de uma típica família da nossa antiga elite política e econômica, buscando interpretar sobretudo, as práticas culturais femininas (2015, p. 17).
Para isso, Albuquerque abordou no primeiro capítulo, intitulado “Nas memórias de Aurélia”, as experiências e vivências dessa jovem sergipana, bem como das demais mulheres da família, inclusive de sua preceptora alemã.
Ao narrar a conjuntura que levou a família do deputado geral Antonio Dias Coelho e Mello (1822-1904), Barão da Estância, a se mudar para o Rio de Janeiro, e o cotidiano das mulheres da família, Albuquerque conseguiu estabelecer pontos de convergência entre a política e cultura do século XIX.
A ligação política do Barão da Estância rendeu às mulheres da família e à preceptora alemã, o acesso a espaços de sociabilidade típicos da corte carioca, como bailes, jantares, cerimônias políticas e religiosas, inclusive contato direto com a família imperial, por meio das visitas residenciais ou cerimônias específicas.
Além disso, tal ligação política também possibilitou identificar o cotidiano dessas mulheres e suas práticas culturais. Dentre essas práticas, Albuquerque destacou as experiências vivenciadas e narradas por Aurélia nos diversos espaços de sociabilidade em que frequentou com sua família e com sua preceptora.
A frequência nesses espaços possibilitava às mulheres da corte e da elite se conhecerem, trocarem informações e experiências sociais e culturais. Assim, Aurélia, as mulheres de sua família, e sua preceptora, conseguiram se inserir no cotidiano feminino carioca e se adaptarem nessa nova realidade sociocultural, uma vez que todas elas provinham de outras realidades culturais.
Quanto à ligação cultural existente no cotidiano da família sergipana, podemos observar a atenção que o autor deu aos indícios textuais de Aurélia sobre a educação recebida pela preceptora alemã.
Da gramática ao estudo de idiomas e de música, a jovem sergipana foi educada para tornar-se uma mulher culta e preparada para um bom casamento e, consequentemente, saber cuidar da casa, do marido, dos filhos e dos criados.
Sua vivência e experiências pela cidade do Rio de Janeiro, acompanhada por sua família e por Marie Lassius, fizeram de Aurélia uma moça atenta ao cotidiano feminino e aos espaços de sociabilidade por ela frequentados.
Guiado pelos indícios das práticas culturais e dos espaços de sociabilidade acessados por Aurélia, Albuquerque continuou explanando no segundo capítulo, intitulado “No Reino Encantado de Pedro II”, o cotidiano feminino pelo Rio de Janeiro durante o reinado de D. Pedro II.
A frequência nos ritos religiosos, no estabelecimento de modistas franceses, na confeitaria Paschoal, nas residências de políticos e damas da elite carioca, em teatros, museus, passeios públicos, jardins botânicos, zoológico, praias e demais endereços ilustram a diversidade de espaços de sociabilidade existentes na cidade do Rio de Janeiro, bem como os locais permitidos ao acesso feminino.
Toda vivência e experiência obtida durante a estadia no Rio de Janeiro, provavelmente proporcionou a Aurélia noções do cotidiano e das práticas femininas, além de prepará-la para a vida de esposa, mãe e dona de casa.
Assim, com o encerramento das atividades políticas do Barão da Estância no Rio de Janeiro em 1879, ele e sua família retornam a Sergipe, deixando para trás o amigo da família Gonçalo de Faro Rollemberg, futuro esposo de Aurélia, e a preceptora alemã, Marie Lassius que faleceu no mesmo ano.
Aurélia, já amadurecida, continuou escrevendo suas vivências e experiências, porém, não da mesma forma como antes. Diante de seus retornos ao Rio de Janeiro, de seu casamento, filhos que teve, permanecia em sua memória os ensinamentos, as práticas, as vivências e as experiências deixadas por sua preceptora.
Assim, se Samuel de Albuquerque buscou destacar em seu livro a importância da prática da preceptoria no Brasil para a formação feminina, em especialde Aurélia, ele também conseguiu dar visibilidade às experiências, vivências e práticas culturais no cotidiano feminino no Rio de Janeiro do século XIX.
Everton Vieira Barbosa Correio – Mestrando no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP-Campus de Assis). Bolsista pelo processo 15555-8, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).E-mail: semusico@hotmail.com.
ALBUQUERQUE, Samuel. Nas memórias de Aurélia: cotidiano feminino no Rio de Janeiro do século XIX. São Cristóvão: Editora UFS, 2015, 152p. Resenha de: CORREIO, Everton Vieira Barbosa. História histórias. Brasília, v.4, n.7, p.231-233, 2016. Acessar publicação original. [IF]
The African-American Family in Slavery and Emancipation | Wilma Dunaway
Em 1965, Daniel Patrick Moynihan, sociólogo e assistente da Secretaria do Trabalho durante a presidência de Lindon Johnson, publicou um relatório cujo tema central era a família negra norteamericana. Embora tivesse como título oficial “A família negra: um caso de ação nacional”, o relatório tornou-se efetivamente conhecido como “Relatório Moynihan”.
Buscando as origens mais profundas da pobreza dos negros nos Estados Unidos, Moynihan relacionou a situação de desigualdade política e econômica, vivenciada por esse grupo social, a uma ausência relativa da família nuclear. Dessa forma, na década de 1960, segundo as orientações do Relatório, os casos crescentes de divórcios, de mães solteiras, de abandono familiar, de lares chefiados apenas por mulheres e os altos níveis de pobreza entre a comunidade negra não seriam sanados sem a intervenção governamental. Leia Mais
Liberdades Negras nas Paragens do Sul | Gabriel Aladrén; Egressos do Cativeiro, c.1798 – c.1850) | Roberto Guedes; A Remissão do Cativeiro, c.1750 – c.1830 | Márcio de Sousa Soares
A historiografia brasileira já conta com um número substantivo de pesquisas sobre alforrias e a vida de africanos e afro-descendentes no período posterior à libertação. Em se tratando do primeiro tema, as investigações versam, em especial, sobre as modalidades de manumissão e o perfil de escravos alforriados. No que tange aos libertos, as pesquisas apresentam conclusões dicotômicas, ora associando-os à pobreza e marginalidade, ora à ascensão econômica. A primeira vertente teve início em 1942, com algumas considerações feitas por Caio Prado Júnior (Formação do Brasil Contemporâneo, 1942), como a relação estabelecida entre esse segmento da população e os grupos intermediários da sociedade colonial, ou seja, aqueles que não se inseriam nas categorias de senhores nem de escravos. Os estudos subsequentes como os de Laura de Mello e Souza (Desclassificados do Ouro, 1982) e Núbia Braga Ribeiro (Cotidiano e Liberdade, 1996) adotaram essa linha interpretativa ao considerarem esse segmento social como desclassificado, temido socialmente e sujeito a políticas de controle pela administração portuguesa. Outros trabalhos, porém, negligenciaram a associação à pobreza e marginalidade e deram lugar às investigações acerca da ascensão econômica desses grupos, como Sheila de Castro Faria (A Colônia em Movimento, 2004), Eduardo França Paiva (Escravos e Libertos nas Minas Gerais, 1996 e Escravidão e Universo Cultural na Colônia, 2001), Cláudia Cristina Mól (Mulheres forras, 2002), dentre outros.
Os três livros recentes de Roberto Guedes, Márcio de Sousa Soares e Gabriel Aladrén se destacam nesse campo por procurarem integrar o estudo das alforrias ao exame das trajetórias sociais dos egressos do cativeiro durante a vigência do regime escravista. As referidas publicações são fruto de trabalhos apresentados em programas de pós-graduação: os trabalhos de Guedes e Soares foram originalmente defendidos como teses de doutoramento na UFRJ, em 2005, e na UFF, em 2006; o livro de Aladrén resultou de uma dissertação de mestrado defendida na UFF, em 2008.
Guedes e Soares priorizam a análise das famílias de libertos e seus descendentes e sua atuação na dinâmica econômica local. O primeiro estudou Porto Feliz, em São Paulo, e, o segundo, Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro. Já Aladrén se deteve nas trajetórias individuais e analisou os ex-escravos a partir dos acontecimentos políticos que inquietaram a região de Porto Alegre nas três primeiras décadas do século XIX.
Esses autores atribuem importante papel aos escravos em prol da liberdade e de melhoria das condições de vida após a sua efetivação. Embora fosse um acordo entre desiguais, a alforria consistia em uma doação feita pelo proprietário, mas, acima de tudo, aceita pelos escravos. Tratava-se, portanto, de uma troca que gerava novos vínculos entre os forros e seus antigos senhores, os quais se perpetuavam para o resto de suas vidas. Os ex-senhores esperavam dos escravos alforriados (gratuitamente ou sob condição) constante respeito e subordinação. Qualquer desvio ou rompimento dessas referências colocava em risco a legitimidade do novo status.
Várias discussões já propuseram que as manumissões estariam vinculadas à negação da ordem escravista, mas os três autores as analisam como parte de um sistema composto pela tríade tráfico, escravidão e liberdade. A alforria seria parte estrutural da escravidão, amortecendo conflitos inerentes à relação existente entre escravos e seus proprietários. Outro ponto marcante desses trabalhos consiste na idéia de que, após a conquista da liberdade, os libertos buscavam melhores condições de vida. Ainda que encontrassem limitações inerentes à condição social, estiveram atentos às oportunidades que lhes eram apresentadas e conseguiram trilhar caminhos diferenciados daqueles em que se encontrava grande parcela dessa população.
A ascensão econômica não indicou necessariamente ascensão social. Em especial, Roberto Guedes e Márcio de Sousa Soares mostram que a mobilidade social era geracional, ou seja, acontecia predominantemente para gerações que descendiam dos libertos. Os casamentos com pessoas livres contribuíram fortemente para isso. Também evidenciam que as categorias de cor encontradas em registros coloniais e do período imperial eram fundamentais para a inserção de pretos e pardos na hierarquia social vigente.
Os três livros contribuem de maneira decisiva para os estudos sobre a escravidão no Brasil. Além de levantar dados sobre as alforrias em regiões pouco exploradas pelos historiadores que os antecederam, como as áreas rurais e o sul do país, ainda avançaram na análise da vida dos escravos após a libertação. Os três pesquisadores utilizaram métodos qualitativos e seriais. Recorreram à micro- história e reuniram fontes diferenciadas que permitem conhecer múltiplas experiências dos homens e mulheres investigados. Os registros referentes à justiça colonial e imperial como os processos crime e as ações cíveis forneceram importantes recursos para tal perspectiva.
O trabalho de Roberto Guedes consiste na análise de quatro gerações de famílias de Porto Feliz, compostas por libertos e seus descendentes, entre os anos de 1798 e 1850. A partir de cruzamento onomástico, o autor acompanha a dinâmica econômica e social de seus membros, com o objetivo de compreender as principais estratégias de mobilidade social em âmbito familiar. Márcio Soares fez um estudo da escravidão, priorizando a região de Campos dos Goytacazes no período que compreende a segunda metade do século XVIII e as três primeiras décadas do século XIX. Seu foco, contudo, é a investigação das complexas relações entre senhores e escravos em uma região rural. Observou principalmente as estratégias sociais que favoreciam o acesso à liberdade e a inserção social de libertos e seus descendentes.
Gabriel Aladrén trata basicamente dos padrões de alforrias encontrados nas proximidades de Porto Alegre e das experiências dos egressos do cativeiro e seus descendentes entre os anos de 1800 e 1835, período de grandes conflitos militares como as Guerras Cisplatinas e a dos Farrapos. O autor acredita que esse conturbado momento contribuiu para o recrutamento de escravos e libertos para o exército, milícias e guerrilhas, favorecendo, por sua vez, a incidência de alforrias, inserção e mobilidade social dos mesmos.
Os estudos desses autores partem de uma abordagem que relaciona as forças econômicas e sociais. As três localidades sofreram mudanças significativas na economia. Em Porto Feliz, o crescimento da produção de alimentos e de açúcar na primeira metade do século XIX foi responsável por um considerável aumento do contingente populacional na região, acompanhado também pelo crescimento de escravos. O mercado de gêneros alimentícios passou a ser controlado por pequenos proprietários. Isso implicou uma população composta por pessoas de parcos recursos em meio a uma parcela reduzida de produtores que concentravam maiores posses. Campos dos Goytacases verificou grande expansão açucareira entre os anos de 1750 a 1830, voltada para a exportação. Esse processo foi acompanhado por uma concentração de propriedade de escravos, sem impedir, contudo, que pequenos e médios proprietários tivessem acesso à sua posse. Já a região de Porto Alegre era formada pela vila e algumas freguesias como a Aldeia dos Anjos e Viamão. Caracterizada por extensa área rural, suas fazendas, chácaras e campos conjugavam a produção agrícola e agropecuária para o abastecimento interno.
O ponto de partida dessas pesquisas foi o estudo das alforrias. Os autores buscam conhecer as principais características dessa prática a partir do levantamento de fontes como registros de batismos, testamentos, cartas de liberdade e livros de notas. Analisam os perfis dos senhores, dos escravos alforriados e o significado dessas libertações para ambos. As incidências foram significativas nas três localidades, seguindo os padrões anteriormente vigentes na América Portuguesa. Eram predominantes as concessões para as mulheres e escravos nascidos na colônia, favorecidos com libertações gratuitas, condicionais ou pagas por terceiros, em detrimento dos africanos que compravam a própria liberdade.
No final da década de 1970, Jacob Gorender (O Escravismo Colonial, 1978) afirmou que as manumissões foram associadas aos interesses senhoriais, e que um escravo estaria mais propenso a receber a liberdade em momentos de crise econômica. Contudo, Aladrén, Souza e Guedes adotaram outro viés para a compreensão das alforrias, valorizando o papel que tiveram no contexto do sistema escravista. Para esses autores, as concessões em testamentos e pias batismais foram compreendidas como um reforço do paternalismo inerente à escravidão. Essa atribuição cabia unicamente ao proprietário, e seu desdobramento era a produção de dependentes, pois era fruto de um arranjo entre desiguais. Obediência, respeito e gratidão deveriam pautar as relações entre o ex-senhor e o liberto para que o mesmo pudesse manter o novo status alcançado. Salvo algumas exceções, o empenho desses homens e mulheres era sempre em função de ganhos pessoais. Seus esforços visavam a conquista da própria liberdade ou de terceiros, sem nunca questionar a instituição da escravidão.
Roberto Guedes ainda destaca a função importante que os casamentos entre escravos desempenhavam no incentivo à liberdade. No primeiro momento, os senhores acabavam adquirindo status quando incentivavam as uniões entre seus cativos. Em Porto Feliz, as alforrias eram prerrogativas mais direcionadas às escravas, que passavam a ser agregadas, enquanto seus maridos permaneciam na condição de escravos. Essas uniões eram duradouras e somente rompidas pela morte de um dos cônjuges. Predominavam as uniões exogâmicas entre os próprios crioulos e entre os africanos.
Soares destaca que as liberdades concedidas em testamentos e pias batismais, de alguma forma, se associavam a razões morais e afetivas. Do intercurso sexual entre escravas e seus senhores acabavam nascendo crianças que recebiam alforria como forma dos pais se redimirem do erro de ter gerado um filho em cativeiro. Os altos índices de ilegitimidade entre as crianças batizadas levam a crer que as alforrias em pia batismal eram formas veladas de reconhecimento da paternidade. Já o momento da morte mostrou-se propício para que os senhores concedessem a liberdade a seus cativos, ou parte deles. Em ocasiões de doenças ou mesmo velhice, alguns fiéis buscavam a salvação da alma e a remissão de suas culpas.
Tendo em vista a incidência de concessões de manumissões onerosas, esses estudos abordam os artifícios empregados pelos libertos como forma de acumularem pecúlio e até mesmo ascenderem economicamente. A idéia de que a ascensão econômica não significou necessariamente mobilidade social é comum aos três trabalhos; o que os diferencia são as metodologias utilizadas para a análise desse aspecto.
A partir do levantamento de inventários post mortem, Gabriel Aladrén busca conhecer as ocupações dos libertos da região de Porto Alegre. Os indícios apontam para o envolvimento em atividades agrícolas e o acesso à terra. Utiliza processos crime como forma de viabilizar a reconstituição de algumas trajetórias de libertos que praticaram ou sofreram algum tipo de delito. A análise de dados pessoais e de depoimentos de pessoas próximas permitiu identificar eventos marcantes na vida de ex-escravos daquelas paragens. A inserção no meio social, o estabelecimento de redes de sociabilidade, o acesso a bens materiais e até mesmo o alcance de uma posição mais favorável são alguns deles.
O método utilizado por Roberto Guedes em seu estudo é peculiar. O autor acompanha gerações de cinco famílias de egressos do cativeiro da região de Porto Feliz e se reporta a diferentes momentos de suas vidas para mostrar que a combinação entre estabilidade familiar, trabalho e boas relações contribuíam para a ascensão econômica. Encerra seu livro afirmando que os escravos contraíam matrimônio, conseguiam a liberdade, herdavam bens, tornavam-se proprietários de escravos e contribuíam para que seus descendentes deixassem de carregar o estigma da escravidão a partir da percepção social da cor.
Soares chega às mesmas conclusões; porém, seu método se baseia na análise de casos específicos, sem acompanhar registros de uma mesma família, como o fez Guedes. Mostra que as possibilidades de obterem melhores condições de vida eram condicionadas a fatores como bons casamentos, relações com pessoas influentes da sociedade, mas também às ocupações de postos militares ou em irmandades. A presença de ao menos um desses aspectos era suficiente para diferenciar um liberto de outras pessoas com a mesma condição social. Ao analisar testamentos e inventários post-mortem, verifica que eles acumularam posses e acabaram se comprometendo com a escravidão ao se tornarem proprietários de escravos. As alforrias recebidas e acompanhadas de bens que os senhores, por vezes, os deixavam, contribuíram muito nesse sentido. Para esse autor, a mudança de status favoreceu a alteração da identificação da pessoa quanto à cor. Essa atribuição era dinâmica e variava conforme as diferentes gradações da hierarquia social.
A análise das hierarquias raciais vigentes nos períodos colonial e imperial é outro ponto abordado nesses trabalhos, porém mais explorado por Aladrén. O autor lembra que a escravidão no Brasil não foi pautada em bases raciais, embora a classificação da população, sobretudo no que se referia a escravos e seus descendentes, tivesse sido estruturada a partir das categorias estamentais vigentes no Antigo Regime português. Nesse sentido, concorda com Hebe Mattos (Escravidão e cidadania no Brasil monárquico, 2000) ao considerar que, na prática social, houve uma hierarquia relativa à raça nos tempos coloniais, que foi redefinida a partir da independência da América Portuguesa e da construção da nova nação.
Em se tratando da colônia, as designações dos escravos, libertos e seus descendentes eram determinadas pela classificação de cor e origem. Fatores como riqueza, posição social e comportamento também tinham peso. Tais critérios não eram rígidos; formas diferenciadas podiam ser atribuídas de acordo com a época, região e a pessoa que os empregava. Os autores observam que a alteração ou até mesmo o desaparecimento dos designativos de cor ocorriam quando se tratava de pessoas que provinham da terceira geração de descendentes de escravos e, principalmente, no caso de ex-escravos que contraíam matrimônio com livres. O trabalho supracitado de Hebe Mattos e também o de Sheila de Castro Faria (A colônia em movimento, 1998) evidenciam ainda que o termo pardo indicava miscigenação, embora não deixasse de eximir a marca da ascendência escrava. Já o termo “pardo livre” surgiu a partir do aumento da população de egressos do cativeiro e de seus descendentes, em fins do século XVIII e início do XIX, como uma necessidade de diferenciar aqueles que não passaram pela experiência do cativeiro.
Aladrén compara ainda os designativos conferidos aos escravos no momento em que iam receber a liberdade e as assinaturas encontradas depois de libertos. Assim, verifica que os mapas de população elucidam uma linguagem oficial, porém não tão distinta daquela utilizada nas práticas cotidianas da população. Com o processo de independência e de construção da nação brasileira nas primeiras décadas do século XIX, foram observadas “formas específicas de racialização”. As expressões utilizadas acabavam delimitando socialmente as fronteiras entre pessoas brancas, libertos e seus descendentes.
Para compreender as estratégias de inserção social dos pretos e pardos no período das Guerras Cisplatinas e da Independência do Brasil, Aladrén estudou o recrutamento das tropas regulares. No final do período colonial, a convocação seguia critérios raciais. As tropas classificadas como de primeira linha admitiam somente homens brancos ou de pele bem clara. Já as de segunda aceitavam brancos, pardos e também pretos. Segundo Aladrén, os conflitos ocorridos na região de Porto Alegre e, sobretudo, a conjuntura gerada com os movimentos de emancipação da América Portuguesa contribuíram de maneira decisiva para que a composição do exército tomasse novos formatos, passando a recrutar escravos, livres e também libertos. Os escravos e libertos se alistavam voluntariamente nos batalhões visando futuramente a alforria e a melhoria das condições de vida ou a mobilidade social. Parcela considerável daqueles que lutavam ao lado de seus senhores recebiam a liberdade.
O reconhecimento social dos direitos garantidos a libertos e seus descendentes pela legislação do Império do Brasil é outro tema que chama a atenção do autor. Para conhecer esse aspecto, ele analisa alguns conflitos cotidianos por meio de processos crime. Assim, avalia o posicionamento desses e das demais pessoas envolvidas em demandas judiciais. Conclui que os brancos daquela sociedade, nas primeiras décadas do século XIX, ainda operavam de acordo com os padrões hierárquicos do Antigo Regime. Alguns continuavam desqualificando negros com discursos racialistas, provando que, mesmo conquistando postos mais elevados, acabavam sendo vistos com desconfiança.
O principal aspecto que diferencia o trabalho de Aladrén dos demais autores resenhados é o peso que ele confere às mudanças políticas como determinantes na inserção social dos libertos e seus descendentes. De maneira geral, os três livros trazem avanços notáveis para o campo de estudos sobre os ex- escravos e seus descendentes. No primeiro momento, analisam as alforrias locais sem perder de vista as características estruturais que engendravam essa prática. As modalidades, o perfil dos escravos libertados, as possibilidades de anulação de status alcançado, são fatores que ajudam a visualizar a complexidade da escravidão na América Portuguesa e no Brasil Independente. Não há como apreender esse complexo sistema sem passar pelas alforrias, pois elas são parte constitutiva do mesmo. Em um segundo passo, buscam compreender a inserção social dos egressos do cativeiro. Enquanto Guedes e Soares se baseiam no estudo de casos de famílias de libertos e suas estratégias de mobilidade social em um contexto de expansão econômica, Aladrén se detém nas trajetórias individuais em um período compreendido por profundas mudanças políticas.
A passagem da escravidão para a liberdade acarretou mudanças significativas. A aquisição de capacidade civil foi a principal delas, pois permitiu o direito à constituição de família, à mobilidade, à herança e à propriedade. Por maior que fosse a autonomia de um escravo, suas prerrogativas não se equiparavam às de um liberto. Em um momento de intensas transformações políticas como as da virada do século XVIII para o XIX e, especificamente, no contexto de independência da América Portuguesa, ocorreram mudanças significativas para a população liberta. Soares e Guedes não exploram esse contexto político; Aladrén, por sua vez, enfrenta a questão, mas valoriza basicamente a inserção social incentivada pela necessidade de novos recrutamentos para as forças militares em conflito. Em função disso, restringe-se à análise do gênero masculino, mesmo tendo em vista que as mulheres eram as mais alforriadas no período por ele abordado.
O exame da inserção de libertos e seus descendentes na América Portuguesa e no Brasil Independente é o principal fio condutor desses trabalhos. Os três autores conduzem suas pesquisas na contramão de parte da historiografia, anteriormente mencionada, que tende a considerar os ex-escravos como uma subcategoria social. Ao contrário, Guedes, Soares e Aladrén empregam métodos peculiares e revelam as diferentes estratégias por eles adotadas em função de galgarem melhores condições de vida. Mais do que discutir os caminhos para a manumissão e o perfil dos manumissos, esses historiadores mostram que homens e mulheres forras souberam alongar o horizonte da liberdade, fosse por meio da constituição de família, da inserção em irmandades e ou ordens militares.
Os referidos estudos ainda somam- se à historiografia e tornam evidente que as esferas públicas foram palco das mais variadas reivindicações iniciadas por egressos do cativeiro na passagem do século XVIII e XIX. O acesso à justiça, sobretudo no período colonial, pode indicar que ela funcionou como um importante instrumento de garantia do que hoje entendemos por direitos civis para os ex- escravos. É possível que os litígios tivessem uma conotação de luta pela afirmação das conquistas dos ex- escravos após a obtenção da liberdade. A investigação das práticas cotidianas nos contextos de inserção política nos momentos que antecederam a Constituição de 1824, enfim, ainda não foi explorada.
Renata Romualdo Diório – Doutoranda em História pela Universidade de São Paulo (FFLCH/ USP – São Paulo/Brasil). E-mail: diorio@usp.br
ALADRÉN, Gabriel. Liberdades Negras nas Paragens do Sul: alforria e inserção social dos libertos em Porto Alegre. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009. GUEDES, Roberto. Egressos do Cativeiro: trabalho, família e mobilidade social (Porto Feliz, São Paulo, c.1798 – c.1850). Rio de Janeiro: Mauad X/FAPERJ, 2008. SOARES, Márcio de Sousa. A Remissão do Cativeiro: a dádiva da alforria e o governo dos escravos nos Campos dos Goitacases, c.1750 – c.1830. Rio de Janeiro: Apicuri, 2009. Resenha de: DIÓRIO, Renata Romualdo. Alforria e mobilidade social nos séculos XVIII e XIX: os casos de Porto Feliz, Campos dos Goitacases e Porto Alegre. Almanack, Guarulhos, n. 1, p.155-161, jan./jun., 2011.
Maternidade tardia: mulheres profissionais em busca de realização plena – HEWLETT (REF)
HEWLETT, Sylvia Ann. Maternidade tardia: mulheres profissionais em busca de realização plena. Tradução de Grace Khawali. Osasco, SP: Novo Século, 2008. 287 p. Resenha de: SPONCHIADO, Justina Inês. A árida arte de conciliar carreira e plenitude nos vários âmbitos do viver. Revista Estudos Feministas v.19 n.1 Florianópolis Jan./Apr. 2011.
Doutora em Economia, Sylvia Ann Hewlett foi professora nas universidades de Cambridge, Columbia e Princeton; e fundadora presidente da ONG Center for Work-Life Policy. Autora de seis livros, articulista do New York Times, foi também a primeira mulher a presidir, nos anos 1980, o Conselho de Políticas Econômicas nos EUA. Vive em Nova York. Sua ação social dirige-se, sobretudo, a empresários e empresárias, apostando na formação de opinião e na construção de políticas que apoiem a família, na perspectiva de criar condições para que as mulheres possam conciliar carreira e vida.
Relativizando sua aposta irrestrita na família de modelo tradicional, colheremos elementos relevantes para as reflexões sobre relações de gênero, considerando a condição de mulheres profissionais heterossexuais. Depois do prefácio em que declara sua alegria de viver um casamento feliz e sua infinita paixão por ser mãe, expõe sua intensa luta para conciliar carreira e maternidade e para ter filhos mais tarde; sentimentos envolvidos ao sofrer um aborto de gêmeos iniciado durante um dia exaustivo e estressante de trabalho; críticas de colegas por engravidar, desviando-se do foco da carreira e do trabalho, e por insistir em ter [ainda] mais filhos. Ela conta como enfrentou – e confrontou – tudo isso. Leia Mais
Gerações, família, sexualidade | Gilberto Velho e Luiz Fernando Duarte
Os organizadores deste livro já são conhecidos dos cientistas sociais no Brasil. Tanto Gilberto Velho quanto Luiz Fernando Duarte representam uma parte importante da antropologia urbana brasileira e foram os responsáveis por esta obra. Além deles, contribuíram para o livro Myriam Moraes Lins de Barros, Jane Russo e Maria Luiza Heilborn, também autoras bastante conhecidas dos cientistas sociais.
Inicialmente, os autores ressaltam a importância do tema para a antropologia urbana, citando a Escola de Chicago e a antropologia social britânica como fontes importantes para a discussão. Também destacam a discussão interdisciplinar, principalmente através da psicologia, como uma rica contribuição para esses debates.
O texto trata das transformações no âmbito da sexualidade e da família, enfocando prioritariamente as mudanças sociais referentes a gênero e gerações. Tal temática já vem sendo abordada de forma interessante por autores como Michel Bozon, cientista social francês que tem produzido principalmente com Maria Luiza Heilborn.
O texto “Sujeito, subjetividade e projeto”, de Gilberto Velho, aborda uma discussão que o autor já faz desde a década de 1980. Velho – que cita Alfred Schutz e George Simmel como fontes importantes do seu trabalho – apresenta seu objeto de investigação, que são as trajetórias individuais dos sujeitos e as gerações. Isso porque analisa hoje a geração dos que seriam filhos dos seus pesquisados do passado. Sua preocupação com a temática aparece há muito tempo, desde quando elaborou sua tese de doutorado. Só que neste texto fica explícito o que tem procurado investigar: o que muda nessas gerações, principalmente através dos “objetivos e metas, […] valores e autopercepções de individualidade e subjetividade” (p. 9).
O autor aponta para mudanças significativas dos sujeitos e suas relações consigo mesmo e com aquilo que ele chama de “ethos psicologizante” (grifo do autor). Curiosamente, localiza nos estoicos esse processo sobre a individualização dos sujeitos, mas, devido à brevidade do artigo, não chega a aprofundar seus argumentos. No fim do artigo, o autor estabelece as relações da sua pesquisa com países como Portugal e Estados Unidos, além de citar alguns pesquisadores da mesma temática, como já foi apontado por Simmel. Sem apresentar grandes novidades, o artigo faz uma retrospectiva do que o autor produziu até os dias de hoje.
O texto de Luiz Fernando Dias Duarte – intitulado “Família, moralidade e religião” – aponta para a complexidade da administração da vida privada nas diferentes camadas sociais da vida urbana no Brasil. Há, conforme o autor, uma oposição entre os valores como religião, família, moralidade e, principalmente, sexualidade na modernidade. Três interessantes questões vêm sendo estudadas por ele, junto a camadas populares, são elas: a) há formas de conjugalidade diferentes de modelos tradicionais contrastando com formas que reforçam padrões de casamento tradicionais; b) existe um aumento da individualização da sexualidade, ao mesmo tempo que existe uma ampliação sobre seu controle; e c) ocorre um aumento da adesão às religiosidades específicas de certos segmentos, simultaneamente à diminuição da religiosidade e da crença em jovens. Para o autor, isso tem relação com o aumento do subjetivismo.
Segundo Duarte, não existe uma diferença entre camadas sociais sobre essas alterações de moralidade. Assim, tanto camadas médias superiores quanto camadas populares podem oscilar entre esses padrões. Uma pista interessante sugerida por Duarte e que pode contribuir com as pesquisas sobre essa temática é que, independentemente dos diferentes níveis de camadas sociais, o processo de individualização também é importante presença na constituição da singularidade de camadas sociais de baixa renda. Esse fato é muitas vezes negligenciado por pesquisadores que diferenciam as classes sociais pelas distâncias sociais econômicas entre elas.
O autor cita que dentro de camadas médias e letradas existe uma concepção de que ser moderno é estar mais atento às mudanças de comportamentos de sexualidade e relativos – controle de natalidade, mais especificamente. Aqui, mesmo que não tenha sido citado, é possível comparar ao clássico texto de Giddens sobre A transformação da intimidade.1
A contribuição de Duarte aqui é apontar de forma significativa as tensões sobre as disposições “liberais” e as “morais”, mas não fica claro como estas se constituem no universo social desses grupos sociais. Ele utiliza uma categoria que curiosamente chama de “desentranhamento” (p. 23) e que é uma das responsáveis por compreender as mudanças sociais na vida cotidiana.
O autor ao final revela que a sua proposta foi de, através do conceito de cismogênese (abordado de forma muito interessante em seu texto), encontrar elementos teóricos para compreender as “tensões contrastivas” que se apresentam para esses grupos, principalmente a partir da experiência religiosa.
No texto “Três gerações femininas em famílias de camadas médias”, Myriam Moraes Lins de Barros aborda as transformações sociais e de gênero advindas do envelhecimento da população. O estudo enfocou principalmente as mulheres, por meio de 24 entrevistas. Foram escolhidas mulheres nascidas nas décadas de 1940 e 1950, devido às transformações sociais que vão desde o casamento até o trabalho ocorridas para essas gerações.
A autora ressalta a importância dos movimentos sociais da década de 1960 para a “configuração dos valores individualistas” (p. 48). Ela deixa claro que seu interesse é descobrir formas psicológicas de introjeção dos valores individualistas. Uma leitura à primeira vista demonstra forte influência da psicologia, uma marca de todos os trabalhos desta obra. Myriam de Barros ainda aponta para a importância de se entenderem as relações de gênero nas dinâmicas interacionais.
Uma das principais mudanças, segundo a autora, é sobre a compreensão de conjugalidade para as mulheres entrevistadas, que se diferenciou a partir das gerações pesquisadas. A autora identificou tensões entre os grupos pesquisados, principalmente atreladas às diferenças geracionais. O processo de individualização foi fundamental para que as entrevistadas pudessem estabelecer novas relações com seus parceiros, assim como com suas famílias.
No texto intitulado “A sexologia na era dos direitos sexuais: aproximações possíveis”, de Jane Russo, a temática é a politização dos movimentos sociais sobre a sexualidade. Ela inicia falando do movimento gay e sua articulação para tirar a homossexualidade do rol das perversões.
A autora faz uma constatação: houve, simultaneamente, uma politização das sexualidades divergentes e uma medicalização da sexualidade heterossexual. Ela revela que a preocupação com a sexualidade surge na passagem do século XIX para o século XX com estudiosos, dentre eles talvez o mais conhecido seja Havelock Ellis. Essas considerações são claramente influenciadas por Foucault, citado pela autora em diversos momentos. Um apontamento trata da discussão de Russo sobre a despatologização dos chamados desvios sexuais, a partir do discurso sobre os direitos sexuais. O interessante é que, ao mesmo tempo que isso acontece, existe uma crescente disciplinarização da sexualidade dos casais heterossexuais.
A autora apresenta um quadro com datas e acontecimentos políticos significativos para a discussão sobre os movimentos sociais que lutaram contra a medicalização da sexualidade, como a Revolta de Stonewall, por exemplo, em 1969. Aqui vale lembrar o recente livro intitulado Preconceito contra homossexualidades: hierarquia da invisibilidade,2 que faz uma importante retrospectiva do movimento gay nos Estados Unidos e no Brasil.
O que a autora revela é que começa a haver um levantamento de novas condutas da sexualidade para os casais heterossexuais, principalmente as defendidas como ideal de saúde e bem-estar. Assim como Michel Bozon,3 ela cita o surgimento do Viagra como a inauguração da medicalização da sexualidade. O curioso é que, com o lançamento desse medicamento, aumenta o conceito de disfunção erétil como um problema de saúde pública nos Estados Unidos, atingindo 52% dos homens entre 40 e 74 anos, ou seja, existe uma orientação da sexualidade que passa por uma forma de medicalização dela.
No último texto, intitulado “Homossexualidade feminina em camadas médias no Rio de Janeiro sob a ótica das gerações”, Maria Luiza Heilborn aborda – em uma etnografia realizada em sua tese de doutoramento no Rio de Janeiro com mulheres homossexuais – fortes características de uma valorização da conjugalidade. A autora se propõe a investigar as gerações e a maneira como as suas entrevistadas apresentavam-se em relação à própria orientação sexual. Revela que sua preocupação não está relacionada com a identidade sexual, mas é inegável que essa discussão a tangencia em todo o seu texto. Ela elabora uma interessante definição de conjugalidade, centrando-a principalmente em um tipo de relação estabelecida entre os companheiros, independentemente de serem heterossexuais ou homossexuais. Ainda assim, talvez esse conceito pudesse ser mais bem descrito, pois, em caso de pesquisas, a ideia de “não conjugalidade” dificulta uma distinção, por exemplo, de uniões estáveis para namoros com casais que não coabitam e também se relacionam afetiva e sexualmente. Curiosamente, em sua atual pesquisa, a autora identificou que as mulheres recusaram o modelo de masculinidade lésbica.
A análise é relativa à sexualidade como uma biografia, citando John Gagnon, que tem sua primeira obra publicada no Brasil em 2006, intitulada Uma interpretação do desejo: ensaios sobre o estudo da sexualidade.4 Tal perspectiva tem encontrado forte amparo nos pesquisadores das ciências sociais, principalmente na Europa e no Brasil. O estudo parte do que Gagnon chama de scripts sexuais: uma relação entre perspectivas sociais, interpessoais e intrapsíquicas; uma teoria complexa, mas de grande contribuição para o campo de conhecimento da sexualidade. Heilborn ainda aponta que os scripts sexuais podem ser úteis para compreender as nuances cada vez mais significativas da orientação sexual, não como algo fixo, mas sim fluido. Aqui é clara uma influência do pensamento queer de Butler, mesmo sem ser citado.
A autora aborda ainda que existem poucas produções sobre homossexualidade feminina no mundo acadêmico nacional, mas que aparecem já algumas teses e dissertações relativas ao tema. Isso teria relação com a imbricação entre sexualidade e gênero. A visibilidade é muito maior entre homens gays do que entre mulheres. A autora revela que a conjugalidade acaba sendo uma preferência das lésbicas, devido à sua constituição caracteristicamente atribuída ao universo feminino.
A obra analisada apresenta contribuições interessantes em relação à temática, principalmente da sexualidade e do gênero, passando pela discussão sobre família e gerações. Mas o que chama realmente a atenção é a influência do processo de individualização sobre os sujeitos, que, na maior parte dos artigos, se faz presente. Essa discussão é um dos principais objetos da psicologia, especialmente da psicologia social. Mas o que podemos identificar é que existe aqui um claro diálogo interdisciplinar que está presente nos trabalhos dos autores e da antropologia que eles abordam.
Os artigos apresentam, na maior parte das vezes, uma contribuição importante para as discussões sobre as mudanças sociais e da família e sua interlocução sobre a sexualidade, ainda que por vezes pudessem aprofundar mais ou trazer outros textos, pois o livro apresenta apenas cinco artigos. Seria mais enriquecedor se outros autores participassem também com suas pesquisas sobre a temática. Ainda assim, como é de praxe, os autores trazem leituras instigadoras para novos pesquisadores que se aventuram no campo da sexualidade, do gênero e da família.
Notas
1 Anthony GIDDENS, 1993.
2 Marco Aurélio Máximo PRADO e Frederico Viana MACHADO, 2008.
3 Michel BOZON, 2004.
4 John GAGNON, 2006.
Referências
BOZON, Michel. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro: FGV, 2004. [ Links ]
GAGNON, John. Uma interpretação do desejo: ensaios sobre o estudo da sexualidade. Rio de Janeiro: Garamond, 2006. [ Links ]
GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades. 2. ed. São Paulo: UNESP, 1993. [ Links ]
PRADO, Marco Aurélio Máximo; MACHADO, Frederico Viana. Preconceito contra homossexualidades: hierarquia da invisibilidade. São Paulo: Cortez, 2008. [ Links ]
Leandro Castro Oltramari – Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade do Sul de Santa Catarina
VELHO, Gilberto; DUARTE, Luiz Fernando (Orgs.). Gerações, família, sexualidade. Rio de Janeiro: 7 letras, 2009. 96 p. Resenha de: OLTRAMARI, Leandro Castro. As transformações na família e na sexualidade. Revista Estudos Feministas, v.18, n.3, 2010.
Homossexualidade e adoção – UZIEL (REF)
UZIEL, Anna Paula. Homossexualidade e adoção. Rio de Janeiro: Garamond, 2007. 224 p. Resenha de: HERRERA, Florencia. Develando prejuicios: ¿Por qué los hombres homosexuales son padres de segunda categoría? Revista Estudos Feministas v.18 n.1 Florianópolis Jan./Apr. 2010.
Tener hijos, en nuestra cultura, es considerado como algo esencial para la realización personal y para la sobrevivencia de la sociedad. Se espera que las parejas, tarde o temprano, se conviertan en padres. Sin embargo, al desear hijos, las personas y parejas homosexuales no se acercan, sino que se alejan de las expectativas sociales. Homosexualidad y parentalidad son vistos como antagónicos e incompatibles por la sociedad. A pesar de ello, no es un hecho nuevo el que gays y lesbianas sean madres y padres, ya sea a raíz de relaciones heterosexuales y, más recientemente, mediante la adopción y las nuevas tecnologías reproductivas.
En su libro Homosexualidad y adopción Anna Paula Uziel, doctora en antropología social y psicóloga social del Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), da cuenta de las ideas preconcebidas, los mitos y los miedos que surgen cuando se habla de adopción por parte de homosexuales en el Brasil de hoy. Su análisis le permite interpelar los discursos clásicos sobre la familia para volver a preguntar ¿Qué significa ser padre? ¿Sobre qué base se puede decidir quién será un buen padre? ¿Qué y quiénes constituyen una familia?
Uziel combina dos temas que por sí solos plantean importantes desafíos a las formas tradicionales de hacer familia. Por un lado la adopción, que permite una filiación sin vínculo biológico, es decir, desafía el núcleo de nuestras ideas de lo que es el parentesco.1 Aquí el parentesco se construye mediante el lazo legal y se mantiene a través de los cuidados cotidianos. Históricamente la adopción ha pretendido mantener la ficción de la familia nuclear tradicional creando una representación de una pareja coherente con el modelo biológico básico.2 Por otro lado, la homosexualidad, que hace imposible mantener esta ficción, ya que cuestiona la centralidad del sexo procreativo y la diferencia de sexo como base de la familia.
El libro se divide en dos partes. En la primera, la autora presenta una discusión de los desafíos que plantean los nuevos arreglos familiares. Para esto revisa los elementos que pueden ser un aporte al análisis de los temas centrales del libro – Homosexualidad y adopción – presentes en las familias monoparentales, las familias pluriparentales y las familias recompuestas. Aquí Uziel concluye que sexualidad y parentalidad son esferas distintas de la vida y que las funciones parentales no implican el ejercicio de la sexualidad.
En la segunda parte del libro, Uziel se centra en los elementos que entran en juego en la adopción por parte de personas homosexuales. Para ello se basa en entrevistas realizadas a técnicos y operadores que trabajan en los procesos de adopción y en los documentos de 8 procesos de adopción donde el solicitante es homosexual. Notablemente 6 de estos procesos fueron favorables en su resultado final para los solicitantes. Esto da cuenta de un avance hacia el reconocimiento del derecho de las personas homosexuales a tener hijos.
Uziel realiza un análisis rico y profundo de los discursos y posiciones de psicólogos, asistentes sociales, promotores, defensores públicos y jueces. Creo que es un acierto dar cuenta de las narrativas de estos actores ya que en su actuar cotidiano y en las interpretaciones que hacen de la legislación, ellos están tomando decisiones respecto a quiénes pueden y quiénes no pueden convertirse en padres y por lo tanto, están definiendo qué significa ser un buen padre hoy en Brasil.
La autora analiza no sólo lo explícito en las palabras de sus entrevistados, sino que lee entrelíneas e interpreta también los silencios. De esta forma logra ir más allá del discurso políticamente correcto que le presentan los técnicos y operadores. En un primer nivel éstos son abiertos y tolerantes, pero al observar con más cuidado Uziel devela cómo en las narrativas de estos profesionales surgen los clásicos prejuicios, miedos y mitos asociados con la homosexualidad. Un ejemplo de ello es la recurrente asociación de homosexualidad con promiscuidad.
Resulta provocador el foco del libro en la homoparentalidad masculina. Ya por sí sola la paternidad de un hombre, sin una mujer a su lado, resulta controversial. La crianza de los hijos está tradicionalmente asociada a lo femenino. Es curioso como los técnicos resaltan características femeninas y maternales de los adoptantes homosexuales para argumentar su idoneidad como padres. De alguna manera, a sus ojos, la orientación sexual de estos candidatos a padres los acerca a la figura maternal y, por lo tanto, los hace más capaces de asumir la paternidad. Sería interesante poder comparar qué pasa con las solicitudes de mujeres lesbianas para adoptar. ¿Está el tema de su sexualidad igualmente presente en los procesos de adopción? ¿Son menos cuestionadas al ser mujeres?
Es revelador que técnicos y operadores tiendan a cuestionar más la homoparentalidad en pareja que la paternidad individual de hombres homosexuales. El sentido común indica que es menos difícil criar un hijo entre dos y que para el niño es mejor tener dos personas que lo quieran, lo guíen y lo protejan. Sin embargo, la sexualidad, que puede ser invisibilizada en el caso de adoptantes individuales, pasa a ocupar un lugar central cuando se trata de una pareja de personas del mismo sexo. Se desprende de los discursos de los entrevistados y del análisis de los procesos que la sexualidad homosexual sigue siendo considerada algo sucio, desviado y con un alto potencial de contaminar a las personas que están cerca de ella, especialmente a los niños.
A lo largo de las páginas del libro de Uziel hay una pregunta que persiste ¿Cuál es la pertinencia de hablar de sexualidad cuando se trata de parentalidad? De acuerdo con los resultados de su investigación el tema de la sexualidad surge sólo cuando el que solicita la adopción es homosexual. La autora se pregunta ¿influye la orientación sexual en la capacidad de criar niños? O ¿existe una manera de ser padre diferente si se es homosexual o heterosexual? ¿Está relacionado el ejercicio de la parentalidad con la sexualidad? ¿Tiene sentido hablar de homoparentalidad? Creo que la autora toca aquí un tema clave para los estudios de familia y homosexualidad.
Un argumento para esgrimir que la homosexualidad y la parentalidad están relacionadas es que es en la familia y son los padres los que transmiten modelos de género y también sexuales a sus hijos. Los principales referentes de género y de relaciones de pareja que los niños tienen son entregados por sus padres. Sin embargo, aún sosteniendo la pertinencia de hablar de homoparentalidad cabe preguntarse ¿por qué el modelo de pareja homosexual es un mal modelo para los niños? Lo que está detrás es la idea de que la homosexualidad es algo desviado, negativo y que debe ser evitado. Al parecer, pesar de los avances respecto a la tolerancia a la diversidad sexual en Brasil, no se ha logrado construir una imagen positiva del ser homosexual. Esto está claramente reflejado en el análisis de los procesos y las entrevistas realizadas por Uziel.
Los padres homosexuales pueden cumplir todas las funciones tradicionalmente atribuidas a la parentalidad (socialización, cuidados, entrega de una identidad, protección, afectividad, etc.) Y, como señala Uziel, en muchos sentidos una pareja homosexual que cría un hijo no se distancia demasiado de la familia nuclear tradicional. En ambos casos la pareja conyugal es la misma que la pareja parental (entendida esta última como los padres que crían al niño).3
Uziel aborda lúcidamente un tema trascendental tanto para los estudios de familia como para nuestras sociedades. El reconocimiento legal y judicial de los vínculos entre padres homosexuales y sus hijos es vital para alcanzar el reconocimiento social. Hequembourg y Farrell4 señalan que a los padres y madres de mujeres lesbianas que no han adoptado legalmente a sus hijos no biológicos les es más difícil sentirse abuelos ya que sienten que el vínculo con sus nietos es más precario. No se debe olvidar que las familias constituidas por personas homosexuales se inscriben en contextos más amplios de familia extensa (abuelos, tíos y primos), instituciones escolares, instituciones de salud, etc. La plena aceptación por parte de estos contextos es vital para el desarrollo sano y feliz de los niños adoptados por personas homosexuales.
Creo que Uziel acierta al comparar la homoparentalidad con el divorcio, un cambio ahora asimilado pero que en su momento causó mucho revuelo y sin duda es una transformación importante en las formas que puede tomar la familia. El libro Homosexualidad y adopción es un gran aporte que nos ayuda a comprender las resistencias que encuentran las nuevas formas de construir familia.
Notas
1 David SCHNEIDER, 1980.
2 Anne CADORET, 2003.
3 CADORET, 2003; y Florencia HERRERA, 2009.
4 Amy HEQUEMBOURG y Michael FARREL, 1999.
Referencias
CADORET, Anne. Padres como los demás: homosexualidad y parentesco. Barcelona: Gedisa, 2003. [ Links ]
HEQUEMBOURG, Amy; FARRELL, Michael. “Lesbian Motherhood: Negotiating Marginal-mainstream Identities.” Gender and Society, v. 13, n. 4, p. 540-557, 1999. [ Links ]
HERRERA, Florencia. “Tradition and Transgression: Lesbian Motherhood in Chile.” Sexuality Research & Social Policy: Journal of NSRC, University of California Press, v. 6, n. 2, p. 35-51, 2009. ISSN 1553-6610. [ Links ]
SCHNEIDER, David. American Kinship: A Cultural Account Second Edition. London: The University of Chicago Press, 1980. [ Links ]
WEEKS, Jeffrey; HEAPHY, Brian; CATHERINE, Donovan. Same Sex Intimacies: Families of Choice and Other Life Experiments. London: Routledge, 2001. [ Links ]
WESTON, Kath. Families We Choose: Lesbians, Gays, Kinship. New York: Columbia University Press, 1991. [ Links ]
Florencia Herrera – Universidad Diego Portales, Chile.
Intimate Citizenship: Private Decisions and Public Dialogues – PLUMMER (CSS)
PLUMMER, Ken. Intimate Citizenship: Private Decisions and Public Dialogues. Montreal & Kingston: McGill-Queens University Press, 2003. 187p. Resenha de: HORTON, Todd. Canadian Social Studies, v.41, n.1, p., 2008.
Ken Plummer, a distinguished scholar of social interaction and human sexuality, has written a fine synoptical book (p. xi) that examines the realm of intimacy and the conflicts the intimate problems to which these changes constantly give rise (p. back cover). Citing turn of the millennium issues such as solo parenting, invitro ferlization, surrogate mothers, gay and lesbian families, cloning and the prospect of designer babies, Viagra and the morning-after pill, HIV/AIDS, the global porn industry, on-line dating services and virtual sex, Plummer argues that dramatic changes in our intimate lives have increasingly bound private decisions to public dialogues in law, medicine and the media. He further asserts this requires a notion of intimate citizenship (p. 50), a sensitizing, open and suggestive concept to be used in the provisional quest of exploring the nature of social change and intimacies (p. 15).
This book is a valuable addition to the growing list of books engaged in unpacking somewhat stodgy concepts like citizenship and identity and repackaging them in new, exciting and dynamic ways. While admittedly brief, Intimate Citizenship does offer a good quality synopsis of current perspectives and expertly crafts a paradigm for analysis that is sure to stimulate conversation about where to go next. Almost certainly written for students in post-secondary education and scholars in the fields of sociology, political theory and cultural studies, the book is readerly enough to be used in secondary school, albeit in excerpt form, to initiate discussion and extend perspectives.
The book is divided into nine chapters, written as an interconnected whole that builds an argument. This is followed by reference notes and an extensive bibliography. It should be stated that at the beginning of each chapter several quotes, often as many as five or six, from authors to activists, are used to foreshadow the discussion(s) to follow. While some may find the quotes distracting and perhaps a bit bombastic, they provide an indication of the perspectives that permeate the discourses within and across the vibrant field of citizenship.
Chapter One, Intimate Troubles, is an appropriate title as Plummer lays out a series of issues and choices facing people at the dawn of the 21st century. He frames the discussion around the question how do we live and how should we live our lives in an emerging late modern world? (p. 7) and offers a conceptualization of the Intimate Citizenship Project (p. 13) that uses zones of intimacies such as self, gender, identity and spirituality to explore: the decisions people have to make over the control (or not) over ones body, feelings, relationships; access (or not) to representations, relationships, public spaces, etc.; and social grounded choices (or not) about identities, gender experiences, erotic experiences (p. 14).
Chapter Two, titled Postmodern Intimacies: New Lives in a Late Modern World, expertly examines intimate troubles in more detail while chapter three, Culture Wars and Contested Intimacies delves into the ways that change brings with it dissent. It is in chapter four that Plummer outlines the core organizing concept of the book.
Entitled The New Theories of Citizenship, Chapter Four is designed to help us navigate our way through the tangled web of conflicts that now surround our personal lives (p. 49) and to a large degree it is successful, though it must be added that brevity does occasionally work against clear sailing toward his new conceptualization. Plummer begins by offering an overview of two concepts: citizenship and identity, which he believes are really about difference and unity. Moving on to new citizenships (p. 51), he focuses on the works of T. H. Marshall, the British sociologist who outlined three clusters of citizenship rights civil, political and social to which all members of a community are entitled. While Plummer does outline many of the criticisms that have been lodged against Marshalls post-WWII work, he rushes through these to get to the main point of the section that the post-structuralist approach is the most fruitful starting point in which to develop newer ideas of citizenship, including intimate citizenship. Indeed, the reader may be left with the feeling that dwelling a little longer with the myriad of authors working in the post-Marshallian field might have made arriving at the destination a little more compelling.
Chapter Four continues by outlining the issue of boundaries and exclusions (p. 53), suggesting that in any framework of citizenship runs the risk of being critiqued as to who is inside and who is outside, who is included and who is excluded, both within and across social worlds (p. 55). A proposed solution is to further develop Ruth Listers idea of a differentiated universalism (p. 55) whereby boundaries are present but shift and sway in addition to becoming more porous. After a brief but worthwhile examination of natural rights, the state, society and inequality, as well as obligations relative to rights, and identity, Plummer pauses to pay homage to the work of authors who have extended citizenship to include feminist and sexual citizenships before adeptly using all of the discussions that have come before to outline a workable, if tentative, account of the issues critical to a new intimate citizenship (pp. 65-66). Among the issues addressed is a key theme that Plummer returns to again and again that citizenship must always be sensitive to the whole panoply of inequalities – of the problem of just citizenship in an unjust society (p. 66).
Four themes provide the details of intimate citizenship in the next four chapters. Chapter Five examines Public Intimacies, Private Citizens and the ways the public sphere is being radically redrawn in the 21st century, while Chapter Six, Dialogic Citizenship, embraces the crucial role of pluralism and conflict along with the need for dialogue across opposing positions. Chapter Seven, Stories and the Grounded Moralities of Everyday Life, is particularly rich, peppered as it is with excerpts of arguments from writers such as Alasdair MacIntyre, Martha Nussbaum, Carol Gilligan, Richard Rorty and Maria Pia Lara who support, in one form or another, Plummers belief in the importance of listening to the voices of citizens as we struggle to resolve ethical dilemmas in our daily lives. Chapter Eight, entitled Globalizing Intimate Citizenship, explores the ways many of these issues now figure on the global stage and within global fora.
The book concludes with Chapter Nines The Intimate Citizenship Project, an attempt to develop a paradigm for analysis. Having spent much of the book cataloguing issues around intimacies, Plummer does an admirable job of pulling the threads of many arguments together to present an eight-point series of concerns for an intimate citizenship (pp. 140-142) as it moves forward. These concerns are focused around questions that 21st century theorists in the area of citizenship must grapple if the field is to grow in a legally, politically and socially just manner.
The author also demonstrates the proper amount of humility when he states that his work tends to raise more questions than it answers (p. 142) and acknowledges that it can be criticized from a number of different directions including the creeping return of the meta-narrative, the need for further detail, a western bias in the conception of rights and a certain nave optimism or utopianism. Still, his closing section situates the intimate citizenship project within the ongoing effort to eliminate inequalities in the world suggesting a reasonableness and sense of proportion for the task at hand and the challenges ahead. As Plummer states: intimacies are lodged in worldwide inequalities of class, gender, age, race and the like. These inequalities structure on a daily basis the debasement and degradation, the patterns of exclusion and marginalization, the sense of powerlessness that, in one way or another, many people experience as the inevitable backdrop of ordinary intimacies. Cutting across my entire book is a persistent need to return to these issues (p. 145).
This positioning is elevated by the final section in the book, Moving On: Learning to Listen, where he entreats the reader to consider familiar words citizenship, identity, community, public sphere, morality and ethics not as tight words, defined, fixed, with established boundaries but as open, polyvocal, flexible, porous and interwoven (p. 145). This means accepting that there are no simple solutions to how to live life and embracing the permanently unsettled state (p. 145) which is our future. For those who can only envision anarchistic chaos, relativist vacuums or tribal wars emanating from his paradigmatic positioning, Plummer concludes on a note of hope, suggesting that we must listen to one anothers stories of how to make our way through the moral tangles of today (p. 145) because it is there that virtue is re/constructed, morality is debated, ethical dilemmas are re/solved and the common values that hold humanity together (p. 146) are re/discovered.
Todd Horton – Nipissing University. North Bay, Ontario.
[IF]Family Life and Sociability in Upper and Lower Canada, 1780-1870 – NOËL (CSS)
NOËL, Françoise. Family Life and Sociability in Upper and Lower Canada, 1780-1870. Montreal & Kingston: McGill-Queen’s University Press, 2003. 372p. Resenha de: HOFFMAN, George. Canadian Social Studies, v.39, n.2, p., 2005.
In Family Life and Sociability in Upper and Lower Canada, 1780-1870, Franoise Nol portrays middle class family life in the mid-nineteenth century. The book is divided into three parts. Part one is entitled The Couple and deals with courtship and marriage. The second part concerns parents and children and discusses childbirth, childhood and parent-child relationships. The last section discusses kinship ties and community life.
The book contains several generalizations related to Canadian family history in the 1800s. The author contends that most couples married for love. Companionate marriage was the norm, and the role of parents in mate selection was no longer as significant as it had been. As well, Nol shows that relations within families were affectionate. Parents showed an extraordinary concern for their children, which continued even after they married and left home. She also illustrates that much of family life took place beyond the door of the home. Families were a part of a large social network which included kin, friends and neighbours. Sociability was an essential part of family life.
Nol’s account has many strengths. The research, as indicated by the endnotes and bibliography, is impressive. The author shows a broad knowledge of her subject. She links her findings to scholarship in the United States and Britain. She is always aware of the larger picture. Parallels are drawn between families in the Canadas and what American historians of the period refer to as the rise of the Republican Family. When discussing child rearing, she refers to the Enlightenment and the influence which thinkers such as Locke and Rousseau were having on the view that children could be nurtured. Such analysis illustrates the significance of family history as a field of study. Family history is not merely human interest stories from the past. Nor is it titillating tidbits related to love, courtship and marriage. Rather, as Franoise Nol shows, it is an important part of social history which helps us to better understand the overall nature of past societies.
I would suggest that readers begin this book by studying the introduction. Here the author discusses the sources upon which her work is based. The book’s subtitle is A View from Diaries and Family Correspondence. In the introduction Nol identifies the diarists and letter writers. We are told when and where they lived and something about the circumstances of their lives. These people appear and re-appear in the pages which follow. It is important to consider who these correspondents are when assessing the conclusions Nol reaches regarding nineteenth century Canadian families.
The diaries and letters which are used do raise some concerns. The sample is not representative of all segments of society. Nol acknowledges this limitation but suggests that the sources accurately reflect the middle class, which in itself, of course, is a valuable historical contribution. However, some questions can be asked about some of the diarists and correspondents, particularly those who are used to illustrate that family values among francophones and anglophones and people of different religious backgrounds were similar.
There is a general contention in the book that the attitudes and principles which guided family life were similar regardless of religion, language and ethnicity. Several diaries and numerous letters of English Canadians are referred to but so are those of French Canadians like Amde Papineau and Ludger and Reine Duvernay. Considerable emphasis is also placed on the journal of Abraham Joseph, a merchant and member of a well-known Jewish family in Lower Canada. The conclusion that follows is that class, not other factors, was most influential in shaping family life in the Canadas during the nineteenth century. Nol does not ignore religious and cultural differences but in the end suggests that religion was not the deciding influence. Family life of Protestants, Catholics and Jews was similar.
But can Amde Papineau and his extended family be used to prove such a point? Papineau was the son of patriote leader Louis Joseph Papineau. After the Rebellion of 1837 he lived in exile with his family in the United States. There he met and eventually married Mary Westcott, the daughter of a merchant from Saratoga, New York. Amde kept a diary rich in detail about his life before and after his marriage. After moving to Montreal following her marriage, Mary exchanged letters with her father in New York for the rest of her life. Nol uses both the diary and letters extensively throughout the book.
Amde was Catholic, and Mary was Protestant. In 1846 they were married in Saratoga by a Presbyterian minister in a fifteen minute ceremony in the Westcott home. After their move to Montreal, Mary usually attended her own church but sometimes accompanied her husband to a Catholic mass at Notre-Dame. And occasionally Amde went with his wife to a Protestant service. A daughter was baptized in the Presbyterian church and a son in the Catholic church. Clearly this was an unusually liberal attitude toward religion and inter-faith marriage. Or perhaps it was evidence of religious indifference. This unconventional family has an important place in Nol’s portrait of family life. One can well ask if Amde Papineau and Mary Westcott can be used to illustrate French Canadian Catholic families, particularly in light of the conservative forces which were growing in the Quebec church after 1850.
Despite this reservation Family Life and Sociability is a major contribution to nineteenth century Canadian social history. It will not be easily read by high school students or by students in introductory university courses. However, teachers and professors certainly can use it to introduce their students to family history as a branch of historical studies. The fascinating information which the book contains about love, birth, life and death is and always will be of interest to everyone.
George Hoffman – History Department. University of Regina. Regina, Saskatchewan.
[IF]Bastardos do Império: Família e sociedade em Mato Grosso no século XIX | Maria Adenir Peraro
A publicação de “Bastardos do Império: Família e sociedade em Mato Grosso no século XIX”, de Maria Adenir Peraro, é motivo de honra e orgulho múltiplos, quer por parte do Programa de Pós-Graduação em História, da UFPr, de cujos bancos escolares a obra é resultado de tese de Doutorado, quer para o Programa de Pós-Graduação em História, da UFMT, do qual a pesquisadora é integrante. Não bastasse isto, a obra expressa uma política editorial corajosa e encorajadora no sentido de abrigar publicações ditas “regionais”, conotação esta que tem dificultado a inserção acadêmica de temas e objetos relevantes e pertinentes e que extrapolam o caráter “local”. Particularmente, os centros de pesquisa cujo foco reside nas questões de fronteira, populações, territórios e identidades, foram os grandes beneficiados, pois a obra vem chancelar, não apenas um grandioso esforço na preservação de fontes paroquiais, mas, sobretudo, um importante patrocínio institucional à pesquisa da história da família. Neste sentido, imprescindível reconhecer o apoio da Cúria Metropolitana de Cuiabá, que facilitou o acesso ao seu acervo documental. Leia Mais
Rum and Axes: The Rise of a Connecticut Merchant Family, 1795-1850 – SISKIND (CSS)
SISKIND, Janet. Rum and Axes: The Rise of a Connecticut Merchant Family, 1795-1850. Ithaca, NY: Cornell University Press, 2002. 191p. Resenha de: GILLIS, Michael J.. Canadian Social Studies, v.38, n.2, p., 2004.
Siskind’s Rum and Axes is an examination of the rise of industrial capitalism in Connecticut after the American Revolution. The author uses the Watkinson-Collins family as her vehicle to reveal the social tensions and economic motivations that permeated the rise of capitalism during this era. Relying on three generations of primary materials Siskind recreates and explains the changing world of the Watkinsons. As members of a religious ‘dissenting society’ while living in East Anglia England, the Watkinsons subscribed to the practice of maintaining social distinctions based on class. However, as middle class dissenters the family found itself being squeezed between an aristocratic land owning class above them and a tradesman and shop-owning class below them. As religious and economic conflicts continued to grow in England, they sought safe harbor for themselves and their capital in America.
In America the families discovered that labour was too expensive to go into farming or wool production so they entered the West Indies import business, focusing mostly on rum and dry goods. As importers and merchants they were able to become a member of New England’s elite without severing their personal relationships with their workers. Eventually, however, the Watkinsons and Collins moved beyond the simple importation of goods when they established their own axe factory and by doing so they firmly established themselves as part of New England’s emerging industrial capitalist class.
Siskind does a good job of examining the inner workings of the Collins Axe Company and its labour force. Initially the company sought to employ skilled workers by providing long-term contracts, company housing and schools. With the introduction of new machinery, however, there was a gradual transition in the factory from skilled to unskilled labour. As skilled Yankee artisans were replaced by Irish labourers so too did the Watkinsons and Collins move from being paternalistic employers to distant supervisors with little interest in their employee’s welfare. Remarkably, when it became apparent that many of their axe company employees were dying from lung diseases brought on by the airborne particles created in the axe grinding process, the owners simply wrote it off as the price of doing business. Here we can see how removed from their employees the company owners had become. The transition from Christian ‘dissenters’ on the run to crass company owners who see the deaths of their employees as the price of progress makes for interesting reading. Siskind explores this transition by examining the family’s letters, their religious ideology, and emerging capitalist society in New England.
This book ably examines the early rise of capitalism in New England as well as exploring numerous familial and business relationships associated with it. The author’s close reading and interpretation of Samuel Watkinson Collins’ memoir is also valuable. Here she traces how quickly the relationship between worker and company owner had changed and how the ideology of the capitalist class was changing as well.
Rum and Axes is suitable for use in high schools with the understanding that this is more than just a simple straightforward colonial history. Siskind, an anthropologist, places strong emphasis on the means of production and how its attendant labour systems create culture. For younger students, this approach will perhaps be difficult to understand and for teachers difficult to demonstrate. However, there is plenty here to create lively classroom discussions. In addition, the author’s extensive use of primary materials offers the readers an intimate look at a remarkable yet troubled family in post-revolution America.
Michael J. Gillis – Department of History. California State University, Chico
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Amor y opresión en los Andes coloniales – LAVALLE (VH)
LAVALLE, Bernard. Amor y opresión en los Andes coloniales. Lima: IEP/IFEA/UPRP, 1999 (Estudios Históricos, 26). Resenha de: CAMPOLINA, Cristina. Varia História, Belo Horizonte, v.17, n.24, p. 278-281, jan., 2001.
Aqueles que têm os interesses voltados para o estudo da história dos Andes por seguro já conhecem a obra de Bernard Lavalle e a grande sensibilidade do autor em relação aos sinais do passado colonial andino. Neste livro, o autor nos apresenta doze textos elaborados durante as duas últimas décadas, tendo alguns já sido publicados em revistas especializadas.
Embora o autor não seja pioneiro no tema, a leitura desse livro nos leva ao lugar das possibilidades de liberdade e reivindicações das classes oprimidas no interior de um sistema de repressão. A criatividade na busca das fontes e a perspicácia na leitura dos documentos tornam seus textos essenciais para aqueles que procuram outras vias para a construção do passado histórico. No caso, a sociedade andina comporta uma outra história àquela marcada apenas pela exploração de uns pelos outros, pela profunda desigualdade social e marginalização de alguns grupos sociais. Através de uma postura não preconceituosa e livre dos entraves da história tradicional e parcial, Lavalle desvenda realidades ocultas enfocando micro acontecimentos para enfeixá-los como expressão do coletivo e daí entender a globalidade do sistema. Respaldado por vasta documentação, o ponto para o qual todos os textos convergem será a peculiaridade do diálogo entre dominadores e dominados. Pelo exposto, o surpreendente resultado dessa coletânea é uma fascinante revisão da complexidade social e política andina.
A obra está composta por três eixos principais: “Casal e Família Como Reveladores Sociais”; “O Longo Caminhar da Resistência Negra”; “Falhas e Fendas do Sistema Colonial”.
Na primeira parte, o autor se alimenta de uma fonte vital, o Arquivo Arcebispal de Lima (herdeiro do antigo Tribunal Eclesiástico), nas seções relativas às causas criminais de matrimônio, aos litígios matrimoniais, aos divórcios e anulações de matrimônio. Lavalle identifica o lugar ocupado pela família e suas relações mais íntimas sob o olhar controlador e regulador da Igreja, então sob a mira de uma sociedade eminentemente machista. Grande parte das fontes primárias utilizadas pelo autor são os testemunhos sobre as desavenças conjugais. O fenômeno mais comum no contexto dos divórcios e anulações de casamento foi a violência doméstica e familiar. As razões que levaram à abertura dos processos multiplicam-se desde as incompatibilidades pessoais, étnicas, financeiras, às questões sexuais. Por razões óbvias, o discurso do corpo relacionado com a líbido e desempenho no intercurso sexual se manifestam de maneira alusiva ou metafórica em consonância com a codificação social da época. A Igreja não considerava esta uma causa para o divórcio. No outro extremo, os expedientes que denunciavam trangressões sexuais às normas vigentes, como o homossexualismo e a sodomia, eram encaminhados aos Tribunais da Inquisição.
Segundo o autor, essa documentação é insuficiente para julgar as normas de conduta matrimonial limenha dadas as distorções as quais se pode conduzir o manejo unilateral de ações judiciais. No entanto, ela fornece os subsídios para investigar os comportamentos abusivos e a subsequente atitude das vítimas, em geral mulheres e índios, frente aos mesmos. Assim, ainda que as relações estáveis e duradouras não possam ser checadas, os documentos analisados revelam uma parte significativa do panorama mental e social da época e a relação de força onde amor e rendimento pareciam normais e parte da potestade marital.
Na segunda parte do livro, Lavalle utiliza os Atos do Cabildo de Trujillo na série Causas Criminales, localizado no Archivo Regional de la Libertad e no Archivo Nacional del Ecuador. Essa parte está dividida em 4 capítulos que tratam da resistência negra no contexto da violência, abuso e marginalização do escravo, o qual respondia com fugas e outros comportamentos que serão julgados pelas autoridades como mera criminalidade. Ser “cimarrón” nos Vales de Trujillo, no século XVII, foi a forma mais difundida e espontânea da contestação negra sem resultar na ruptura com o mundo dominante. O autor decreve as diferentes formas de “cimarronage”, revelando seus esconderijos, tipos de assalto e bandoleirismo, tamanho dos grupos (em geral pequenos) e o isolamento dos fugitivos, que muitas vezes os levaram ao suicídio, expediente drástico para interromper com a misérias da escravidão e as angústias de um castigo anunciado quando capturados. As manifestações de violência negra eram dirigidas contra os amos e, de uma forma geral, contra a população branca. No entanto, havia a possibilidade para o negro, autor de um delito grave, acolher-se ao sagrado, isto é, refugiar-se em uma Igreja onde a Justiça jamais o capturava. Sabia-se muito bem que o promotor fiscal do bispado defendia com zêlo e eficiência as fronteiras dos foros eclesiásticos. Ao lado disso, os proprietários de escravos civilmente responsáveis pelos seus negros tinham justos interesses na proteção oferecida pela Igreja. A eles eram cobradas multas pelas faltas de seus escravos, além de serem acusados de negligência e correção dos negros. Daí a tentação de encobrir os culpados. Conhecedores da convergência de interesses, os negros infratores, escravos ou livres, serão, em última análise, beneficiados.
No século XVII, os palenques ofereceram uma alternativa frágil, mas clara ao mundo escravista. Esses palenques evoluíram até a formação de quadrilhas de salteadores de caminhos e estradas. Nos finais do século XVIII, o bandoleirismo “cimarrón” contribuiu para questionar em outros termos a ordem e as relações de forças escravistas. Houve um aumento acentuado da demanda de escravos para o cumprimento da lei pela manumissão, paródia da liberdade pois o escravo nem sempre saía ganhando.
Todos esses dados são amostras do que estava ocorrendo no Peru como em todo o Império. O questionamento da escravidão adotou formas que, assomadas a uma série de movimentos índigenas e de mestiços contra a nova política fiscal, só faziam aumentar as angústias dos dominadores. As explosões de ressentimento e as exigências então expressadas nas mais diferentes formas sinalizavam para o desmoronamento geral da estrutura de autoridade na qual o mundo escravista descansava. Enquanto os senhores qualificavam os negros de insolentes, esses, paralelamente a uma atitude agressiva, recorriam com grande freqüência à Justiça.
A partir da última década do século XVIII, os expedientes estudados contém frases e expressões muito mais duras contra os amos e seus excessos. O notável é que, por essa época, os pleiteantes insistiam sobre o fato de que ser escravo ou escrava não invalidava o fato de continuarem a ser seres humanos. Como conclusão, diríamos que: as Luzes cunhadas no século XVIII abriram um espaço para a afirmação da igualdade fundamental; que o sistema jurídico espanhol abria um espaço para combater os excessos cometidos contra os escravos; que os negros demonstravam a pertinaz vontade de sacudir o jugo que lhes foi imposto; e que entre certos elementos das classes dominantes soavam discrepantes vozes abolicionistas. Embora não se possa inferir daí que os donos de escravos estivessem abrindo mão de seus interesses, o tempo já conspirava em sentido contrário.
A terceira e última parte do livro, “Falhas e Fendas do Sistema Colonial” , está organizada em 4 capítulos que tratam das táticas da violência indígena, das demandas dos naturais e da doutrinação dos índios. Esta última tarefa que, por definição, deveria ser norteada apenas pelo espírito religioso, foi, também, motivada pelas grandes vantagens econômicas que proporcinava aos padres. Isso não significa que a catequese não tenha sido feita por homens de fé, mas aponta para outros aspectos que esvaziam a catequese de um purismo religioso. Inteirados dos abusos dos padres, recorrentes em todo o período colonial, os administradores espanhóis tomaram sérias providências moralizantes que esbarraram com fortes reações das ordens religiosas contra a ingerência do Estado na missão da fé. As Cédulas Reais que tentaram corrigir essa deformação de parte do clero foram pouco eficazes e, em que pese a atuação de padres bem intencionados, muitos deles não se diferenciaram dos “encomenderos”, corregedores, “hacendados” ou mineiros.
As evidências mostram que o século XVII pode ser considerado um século de paz em comparação com as reações de violência indígena que pontilharam o século XVIII. A resistência podia se manifestar desde atos de extrema violência ao mais intenso silêncio, no marco de uma sutil tática de auto-exculpação bem organizada desde há muito tempo, frente a um adversário, o poder colonial, todo poderoso, mas conhecido, e perante o qual os índios sabiam como manobrar.
Em pesquisa realizada no Arquivo Departamentel de Trujillo e no de Cajamarca, na seção intitulada “Protector de Naturales”, o autor analisa o conjunto de demandas e pleitos indígenas que indicam a capacidade dos índios de recorrer ao direito que o sistema colonial espanhol havia organizado e que com o tempo transformou-se em válvula de escape para a população oprimida. Se a eficácia do “Protector” foi comprometida pela pressão do poder colonial, essa mesma eficácia toma lugar através da honra de muitos funcionários encarregados do manejo das leis e também da tomada de consciência daqueles que do fundo de sua miséria seriam beneficiados.
Sendo as mulheres, os índios e os negros parte da grande massa dos silenciados da História, a pesquisa aponta para a validade dos espaços de questionamento que as próprias forças de coesão social, no caso a Igreja e o Estado Espanhol, davam a esses indivíduos que, por outro lado, enquadravam e pressionavam. Finalmente, o livro de Lavalle pode ser sintetizado como um exemplar estudo da “história vivida dos homens”.
Cristina Campolina – Departamento de História – FAFICH-UFMG.
[DR]
The Infinite Bonds of Family Domesticity in Canada, 1850-1940 – COMACCHIO (CSS)
COMACCHIO, Cynthia R. The Infinite Bonds of Family Domesticity in Canada, 1850-1940. Toronto: University of Toronto Press, 1999. 180p. Resenha de: SPEER, Lynn. Canadian Social Studies, v.35, n.3, 2001.
As another book in the Themes in Canadian Social History series, this volume explores the history of Canadian families during a time period which saw an industrial revolution, World War I, and the Great Depression. Comacchio uses these larger historical events to trace and explain continuity and change in the lives of Canadian families, arguing that these events were punctuation points (p. 149) that effected the ways in which families constructed and reconstructed themselves. However, the author acknowledges that the historical path of family life cannot be examined in a linear fashion because there has never been one ‘kind’ of family. She claims that while family is universal in that all cultures have constructs known as ‘family’, families are also unique in that they emerge out of a mix of factors, including: …class, gender, region, race, ethnicity, religion and age…(p. 5). Hence, in tracing continuity and change in families, the author takes into consideration all of the kinds of families found within Canadian society, including: working and middle class families, French Canadian families, Aboriginal families, Anglo-Celtic families, African Canadian families, long-settled families and recently immigrated families.
Though Comacchio has made a solid effort to affirm the complexity of domestic life, she was unable to resist imposing a type of unity on her work. In formulating a focus for the book, she claims that: … if there is one thread that winds unbroken through this era of rapid and intensive change, it is a widespread public perception that ‘the family’ was in a state of crisis (p. 4). With this focus, the author is able to demonstrate how the notion ‘families in crisis’ helped to shape Canadian social policy, proving her claim that families both effect and are effected by society. However, because this idea actually emerged out of the middle class, the ‘families in crisis’ thesis creates difficulties for Comacchio. This social group constructed and promoted the notion of the ‘ideal’ family and then perceived that families were in crisis because of the dissonance between real families and the idealized family, a dissonance which became most extreme when real families were impacted by events like economic change and warfare. Comacchio indicates that she will trace continuity and change among all kinds of Canadian families, as well as tracing the impact of the perceptions of the middle classes on families belonging to other social groups. Hence, in attempting to create a unified focus or thesis, the author compounds her already complicated task.
While this type of complex examination is laudable, the length, depth, and breadth of this book is limited by restrictions placed upon it because it is designed to provide an overview of a particular theme in Canadian social history for undergraduate and graduate students. In creating this overview, the author did not engage in original research, but rather created a synthesis of the scholarly studies investigating the history of Canadian families undertaken over the last two decades. The main purpose in compiling this book, as stated on the back cover, was to …pull together a large body of research and lay out the main themes and interpretations…, rather than to explore complexities. It is from the imposition of this main purpose that the main criticisms arise.
The attempt to create a synopsis of important themes, while trying to acknowledge the complexity of the lives of families, leaves the reader with a sense of frustration. This arises from the lack of in-depth discussion of important and enticing information. For example, the discussion of the impact of industrialization on Canadian families is disjointed. Over the space of only a few pages, such topics as housing, income levels, poverty, racism, widows, orphans, health, disease, and old age are given coverage, with only a paragraph or part of a paragraph devoted to each (pp. 28- 30) . This lack of depth is an irritation.
Added to this, is that fact that the reader is rarely taken ‘inside’ the lives of Canadian families. While there are occasions where the author includes a direct quote from a family member, allowing some insight into how a family viewed the world, the book generally examines domestic life from an ‘outside’ viewpoint. We receive a variety of statistics, for example, describing aspects of the changing role of women: in 1860, one in five middle-class housewives had regular paid help, while in 1921 only one in twenty housewives had this kind of help (p. 81). However, we do not hear the voices of women themselves discussing their personal views about housework, children, or husbands. In taking the ‘observer’ point of view, the book is able to point out major themes, but it lacks intimate, personal insights which seem especially important in understanding the histories of families.
Finally, there are no citations indicating the specific sources from which statistical information or direct quotations were extracted. This is not only irritating, but is poor scholarship as well. Without appropriate citations the reader is unable to identify the particular historical study the author consulted when creating statements of fact and arguments. While there is a reference section listing the titles of the sources used for each chapter, the lack of citations makes this book a bad example for use with undergraduate and graduate students, who should be learning to indicate the sources from which information and evidence is derived.
The main criticisms arise from what appears to be the format required of books that are part of the Themes in Canadian Social History series. The author is attempting to accomplish an extremely complex task, but seems to be required to do this using an undocumented, overview approach. This being said, Comacchio must be given credit for attempting to tell an inclusive, multilayered story about Canadian families who lived between 1850 and 1940. While the book does not have practical value for classroom teachers, it is accessible to both secondary and post-secondary readers providing insight into topics and issues that could spark an interest to further explore the historical lives of Canadian families.
Lynn Speer Lemisko – Nipissing University. North Bay, Ontario.
[IF]História da Vida Privada no Brasil: Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa – SOUZA (VH)
MELLO e SOUZA, Laura de Mello e (Org.). História da Vida Privada no Brasil: Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997 (História da Vida Privada no Brasil, 1). Resenha de: RODRIGUES, André Figueiredo. Varia História, Belo Horizonte, v.16, n.22, p. 211-214, jan., 2000.
” … verdadeiramente que nesta terra andam as coisas trocadas. porque toda ela não é república, sendo-o cada casa”. Esta é uma frase da epígrafe do primeiro capítulo da publicação História da Vida Privada no Brasil: Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa, livro organizado por Laura de Mello e Souza, primeiro volume da coleção História da Vida Privada no Brasil, dirigida por Fernando Novais. A frase, extraída da obra História do Brasil (1500- 1627), escrita por nosso primeiro historiador, frei Vicente do Salvador, anuncia o primeiro problema encarado pelos autores do livro e que constitui motivo central da reflexão de Fernando Novais: o desenvolvimento do espaço privado sem que a vida privada estivesse totalmente consolidada. Os níveis de público e privado estão enredados. A noção de privado está associada à formação da nacionalidade, como nos alerta Novais. Assim, a rigor, não existiria uma “vida privada” durante o período colonial, mas só a partir do século XIX, momento da formação de um Estado Nacional.
Guiando-se pelos passos de Philippe Ariês e Georges Duby, que coordenaram a edição de uma História da Vida Privada para a Europa ocidental [Histoire de la Vie Privée. Paris: Seuil, 1985], os historiadores que escreveram a versão brasileira alargaram o conceito de vida privada, considerando as especificidades da América portuguesa e particularizando-o ao abordarem cada um dos temas tratados.
A forma de trabalho adotada para a elaboração de nossa história da vida privada inspirou-se na Nova História e, de resto, nos Annales. Desde 1929, com a criação da revista francesa Anais de História Econômica e Social por Marc Bloch e Lucien Febvre, as observações sobre o cotidiano de um determinado momento, de uma localidade ou de uma personagem, assim como as suas crenças, as suas atividades e valores sociais, políticos e econômicos são retratados, além de serem auxiliados pelo intercâmbio com as outras ciências humanas, como a antropologia e a sociologia. Optou-se por uma história narrativa como forma de expressão do pensamento, da linguagem, dos hábitos, de gestos, de amores e das sensibilidades. A obra em questão procurou combinar e articular diversas propostas temáticas da história da cultura, do cotidiano e das representações sociais, advindas de uma historiografia não só francesa, mas inglesa e italiana. É preciso ressaltar, ademais, que o livro é tributário de dois marcos nas ciências humanas no Brasil: Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre. Por fim, o livro prossegue o esforço inaugurado pelo pioneiro Vida Privada e Quotidiano no Brasil na Época de d. Maria I e de d. João VI, de Maria Beatriz Nizza da Silva, obra que já havia retratado aspectos dessa temática entre nós historiadores.
A influência antropológica e sociológica de Gilberto Freyre, um dos pioneiros nos estudos sobre a sexualidade e a religiosidade do “brasileiro”, é observada nos capítulos da obra. Freyre mostrou que a sexualidade poderia ser apreendida em manifestações cotidianas e, por outro lado, que o cotidiano da América portuguesa impunha a preocupação acentuada com as questões sexuais: na vastíssima colônia, portugueses, ameríndios e, depois, também os negros, mergulharam de corpo e alma em deleites sexuais; além disso, atribuíram aos santos um papel intermediário entre os amores, ou conceberam-nos como entidade propiciadora de fertilidade e vantagens amorosas1 . Na medida em que eram atribuídos papéis aos santos, estes eram envolvidos numa forte carga afetiva. O amaciamento entre senhores e escravos levou a miscigenação e a relações de intimidade entre ambos; aspectos levantados por Freyre, também, destaques nesses capítulos. Todos esses assuntos desenvolvidos na obra já haviam sido tratados em Casa Grande & Senzala e Sobrados e Mucambos, obras freyrianas, fundadoras dos estudos sobre a vida privada no Brasil.
A obra História da Vida Privada no Brasil procura compor a pré-história de nossa vida privada. Articulada em 8 capítulos interligados entre si, apresentando como eixo temático questões como a escravidão (que medeia todos os capítulos), privacidade e relações familiares. Em seu capítulo inicial, “Condições de privacidade na colônia”, o historiador Fernando Novais desenvolve questões teóricas sobre as condições para a existência de vida privada na América portuguesa. No capítulo 2º: “Formas provisórias de existência: a vida cotidiana nos caminhos, nas fronteiras e nas fortificações”, a historiadora Laura de Mello e Souza estuda as expedições de bandeirantes e viandantes que adentraram no território, defrontando-se com mosquitos, animais de diversos portes, a falta de comodidade e desconforto das pousadas e as andanças realizados no outro lado da fronteira- o sertão, em detrimento da vida do litoral.
A partir do capítulo escrito por Leila Mezan Algranti (“Família e vida doméstica”), seguindo-se os de Luiz Mott (“Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu”), Ronaldo Vainfas (“Moralidades brasílicas: deleites sexuais e linguagem erótica na sociedade escravista”) e Mary del Priore (“Ritos da vida privada”), a questão da privacidade colonial começa a ganhar contornos mais claros, em assuntos como a sexualidade, a família e a religiosidade.
Através dos capítulos de Lei la Algranti e Ronaldo Vainfas, percebemos que as relações de privacidade estavam longe de serem desvendadas, devido à escassez de fontes. Essa ausência talvez se explique pela falta de cadernos, cartas ou diários dedicados ao relato das intimidades. Como bem observa Algranti, a ausência desse tipo de exposição deve-se à própria estrutura da sociedade colonial: a intimidade era mantida na esfera do privado, não se escrevendo sobre recordações e intimidades. O alto índice de analfabetos é um outro dado a ser destacado. As famílias convivem em casas sem um mínimo de privacidade, onde os cômodos têm múltiplos usos, onde os móveis- aí enquadram-se as camas – são montados e desmontados de acordo com as necessidades do dia. Havia, além disso, pouca distinção entre o público e o privado, ocorrendo, muitas vezes, a inversão entre esses dois espaços: o que é público torna-se privado e vice-versa. Vainfas esclarece: um espaço por assim dizer, público, como era o mato ou a beira do rio, podia ser mais apto à privacidade exigida por intimidades secretas do que as próprias casas de parede-meia ou cheias de frestas” (p. 257).
No nosso entender, entre os 8 capítulos que compõe o livro, 2 sobressaem-se aos demais. O primeiro deles, o do antropólogo Luiz Mott, sobre a religiosidade e, o segundo, o da historiadora Mary del Priore sobre os ritos da vida privada. As práticas supersticiosas constantes na sociedade colonial mesclavam-se às vivências da religião oficial do império português – o catolicismo. O isolamento geográfico possibilitou aos habitantes do interior da América portuguesa o aparecimento de práticas religiosas privadas como o eremitismo, chegando-se a encontros sabáticos. Através do diário (borrador) do senhor de engenho falido Antônio Gomes Ferrão Castelo Branco, uma peça documental inédita pertencente à coleção particular do bibliófilo José Mindlin, Mary dei Priore perfaz os caminhos desse senhor, demonstrando que a relação entre o público e o privado estava, mais do que nunca, interligadas. Demonstra, ainda, que a privacidade misturava-se com o cotidiano na vivência de certos ritos como o casamento, a morte e o nascimento.
O sétimo capítulo (“O que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura”) foi escrito pelo historiador Luiz Carlos Villalta e trata das práticas de leitura, da educação e da língua na América portuguesa. No último capítulo (“A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final do século XVIII “), o historiador lstván Jancsó analisa as revoltas ocorridas no final do setecentos. Em ambos ensaios, nota-se o aparecimento do intelectual do século XVIII: o libertino de idéias afrancesadas, influenciado pelo pensamento iluminista. Ambos os autores observam uma questão: aonde começa e aonde termina a vida privada? Através das sílabas F de fé, L de lei e R de rei , Villalta conclui que a identidade privada e a pública confundem-se. Estudando as bibliotecas e o teor de algumas obras nelas existentes, dá gancho para o capítulo seguinte, o de lstván. Este, através da análise dos movimentos sediciosos ocorridos em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e na Bahia, investiga as categorias de privacidade entre os que se envolveram nas práticas conspiratórias ocorridas no final do setecentos.
Enfim, acho que a amostra é suficiente para os que não conhecem o livro. Os leitores não se arrependerão de travar com ele uma discussão fecunda sobre a nossa pré-história da vida privada.
Nota
1 Laura de Mello e Souza. Sexualidade e religiosidade popular no Brasil colonial. In: Suzel Ana Reily & Sheila M. Doula (orgs.). Do Folclore à Cultura Popular. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, p. 87.
André Figueiredo Rodrigues – Mestrando em História/ USP.
[DR]