Posts com a Tag ‘Faces de Clio (FCd)’
História Pública: as faces de Clio no cotidiano da sociedade | Faces de Clio | 2022
Luís Inácio Lula da Silva | Imagem: DW
Ser pesquisador/a no Brasil nunca foi uma tarefa fácil. O país, que tradicionalmente sempre formou seus doutores no exterior, somente promoveu a alfabetização ampla e gratuita na segunda metade do século XX, sendo que as camadas de menor poder aquisitivo só tiveram real acesso às Universidades Federais há pouco mais de dez anos por meio, principalmente, da implementação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como forma de ingresso a esses espaços até então reservados às elites. Segundo dados disponibilizados pela Casa Civil (2014, online), em 2004, “20% mais ricos representavam 55% dos universitários da rede pública e 68,9% da particular”. Esse dado impressionante só é sobreposto por outro ainda também exposto no texto: “acesso de estudantes pobres à universidade pública cresce 400% entre 2004 e 2013”.
As razões deste feito brasileiro estão intimamente associadas ao cenário político que, naquele momento, tinha como chefe da república um operário: Luís Inácio Lula da Silva. Ou somente, Lula. Integrante do Partido dos Trabalhadores, durante sua gestão (2003-2011) a maior parte da população brasileira teve acesso não só a bens de consumo, devido à valorização do real e tantas outras políticas econômicas, como também pode viver dignamente com acesso a saúde e educação de qualidade. Durante seu governo, conforme dados do Instituo Lula (2019, online), foram criadas 18 universidades federais e 173 campus universitários, sendo que de 2003 a 2014 o número de discentes passou de 505 mil para 932 mil. Leia Mais
Povos originários: histórias, culturas e resistências/Faces de Clio/2022
Ao olhar para a realidade latino-americana do tempo presente, pode-se perceber algumas urgências que emanam de processos de violência que se edificaram através da relação entre poder e colonialidade, que ecoaram durante as últimas décadas e se intensificaram na atualidade. Analisar questões que tocam diretamente ou indiretamente em assuntos relacionados aos povos originários nos espaços da academia requer uma série de considerações, principalmente porque a escrita como conhecemos através da cultura ocidental foi utilizada para construção de um imaginário que contribuiu significativamente para a desumanização, marginalização e violência contra esses povos durante a construção do Estado nação no Brasil. A historiografia a partir da década de 1970, especificamente através da Nova História Indígena, contribui significativamente para que outro olhar na produção da história em relação aos povos originários fosse possível. Leia Mais
Diplomacia Patrimonial: o patrimônio como mediador das relações internacionais | Faces de Clio | 2021
A Revista Faces de Clio, periódico discente vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), publica a sua 14ª edição com o dossiê temático “Diplomacia Patrimonial: o patrimônio cultural como mediador das relações internacionais”. O presente número reúne quinze trabalhos e uma entrevista: seis artigos vinculados ao dossiê, sete artigos livres e duas resenhas. A presente publicação possui diversos trabalhos pertencentes ao eixo Patrimônio e Relações Internacionais e que dialogam a partir da vinculação do patrimônio cultural, memória, poder e diplomacia.
Agradecemos a toda equipe da revista Faces de Clio que se compromete a cada edição para entregar o melhor produto para os leitores e autores que confiam suas pesquisas ao nosso periódico. Mesmo neste momento difícil de cortes de recursos na educação e na ciência, seguimos resistindo e publicamos esta edição, o quarto dossiê durante a pandemia do COVID-19. Estendemos nosso agradecimento aos pareceristas que nos auxiliam na avaliação dos artigos para publicação. Leia Mais
Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades | Faces de Clio | 2021
É com enorme satisfação que apresentamos a edição número treze da Revista Faces de Clio com o dossiê “Arte e Política: raça, gênero e nacionalidades”, contando com 12 artigos ligados à temática do dossiê e 5 artigos livres. Temos a proposta, nesta edição, de apresentar discussões que contribuam nas pesquisas e reflexões acerca da complexa e estreita relação da arte com a política. Novamente apresentamos pesquisas que se detém sobre os mais diferentes suportes, desde o videogame, a ópera e a literatura, passando pela performance, pela dança, arquitetura e pintura. No presente dossiê reunimos artigos ligados à temática da raça, do gênero e das nacionalidades, pensados todos, claro, através e, a partir, da arte!
Este é o terceiro volume da Revista Faces de Clio publicado durante a pandemia do coronavírus e gostaríamos de agradecer à equipe da Faces de Clio por todo empenho em continuar com as atividades da revista diante de um cenário desolador da pandemia e do desmonte da pesquisa e da ciência no Brasil. É na resistência que encontramos formas de continuar sobrevivendo e lutando por um país mais justo e igualitário. Agradecemos também aos pareceristas que contribuíram com a revista e nos ajudaram a manter a qualidade de nossa publicação. Leia Mais
Arte e política: Estado e nacionalismo / Faces de Clio / 2020
A Revista Faces de Clio, periódico discente ligado ao programa de pós graduação em história da Universidade Federal de Juiz de Fora, tem o prazer de apresentar a sua mais nova edição “Arte e política: Estado e nacionalismo”. Essa edição foi toda construída, desde a escolha do tema, o recebimento de artigos, avaliação dos textos até a diagramação dos arquivos, durante a pandemia do Coronavírus e a crise sanitária, política e social que estamos vivendo. Por esse motivo, reconhecemos e agradecemos o esforço de toda a nossa equipe e dos pareceristas que colaboraram para manter a qualidade da revista. Diante do complicado momento que enfrentamos, a Faces de Clio reforça o seu compromisso com a ciência e com a defesa da Universidade pública, ressaltando a importância de combatermos o negacionismo, o autoritarismo e as falsas notícias.
O presente dossiê apresenta vinte artigos que versam sobre o tema das relações e disputas entre a arte e política, com a temática mais ligada à utilização da arte pelo Estado e como instrumento de construção de nacionalismos. Partindo dos mais diferentes suportes artísticos, da música à história em quadrinhos, dos mais diversos espaços geográficos e períodos históricos, os textos apresentam grande contribuição historiográfica e cultural.
Abrimos a edição com o artigo do Álvaro Saluan da Cunha que busca apresentar alguns aspectos observados na coleção de gravuras e textos intitulada “Quadros historicos da guerra do Paraguay” e nas imagens e notícias da Guerra que circularam em periódicos como a Semana Illustrada e A Vida Fluminense, que foram úteis, não só para informar o povo da Corte, mas também para a consolidação da memória e do imaginário popular sobre o conflito.
Em seguida, ainda no campo da história militar, o artigo da Bárbara Tikami examina a relação entre a Marinha Brasileira e um determinado conjunto de quadros pintado por Eduardo de Martino, um oficial da Marinha Italiana que renunciou a sua carreira castrense para se dedicar a atividade artística após chegar a América do Sul.
Carlos Cesar de Lima Veras, em seu artigo, “Deus e o Diabo em Bacurau” tem por objetivo realizar uma análise acerca dos usos da história em duas produções cinematográficas brasileiras: Deus e o Diabo na Terra do Sol, filme de 1964 dirigido por Glauber Rocha, e Bacurau, filme de 2019 dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles.
Continuando com a leitura, Carlos Conte Neto realiza um relato da recepção de Uivo e de outros textos beats na sociedade norte-americana dos anos 50 e 60, em seguida, aponta indícios de como essa literatura reverberou em Portugal durante a ditadura do Estado Novo, onde também provocou reações adversas, mas inspirou poetas. O artigo tem o objetivo de evidenciar aproximações entre a poesia ginsberguiana e os textos de alguns poetas portugueses da segunda metade do século XX.
Deivid Fernando Franco, em seu artigo “Do desencanto a desilusão: Rock e política nos anos 80” discorre sobre a relação entre rock e política, por meio da análise de letras de músicas e de entrevistas cedidas por artistas às mídias da década de 80. Buscou-se perceber se existem posicionamentos políticos nesses discursos e como se deram as relações entre política e rock nos quadros da redemocratização brasileira.
Em “Tancredo em Charges: A representação do humor gráfico na redemocratização (1985)”, Fábio Donato analisa charges publicadas em um conjunto de periódicos durante o período de transição da ditadura civil-militar no Brasil, selecionando periódicos da chamada grande imprensa.
A pesquisadora Fernanda Arouca, se propõe a analisar os trabalhos dos caricaturistas Calixto e Storni, integrantes da revista O Malho, que tiveram como tema a Grande Guerra, e a identificar o discurso sobre o conflito veiculado em um contexto no qual a propaganda e a censura da imprensa foram determinantes para o desdobramento do conflito.
Continuando a leitura, o autor Fernando Cardoso, pretende articular a memória visual e a política cultural imbricadas no painel figurativo “Capela dos fundadores” do artista curitibano Sérgio Ferro, com o que Fraçois Hartog denomina de os sintomas presentistas: memória e patrimônio.
Em seguida, Indaiá Demarchi Klein, busca compreender a presença da obra O Lago dos Cisnes (1887), originaria do período czarista, durante o regime soviético até o seu uso em turnês internacionais, como propaganda ideológica.
Janine Figueiredo de Souza Justen em seu texto “Imagens como tomadas de posição: Uma análise da caricatura política na revista O Malho (1902-1906)” propõe-se investigar as relações editoriais, ideológicas e estilísticas estabelecidas entre as imagens publicadas n’O Malho e seus produtores no contexto do “Bota-Abaixo” (1902-1906).
Leandro Martan Bezerra Santos faz uma reflexão sobre disputas de poder, narrativa, espaço e proeminência no campo musical, a partir da análise das composições do cantor Belchior. Para isso relaciona os trabalhos de Belchior com outros artistas da Tropicália e Pessoal do Ceará, além de tratar sobre a relação deste com a indústria musical.
No artigo “Arte, política cultural e cooperação teuto-italiana no Rio de Janeiro da Era Vargas”, Liszt Neto tem como base os interesses e estratégias comuns utilizados pela política cultural alemã e italiana no Rio de Janeiro ao se estabelecerem nas Américas. A partir disso, o autor estuda como a colaboração no campo artístico e cultural teve influência direta nas atividades da Pro Arte, associação de artistas e amantes das artes alemãs no Brasil.
Já Luciana da Costa de Oliveira realiza um estudo sobre o artista Pedro Weingärtner (1853-1929), atentando-se principalmente as pinturas sobre os espaços da imigração no Rio Grande do Sul e as atividades dos gaúchos, procurando problematizar as indagações que estiveram no entorno da construção da pintura Rodeio, finalizada no ano de 1909 e produzida a partir de uma encomenda do governo do Estado do Rio Grande do Sul.
Em “Napoleão como Filoctetes: Apropriação de um mito grego em uma caricatura antinapoleônica”, Mateus Dagios apresenta um caso de reapropriação do mito de Filoctetes na caricatura antinapoleônica, Nicolas Philoctète dans l’Îsle d’Elbe (1814-1815), que compôs um Napoleão ferido e abandonado, a partir da mistura da antiguidade, discurso nacional e caricatura.
O artigo escrito por Mikaela Moreno Vasconcelos Araujo, “Pintura Histórica na Amazônia: O vernissage de 1908 como Hauptmomente da história na Amazônia”, reflete sobre a Amazônia enquanto capital da borracha, na qualificação de uma Petit Paris. A autora destaca o projeto artístico-civilizador do intendente e mecenas que idealizara uma representação épica da história da nação, aos olhares pintores-historiadores da Europa do século XIX. A partir deste contexto, o artigo salienta a narrativa visual pintada por Theodoro Braga e Antônio Parreiras acerca da Amazônia.
Com intuito de analisar as representações do presidente Ronald Reagan (1911-2004) na história em quadrinhos “Batman, o Cavaleiro das Trevas” (1986), roteirizada por Frank Miller, Millena Barbosa de Carvalho, traz uma discussão sobre as possíveis relações entre este gênero textual e o contexto de sua produção, a década de 1980 nos Estados Unidos.
Em tempos de pandemia do vírus Covid 19, Pablo Lemos Lucena se propôs a pensar sobre as condições precárias dos entregadores que trabalham com aplicativos. O autor associa as imagens e vídeos feitas destes entregadores com autores como Achille Mbembe e Vladimir Safatle ou sobre arte política, arte como tomada de posição a exemplo de Georges DidiHuberman e Hall Foster, a fim estabelecer um diálogo sobre diversos aspectos, como o tempo, a impermanência, além das contradições e fraturas presentes em nossa sociedade.
A autora Paola Pascoal apresenta uma abordagem sobre a relação entre a criação de uma arte nacional e a própria formação da nação brasileira, a partir da análise da ressignificação dos resquícios da cerâmica arqueológica Marajoara, na primeira metade do século XX, que foram utilizados como fonte original da verdadeira arte brasileira.
A fim de realizar uma discussão sobre a consagração da baiana e dos balangandãs como um elemento da identidade nacional na Era Vargas, a autora Sura Souza Carmo faz uma análise das ações de fortalecimento do Estado, que na década de 1930, valorizaram as atividades artístico-culturais para reforçar o nacionalismo e unidade nacional.
No trabalho “Ingênua e frouxa substância humana: A Moreninha na encruzilhada entre Miroel Silveira e João Apolinário (1969)”, Thales Reis Alecrim, busca investigar o programa da peça A Moreninha, baseada no romance de Joaquim Manuel de Macedo (1844) e encenada em 1969, relacionando esta com uma crítica teatral escrita por João Apolinário, visto que este apresenta uma leitura diferente do romance.
Encerrando a sessão do dossiê temático, Wagner Pires da Silva, apresenta um diálogo com base na literatura, para mostrar como os russos se esforçaram na construção de uma Rússia comunista com melhor infraestrutura de ferrovias, estradas e fábricas, após a destruição destes, devido anos de conflitos.
A próxima edição da Revista Faces de Clio também terá o tema de Arte e Política. Felizmente recebemos muitos artigos de alta qualidade e resolvemos dividir a edição em duas partes, o segundo dossiê será lançado no início de 2021. Desejamos a todos e todas uma boa leitura e um 2021 mais leve e de muita luta!
Bárbara Ferreira Fernandes – Editora-chefe da Revista Faces de Clio, doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: barbaraffernandes@outlook.com
Carolina Martins Saporetti – Editora-chefe da Revista Faces de Clio, doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: carolinamartinssaporetti@gmail.com
FERNANDES, Bárbara Ferreira; SAPORETTI, Carolina Martins. Editorial Faces de Clio, Juiz de Fora, v.6, n.12, jul / dez, 2020. Acessar publicação original [DR]
Diálogos transatlânticos: relações e dinâmicas entre Portugal, África e América (séculos XVI e XIX) / Faces de Clio / 2020
A Revista Faces de Clio, periódico discente vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), com grande satisfação, publica a sua 11ª edição com o dossiê temático “Diálogos transatlânticos: relações e dinâmicas entre Portugal, África e América (séculos XVI e XIX)”. O presente número reúne 18 trabalhos: 15 artigos vinculados ao dossiê e três artigos livres.
Com um tema há muito explorado por grandes nomes da historiografia, o dossiê reúne novas contribuições teóricas e metodológicas acerca das relações que se desenvolveram e se dinamizaram nas e entre as margens atlânticas daqueles espaços que um dia fizeram parte o Império Português. Nesse sentido, os trabalhos aqui publicados em muito contribuem para a percepção das dinâmicas dos aparelhos político-administrativos, das economias, dos cotidianos, das relações entre os homens e das manifestações culturais concebidos pelos intercâmbios entre Portugal, África e América entre séculos XVII e XIX. Visando facilitar a difusão dos nossos artigos, com grande alegria comunicamos que a Revista Faces de Clio está, agora, integrada ao novo Portal de Periódicos da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com nosso novo site (OJS 3), passamos a administrar todo o fluxo editorial pela nova plataforma da revista, facilitando a comunicação entre autores, editores, pareceristas e leitores.
Abrimos esta edição com o artigo de Lucas Lixa Victor Neves “Um relato sobre a Restauração de 1640 no Rio de Janeiro: A importância da demonstração de lealdade à causa de d. João IV” partindo de uma discussão acerca do ambiente politicamente fragmentado no reino luso após o fim da União Ibérica (1580-1640), Lucas Neves reflete, por meio de um relato sobre a aclamação de D. João IV no Rio de Janeiro, sobre a importância de se propagandear méritos de determinados sujeitos em um momento de quebra de regime em Portugal.
Em seguida, no artigo “Entre mares e alteridades: Um mouro disfarçado nas galés portuguesas do seiscentos”, Thaís Tanure aborda a história do corsário muçulmano Amet e suas desventuras diante da Inquisição portuguesa em 1656. Tendo como fio condutor de sua pesquisa o processo inquisitorial de Amet, a autora o cruza com outras fontes documentais e conecta a história penal portuguesa à história do corso no Mediterrâneo, refletindo acerca das relações entre alteridade e Império.
Bento Machado Mota, no artigo “Ecos dissonantes no atlântico: fundamentos e limites do antiescravismo de Epifanio Moirans”, analisa as ideias antiescravistas de missionários capuchinhos em fins do século XVII a partir do livro La Justa defesa (1681), do capuchinho francês Epifanio Moirans. Trata-se de um registro incomum, no qual diversos argumentos contra a escravidão são abordados, por um lado, à luz de justificativas jurídicas relativas ao tráfico negreiro vindas de Roma e de teólogos europeus e, por outro, por meio dos relatos missionários católicos da América do sul.
Já no artigo “Cães danados, porcos vadios e formigas excomungadas: A convivência entre homens e animais à luz do direito do Antigo Regime”, Patrícia Ribeiro analisa um tema ainda pouco frequentado pela historiografia nacional, qual seja, os conflitos advindos das relações entre humanos e bichos no império português entre os séculos XVI e XIX. Trata-se de uma significativa contribuição aos estudos de Direito Animal, um trabalho original e de grande pertinência que, tendo como pano de fundo os vários dispositivos legais que se referiam a animais, preenche significativa lacuna de conhecimento neste campo.
Juntos, Diego de Cambraia Martins e Gustavo Meira Menino discutem sobre a circulação de pessoas e mercadorias nas rotas mercantis que convergiam para a Ilha da Madeira, na primeira metade do século XVIII. A partir de um estudo de caso que analisa a trajetória de um dos mais atuantes capitães de embarcação do período analisado, os autores demonstram a inserção desse espaço geográfico em relações diretas e indiretas com outras partes do mundo. A Ilha da Madeira, em uma perspectiva global, parte de “Uma Encruzilhada no Atlântico”.
O artigo de Fabricio Lamothe Vargas, que analisa e contextualiza a obra do português D. Luís da Cunha, “Instruções Políticas a Marco Antônio de Azevedo”, reflete também sobre a difícil situação de Portugal frente aos problemas enfrentados no final do século XVII e em inícios do século XVIII, tal como as tentativas do diplomata Luís da Cunha de encaminhar propostas para que tais entraves fossem superados. Nesse sentido, o autor destaca uma das principais e mais curiosas soluções inferidas português: a mudança da corte para a cidade do Rio de Janeiro e a tomada do título de imperador do Ocidente pelo rei D. João V.
Adentrando na primeira metade do século XIX, Luiz Gustavo Martins da Silva investiga aspectos da experiência política de exilados liberais na Europa e no Brasil que foram perseguidos pelo regime de D. Miguel entre os anos de 1826 e 1837, momento no qual se desencadeou também o maior exílio português do oitocentos. Busca-se, assim, abordar o exílio liberal português, o qual se direcionou para o Brasil, numa dinâmica transnacional e transatlântica.
Em “Às Margens do Império, por dentro dos sobados: Estratégias comerciais de sertanejos e centro-africanos no Planalto Central Angolano (décadas de 1840 a 1860)”, Ivan Sicca Gonçalves analisa, a partir dos relatos cotidianos de um comerciante residente em Angola, as mudanças sociais, políticas e econômicas que ocorreram no interior do continente, na chamada zona atlântica, a partir de 1836. Ao apontar as estratégias adotadas por este sertanejo, o autor demonstra a atuação de diversos agentes que estavam envolvidos nessa rede comercial, cujo centro era o reino centro-africano do Bié.
Frederico Antonio Ferreira investiga o episódio de dois grupos de luso-brasileiros que migraram, com a ajuda do governo português, da cidade de Recife para a região de Namibe e Huíla em Angola, em 1849. Dentro do novo modelo colonial implantado pelo governo português na África, estabeleceram um sistema de cultivo de cana-de-açúcar baseado na grande propriedade e na força de trabalho escrava, conforme o existente no Brasil, evidenciando as interações existentes entre Brasil, África e Portugal na metade do século XIX.
Em seguida, já na segunda metade do oitocentos, Laryssa da Silva Machado e Lucas da Silva Machado abordam, através do caso de Itapemirim, Espírito Santo, a complexa rede de tráfico de escravos que se configurou na região Sudeste após a promulgação da Lei Eusébio de Queirós. As inúmeras denúncias e correspondências relacionadas ao desembarque de africanos no litoral sul capixaba após 1850, enviados principalmente para as fazendas de café em Cachoeiro do Itapemirim, Zona da Mata mineira e região ao norte do Rio de Janeiro, demonstram que o problema que preocupava as autoridades do Império perdurou durante toda a década de 1860.
No artigo “O sagrado, o profano e o enfermo: A Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora”, Maciel Fonseca analisa o surgimento da Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora na segunda metade do século XIX. Alicerçado em jornais de circulação da época, produções historiográficas locais e o uso do Estatuto e do Compromisso da recém-fundada instituição, o autor reflete sobre a dinâmica de funcionamento da associação cujo principal objetivo era socorrer os pobres e desvalidos na tentativa de aliviar a miséria humana.
A imigração portuguesa para o rio Madeira, no estado do Amazonas, entre 1840 e 1918, foi objeto de análise de Paula de Souza Rosa, doutoranda em Historia Social da Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). No presente artigo, a partir da trajetória individual e coletiva de 91 sujeitos, a autora desvelou o perfil social dos imigrantes portugueses, as redes sociais que possibilitaram os múltiplos deslocamentos desses indivíduos, bem como os aspectos relativos ao papel desempenhado por eles em escala local e a nível global.
Tendo presente que o melhor antidoto contra a violência é a memória, e que a historiografia brasileira está recheada de silêncios, Bruno Zétola analisa a repercussão dos atos heroicos de Simão Salvador, um africano livre que na segunda metade do século XIX ganha as páginas dos principais jornais do país, e passa a ser reconhecido por associações civis e pelo próprio Imperador. O artigo, absolutamente instigante, resgata a história de um personagem pouco conhecido e estudado de nossa historiografia, e, com base em seus feitos, nos faz refletir sobre o lugar do negro no Império escravista brasileiro e as contradições de uma sociedade escravocrata que se vê obrigada a louvar um africano livre.
Ainda na segunda metade do século XIX, Cleudiza Fernandes de Souza apresenta-nos algumas reflexões acerca das possibilidades do cruzamento entre a História Atlântica e a historiografia de outros contextos, como o pós-abolição no Brasil, por exemplo. Assim, por intermédio de obras que tratam da questão das trocas atlânticas, comparações e seus desdobramentos, a autora discute sobre os desafios da contemporaneidade em unir estas duas abordagens historiográficas, os possíveis caminhos para o encontro das duas perspectivas e os ganhos advindos a partir desse cruzamento teórico.
Finalizando a sessão do dossiê temático, Leonardo Aboim Pires examina o impacto da Grande Depressão em Portugal num contexto de transição política entre a Ditadura Militar e o Estado Novo. Tendo o desemprego rural como objeto de estudo, o autor analisa este fenómeno de forma mais completa, refletindo sobre as circunstâncias em que ocorreu, suas consequências sociais, dinâmicas exógenas, mecanismos institucionais e de governação atuantes no período em análise.
Na sequência, a 11° edição da Revista Faces de Clio inicia a sessão de artigos livres com as contribuições do historiador Pablo Gatt, que, no contexto da antiguidade grecoromana, analisa a trajetória das representações acerca do corpo feminino, visto como herdeiro direto de Eva, cunhadas pelas filosofias pagãs, pelos discursos da Igreja cristã dos primeiros séculos, e dos discursos medievais, visto que o mesmo esteve dividido por uma linha bastante tênue.
Temática ainda pouco estudada na história da imprensa mineira, Michel Saldanha investiga a configuração político-doutrinária da imprensa periódica da província de Minas Gerais na década de 1860. Ao aprofundar a questão pesquisada com a utilização de fontes primárias, o autor verifica quais periódicos levantaram a bandeira dos partidos políticos de Minas Gerais, ou da Liga Progressista, e em quais ideias político-partidárias esses periódicos se apoiaram. Em síntese, compreende as principais tendências partidárias circuladas através dos periódicos na província mineira.
Encerramos esta edição com “Os bacharéis fardados: cor, meritocracia e mobilidade social na Escola Militar da Praia Vermelha (1870-1880)”, trabalho de Geisimara Soares Matos. Através de algumas trajetórias de ofício de militares, a autora analisa o discurso do mérito que foi praticado dentro da Escola Militar da Praia Vermelha. Ancorado a isso, o autor procura entender como a cor e a origem social dos alunos influenciava a prática do discurso da meritocracia na instituição.
Por fim, gostaríamos de agradecer aos membros(os) da equipe editorial, ao conselho consultivo, aos pareceristas e autores(as), que participaram ativamente da construção deste dossiê. Aos leitores, que prestigiarão o nosso trabalho, ressaltamos que a História se faz, cada vez mais, através de um exercício democrático e de cidadania, constituindo-se como palco profícuo para novos debates e aprendizado. Desta feita, esperamos que a edição da Revista Faces de Clio que por ora se apresenta possa ampliar os conhecimentos e instigar novas pesquisas históricas. Seremos resistência.
A todos, o desejo de uma excelente leitura!
BÔSCARO, Ana Paula Dutra; FERNANDES, Bárbara Ferreira. Editorial Faces de Clio, Juiz de Fora, v.6, n.11, jan / jun, 2020. Acessar publicação original [DR]
Catolicismo, poder e sociedade / Faces de Clio / 2019
Com muita satisfação, a Revista Faces de Clio lança o dossiê Catolicismo, poder e sociedade (Julho – Dezembro de 2019). O presente arquivo reúne artigos de historiadores e cientistas da religião sobre as relações do catolicismo para com as instituições políticas e sociais em diferentes contextos históricos, considerando não apenas os espaços oficiais ou teológicos da Igreja Católica, mas também as suas manifestações não oficiais ou populares.
Visando facilitar a difusão dos nossos artigos, damos início a uma nova fase da Revista, que agora se integra ao novo Portal de Periódicos da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com nosso novo site (OJS 3), teremos todo o fluxo editorial administrado na plataforma, facilitando a comunicação entre autores, editores, pareceristas e leitores.
Iniciamos este número com o artigo de João Antônio Fonseca Lacerda Lima, que analisa a importância das cerimônias católicas nos vários âmbitos dos bispados do Maranhão e do Pará, desde a sua instalação até o modo de seleção dos clérigos nas dioceses. Assim, mediante o estudo da “pompa e circunstância”, o autor demonstra o lugar da Igreja e dos eclesiásticos naquela sociedade.
Em seguida, temos o artigo de Júnior Cesar Pereira, “Lágrimas no púlpito A morte de D. Pedro III na parenética de Teodoro de Almeida”, que explora a relação entre a esfera do político e do religioso a partir da oratória sagrada, entendida com prática cultural. No texto, o autor procurou demonstrar como a morte de Dom Pedro III foi refletida no púlpito, a partir da análise de um sermão pregado pelo padre Teodoro de Almeida (1722-1804).
Nívea Mendonça, doutoranda em História Social pela Universidade Federal Fluminense, analisa o processo de entrada de pessoas na Ordem Terceira do Carmo em Vila Rica e em Mariana. De acordo com a autora, tal processo era extremamente criterioso e, somente ao final de todas as etapas, os noviços eram reconhecidos como Irmãos Terceiros da Ordem do Carmo.
No artigo intitulado “A Igreja Católica e o Movimento de recatolização no início do século XX”, Allan Fernandes discorre sobre a Igreja Católica no contexto político das décadas de 1920 e 1930. No texto, o autor relaciona o movimento de Recatolização no Brasil, a crise dos anos 1920, a ascensão de Vargas ao poder com os Levantes comunistas de 1935.
O texto de Pedro J. Silva Reis, Mestre em história contemporânea pela Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Nova de Lisboa, retoma o debate em torno da problemática da observação do comportamento político dos católicos produzido no âmbito da historiografia francesa, confrontando e equacionando as vantagens e desvantagens do universo crente contemporâneo.
No artigo intitulado “O Social Catolicismo e a sua atuação no meio rural na segunda metade do século XX no Brasil”, Nilmar Carvalho analisa a atuação da Igreja Católica no meio rural brasileiro, na segunda metade do século XX, sobretudo em relação à reforma agrária. A pesquisa está circunscrita aos eventos que ocorreram entre os anos de 1950 e 1964 e analisa os documentos eclesiais e bibliografias sobre o assunto.
Leiliane Louise Lucena da Costa, por sua vez, investiga por meio de cartas e rabiscos deixados por suicidas nos processos policiais de 1920 e 1952, a busca pelo perdão do pecado cometido contra si mesmo. O suicídio, tema tabu e hodierno para sociedade, é trabalhado na perspectiva da Igreja Católica, que com o desenvolvimento da medicina e áreas afins, fez rever algumas de suas doutrinas e passou a permitir o cumprimento de todos os rituais necessários para encomendar o enterro destes sujeitos.
Ainda no século XX, o artigo “Orientando o voto católico sul-rio-grandense: a LEC (Liga Eleitoral Católica) e a propaganda político-partidária veiculada na imprensa escrita em 1950” tem como objetivo compreender a influência da Igreja Católica por meio dos ditames apregoados pela Liga Eleitoral Católicos (LEC) na propaganda político-partidária do Partido Social Democrático (PSD) e do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) veiculada nos jornais Correio do Povo e Diário de Notícias.
Finalizando a sessão do dossiê temático, trazemos o artigo de Rita Suriani Lamas, que apresenta uma revisão bibliográfica sobre a atuação da Igreja Católica durante o governo ditatorial militar brasileiro, entre as décadas de 1960 e 1980. Ao longo do texto, a autora analisa documentos oficiais emitidos por órgãos ligados à Igreja, examinando as transformações ocorridas no clero brasileiro relativas às posturas adotadas frente às ações dos militares no poder.
Quanto aos artigos livres, iniciaremos com as contribuições do historiador Aguiomar Rodrigues Bruno, que no artigo intitulado “Por tudo que é vivo morre: a morte negra numa freguesia do Recôncavo da Guanabara, Rio de Janeiro (Séc. XVIII)”, o autor analisou as representações e as práticas do bem morrer católico entre os indivíduos forros da freguesia de Nossa Senhora da Piedade do Iguaçu, no Recôncavo da Guanabara, ao longo do século XVIII.
Adentrando na segunda metade do século XIX e início do século XX, o Professor Doutor Antônio Gasparetto Junior explora as manifestações culturais da comunidade germânica em Juiz de Fora, município que recebeu elevado número de imigrantes alemães e em muito se destacou pelas manifestações culturais e profissionais que os mesmos empreenderam na cidade. Por meio de fontes provenientes de suas antigas associações, o autor avalia a relevância que elas tiveram para a proteção dos germanos na região.
Finalizando os artigos da revista, Geovano Chaves, professor de história do IFMS, apresenta o artigo intitulado “O cinema polonês nos trilhos da História: As 200 crianças do Doutor Korczac de Andrej Wajda”. Ao longo do texto, o autor analisa as afinidades entre política e religião através do cinema, refletindo sobre os aspectos do antissemitismo no território polonês. No artigo, o autor analisa o filme “As 200 crianças do Doutor Korczac” com o objetivo de exemplificar alguns “trilhos” da história da Polônia.
Agradecemos a todos(as) membros da equipe editorial, ao conselho consultivo, aos pareceristas, aos autores(as), que participaram ativamente da construção deste dossiê, e aos leitores que prestigiarão o nosso trabalho.
Ana Paula Dutra Bôscaro – Doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: anapaulaboscaro@gmail.com
Bárbara Ferreira Fernandes – Doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: barbaraffernandes@outlook.com
Jorge William Falcão Junior – Doutorando em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: williamfalcaojr@gmail.com
BÔSCARO, Ana Paula Dutra; FERNANDES, Bárbara Ferreira; FALCÃO JUNIOR, Jorge William. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.5, n.10, jul / dez, 2019. Acessar publicação original [DR]
Múltiplos olhares sobre política e religião / Faces de Clio / 2019
Com muita satisfação, a Revista Faces de Clio lança o dossiê Múltiplos olhares sobre política e religião (Janeiro – Junho de 2019). O arquivo é composto de trabalhos que observam os limites entre os espaços públicos e privados, assim como as fronteiras entre as experiências religiosas e as atuações políticas. Contamos, nesta edição, com artigos que transitam sobre diversos períodos da história, desde a “Grécia antiga” ao Brasil contemporâneo.
Visando facilitar a difusão dos nossos artigos, damos início à uma nova fase da Revista, que agora se integra ao novo Portal de Periódicos da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com nosso novo site (OJS 3), teremos todo o fluxo editorial administrado na plataforma, facilitando a comunicação entre autores, editores, pareceristas e leitores.
Iniciamos este número com um artigo de Thales Moreira Maia Silva, no qual a semântica do conceito de “experiência religiosa” é explorada a partir de fontes da Grécia antiga e de um diálogo com a historiografia. O fio condutor do trabalho é a relação com o contexto político das “religiões de mistério” helenísticas.
Ainda sobre História Antiga, Eduardo Belleza traz a sua contribuição com o artigo “Os Césares” de Juliano como construção de uma propaganda política. Recorrendo à sátira intitulada “Os Césares”, demonstra as tentativas do imperador Juliano (361 – 363 d.C.) para difundir uma propaganda política e religiosa no intuito de promover a sua imagem e reestabelecer os antigos cultos romanos em oposição ao avanço do cristianismo.
No artigo O príncipe indômito: uma análise das políticas praticadas nas vidas de São Hermenegildo para a construção hagiográfica do príncipe mártir visigodo, a historiadora Luanna Klíscia explora as implicações políticas das vidas do príncipe visigodo São Hermenegildo (564 – 585 d.C., considerado mártir da Igreja espanhola), sobretudo na disputa contra o rei Leovigildo (seu pai, que adotava em seu reino uma perspectiva ariana do cristianismo).
Recorrendo como fonte aos jornais A República e O Apologista Christão Brasileiro, o historiador João Gabriel Moraes de Souza trata das tensões presentes no processo de laicização da República Federativa do Brasil a partir da polêmica em torno ao casamento civil no Belém do Pará. A problemática envolve o missionário metodista Justus Nelson, os católicos e os republicanos entre os anos de 1890 e 1893.
Nilciana Alves explora o olhar de Emma Goldman sobre o puritanismo, sobretudo no que se refere às relações estabelecidas entre mulher, política e religião. Para tanto, a autora, além de explorar o artigo “The Hypocrisy of Puritanism” (1910), analisa os livros “La palavra como arma”, “O indivíduo, a sociedade e o Estado, e outros ensaios” e “Vivendo minha Vida”.
Karina Fonsceca Soares Rezende apresenta uma reflexão histórica acerca da teologia política que orientou Dietrich Bonhoeffer (teólogo conhecido por sua atuação contra o nazismo), tendo como fio condutor a análise do conceito de “comunhão”, dado sua importância para a articulação de uma ideia de responsabilidade cristã em relação aos problemas de ordem pública. Além disso, a historiadora traça um paralelo entre o referido termo e o conceito de “amizade política”, desenvolvido por Hanna Arendt no livro “As origens do totalitarismo”e as ideias de Bonhoeffer.
Em relação ao envolvimento dos evangélicos na política, o historiador Vinícius Rodrigues Dias propõe uma análise das eleições para deputados estaduais de Rondônia em 1982, as primeiras depois da criação do Estado, com ênfase nas trajetórias de Amizael Silva do PDS e de Sadraque Muniz filiado do PMDB. Para isso, o estudioso recorre à fontes orais, jornais e cartas.
Adentrando no século XXI, Aline Beatriz Coutinho investiga as disputas em torno à questão do aborto na Câmara dos Deputados por parte dos movimentos feministas, dos deputados federais pentecostais e do poder executivo. Coutinho explora o impacto da temática a partir das eleições de 2014 e observa em que medida a discussão é pautada no âmbito da moralidade e da religião e no contexto da saúde pública.
Sobre os eventos políticos recentes da História do Brasil, o prof. Dr. Emanuel Freitas da Silva (Universidade Estadual do Ceará) aborta as tensões entre os parlamentares evangélicos o governo de Dilma Rousseff. Além de discutir o conceito de modernidade e secularização aplicados aos eventos recentes da história política do Brasil, o sociólogo apresenta brevemente a constituição da bancada evangélica desde 1988 ao governo Dilma. Por fim, expõe sete cenas, como o debate sobre o conceito de família, que marcaram os debates entre o governo e a bancada evangélica.
O historiador Marcelo Noriega reflete acerca dos desafios no Ensino de História no combate à intolerância religiosa. Pautado na abordagem da Educação Histórica, tendo como fundamento às contribuições da Jorn Rusen, o autor demonstra a importância de desenvolvermos, além dos aspectos cognitivos, as capacidades dos estudantes se posicionarem como cidadãos autônomos aptos a conviverem numa sociedade plural.
Enceramos esta edição com uma resenha produzida por Edson Silva de Lima sobre o livro Bram Stoker e a Questão Racial. Literatura de horror e degenerescência no final do século XIX.
Agradecemos a todos (as) membros da equipe editorial, ao conselho consultivo, aos pareceristas, aos autores(as), que participaram ativamente da construção deste dossiê, e aos leitores que prestigiarão o nosso trabalho.
Ana Paula Dutra Bôscaro – Doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: anapaulaboscaro@gmail.com
Bárbara Ferreira Fernandes – Doutoranda em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: barbaraffernandes@outlook.com
Jorge William Falcão Junior – Doutorando em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: williamfalcaojr@gmail.com
BÔSCARO, Ana Paula Dutra; FERNANDES, Bárbara Ferreira; FALCÃO JUNIOR, Jorge William. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.5, n.9, jan / jun, 2019. Acessar publicação original [DR]
Experiências Autoritárias: Política, Instituição e Sociedade / Faces de Clio / 2018
A Revista Faces de Clio, periódico discente vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, publica, com grande satisfação, a sua 8ª edição com o dossiê temático Experiências Autoritárias: Política, Instituição e Sociedade. Contamos nesta edição com quinze trabalhos de pesquisadores: nove artigos relacionados à temática do dossiê e seis artigos livres.
A organização desta publicação foi realizada com o objetivo de integrar pesquisas que abordam o conceito de autoritarismo enquanto corrente do pensamento político ao longo da história mundial a partir do século XX. A proposta, portanto, foi de reunir trabalhos com enfoques em regimes políticos, eventos, personalidades, intelectuais, ideias ou instituições que experienciaram essa ideologia ou forma de governo. A ideia é problematizar as participações sociais vivenciadas nesses regimes.
Regimes autoritários, na tipologia dos sistemas políticos, conforme nos esclarece o Dicionário de Política1, são aqueles que privilegiam a autoridade governamental, reduzem o consenso e concentram o poder político em apenas uma pessoa ou órgão, posicionando secundariamente as instituições representativas. Por esse motivo, excluem ou reduzem a participação do povo no poder e empregam meios coercitivos. Ideologias autoritárias são aquelas que negam a igualdade dos homens, colocam em destaque o princípio hierárquico e defendem formas de regimes autoritários e personalidades autoritárias.
O autoritarismo foi uma característica presente no pensamento político alemão do século XIX com Carl Ludwig Haller; Friedrich Stahl e Heinrich Treitschke. Na primeira metade do século XX, Charles Maurras encabeçou o movimento de extrema direita da Action Fran-çaise na França da III República. A partir da Primeira Guerra Mundial novas correntes políticas e ideológicas emergiram representando a crise do sistema liberal com novas formas de se compreender a realidade. Partindo de questionamentos sobre o liberalismo, desenvolveram-se correntes ideológicas autoritárias. Depois da Segunda Guerra Mundial e de duas consequências, entretanto, o autoritarismo encontrou-se frente a uma realidade fechada para lançar suas profundas raízes2.
A partir disso, estudiosos acreditavam que a ideologia autoritária não teria futuro. Ao contrário, nossa conjuntura política atual nos demonstra um ressurgimento e uma readaptação aos novos tempos. Deste modo, a organização deste dossiê temático responde a algumas das prioridades e tendências atuais e nos ajuda a empreender uma análise crítica e apropriada desse passado político recente.
O artigo de Álvaro Ribeiro Regiani, A Recepção do Holocausto na América: os artigos de Hannah Arendt na Partisan Review e a elaboração de Origens do Totalitarismo, interpreta alguns ensaios de Hannah Arendt publicados na revista literária Partisan Review entre 1944 e 1954. Seu objetivo é estabelecer uma conexão entre esses textos e os temas centrais apresentados em Origens do totalitarismo (1951). Além disso, o seu intuito é compreender as considerações de Arendt sobre o cotidiano, a tradição e a filosofia da história para indicar o sentido que atribuiu à crise política e moral do século XX, que se iniciou com o sistema totalitário.
Trabalhadores Rurais e Movimentos Reivindicatórios no Regime Militar: greve nos engenhos da zona canavieira de Pernambuco – 1979, de Cristhiane Laysa Andrade Teixeira Raposo, trata das experiências trabalhistas coletivas no mundo dos engenhos e usinas da zona canavieira de Pernambuco através das paralisações e mobilizações trabalhistas do final da década de 1970. Para tal abordagem, a autora utiliza prontuários arquivados pelo DOPS de Pernambuco, processos trabalhistas e registros na imprensa local e nacional sobre a paralisação no campo. A intenção é refletir sobre a organização dos trabalhadores rurais, suas reivindicações por espaços de luta e a repercussão legal do movimento com a primeira Convenção Coletiva do Trabalho no campo em meio ao regime autoritário instaurado com o golpe civil-militar de 1964.
O artigo intitulado Repressão ao Parlamento: as cassações de mandatos dos arenistas paraibanos em 1969, de Dmitri da Silva Bichara Sobreira, analisa o processo de cassação do mandato e dos direitos políticos dos membros da Aliança Renovadora Nacional (ARENA), secção Paraíba, no ano de 1969, através das atas do Conselho de Segurança Nacional (CSN) e de jornais locais. O objetivo é investigar os motivos que levaram a ditadura a expurgar membros de sua base aliada.
Em Definindo o Fascismo: comparando análises e interpretações, Gustavo Feital Monteiro analisa duas obras sobre a história do fascismo: A anatomia do fascismo, de Robert Paxton, e Fascistas, de Michael Mann. Através da comparação das interpretações, o autor busca identificar quais os pontos entre as duas obras que se assemelham e quais se diferem. A análise crítica dos textos em questão permite a percepção de questões complexas voltadas à compreensão do fascismo, além das diferenças entre perspectivas analíticas deste tema tão complexo.
O Antiliberalismo de Alberto Torres e Andrés Molina Enríquez: a formação do pensamento autoritário no Brasil e no México em princípios do século XX, de Jorge Eschriqui Vieira Pinto, tem como proposta a análise de uma corrente de pensamento autoritário no Brasil e no México a partir do entendimento e da reflexão das ideias de Alberto Torres e Andrés Molina Enríquez. Ambos, nas primeiras décadas do século XX, esforçaram-se na reflexão de suas respectivas sociedades nacionais e elaboraram um projeto de política nacional para a promoção do desenvolvimento e a construção de uma unidade nacional por meio de uma ação efetiva de um governo central forte.
O artigo As Resistências à Organização Corporativa Portuguesa: a perspectiva regional do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, de Jorge Mano Torres, propõe-se a esclarecer aspectos sobre o Estado Novo português, que criou um aparato para o regime corporativo, como o Instituto Nacional do Trabalho e Previdência. O INTP possuía funções de coordenação e controle sob a organização corporativa lançada a nível nacional e regulava o trabalho e a previdência. Desse modo, esse texto procura analisar as dificuldades / constrangimentos para a implementação da organização corporativa sindical e patronal no olhar dos delegados distritais do Instituto.
Rafael Athaides, com seu artigo Liderança Carismática e Mobilização Afetiva na Ação Integralista Brasileira: a “fascinação do predestinado” no Paraná (1935), procura analisar a liderança carismática de Plínio Salgado na Ação Integralista Brasileira, observando seus aspectos afetivos. Para isso, a fonte utilizada é o jornal A Razão, pertencente ao movimento no Paraná. É uma documentação de caráter regional / local que revela os níveis de devoção carismática tanto em aglomerações urbanas, quanto em lugares longínquos.
No trabalho Nacionalismo, Educação e Conflitos Religiosos Durante o Período Estadonovista no Rio Grande do Sul, Rodrigo Luis dos Santos analisa os conflitos políticos que que envolveram os campos educacionais e religiosos no Rio Grande do Sul, entre os anos de 1937 e 1945, permeados pelo pensamento e discurso nacionalista impetrado pelo regime do Estado Novo. Para tanto, seu recorte espacial se dará no município de Novo Hamburgo, localizado próximo da capital do estado, Porto Alegre.
Já o artigo La Dictadura Perfecta: una analisis de las estrategias de permanencia del régimen priista en México, Romulo Gabriel de Barros Gomes empreende uma análise a respeito do Partido Revolucionário Institucional (PRI) no México. O autor discute aspectos que levaram o governo do PRI a mergulhar nos eixos mais profundos da vida cotidiana dos cidadãos mexicanos. Também, reflete sobre a permanência do partido no poder durante décadas, a partir do uso da violência e controle ideológico através do discurso da imprensa e da difusão de material cinematográfico erótico influenciando, pois, a dinâmica cultural deste país. Assim, o artigo analisa o impacto cultural de tais ações no âmbito das relações cotidianas do referido país.
Quanto aos artigos livres, iniciaremos com as contribuições da historiadora da arte Clara Habib de Salles Abreu. Em seu artigo Da “Mimese” na Antiguidade à “Imitatio” Renascentista: Reflexões Sobre O Conceito De Imitação Na Teoria Da Pintura, Clara levanta uma discussão acerca dos usos dos conceitos de imitação e imagem, presente desde os debates filosóficos da antiguidade clássica, entre os renascentistas, como: Leon Battista Alberti, o escritor Aretino e o gramático Fabrini.
A respeito das questões de gênero, raça e justiça, Ceudiza Fernandes de Souza expõe em Trajetórias E Experiências De Gênero, Racialização e Liberdade no Âmbito Judicial do Pós-Abolição os resultados de sua recente pesquisa sobre um caso criminal ocorrido em Oliveira de Minas Gerais, em 1983. O evento está relacionado a Narciza da Conceição, uma ex – escrava.
Em seu artigo Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e o Personalismo na Memória sobre a Revolução de 1930, o historiador Danyllo Di Giorgio Martins da Mota explica, tomando como base textos de Aurino Morais, como os mitos que envolveram o referido momento político ajudaram a afirmar a imagem de Antônio Carlos no cenário político mineiro.
Tendo como fundamento as contribuições de Peter Burke no trato das imagens enquanto fontes históricas, Lorenzo Silva Ortiz tece apontamentos acerca das composições e posições sociais da Nova Espanha em seu artigo Castas y Posición Social: Un Cuadro de Mestizaje como Reflejo del Poder en la Sociedad Novohispana del Siglo XVIII.
Para esboçar respostas à pergunta lançada em seu título Relação Brasil – França no Oitocentos: Fruto de uma Empatia Cultural ou de um Projeto de Hegemônia, a historiadora Thalita Moreira Barbosa utiliza como aporte teórico as contribuições de Raymond Willians sobre cultura e materialismo.
Finalizamos esta edição com a apresentação dos resultados das pesquisas de Yobani Maikel Gonzales Jauregui, que parte de uma abordagem comparativa para investigar a questão do matrimônio entre escravos, haja vista a legislação canônica em seu artigo La Legislación Canónica y el Matrimonio de Esclavos en la América Española y la América Portuguesa.
Agradecemos a todos os pesquisadores que confiaram na Revista Faces de Clio e enviaram artigos para serem publicados. Indubitavelmente, para nós é uma grande honra receber trabalhos concernentes às diversas e importantes temáticas advindas de distintas regiões do Brasil e do exterior.
Agradecemos aos professores pareceristas, membros de nosso Conselho Consultivo, que, gentilmente, dedicaram tempo nas análises dos artigos.
Agradecemos à nossa equipe do Conselho Editorial por toda dedicação e empenho neste trabalho junto conosco ao longo do semestre. Vocês são peças-chave para o êxito da revista.
Notas
1 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco (orgs.). Dicionário de política I. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998
2 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco (orgs.). Dicionário de política I. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998
Daniela de Miranda dos Santos
Jorge William Falcão Junior
SANTOS, Daniela de Miranda dos; FALCÃO JUNIOR, Jorge William. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.4, n.8, jul / dez, 2018. Acessar publicação original [DR]
Diplomacia: acordos e tensões nos séculos XIX e XX / Faces de Clio / 2018
Com grande satisfação a Revista Faces de Clio, periódico discente vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, publica, compondo de dez artigos, a sua 7ª edição, cujo dossiê temático é: Diplomacia: acordos e tensões nos séculos XIX e XX.
O principal objetivo desse dossiê é reunir trabalhos acadêmicos e contribuir para o debate historiográfico a respeito da diplomacia como instrumento da política externa, conduzida pelos Estados em prol de seus interesses. Em diferentes contextos históricos ocorreram acordos e tensões impulsionados pelo desejo de riqueza, força e poder. Torna-se primordial, portanto, pensar nas estratégias que envolveram os assuntos diplomáticos no passado, muitos dos quais significaram importantes transformações mundiais.
Desse modo, colaborando para o debate em torno da diplomacia e com a proposta de pensar as formas de atuação e aplicação das atividades desenvolvidas nessas relações externas, a presente publicação conta com quatro artigos de pesquisadores que trabalham com este tema a partir de lentes e recortes distintos. Dois deles tratam desses contextos no século XIX e os outros dois, tratam do século XX.
Abner Neemias da Cruz, doutorando em História na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho, aborda em seu artigo as negociações e pactos entre o governo de Washington, sob a gestão de James Monroe e John Quincy Adams com o governo de D. Pedro I. Para isso, examina problemas pontuais envolvendo as relações entre Brasil e Estados Unidos entre os anos de 1822 e 1828, quando foi assinado o Tratado de Amizade e Comércio entre os dois países apresentados. Sua intenção é demonstrar um cenário envolvido por jogos diplomáticos complexos e multifacetados.
Neste contexto do Brasil no século XIX, contamos também com o artigo de Luan Mendes de Medeiros Siqueira, mestre pelo Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, cujo objetivo central é realizar uma discussão das possibilidades diplomáticas e estratégias de paz entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata no conflito cisplatino. Para isso, aborda os diferentes discursos diplomáticos encabeçados por cada um dos governos sobre a província Cisplatina sobretudo a região do Rio da Prata, bem como as resoluções de fronteiras, uma das pautas diplomáticas centrais debatidas no desfecho da guerra.
Contribuindo com a compreensão da diplomacia brasileira no século XX, mais especificamente na década de 1920, Filipe Queiroz de Campos, mestrando no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, analisa as tensões diplomáticas entre o Brasil e os países latino-americanos na Liga das Nações, e explica como essas tensões influenciaram na política externa do governo de Artur Bernardes, cuja estratégia foi defender a candidatura brasileira como membro permanente do Conselho dessa organização internacional.
Ainda sobre o século XX, Augusto Lira, mestre em História pela Universidade Federal de Pernambuco, reconstrói a trajetória do nutricionista escocês John Boyd Orr, a partir do ano de 1942, período em que ele esteve na América por ocasião dos debates acerca da criação do Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). Este artigo se encaixa no dossiê a partir da história deste intelectual, que esclarece os arranjos de uma nova cultura alimentar em foros diplomáticos internacionais, sobretudo, situando a questão da fome, da saúde pública e da agricultura no epicentro de uma reorganização econômica pós-Segunda Guerra Mundial.
A presente edição também é composta de seis trabalhos relevantes que não são concernentes à temática do dossiê e que são classificados como artigos livres. Nessa seção, Valdinar da Silva Oliveira Filho, professor doutor na Universidade Estadual do Piauí (campus Poeta Torquato Neto), discute em seu artigo relações teóricas e metodológicas entre as interfaces da História e da Psicanálise sob a análise da invenção histórica do Nordeste e do nordestino. Analisa em sua narrativa a emergência histórica dos termos “Nordeste” e “nordestino”, da identidade e “cultura nordestina” a partir do encontro de uma identidade regional e uma identidade sexual. Discute, ademais, a masculinidade, a violência e o gênero como elementos constitutivos do que é ser homem dentro e fora da região.
Thársyla Glessa Lacerda da Cunha, doutoranda em História Política pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em seu texto, investiga o poder de atuação da imprensa no campo histórico, destacando sua relação na construção dos acontecimentos políticos. Neste caso, através da análise dos jornais Tribuna da Imprensa e Última Hora, durante a crise no segundo governo de Getúlio Vargas, a autora discute de que modo os interesses disseminados na imprensa influenciaram os rumos políticos naquele momento, que teve como desfecho o suicídio do presidente em agosto de 1954.
A doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, Sílvia Correia de Freitas, trata, em seu trabalho, do processo de construção do “arquivo quilombola”. Ela desenvolve sua ideia a partir da noção de que o processo de transformação política das comunidades em remanescentes de quilombos produz um arquivo, o que significa a constituição do arquivo como gesto. Assim, toma o próprio processo de construção do arquivo como objeto a ser interpretado.
“Os moços da areia contra o Barão: conflitos políticos em Itapemirim no século XIX” de Laryssa da Silva Machado, mestranda do Programa da Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Espírito Santos, aborda os conflitos políticos que aconteciam em Itapemirim, região sul da Província do Espírito Santo, durante a segunda metade do século XIX. Estuda os partidos locais e divergentes, Macucos e Arraias que eram alinhados, respectivamente, aos Conservadores e Liberais, cujos líderes estavam envolvidos em denúncias sobre tráfico de escravos na Corte.
Julia Maria Gonçalves, mestranda do Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Estadual de Londrina, em seu artigo, a partir de análises em inventários post mortem, trata dos aspectos referentes às vestimentas e às aparências dos habitantes da Vila de Curitiba durante o século XVIII, buscando perceber a sua importância econômica e simbólica.
Por fim, o artigo intitulado “Estrangeiros no Maranhão: transição do regime de trabalho, a imigração e a tentativa de construção de uma sociedade eugênica em meados do XIX” da mestranda em História pela Universidade Federal de Goiás, Amanda Porto Ribeiro, traz uma nova perspectiva sobre a imigração, a substituição de mão de obra escrava e a “linha de cor”, dando destaque ao colonizado como sujeito ativo no processo de colonização em meados do XIX. Para isso, mostra como se desenvolveu, na esfera nacional e mais especificamente no Maranhão, a entrada de imigrantes estrangeiros e a substituição do trabalho escravo pelo livre, dentro do discurso elitista dominante da época, que enxergava na imigração a solução para a alegada “inaptidão” do nacional ao trabalho livre.
Cumprindo com a nossa função de oportunizar aos pesquisadores espaços para divulgação de trabalhos científicos de relevância para a área, publicamos, com grande honra, a 7º edição da Revista Faces de Clio, composta de artigos de mestrandos, mestres, doutorandos e doutores vinculados a instituições de qualidade de diversas regiões do Brasil. Este dossiê conta com uma pluralidade que nos propicia a diversidade do debate e nos permite propagar pesquisas que estão sendo desenvolvidas pelo país, nos estados de Pernambuco, Piauí, Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Santa Catarina.
Agradecemos imensamente aos professores membros do conselho consultivo pela colaboração na avaliação especializada dos artigos, com críticas, sugestões e apontamentos construtivos que nos ajudam a consolidar e elevar a qualidade de nossa revista.
Agradecemos igualmente todo o esforço, dedicação e competência de nossa equipe editorial, que contribuiu para que esta edição fosse publicada. Agradecemos, também, aos autores pelo interesse e pela confiança.
Desejamos a todos uma excelente leitura.
Janeiro de 2018
Daniela de Miranda dos Santos
Flávia Salles Ferro
FERRO, Flavia Salles; SANTOS, Daniela de Miranda dos. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.4, n.7, jan / jun, 2018. Acessar publicação original [DR]
Transições políticas no Brasil / Faces de Clio / 2017
Diante do contexto de cortes de financiamento na área de educação e pesquisa que enfrentamos, pelo qual o governo federal é responsável, a Revista Faces de Clio, demonstrando resistência ao dar continuidade à divulgação da ciência, tem o prazer de publicar sua 6ª edição (jul-dez de 2017), cujo tema de dossiê é: “Transições políticas no Brasil”. A proposta é analisar diferentes regimes e sistemas de governo no que se refere ao processo de mudança entre eles. Além do fenômeno político, existe o interesse em pensar o social, refletindo sobre valores, expectativas, ideais de grupo em diferentes conjunturas, analisando suas adaptações. Por fim, convidamos a uma reflexão que relaciona a economia a esses movimentos políticos, bem como fenômenos e acontecimentos internacionais que influenciaram e contribuíram para crises e mudanças de regimes políticos.
Os textos recebidos evidenciam a riqueza de problemáticas que podem ser estudadas. O dossiê é composto por quatro artigos, cujos períodos históricos retratados vão desde a Monarquia até o Tempo Presente, perpassando pela República Oligárquica, ditaduras e democracia. São trabalhadas as tensões, rupturas e conciliações inerentes a contextos de transição política. As metodologias utilizadas para o estudo do político também são destaques nesta edição da Revista Faces de Clio: análise de discursos, de imprensa e de fotografias.
A edição conta, ainda, com seis artigos livres, cujos temas e recortes temporais são variados. É importante considerar que os autores são doutorandos, mestres e mestrandos, de diferentes instituições e estados brasileiros, contribuindo, dessa forma, para a diversidade na promoção do debate historiográfico e de áreas afins.
Principiando o dossiê temático, Andrielly Oliveira, mestre pela Universidade Federal do Mato Grosso e professora da Universidade Estadual de Mato Grosso, problematiza, em seu texto, as disputas de memórias e suas relações com o processo de superação dos eventos vividos durante a Ditadura Militar brasileira a partir da justiça de transição. Para esse estudo, a historiadora analisa discursos memorialísticos das Forças Armadas, especificamente no que diz respeito à lei de anistia, publicados na Revista do Clube Militar entre 1985 e 2010. Outro viés de análise sobre a Ditadura Militar brasileira foi realizado por Aryanny Silva, doutoranda do Programa de Pós Graduação em História da Universidade Federal de Pernambuco. Ao contrário de Oliveira, que compreende o contexto de transição da Ditadura Militar para a Democracia, o trabalho de Silva tem seu recorte temporal entre 1960 e 1980, abrangendo, portanto, as mudanças ocorridas após o golpe de 1964, que encerrou a primeira experiência democrática brasileira e iniciou a Ditadura Militar. A partir de análises de fotografias que retratam a destruição da Igreja do Bom Senhor dos Martírios, realizadas pelo fotógrafo Alcir Lacerda, Silva discute os debates do cenário político ocorridos nessa época. Seu estudo demonstra o fotógrafo como sujeito histórico e testemunha ocular, e discute a fotografia como um exercício de documentar e rememorar.
Distanciando do contexto de democracias e Ditadura Militar, os outros dois artigos que fazem parte do dossiê temático retratam o contexto que encerra a Monarquia e inaugura a República brasileira. A doutoranda Marta Fittipaldi, estudante da Universidade Federal de Juiz de Fora, em seu artigo “‘Adesistas’ e ‘históricos’: as disputas discursivas no processo de legitimação dos vários projetos republicanos”, analisa os termos “adesistas” e “históricos”, utilizados pela imprensa e em pronunciamentos parlamentares, no intuito de compreender como o uso dessas denominações se inseria em concorrências políticas em torno de projetos republicanos distintos. Ademais, relaciona a atuação de Antônio da Silva Jardim às disputas retóricas que se estenderam durante o primeiro decênio da República brasileira. Encerrando o dossiê temático, o trabalho de Bruna Santos, mestranda da Universidade Federal de Sergipe, discute o papel da imprensa sergipana, em especial o Diário Oficial do Estado, na formação da opinião pública da sociedade em favor do Estado Oligárquico, contribuindo, assim, para a consolidação da oligarquia naquela unidade federativa.
Os artigos livres possuem temáticas diversas. Luiz Henrique Giacomo, doutorando em História pela Universidade de São Paulo, desenvolve, por meio de análises de peças numismáticas, um interessante trabalho sobre a preocupação de Otaviano com esses objetos, no intuito de legitimar seu poder através desses artefatos. Giacomo compreende que essas peças serviram para difundir mensagens ao povo, geralmente de cunho cívico e político.
Retornando aos estudos sobre o Brasil, Pedro Henrique Ferreira Oliveira, também doutorando, estuda a História da Psiquiatria na Casa de Oswaldo Cruz – Fundação Oswaldo Cruz, instituto de excelência em História das Ciências e da Saúde. Seu artigo compreende as moléstias mentais nos periódicos médicos no Brasil a partir da chegada da Corte portuguesa. Ele analisa de que modo a criação de escolas de medicina, bem como da imprensa, contribuíram para a difusão do conhecimento médico e científico e para o monopólio do tratamento e da cura de doenças da população. Encerrando o contexto da monarquia brasileira e inaugurando a República, o trabalho de Bruno Mandelli, mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, discute a representação do trabalho no início da industrialização do Vale do Itajaí, em Santa Catarina, entre 1880 e 1900. A partir de análises de literaturas de viagem, Mandelli compreende que a ideologia do teuto-brasileiro defendia a superioridade do trabalho imigrante alemão em detrimento de outras etnias, buscando, assim, despertar o interesse pela emigração para o sul do Brasil.
Assim como Mandelli, Luis Francisco Abreu Alvarez (mestrando em Política Social pela Universidade Federal Fluminense) também estuda o Mundo do Trabalho, porém, sob outros vieses. Seu artigo é uma análise dos processos de precarização do trabalho no Brasil a partir de três de suas características específicas: contratação, jornada e remuneração. Seu recorte temporal contempla o período da promulgação da Constituição Federal de 1988 até o ano de 2015. Alvarez defende que as relações precárias no Brasil se institucionalizam mediante legislações específicas e contrariam as disposições gerais da Constituição e da Consolidação das Leis do Trabalho. Contudo, as leis que regem o trabalhador continuam sendo normas significativas na defesa de direitos trabalhistas e vínculos empregatícios estáveis.
Pedro Silva, mestre em História pela Universidade Federal Fluminense, em seu trabalho “Construindo um novo espaço urbano no Estado Novo: a participação das empreiteiras cariocas nas obras da gestão de Henrique Dodsworth (1937-1945)” estuda a gestão do prefeito do Rio de Janeiro ‒ Henrique Dodsworth ‒ no que se refere à realização de grandes intervenções urbanísticas como projeto de solução para os problemas urbanos da capital brasileira da época. Dessa forma, estuda as empresas cariocas de construção civil ao longo do Estado Novo, analisando o valor investido no programa municipal de obras públicas em cada ano e a divisão do faturamento total entre as empresas.
Encerrando a 6ª edição, o artigo de Lívia Rezende, doutoranda pela Universidade Federal de Juiz de Fora, pautando-se na metodologia da história oral, discute de que maneira a consulta e o convívio regular com os pretos-velhos por meio da religião e da religiosidade influenciam na construção das perspectivas, valores e expectativas dos consulentes, através da reelaboração da escravidão negra no Brasil.
Nosso muito obrigado aos pesquisadores que confiaram à revista a divulgação de seus trabalhos; aos professores colaboradores, que, através de análise minuciosa, contribuíram com seus pareceres aos artigos recebidos.
Agradecemos também à equipe multidisciplinar da Revista Faces de Clio, que, com dedicação, proporcionou a concretização desta edição.
Por fim, nossos sinceros reconhecimentos à Universidade Federal de Juiz de Fora, em especial ao Programa de Pós-Graduação em História, pelo espaço de atuação na promoção da ciência.
Desejamos uma excelente leitura!
Julho de 2017
Flavia Salles Ferro
Leonardo Bassoli Ângelo
FERRO, Flavia Salles; ÂNGELO, Leonardo Bassoli. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.3, n.6, jul / dez, 2017. Acessar publicação original [DR]
Liberalismo: intelectuais e instituições no Brasil / Faces de Clio / 2017
A 5ª edição da revista Faces de Clio, publicação discente vinculada ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, possui como dossiê temático Liberalismo: intelectuais e instituições no Brasil. Congrega-se, nesta publicação, pesquisadores que trabalham o arcabouço político e ideológico liberal em diversas variantes e diferentes contextos históricos. A proposta é pensar formas de atuação de intelectuais que compartilharam desse aporte ideológico, bem como a aplicação dessas ideias em instituições brasileiras.
Contamos, nesta publicação, com a colaboração de doutores, doutorandos e mestres, formados em diferentes universidades do país nos cursos de História, Ciência Política e Artes Cênicas, o que demonstra a interação e divulgação do conhecimento que perpassa a revista. Formam o dossiê três artigos que se referem ao contexto do século XIX, e três que tratam do século XX. Há, também, quatro artigos livres.
Frederico Antônio Ferreira analisa a atuação do consulado brasileiro em Luanda entre as décadas de 1850 e 1860, no combate ao tráfico de pessoas escravizadas com vistas à construção de um Brasil “civilizado”. Outro estudo sobre escravidão no século XIX é o artigo de Wender Souza, que compreende a chamada “acomodação de ideias” no Brasil, pensando, dessa forma, as ideias econômicas liberais e a forma segundo a qual essas ideias refletiram nos assuntos políticos, especificamente no que se refere à instituição da escravidão.
Ainda sobre o oitocentos, contamos com o artigo de Estevão de Melo Marcondes Luz, que analisa o periódico O Homem Social, publicado na cidade de Mariana, entre os anos de 1832 e 1833. O livro é um material importante para a compreensão de diversas manifestações liberais no Brasil do século XIX, como a liberdade de imprensa e a construção de uma esfera pública.
Sobre o século XX, contamos com o artigo de Camila Oliveira do Valle. Ela aborda os “Três Poderes”, de acordo com autores como John Locke, Montesquieu, Hamilton, Madison e Jay, sob a ideia de que houve combinação de poderes – que interagem entre si – influenciando a concepção da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Juliana Martins Alves, por sua vez, trabalha o Manifesto Mineiro de 1943 como um documento representativo do fracionamento das elites no Brasil nesse contexto histórico, diante das discussões sobre o Estado autoritário-corporativo e sobre o projeto político do Estado Novo.
Ademais, há o trabalho de Lívia Freitas Pinto Silva Soares, no qual a autora analisa as propostas e os diagnósticos dos agentes que organizaram e geriram a assistência social na cidade do Rio de Janeiro, com o propósito de recuperar os modelos institucionais de amparo social e avaliar as práticas médico-assistenciais que se destacaram durante os primeiros anos do século XX no Brasil.
Esta edição também contempla trabalhos que não se referem à temática do dossiê, e que estão classificados como artigos livres. Nessa seção, a pesquisadora Camila Silva Gonçalves Figueiredo analisa, em seu artigo, o processo de monitoramento realizado pelo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), instituição de caráter estatal que controlava, entre outros elementos, os movimentos políticos de esquerda no país. Por meio dessa análise, a pesquisadora apresenta uma visão do Estado sobre esses investigados.
Emilla Grizende Garcia aborda, em seu trabalho, aspectos teórico-metodológicos presentes na telenovela O Bem Amado, veiculada pela Rede Globo de Televisão, considerando a potencialidade desse produto cultural como fonte histórica de destacada importância. Como exemplo, têm-se a possibilidade de conhecimento sobre contextos políticos e culturais brasileiros.
Gustavo Oliveira Fonseca busca compreender o desenvolvimento da malha urbana na vila de São Bento do Tamanduá (atualmente conhecida como Itapecerica, Minas Gerais) entre os séculos XVIII e XIX. Para isso, analisa registros administrativos produzidos pelas atividades da Igreja Católica, além de outras instituições, como as associações devocionais leigas. Thiago Herzog analisa a obra Panorama do Teatro Brasileiro, de Sábato Magaldi, para compreender relações de força e poder presentes nesse campo da dramaturgia, como estratégias, disputas, entre outros fatores.
Agradecemos imensamente pela equipe multidisciplinar, formada por colegas dedicados e competentes em suas atribuições, que contribuiu para que esta edição fosse publicada.
Agradecemos, também, aos pesquisadores que confiaram seus trabalhos à revista, promovendo a divulgação científica no meio acadêmico.
Ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, nosso agradecimento pelo apoio e divulgação.
Boa leitura a todos!
Janeiro de 2017
Leonardo Bassoli
Angelo Flavia Salles Ferro
BASSOLI, Leonardo; FERRO, Angelo Flavia Salles. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.3, n.5, jan. / jun., 2017. Acessar publicação original [DR]
Direitas, história e memória / Faces de Clio / 2016
A Revolução Francesa ocorrida no século XVIII é amplamente difundida pela representatividade do evento na história do Ocidente. Entre outras coisas, ela legou ao mundo a dicotomia política que opõe os chamados grupos de direita e de esquerda. Desde então, esses conceitos foram apropriados, relidos e reinterpretados, porém tornando-se termos comuns no vocabulário político.
O século XX contribuiu para fortalecer essa oposição através, especialmente, da Guerra Fria, que opôs o bloco capitalista e o bloco socialista por cerca de 50 anos em estado de tensão permanente, mantendo vivo o forte enfrentamento entre as partes. As vivências verificadas em tal século marcaram intensamente a disputa política entre atores alinhados às ideias de cada parte, de tal forma que essas oposições ainda se fazem presentes e são recorrentemente evocadas em discursos.
Dentre as conceituações atribuídas aos termos direita e esquerda, ganharam notoriedade as reflexões do italiano Norberto Bobbio [1]. Em que pesem as muitas contestações sobre o uso de tais categorias políticas e as diferentes interpretações dos termos, suas ideias têm aparecido de modo destacado nos trabalhos acadêmicos, seja através de sua adoção ou mesmo de sua crítica. Assim, não há consenso que delimite de forma definitiva a conceituação de ambos os termos. Há, na verdade, embates bibliográficos que também são tensos, refletindo o perfil histórico da abordagem dos termos.
De toda forma, é crucial ressaltar que, durante muito tempo, houve substancial interesse de pesquisadores pelo campo da esquerda política, através do qual investigou-se, por exemplo, movimentos sociais, as resistências em contextos autoritários ou os partidos de esquerda, que mais frequentemente estiveram na oposição. Para isso, é natural se observar que o marxismo exerceu profunda influência na produção historiográfica no decorrer do século XX, pautando pesquisas pelos aspectos da luta de classes ou do materialismo histórico-dialético. Recentemente, contudo, cada vez mais pesquisadores têm se atentado para o estudo dos partidos e dos movimentos de direita, abordando suas mais diversas perspectivas teórico-analíticas possíveis. No que concerne às pesquisas brasileiras, cumpre-se destacar que tal movimento enfatizando a abordagem das manifestações da direita política é muito decorrente das pesquisas que se iniciaram acerca do integralismo. Esta manifestação de aspectos fascistas surgida na década de 1930 tornou-se alvo de importantes pesquisas na segunda metade do século XX, chamando a atenção de outros pesquisadores para a investigação de um campo ignorado e que já fora mesmo rejeitado. Hoje, as pesquisas acerca do integralismo brasileiro são múltiplas e estão espalhadas pelo território adotando diversas abordagens. Mais do que isso, no entanto, existe muito mais fundamentação investigativa disponível sobre outras manifestações alinhadas com posicionamentos da direita política, como bem demonstra esta edição da revista Faces de Clio.
Ainda discorrendo sobre as pesquisas e seus pesquisadores, o dossiê da presente edição se vincula diretamente com uma rede de pesquisa internacional homônima, “Direitas, História e Memória” ( https: / / direitashistoria.net / ). Fruto de um significativo crescimento das investigações acerca das direitas, a rede congrega pesquisadoras e pesquisadores de diversos países que se dedicam a analisar as direitas, no plural, uma vez que não se compreende tal posicionamento político como algo monolítico. A rede de investigação também existe formalmente no Brasil reconhecida como Grupo de Trabalho da Associação Nacional de História (ANPUH) desde 2015, sendo composto por suas células estaduais em Minas Gerais, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e em São Paulo. Desde 2014, no entanto, a rede de pesquisa se manifesta através de eventos acadêmicos e de publicações direcionadas para a temática abordada. Nesta edição da revista Faces de Clio, inclusive, estão presentes textos de vários membros da rede, com destaque para os artigos escritos pelos seus coordenadores gerais, Janaína Cordeiro e Odilon Caldeira Neto, e para um importante membro internacional, Werner Bonefeld, da Universidade de York.
A publicação desta edição acontece em momento muito oportuno para semear as reflexões sobre as direitas. Percebe-se, atualmente, a emergência de atores e grupos políticos que se vinculam com discursos e pensamentos ditos de direita não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Em nosso país, estamos testemunhando um processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff que, para além do mérito do crime sobre a qual é acusada, é significativamente impulsionado por grupos de direita. Em manifestações recentes nas ruas do país, tornou-se evidente, mais uma vez, a dicotomia direita e esquerda. Em caminho preocupante, agravam-se as manifestações de extremismo e de intolerância política. Mas tal condição não é uma particularidade nossa, ela se revela como uma nova onda mundial de conservadorismo. Na América do Sul, países vizinhos como Argentina e Peru já elegeram governantes provenientes das direitas que expressam tal condição de maneira mais contundente. Mais ao norte do continente, Donald Trump ganha espaço na disputa eleitoral pela presidência dos Estados Unidos com discursos agressivos que ameaçam estrangeiros e muçulmanos, por exemplo. Na Europa, a extrema direita tem se tornado mais presente no cenário político, conquistando adeptos e mesmo interesses arrojados, como é o caso da saída do Reino Unido da União Europeia.
Em suma, as ideias das direitas estão presentes nos discursos políticos de vários locais do mundo atual. Ainda que identificadas, é preciso que mais análises se desenvolvam sobre seus conteúdos, principalmente no que se refere a revelar os excessos que extrapolam alternativas sobre modos de condução da economia ou atuação do Estado, mas as perspectivas que colocam em risco os direitos e as liberdades.
A edição que ora se apresenta da revista Faces de Clio traz em seu dossiê uma ampla abordagem sobre tais direitas na história. Nele é possível encontrar análises sobre regimes, movimentos e partidos políticos, religiosidade, gênero, trajetórias, abordagens econômicas e sistêmicas. Oferecendo, assim, uma frutífera contribuição para a compreensão do mundo atual.
Abrem a edição Lívia Magalhães e Janaína Cordeiro, Professoras substituta e efetiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal Fluminense (UFF) respectivamente. As historiadoras analisam a relação existente entre o futebol e as ditaduras militar na Argentina e no Brasil por meio dos discursos de Presidentes que se apropriaram dos êxitos de seus países nas Copas do Mundo de futebol de 1970 e 1978 para fortalecer seus projetos nacionais e seus regimes de governo.
Odilon Caldeira Neto, Professor substituto da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), explora as “novas direitas” no Brasil, analisando as especificidades da Frente Nacionalista, um grupo de orientação neofascista na atual conjuntura de crise política e de polarização ideológica.
Há também uma especial participação do Professor Werner Bonefeld, da Universidade de York – Reino Unido, que, em seu artigo, apresenta algumas de suas reflexões sobre o ordoliberalismo alemão, cuja ideologia é apontada como a orientadora da zona do Euro. Em sua abordagem, o autor recupera as ideias de Carl Schmitt que estão presentes em tal ideologia para ampliar a sua compreensão sobre democracia e estrutura de decisão.
Dialogando com a literatura, Natália Guerellus, pós-doutoranda em História na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), analisa a trajetória política da escritora cearense Rachel de Queiroz, que fez parte em sua juventude do Partido Comunista e, mais tarde, apoiou o golpe de 1964. A autora explicita o pensamento político de uma das mais destacadas escritoras brasileiras do século XX, que, ao longo de sua vida, realizou um notório deslocamento em seu posicionamento no espectro político.
No campo religioso, Alexandre de Oliveira, doutorando em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC / RS), apresenta seus apontamentos sobre a atuação do cardeal Sebastião Leme e os mecanismos adotados pela Igreja Católica frente aos desafios do Estado laico. Atuando nos anos 1930, Dom Leme almejava organizar o clericato brasileiro, assim como as próprias bases da instituição religiosa.
O português George Gomes, doutorando na Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3, contribui com a atual edição abordando a relação intelectual existente entre o português António Sardinha e o brasileiro Gilberto Freyre. O autor tenta elucidar a influência do maior doutrinador da direita portuguesa, ideólogo do integralismo daquele país, em um proeminente intelectual do Brasil no século XX.
Por sua vez, Lidiane Friderichs, doutoranda em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), traz para a análise o neoliberalismo divulgado por meio de uma rede de think tanks, institutos utilizados para divulgação de determinadas ideias políticas e econômicas. A autora aborda suas existências e atuações nos contextos internacional e brasileiro.
Outra contribuição proveniente de uma instituição francesa é a de Marina Duarte, doutoranda em História pela Université Paris Diderot – Paris 7. Em seu artigo, a historiadora mapeia os discursos e os mecanismos de desigualdade que recaem sobre as pessoas trans na França. Marina revela a atuação das instituições médicas, jurídicas e legais e mesmo de certo movimento feminista mais radical que nega o direito de tais indivíduos de se engajarem em seu movimento.
Completando o dossiê, Gustavo Oliveira, mestrando em História na Universidade Federal de Ouro Preto, explora o pensamento do renomado filósofo francês Michel Foucault. Correlacionando suas ideias com a de vários outros autores anarquistas clássicos, a linha condutora da análise do autor baseia-se na questão da autonomia da educação anarquista.
Por fim, encerra a edição a resenha feita por Cecilia Ewbank, pós-graduanda em História pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sobre o livro De Olinda a Holanda: o gabinete de curiosidades de Nassau, de autoria de Mariana Françozo. A obra, que foi publicada em 2014 pela Editora da UNICAMP, recebe uma crítica bem elaborada que se conduz pelo enfoque da trajetória social do gabinete desse importante personagem holandês na história brasileira.
Com isso, acreditamos que a atual edição contribui não apenas com um campo de pesquisa em recente crescimento, mas também com questões e temáticas de importantes reflexões para o mundo atual. Pela via das análises históricas, explora-se a atuação das direitas em diversos segmentos no decorrer dos séculos XX e XXI e suas reinvenções desde a Revolução Francesa, oferecendo maior embasamento para compreensão de suas manifestações contemporâneas.
Nota
1. Obra referencial para o debate acerca das categorias direita e esquerda que é amplamente abordada na historiografia é BOBBIO, Norberto. Direita e Esquerda: razões e significados de uma distinção política. São Paulo: Editora UNESP, 1995.
Julho de 2016
Antonio Gasparetto Júnior
Nittina Anna Araújo Bianchi Botaro
BOTARO, Nittina Anna Araújo Bianchi; GASPARETTO JÚNIOR, Antonio. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.2, n.4, jul. / dez., 2016. Acessar publicação original [DR]
Público e Privado: políticas públicas no Brasil / Faces de Clio / 2016
A Revista Faces de Clio é uma publicação discente, criada pelos alunos de Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora, destinada a divulgar pesquisas desenvolvidas no âmbito da pós-graduação, em universidades do Brasil e do exterior. Nessa terceira edição optamos por reunir todos os artigos sob o prisma do dossiê Público e Privado: políticas públicas no Brasil. Nossa intenção é lançar nosso olhar a um contexto vigente nos últimos anos e refletir sobre os prejuízos e as vantagens da interferência do mercado nos serviços públicos brasileiros. Para tanto, contamos com a colaboração de dez artigos escritos por 11 pesquisadores, divididos da seguinte forma: três textos de mestrandos, dois de doutorandos, e cinco de professores de universidades federais e estaduais, referências em suas temáticas.
Para a análise sobre a saúde pública, contamos com a participação especial de três pesquisadores que se destacam internacionalmente no meio acadêmico como referências na produção de conhecimento da área. Ligia Bahia (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e Mario Scheffer (Universidade de São Paulo) nos privilegiam com uma reflexão sobre as propostas feitas pelos presidenciáveis no ano de 2014. O texto é atual, uma vez que os dois autores não se limitam às questões que antecederam as eleições, expandem suas observações à legitimidade de cada proposta e projetam os desafios a serem adotados. Tão importante como esses dois autores para o prisma da saúde pública, o pesquisador Ignacio Delgado (Universidade Federal de Juiz de Fora) nos oferece uma análise sobre a articulação entre a indústria farmacêutica e a arquitetura dos sistemas de saúde, salientando as implicações que os formatos institucionais dos primeiros acarretam para as modalidades de apoio à pesquisa e à inovação na indústria.
O discente de mestrado Adebiano Rodriguez (Universidade Federal de Juiz de Fora), remete para a centralidade do debate a política de saúde no âmbito das políticas sociais. Completando o cenário da saúde pública, Tiago Siqueira Reis (Universidade Nova Lisboa) apresenta a trajetória da Fundação Oswaldo Cruz, ressaltando dois períodos da instituição: de 1970 a 1988, em que responde pelo direito privado; e de 1988, ano da promulgação da Constituição Brasileira, até 2003, período em que se enquadra no regime de direito público.
Ainda nos temas que versam sobre políticas públicas, mas ultrapassando a análise da saúde, a pesquisadora Katiuscia Vargas (Universidade Federal de Juiz de Fora) nos traz uma reflexão sobre o processo de inclusão escolar das pessoas com deficiência de forma a revelar as contradições e marcas presentes neste processo. A estudiosa pretende refletir sobre a (re)significação do que estamos entendendo por inclusão escolar e, principalmente, para repensarmos a maneira como historicamente a escola vem lidando com as pessoas com deficiências e outras necessidades especiais.
O mestrando em direito, Pedro Ribeiro Viscardi (Universidade Federal do Rio de Janeiro), contribui para a revista com uma reflexão sobre as mudanças institucionais das contrapartidas exigidas no Programa Bolsa Família. Argumenta-se que as condicionalidades da política surgiram por meio de alterações incrementais. Para comprovar essa hipótese, recorre a fontes do Legislativo brasileiro, notícias, artigos e livros.
O dossiê continua com o texto do professor João Assis Dulci (Universidade Estadual de Minas Gerais), no qual o pesquisador tem por objetivo demonstrar como as estratégias de desenvolvimento nacional (década de 1980) sofreram modificações, em consonância com as transformações no regime de acumulação do modo de produção capitalista.
Há três análises em escala mais reduzida, feitas por Lívia Freitas Pinto Silva Soares (Universidade do Rio de Janeiro), Cátia Franciele Sanfelice de Paula (Universidade Federal de Uberlândia) e Yuri Amaral Barbosa (Universidade Federal de Juiz de Fora). A doutoranda Lívia Soares avalia as ações de assistência aos pobres, aclamadas pelos poderes públicos e pela filantropia, no Distrito Federal, entre os anos de 1891 a 1910. Cátia de Paula, doutoranda em História, discute como o Estado vem intervindo no setor pesqueiro por meio de políticas púbicas, evidenciando um processo de mudanças causado por danos ambientais que provocaram novas relações de produção vividas por pescadores na cidade de Guaíra / PR. Por fim, o mestrando em geografia Yuri Barbosa, visa discutir o papel da esfera municipal como gestora ativa no planejamento e na constituição do espaço urbano no final do século XIX. Tendo a cidade de Juiz de Fora como pano de fundo, pretende analisar como se sucedeu a formulação e a execução do primeiro “plano diretor” da cidade, o Plano Howyan, em 1892.
Nosso esforço maior nessa edição foi reunir textos que se preocupassem com a interação entre o setor público e privado, motivando a escrever sobre essa problematização que vem se tornando emergente em vários setores e precisa de um olhar mais atento do campo acadêmico sobre seu desenvolvimento. Embora tenhamos em mãos uma revista nova, na sua terceira edição, cumprimos com nosso objetivo de reunir pesquisadores de diferentes universidades, com produtividade e credibilidade asseguradas pelas agências de pesquisas. O que nos torna ainda mais satisfeitos com nosso trabalho.
Por fim, agradecemos a todos os discentes do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora pelas suas valiosas contribuições na construção desta edição. Aos professores do Programa, nosso muito obrigado pela confiança e pela atenção nas sugestões e críticas, que sempre serão importantes para o crescimento da Revista Faces de Clio. Aos pesquisadores que se dispuseram a escrever, nosso intenso agradecimento.
Janeiro de 2016
Nittina Anna Araújo Bianchi Botaro
Antonio Gasparetto Júnior
BOTARO, Nittina Anna Araújo Bianchi; GASPARETTO JÚNIOR, Antonio. Editorial. Faces de Clio, Juiz de Fora, v.2, n.3, jan. / jun., 2016. Acessar publicação original [DR]
Faces de Clio | UFJF | 2015
A Revista Faces de Clio (Juiz de Fora, 2015-) é coordenada por discentes do Programa de Pós Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (BRASIL).
Desde 2015, tem trabalhado na divulgação dos resultados das pesquisas de doutores e estudantes de mestrado e doutorado em História e áreas afins em âmbito nacional e internacional, sendo avaliados artigos escritos em português, inglês e espanhol.
Periodicidade semestral.
Acesso livre.
ISSN: 2359-4489
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