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Exílios latino-americanos e solidariedade transnacional durante a Guerra Fria | Cuadernos de Historia – Serie economía y sociedad | 2022
Nações parte da OTAN (em azul) e do Pacto de Varsóvia (em vermelho) | Imagem: Wikipédia
Na América Latina, o exílio, entendido como a exclusão de opositores das esferas públicas e do território nacional, foi um mecanismo central da vida política de diferentes países da região desde o período das guerras de independência e a consolidação dos Estados Nacionais no século XIX, até se converter em parte de sua cultura política.1 Do mesmo modo, o asilo, como correlato do exílio, configura se como figura recorrente, primeiro como tradição e em seguida como instituição jurídica, oferecendo proteção internacional por razões políticas.2
As ditaduras que se instalaram no subcontinente durante a Guerra Fria e seus métodos de repressão massivos provocaram a exclusão e a perseguição de dezenas de milhares de opositores políticos e setores descontentes das esferas públicas e das políticas nacionais. Este fenómeno de massificação dos deslocamentos na região começou com o golpe na Guatemala no ano de 1954 e teve sequência com a ditadura de Fulgêncio Batista em Cuba, até se tornar um padrão a partir da década de 1960. Caracterizou-se pela diversificação do perfil dos solicitantes de proteção internacional de asilo frente à inédita situação dos Estados da região que se aproximaram do sistema universal de proteção de refugiados.3 Leia Mais
Los exilios y el mundo intelectual. Una introducción / Intellèctus / 2019
El dossier que aquí presentamos se ubica en el cruce de dos grandes campos de conocimiento: los estudios referidos al exilio y a los exiliados y el campo intelectual y de transformación de las ideas y lenguajes políticos en la historia del siglo XX.
Los intelectuales han sido conceptualizados de múltiples formas y sus características han sido subrayadas de distinta manera de acuerdo a los contextos históricos en los cuales se inscribieron. Enzo Traverso (2014) ha destacado el papel del intelectual como el de un outsider a la vez que como aquel pensador capaz de “tomar un fusil” y expresar un compromiso político público, saliendo del acto de la escritura para confundirse en las calles con la gente en una protesta o movilización. Pero, por otro lado, la figura del intelectual también ha convivido con las imágenes de los “expertos” o “asesores” que, de algún modo, han convocado un carácter neutral u objetivo del intelectual, refiriéndose a alguien con la facultad de elaborar una opinión crítica sobre un hecho o proceso sin atender a su inscripción personal en ese contexto. En este sentido, consideramos importante retomar los trabajos de Edward Said (2005), para quien la práctica intelectual no puede ser pensada por fuera de las condiciones subjetivas e históricas de cada persona y mucho menos en el caso de los exiliados. El exilio, que conlleva momentos de tristeza, de desdoblamiento y rabia con la patria a la que se debió abandonar, conduce también a un estado de “sospecha” sobre el orden de las cosas, a una instancia de desnaturalización de los sentidos comunes sobre el mundo, a un momento de interrogación y de propuesta para la transformación. Leia Mais
Exílios: deslocamentos e transnacionalidade / Projeto História / 2015
O exílio nos compele estranhamente a pensar sobre ele, mas é terrível de experienciar. Ele é uma fratura incurável entre um ser humano e um lugar natal, entre o eu e seu verdadeiro lar: sua tristeza essencial jamais pode ser superada, embora seja verdade que a literatura e a história contem episódios heroicos, românticos, gloriosos e até triunfais da vida de um exilado. E, eles não são mais do que esforços para superar a mutiladora da separação.
A cena se torna mais terrível e lastimável, multidões sem esperança, a miséria das pessoas “sem documentos” subitamente perdidas, sem uma história para contar… negociações, guerras de libertação nacional, gente arrancada de suas casas e levadas as cutucadas, de ônibus ou a pé, para enclaves em outras regiões, o que esta experiência significa? Não são elas, quase por essência irrecuperável?
…o exílio é uma solidão vivida fora do grupo: a privação sentida por não estar com os outros na habitação comunal. Como então alguém supera a solidão do exílio sem cair na linguagem abrangente e latejante do orgulho nacional, dos sentimentos coletivos, das paixões grupais? O que vale a pena salvar e defender entre os extremos do exílio, de um lado, e as afirmações amiúde teimosas e obstinadas do nacionalismo, de outro? O nacionalismo e o exílio possuem atributos intrínsecos? São eles apenas duas variedades conflitantes da paranoia?
SAID, Edward. Reflexões sobre o exílio
A longa citação se justifica pela importância que as questões dos exílios adquirem na nossa contemporaneidade, gerando inquietações sobre territórios, deslocamentos violentos e se constituindo num campos de tensão, violência e xenofobia. Terrível de experienciar, fratura incurável, marco de tristeza insuperável, os exílios arrastam multidões subitamente perdidas, sem documentos e esperança. Desencadeados por guerras, totalitarismos, genocídios e exclusões, milhares são e foram empurrados para derivas por territórios transitórios, vivenciando um descontínuo não pertencimento e enfrentando a urgência da busca por reconstruir a vida, vínculos e sentidos. Estas vagas recentes tornaram o século XXI, a “era do refugiado, da pessoa deslocada, da imigração em massa”. (SAID, 2005)
Desde finais do século XX, que se vivencia um processo marcado pela aceleração das transformações e intensificação dos deslocamentos que enfrentam fronteiras e limites territoriais, provocando crises e tensões internacionais. Estes deslocamentos contemporâneos desfizeram barreiras e criaram um ambiente híbrido, cosmopolita e transnacional, colocando a difícil a tarefa de recuperar uma história que considere os esparsos registros, memórias e reflexões de homens e mulheres que partiram para o exílio – entendido em sentido amplo, não apenas o desterro político. Vivendo na instabilidade e em situações precárias, seria possível dizer que esses outsiders foram sensíveis analistas das crises políticas, econômicas e culturais dos tempos sombrios, a que se refere Hannah Arendt. Sua posição de estrangeiros, apátridas sem raízes os transformou em observadores privilegiados das mudanças – frequentemente vezes dramáticas – que afetaram o mundo e suas próprias vidas.
Os fluxos de deslocados, transitando ideias, saberes e projetos, permanece impactando nossa contemporaneidade e gerando a necessidade urgente de reflexões sobre a historicidade desses processos. Assim, são estas questões emergentes que levaram a publicação deste dossiê da Revista Projeto História, intitulado Exílios: deslocamentos e transnacionalidades.
Este volume apresenta pesquisadores do Brasil e de diferentes países, que analisam aspectos diferenciados da temática, colocando novas indagações, ampliando visões e trazendo contribuições para dinamizar conexões entre história passada e a atualidade. Desta forma, os exílios se constituem num amplo espectro de lutas gerando inquietações e desafiando reflexões, possibilitando a ampliação de um campo de investigações aberto a revelar experiências presentes e passadas, e contribuindo para a renovação temática e metodológica.
Nos artigos deste dossiê despontam exímios conhecedores do seu ofício, são pesquisadores inovadores, com diferentes interpretações e com a proposta de recuperar silêncios e invisibilidades. Para tanto vasculharam arquivos, numa paciente busca de indícios, sinais e sintomas, constituindo um mosaico de referências documentais, cuja análise crítica permitiu esmiuçar o implícito, descortinando o oculto, recobrando criticamente memórias, transgressões e controles, dando visibilidade a múltiplas experiências e práticas culturais. Estes escritos encontram-se fundamentados em investigações meticulosas, eruditas, temperadas pela sensibilidade e criatividade dos autores. Os trabalhos reunidos nesse volume apresentam questões próprias dos estudos sobre a experiência exilar e que são de extrema relevância.
Nos textos de Villares e Jensen o tema da solidariedade entre os grupo exilados é apresentado com especial qualidade, uma vez que as redes de acolhimento são associadas aos projetos políticos que circulam nos espaços transnacionais da América e Europa.
Essas redes de solidariedade reaparecem com força no texto de Teresa Schneider Marques, mas, com a especificidade de tratar de um caso envolvendo exilados brasileiros, mais precisamente exiladas. Marques aponta para a difícil condição do feminino no ambiente do exílio e através de um texto pleno de possibilidades encontra um ângulo de observação original da experiência exilar.
Ressaltando as tensões históricas dos que partiram do Brasil para o exílio, temos no artigo “Do exílio, um futuro para o Amazonas. João Daniel e o aproveitamento das riquezas do rio”, de Fernando Londoño que rastreou a experiência e os escritos dos padres da Companhia de Jesus expulsos do Grão Para e Maranhão no século XVIII. Já em “O exílio de Plínio Salgado em Portugal: a Vida de Jesus e a composição do apostolado político”, Leandro Gonçalves recuperou a trajetória pliniana no exílio. Seus textos demonstram o controle dos autores sobre os temas que analisam e provocam o leitor a refletir sobre as dinâmicas intensas da circulação de ideias, tema próprio do campo dos estudos sobre o deslocamento de intelectuais.
Este volume conta com a entrevista de Daniel Aarão Reis que, nessa oportunidade, faz pela primeira vez um balanço sobre a experiência de seu exílio apontando para esse momento como lugar central na sua trajetória intelectual.
O dossiê se completa com a apresentação das pesquisas sobre o tema que se encontram em andamento, de autoria de Antonio Gasparetto Júnior, Guilherme Ignácio Franco de Andrade e Daniela Adriana Garces de Oliveira. Por fim, a resenha, de Érica Sarmiento da Silva, á obra “Inmigracion y retorno. Españoles en la ciudad de México 1900-1936”.
Ainda se somam no volume os artigos de José Weyne Freitas Sousa,“Secas e socorros públicos no Ceará”; Meize Regina Lucena Lucas, “Cinema e censura no Brasil: uma discussão conceitual para além da ditadura” e de Francisco das Chagas Santiago, “Dos lugares de memória ao patrimônio: emergência e transformação da ‘problemática dos lugares’”.
Este conjunto de escritos preenchem lacunas ao investigar os ocultamentos, recobrando múltiplas possibilidades de vivências e representações, mudanças, permanências, tensões e, quiça, possibilidades e perspectivas.
Boa leitura
Maria Izilda S. Matos
Maurício Parada
30.10.2015
MATOS, Maria Izilda S.; PARADA, Maurício. Apresentação. Projeto História, São Paulo, v.52, 2015. Acessar publicação original [DR]
Exílios: Política, Cultura e Resistência / Projeto História / 2015
Exílios – Política – Cultura – Resistência / Projeto História / 2015
“El exiliado mira hacia el pasado, lamiéndose las heridas; el inmigrante mira hacia el futuro, dispuesto a aprovechar las oportunidades a su alcance.”1 (Isabel Allende)
“Pode-se arrancar o homem de seu país, mas não se pode arrancar o país do coração do homem” (John Roderigo dos Passos)
Exilar-se é desterrar-se. É fratura e rompimento. É um deslocamento involuntário e traz consigo o sentimento de perda. É deixar para trás todo um repertório de afetividades não rompidas, porém distantes geograficamente, isolando o exilado de qualquer contato com seu país de origem. Temporário? Eterno? Uma mistura imponderável de elementos da legislação com acontecimentos do contexto histórico o dirão. Seja qual for a temporalidade, o indivíduo, nessa reelaboração forçada, pelo próprio sofrimento experimentado, já deixa de ser o mesmo. Consequências terríveis provoca o exílio.
Em Atenas, durante a Antiguidade Clássica, o exílio era imposto como defesa da democracia. Chamado de ostracismo, representava uma punição forte, que bania o cidadão por dez anos da convivência com seus pares.
Passados mais de dois mil anos, a política e seu mais cruel desdobramento, a guerra, continuam produzindo exilados, com seus silêncios significativos ou suas falas eloquentes. Diferente do emigrado, o exilado, mesmo aquele auto exilado, é obrigado a vivenciar um sofrimento solitário, no qual as novas relações afetivas, difíceis de serem conquistadas, não substituem a mágoa da ausência das anteriores.
O exilado, não raro, é obrigado a se reinventar completamente, sem esquecer os padrões de cultura que são mantidos pela saudade. Essa palavra intraduzível que, no falar de Lévi-Strauss, remete à rememoração de seres, coisas, lugares, e que é uma tomada de consciência impregnada do sentimento agudo de sua fugacidade. Um aperto no coração que a lembrança de certos lugares, físicos ou da memória, nos mostra que não há, no mundo, nada de permanente e nem de estável em que possamos nos apoiar. Somos, portanto, exilados em potencial.2
Este número da revista Projeto História nos apresenta, neste segundo número da temática “Exílio”, uma importante polifonia de assuntos e interpretações substanciosas de autores que nos fazem vivenciar o significado do exílio.
O dossiê Política, Cultura e Resistência: Exílios é composto por uma gama de estudos que possibilitará a reflexão do pesquisador. O Investigador Titular do El Colegio de la Frontera Sur, Enrique Coraza de los Santos, abre o dossiê com uma visão conceitual em perspectiva comparada sobre o exílio através dos casos na Espanha, México, Argentina e Uruguai. Com o mesmo olhar, a especialista em estudos latino-americanos, Silvia Dutrénit Bielous, identifica nos anos 70 observações pautadas entre México e Uruguai, estabelecendo uma importante reflexão sobre as encruzilhadas do exílio.
Na esfera conceitual, o especialista em história intelectual, Maurício Parada, destaca as várias possibilidades entre esse meio com o exílio, estabelecendo uma vasta relação entre a história, exílio, política e intelectualidade, buscando analisar três trajetórias em especial, Otto Maria Carpeaux, Villém Flusser e Stefan Zweig.
No âmbito do contexto varguista e hitlerista, Marlen Eckl, analisa os efeitos do Decreto-Lei n° 383, de 1938 para os alemães. Partindo desse princípio, no artigo Entre resistência e resignação – as atividades políticas do exílio de língua alemã no Brasil, 1933-1945 é possível verificar os obstáculos que os exilados encontraram no Brasil.
Concluindo a primeira seção, Luis Roniger, destaca a importância analítica do exílio como uma experiência geradora de aberturas conceituais, institucionais e de sociabilidade. No artigo, o pesquisador da Wake Forest University, estabelece algumas reflexões, demonstrando a singularidade do caso brasileiro em uma perspectiva transnacional.
O dossiê conta com Alfredo Moreno Leitão e Geny Brillas Tomanik na seção Projetos, que apresentam resultados de suas pesquisas. O primeiro com aspectos em torno do salazarismo e a segunda com interpretações sobre o exílio espanhol.
Há ainda a resenha de duas obras ligadas a temática do dossiê. Francisco Osvaldino Nascimento Monteiro, apresenta ao público, a obra de Victor Barros, Campos de Concentração em Cabo Verde: As Ilhas Como Espaços de Deportação e de Prisão no Estado Novo, enquanto Estela Cristina Mansilla, apresenta a obra de Silvia Dutrénit Bielous, La Embajada Indoblegable. Asilo Mexicano en Montevideo durante la Dictadura.
Para fechar o número, os editores e organizadores, apresentam três artigos na seção livre. Partindo do Método Documentário de Análise de Imagens, Vinícius Liebel, busca o exercício de análise de uma charge do semanário nacional-socialista Der Stürmer. Luis Carlos dos Passos Martins, objetiva analisar como a imprensa carioca abordou o crescimento acelerado e desordenado das cidades brasileira durante o Segundo Governo Vargas, causando o aumento das “favelas” na Capital Federal e fechando o número Silvia Liebel estabelece uma importante análise, destacando à chamada “guerra dos sexos” nos inícios da impressão na Europa moderna.
Desejamos uma ótima leitura e boas reflexões historiográficas!
Notas
1 “O exilado olha para o passado, lambendo as feridas; o imigrante olha para o futuro, disposto a aproveitar as oportunidades a seu alcance”.
2 LÉVI-STRAUSS, Claude; MENDES, Ricardo. Saudades de São Paulo. Companhia das Letras, 1996.
Leandro Pereira Gonçalves (PUCRS)
Yvone Dias Avelino (PUC-SP)
GONÇALVES, Leandro Pereira; AVELINO, Yvone Dias. Apresentação. Projeto História, São Paulo, v.53, 2015. Acessar publicação original [DR]