Trabalho, educação e correntes pedagógicas no Brasil: um estudo a partir da formação dos trabalhadores técnicos da saúde – RAMOS (TES)

RAMOS, Marise. Trabalho, educação e correntes pedagógicas no Brasil: um estudo a partir da formação dos trabalhadores técnicos da saúde. Rio de Janeiro: EPSJV/Fiocruz; UFRJ, 2010, 290 p. Resenha de: SAVIANI, Dermeval. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v.8, n.3, Rio de Janeiro, nov. 2010.

Licenciada em Química em 1990 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Marise Ramos passou a lecionar a disciplina físico-química no ensino médio e em 1995 concluiu o mestrado com a defesa da dissertação “Do ensino técnico à educação tecnológica: (a)-historicidade das políticas públicas dos anos 90”. Em 2001, concluiu o doutorado mediante a defesa da tese “Da qualificação à competência: deslocamento conceitual na relação trabalho-educação”, da qual resultou o livro A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação?, publicado no mesmo ano de 2001. Entre 2002 e 2010, simultaneamente ao exercício da docência na Escola Politécnica da Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz), na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), desenvolveu vários projetos de pesquisa sobre o tema “trabalho, conhecimento e formação humana” como base teórica para o estudo da educação profissional em saúde. Do projeto “Educação profissional em saúde: concepções e práticas nas Escolas Técnicas do SUS” resultou o livro objeto desta resenha.

A obra trata das concepções, políticas e práticas da formação dos profissionais da saúde. Para o tratamento desse objeto a autora desenvolveu uma densa investigação baseada em fontes primárias colhidas por meio de pesquisa de campo junto aos agentes das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde (ETSUS), apoiada numa ampla e significativa gama de fontes secundárias que lhe permitiram examinar as políticas de formação dos profissionais da saúde como expressão de projetos de formação humana em suas bases filosóficas e pedagógicas.

Cumprida a trajetória da pesquisa, Marise se dedicou à ordenação dos achados tendo em vista a socialização dos resultados alcançados. No método de exposição que guiou a escrita do livro, ela começa por aclarar as políticas que orientaram as ações das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde e, passando por um longo détour, desvela os fundamentos e contradições das concepções e práticas das Escolas Técnicas do SUS reveladas pela pesquisa empírica. Em consequência, o livro se apresenta com a seguinte estrutura:

Após uma introdução em que situa e justifica a escolha do tema, a autora aborda as políticas de formação em saúde no Brasil no período de abrangência do estudo, isto é, entre 1980 e 2000. É essa a problemática tratada no primeiro capítulo denominado “Políticas de educação profissional em saúde no Brasil (1980 a 2000)”, no qual ela aborda a gênese das Escolas Técnicas do SUS, as concepções educacionais em disputa na origem dessas escolas, o Programa de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem, considerado como um diferencial na história das Escolas Técnicas do SUS, e a educação permanente que apresenta novos desafios para as referidas escolas técnicas.

Situado o objeto, a autora dele se afasta momentaneamente em busca das mediações filosóficas dos projetos de formação humana, das concepções de educação e das correntes pedagógicas. São esses os temas tratados respectivamente nos capítulos 2, 3 e 4.

No capítulo 2, “Projetos de formação humana e mediações históricas”, Marise começa pelo trabalho como base da formação humana na medida em que constitui a síntese da essência e da existência do ser humano; prossegue analisando as categorias de trabalho e práxis; e conclui com o estudo da prática e experiência no pragmatismo e na filosofia da práxis.

No capítulo 3, “Sentidos filosóficos e políticos da educação”, são analisadas a pedagogia da essência, a pedagogia da existência e sua superação pelas perspectivas de uma educação orientada pela filosofia da práxis.

O capítulo 4, “Um panorama sobre as correntes pedagógicas”, é dedicado ao estudo das pedagogias não críticas e das pedagogias críticas.

Apetrechada com esses elementos mediadores que asseguram a consistência de sua análise teórica, Marise retorna ao seu objeto sistematizando os elementos captados nos depoimentos dos educadores das Escolas Técnicas do SUS. É esse o objeto do capítulo 5, que examina os fundamentos e contradições das concepções e práticas das Escolas Técnicas do SUS.

Completam a obra as “Conclusões”, nas quais se mostra a não confirmação das hipóteses iniciais, discutem-se as contradições presentes nas concepções dos agentes das Escolas Técnicas do SUS, resumem-se os principais resultados e se fecha a exposição com a constatação de que o referencial epistemológico e etico-político das políticas de educação profissional em saúde vem sendo hegemonizado, desde a década de 1980, pelo pragmatismo associado à micropolítica.

Se a hipótese inicial foi que a emergência da pedagogia das competências como orientação teórica se deveu a um vazio epistemológico e etico-político provocado pela tentativa da educação profissional em saúde de superar a supremacia tecnicista e conteudista no ensino, a conclusão revelada pela pesquisa não confirmou essa hipótese. O resultado a que se chegou indica que, em lugar do vazio epistemológico, aquela tentativa de superação das pedagogias tradicional e tecnicista se desenvolveu apoiada na epistemologia pragmatista na qual se funda o escolanovismo. Consequentemente, nas palavras da autora, “a pedagogia das competências se constituiu em referência para as escolas não em razão de uma lacuna teórica produzida por uma concepção epistemológica e pedagógica sincrética, mas sim pelo fato de essa pedagogia se constituir numa atualização do escolanovismo no contexto de indeterminações da sociedade contemporânea” (p. 276). Assim, em lugar da síncrese, o que se deu foi uma síntese entre o pragmatismo e a micropolítica que impediu a assunção da concepção de educação politécnica e omnilateral pelos trabalhadores das escolas técnicas da saúde.

Mas a autora encerra o trabalho observando que a hegemonia do pragmatismo associado à micropolítica é exercida em meio a contradições teóricas e práticas que, se adequadamente aprofundadas, podem abrir novas possibilidades, entre as quais destaca a perspectiva teórica por ela adotada e enunciada como “o referencial epistemológico e etico-político do materialismo histórico-dialético” que fundamenta a concepção de educação politécnica e omnilateral da formação humana.

Para tratar do tema específico da pesquisa voltado para a compreensão da formação dos trabalhadores técnicos da saúde, a autora ampliou consideravelmente a abrangência do estudo ao fundamentar sua análise em considerações filosóficas sobre o trabalho como princípio educativo, sobre o significado filosófico e político da educação e sobre as correntes pedagógicas.

Destaque-se que Marise Ramos moveu-se de forma segura, guiada pelo método do materialismo histórico explicitamente assumido, corretamente compreendido e aplicado de forma coerente e competente.

Desenvolvendo um trabalho original pelo tema tratado, pelas fontes utilizadas, pela perspectiva teórico-metodológica e pelo método adotado no trato das fontes, na construção da pesquisa empírica e na análise dos resultados, a autora traz contribuições importantes para fazer avançar o debate sobre as relações entre educação e trabalho de modo geral e, especificamente, sobre a educação profissional.

Considerando o recorte temático, o livro interessa de modo imediato e direto aos profissionais da saúde, com destaque para os professores e alunos das escolas técnicas de saúde, além dos pesquisadores, professores e estudantes de pós-graduação da área de Educação e Trabalho. No entanto, como situa a questão específica no quadro mais amplo da fundamentação filosófica, política e pedagógica referente à relação entre educação e trabalho e às correntes pedagógicas, esta publicação interessa a todos os que trabalham no campo da educação profissional, da política educacional, da história e filosofia da educação e das teorias pedagógicas.

Em suma, pela atualidade, originalidade e relevância do tema tratado, assim como pela clareza e consistência da fundamentação teórica, o livro Trabalho, educação e correntes pedagógicas no Brasil: um estudo a partir da formação dos trabalhadores técnicos da saúde, de Marise Ramos, traz uma contribuição importante para um melhor entendimento do momentoso problema da educação profissional e se constitui num material de grande utilidade para as atividades de gestores, professores e estudantes das escolas técnicas, dos cursos de pedagogia e demais cursos de formação de professores.

Dermeval Saviani – Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), São Paulo, Brasil. E-mail: dermevalsaviani@yahoo.com.br

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Homo Zappiens: educando na era digital – VEEN; VRAKKING (C)

VEEN, W.; VRAKKING, B. Homo Zappiens: educando na era digital. Trad. de Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2009.  Resenha de: PETARNELLA, Leandro; GARCIA, Eduardo de Campos. Conjectura, Caxias do Sul, v. 15, n. 2, p. 175-179, Maio/Ago, 2010.

A sociedade está em permanente metamorfose. Na atualidade, a força motriz das transformações sociais são as novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Por consequência, educar crianças que se desenvolvem em uma sociedade alicerçada nessas novas tecnologias se torna uma tarefa tão difícil quanto arriscada, uma vez que essas enfrentam dificuldades em se ajustar ao sistema educacional atual, dadas suas íntimas relações com a tecnologia.

Partindo das considerações acima, Wim Veen e Ben Vrakking tecem no livro Homo Zappiens: educando na era digital, suas reflexões sobre um tema atual e polêmico: o papel da escola e da educação em uma sociedade tecnológica. Reflexões essas delineadas em 137 páginas, divididas em seis capítulos: “Tempos de Mudança” como primeiro capítulo; “Conhecendo o Homo Zappiens” como segundo capítulo; “Entendendo o caos” apresentando o terceiro capítulo e como quarto capítulo “Aprendendo de maneira divertida”. “Parando a montanha russa” (5º capítulo), antecede o sexto e último capítulo “O que as escolas poderiam fazer”.

No primeiro capítulo “Tempos de mudança”, os autores discorrem sobre alguns momentos nos quais a sociedade se viu diante do terror do bug do milênio, apresentando de forma fácil a necessidade de um novo saber sobre o velho conhecimento, para que se resolvam os problemas tecnológicos atuais. Segundo os autores, o bug do milênio levou o homem a refletir sobre sua consonância vivencial com a tecnologia, em vista de que a mesma se tornou uníssona em seu cotidiano juntamente com suas responsabilidades vitais. Por meio dessa necessidade, pode-se entender por que os autores denominaram a nova geração como Homo Zappiens.

Para exemplificar a denominação e levar o leitor à reflexão, os autores propõem uma narrativa ficcional, cuja personagem é nominada como Jack. A figura dramática de Jack, ambientalizada numa situação cotidiana, se vê num cenário tecnológico cujos objetos que o circundam conduzem sua vida. Nesse cenário, encontram-se aparelhos que se tornaram íntimos demais para nos desvencilharmos de seus objetivos, ou seja, aquilo que há três mil anos era algo impulsionado pelo músculo-força-cinética hoje é tecno-mecânica-elétrica.

Por meio de Jack podemos perceber que, com o desenvolvimento tecnológico, aquilo que no passado era usufruto de alguns, hoje se massifica transcendendo fronteiras, tempo e espaço. Os autores exemplificam essa facilidade de comunicação colocando Jack numa situação corriqueira: A personagem Jack encontra-se atrasada para o trabalho e parada no trânsito, a metros de distância de seu local de trabalho. Jack, então, se comunica por meio de um celular com sua secretária e, logo em seguida, atende um cliente, tudo isso por meio de um click.

Não é só o click que nos leva às facilidades na comunicação, mas tudo o que nos cerca: televisão, rádio, computador, etc. O fato é que não basta reconhecer que a tecnologia facilita o cotidiano do homem, mas que essa tecnologia, como parte da vida do homem, faz desse homem mais homem na representação social; melhor dizendo, um homem mais sábio, atualizado, antenado, zap. Em outras palavras: a tecnologia que se apresenta é parte da personalidade, de uma essência humana tecnológica, pois o homem contagia-se e se torna complacente com a tecnologia, passando, com o uso dela, a administrar seu “eu”. Desse modo, o tempo passa a ser um estimado bem, que iminencia um tempo em que viver os segundos e produzir nos segundos faz a diferença. Nessa perspectiva, o tempo deve ser administrado de forma orbital e tecnológico, pois, no labore, a postura perante qualquer equipe de trabalho deverá desenvolver e reconhecer o capital humano como meio para se dilatarem as possibilidades de crescimento. O Homo Zappiens se revela como um ser tecnologizado, cujo cotidiano faz dele alguém renovável, flexível como os autores tratam no capítulo seguinte.

No segundo capítulo “Conhecendo o Homo Zappiens”, os autores explanam sobre o comportamento das crianças que representam esses sujeitos, cujo cognitivo é delineado pelas tecnologias e suas convergências. O Homo Zappiens, sendo sujeito hodierno, age de forma dispersa ao olhar dos educadores, que, porém são, na verdade, multifuncionais, o que os leva a observar de forma rápida alguns diferentes meios tecnológicos, tais como, o celular, o MSN, a televisão, o rádio, etc. Nesse aspecto, as gerações tecnologizadas se concebem como a geração de rede, a geração digital, a geração instantânea e, entre tantas outras nominações, a cibergeração. Nessa perspectiva, os Homo Zappiens, por meio de um click, acessam e navegam instantaneamente em qualquer lugar e em qualquer tempo e, nesse navegar, plugam-se em jogos interativos, salas de bate-papo, ciberencontros, etc.

A diferença entre o Homo Zappiens e as outras gerações, segundo os autores, é concebida por meio do modo como ambos se relacionam com as tecnologias: os Homo Zappiens se tornam íntimos da tecnologia, porque aprendem numa relação de intimidade que se contextualiza pela prática e pela experimentação da tecnologia, enquanto as outras gerações se submetem às instruções para depois efetuar operações tecnológicas. Desse modo, as novas gerações têm um desenvolvimento tecnocognitivo enquanto às outras gerações, o real se baseia na instrução para a aprendizagem.

Dando continuidade a ideia de Homo Zappiens, o terceiro capítulo: “Entendendo o caos”, aborda a forma como as crianças da atual geração se familiarizam com a tecnologia. Sendo essa facilmente utilizada no cotidiano dos indivíduos, os Homo Zappiens visualizam na tecnologia uma possibilidade de socialização, o que ocorre por meio de jogos de LAN e mensagens instantâneas, ou seja, aquilo que para muitos (de gerações passadas) pode ser considerado um caos. Para os autores é o desenvolvimento da habilidade icônica, a de tarefas múltiplas, de zapear e a de colaboração que diferencia o Homo Zappiens dos demais sujeitos de gerações passadas. Entendamos por meio da ideia dos autores que, enquanto as gerações passadas assistiam a filmes observando a história e a interpretação, os Homo Zappiens decifram e compreendem como cada cena foi elaborada. Decifrar a tecnologia empregada é o grande desafio da tecnogeração, isto é, para ela construir o conhecimento. O mesmo ocorre, por exemplo, com o processo de leitura, cujos olhos atentos aos  vários ícones nas páginas da NET saciam a ânsia de aprender desses indivíduos, pensadores digitais.

Avançando o pensar, no quarto capítulo: “Aprendendo de maneira divertida”, os autores apresentam o homem como alguém que entende o aprender e o concebe por meio de uma verossimilhança entre o jogar. A interação virtual ou real tem como essência a potencialidade investigativa. Assim, para os autores, aprender é a capacidade de observar o meio e seu entorno, é adaptar-se às transformações ocorridas, é retransformá-lo. Desse modo, o Homo Zappiens vê e vive a interação por meio do contato e do convívio com a tecnologia-interativa ou a interação-sócio-humana. Mesmo porque o novo nada mais é que velhos processos reprojetados por novos meios, novas ferramentas.

Diante do contexto até aqui apresentado, os autores referem que o processo de aprender pode advir de duas concepções: a primeira proposta parte do senso comum e concebe a aprendizagem como um processo permanente no cotidiano de cada indivíduo; a segunda propõe que a aprendizagem se efetive por meio de níveis e que nem sempre a experiência evidencia aprendizagem. O Homo Zappiens aprende de forma que sua autonomia se evidencie, inclusive, por meio da escolha daquilo que se quer aprender e como se quer aprender. Nesse aspecto, podemos considerar que a nova geração fica atenta ao que aprende, por que aprende e, principalmente, como aprende, sendo essa forma a força motivadora da conduta dos Homo Zappiens, conforme relatam os autores no quinto capítulo Parando a montanha russa.

No sexto e último capítulo: “O que as escolas poderiam fazer”, os autores propõem que a escola, sendo meio para sistematização da educação e da aprendizagem, deve atender aos interesses e às necessidades da sociedade, entre esses: a necessidade de acompanhar ou preconizar as tecnologias inerentes aos avanços da sociedade. Partindo dessa concepção de escola, os autores propõem uma leitura da metodologia utilizada na educação atual, meio de poder que linearmente se desenvolve para que as pessoas se tornem emergentes, o que denota transformar-se de dominado em dominante. Assim, se concebe a escola como um espaço que se apropria das tecnologias e evolui para que essas estejam a serviço da emancipação do homem como sujeito autônomo, que se permite experimentar o novo a todo instante.

Nessa proposta de cenários educacionais, os autores propõem uma reflexão sobre quatro eixos cênicos: inovação, marketing, perseverança e melhoria o que implica uma maior liberdade de escolha no trajeto educacional de cada indivíduo. Os respectivos eixos devem ser construídos por meio de um novo design pedagógico, cujos professores devem ficar atentos aos desafios do novo a todo instante, sendo esse novo não só conhecer as novas tecnologias, mas dar espaço às novas atitudes educacionais, dentre elas, a atitude de confiar nos alunos no que tange ao fazer, ao querer e ao cumprir com liberdade, tendo como vértebra educacional o talento e a habilidade do Homo Zappiens, de estar imerso naquilo que faz, quando se apaixona pelo que faz. Desse modo, a organização e a formatação das avaliações devem, também, se modificar para dar espaço a mudanças significativas, mudando matérias em temas, avaliações em desafios, escrita em imagens…

Transformando as reflexões em um tecido orgânico, no comentário final, os autores propõem uma reflexão sobre os assuntos abordados, não esperando que o leitor aceite passivamente as ideias explicitadas no livro, ao contrário, recorrem sabiamente a todo critério de liberdade apresentado no decorrer do livro Homo Zappiens: educando na era digital, para concluir que, enquanto a geração Homo Zappiens for julgada por meio dos velhos paradigmas, nunca compreenderemos como essa geração brinca e se comunica, o que, na verdade, representa uma fonte de informações para que possamos lidar com nosso futuro digital e criativo.

Referências

VEEN, W.; VRAKKING, B. Homo Zappiens: educando na era digital. Trad. de Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2009. 141 p.

Leandro Petarnella – Professor na Universidade Nove de Julho (Uninove/SP). Mestre. Doutorando em Educação pela Universidade de Sorocaba (Uniso/SP) e em Administração pela Uninove/SP. Desenvolve pesquisas relacionadas à tecnologia e ao cotidiano escolar. E-mail: Leandro_66@hotmail.com

Eduardo de Campos Garcia – Professor na Universidade Nove de Julho (Uninove/SP). Mestrando em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo. Especialista em Magistério do Ensino Superior pela PUCSP. E-mail: prof.eduardocg@bol.com.br

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Games em educação: como os nativos digitais aprendem – MATTAR (C)

MATTAR, João. Games em educação: como os nativos digitais aprendem. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010. Resenha de: PESCADOR, Cristina M. Conjectura, Caxias do Sul, v. 15, n. 2, p.191-195, Maio/Ago, 2010.

Em suas 181 páginas, o livro Games em educação: como os nativos digitais aprendem, escrito por João Mattar e publicado pela Pearson Prentice Hall, 2010 (SP), oferece uma leitura agradável e esclarecedora, por vezes provocante, abrangendo pesquisas sobre jogos eletrônicos e computacionais – games como o autor prefere generalizar – e o processo de ensino e aprendizagem.

Com ilustração de Alexandre Mieda, a capa do livro chama a atenção para a imagem estilizada de um jovem sentado em frente de uma tela de computador, interagindo com o equipamento e, a seu lado, na escrivaninha, estão dispostos diversos tipos de games, com seus consoles e joysticks ou modelos portáteis.

O livro tem prefácio escrito pelo Prof. Dr. David Gibson, ele próprio um pesquisador do tema, desenvolvendo estudos sobre jogos e simulações digitais na educação, na Universidade de Vermont (EUA), e tendo ministrado cursos sobre jogos, simulações e aprendizagem e sobre Second Life na Boise State University e como professor convidado na Korea National University of Education.

O autor, João Mattar, tem formação acadêmica em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) e Bacharelado em Letras pela Universidade de São Paulo (USP). Com Mestrado em Tecnologia Educacional pela Boise State University (EUA) e Doutorado em Letras pela USP, dedica-se à pesquisa na área de tecnologias aplicadas à educação, tendo desenvolvido material didático para a área de Educação a Distância (EAD). Faz das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) um meio de divulgação de seu trabalho, através do blog De Mattar (http://blog.joamattar.com) e do hábito de manter atualizações constantes em seu perfil em redes de relacionamento como o facebook e o twitter. Com isso, é possível acompanhar suas “andanças no mundo acadêmico”, pois, através desses recursos, o autor informa suas leituras, sua participação em eventos, palestras e, recentemente (abril/2010), divulgou um curso com a temática do livro: Games em Educação, hospedado no Second Life. É também com essas postagens que o autor mantém um canal aberto para novos contatos em sua rede de networking1 e para divulgar suas atividades acadêmicas.

Um exemplo desse uso das redes de relacionamento e das TICs é o modo como o livro Games em educação: como os nativos digitais aprendem foi amplamente anunciado pelo autor em seu blog, em seu perfil de facebook, em listas de discussão do Google groups, coordenadas por ele e através do twitter, sendo a informação repassada pelos internautas através dos mesmos meios.

O livro foi organizado em duas partes principais: a primeira, sob o título “Conceitos e teorias”, compreende três capítulos: (1) “Estilos de aprendizagem dos nativos digitais”; (2) “O uso de games em educação”; e (3) “O novo design instrucional para os nativos digitais”. Na segunda parte do livro, “Games na prática”, o Capítulo 4 discorre sobre “Design e produção de games educacionais”; o Capítulo 5 trata de “Experiências no Exterior”; e o Capítulo 6 apresenta “O cenário no Brasil”. Ao cabo, o leitor tem acesso a dois apêndices com exemplos práticos: o primeiro apresenta uma análise desenvolvida pelo autor enquanto estudava jogos na Boise State University, “Aprendendo matemática com Yu-Gi-Oh! para PS2”, e o segundo apêndice apresenta alguns pontos sobre “Second Life e educação”. Para os professores que optarem por adotar o livro em suas aulas, há um Companion Website, que consiste em um endereço eletrônico onde é possível encontrar material de apoio para as aulas, tais como, apresentações em power-point, resenhas escritas por ele sobre as obras citadas no livro e muitos outros links úteis.

Em sua introdução ao livro, Mattar critica a escola atual e apresenta ao leitor seu entendimento de que “o aprendizado necessita de motivação para um envolvimento intenso, o que é atingido pelos games”. (2010, p. xiii). Ele fundamenta essa afirmação com teorias que entendem a aprendizagem como resultado de ações colaborativas e em estudos sobre a utilização, por exemplo, de games online multiusuários, que exigem que seus jogadores saibam trabalhar em grupo e estejam dispostos a aprender com seus colegas.

Amparado em autores como o educador e pesquisador americano Prensky, que cunhou a expressão “nativos digitais”, o autor provoca o leitor em toda a extensão do seu livro, convidando-o a repensar seu posicionamento em relação aos games e videogames, apresentando uma grande compilação de textos e pesquisas sobre o tema, incluindo trabalhos desenvolvidos no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa, a partir dos quais o autor vai tecendo suas próprias concepções e ideias. A rede de conceitos e teorias sobre aprendizagem, estilos de aprendizagem e games que Mattar constrói é tão complexa e intrincada, que, por vezes, fica difícil para o leitor distinguir os limites entre os autores que estão sendo citados por ele e suas próprias palavras. No entanto, há momentos em que ele mesmo desfaz essa teia, esclarecendo e destacando aspectos importantes, reconstruindo a evolução de determinados conceitos historicamente e despertando no leitor certo sabor de “quero mais”. Ao término de cada capítulo, esse desejo e essas dúvidas podem ser saciados ou esclarecidos através de uma vasta bibliografia, onde Mattar indica livros, artigos, pesquisas, tanto no formato impresso, como em endereços eletrônicos.

O trabalho de Mattar se destaca pela ênfase que dá aos estilos de aprendizagem da nova geração, nascida em meio a computadores, internet, videogames e outros tantos recursos digitais. São os “nativos digitais”, ou seja, jovens que incorporaram os recursos e as mídias digitais em seu cotidiano de tal forma que sequer os percebem como tecnologia. Para eles, o acesso à informação que precisam deve ser rápido, quase imediato e, por isso, muitas vezes recorrem à internet e a ferramentas de busca antes de pesquisarem em meios impressos tradicionais. Utilizam para isso seus computadores ou aparelhos celulares, que também servem como tocadores de mídia (música e vídeo) e canais de comunicação com seus amigos através das ferramentas de comunicação e mensagens eletrônicas do tipo Messenger, mensagens de texto nos celulares, etc.

Na opinião de Mattar e dos inúmeros autores que ele cita no seu texto, buscando suporte para seus argumentos (Prensky, Oblinger e Oblinger, Papert, entre outros), as experiências desses jovens com as mídias digitais representam uma transformação significativa na forma como eles aprendem e produzem conhecimentos. Ele destaca o game como um importante sinalizador dessas transformações, distinguindo-o de outros recursos midiáticos anteriores a eles, desde programas de TV até CD-ROMs, pois o jogo não permite a passividade (característica de tais recursos) diante dos quais, muitas vezes, o jovem era convidado apenas a assistir a alguma ação na tela da TV ou interagir de forma reativa, clicando para dar sequência a alguma ação na tela do computador com o CD-ROM. Com o game, a interatividade é mútua, sendo o jovem constantemente convidado a participar de forma ativa e estratégica, instigando sua criatividade e capacidade de análise, na busca de soluções e o motivando a progredir em suas conquistas, seguindo para novas fases do game, com novos desafios a vencer.

No entanto, Mattar observa que essas habilidades parecem não estar sendo valorizadas nas escolas, sendo o game e a diversão deixados do lado de fora enquanto os sistemas educativos perpetuam a separação de um mundo de coisas que se faz “dentro e fora da escola”. Para ele, as ações presentes nos games permitem que os jogadores possam ressignificar imagens e objetos de outros games, usando suas descobertas anteriores na manipulação de situações atuais. Explorando o mundo do game, as regras se tornam aparentes e, à medida que joga, o jogador vai aprendendo. O autor vê esse comportamento como algo peculiar dessa geração dos “nativos digitais”, caracterizando seus estilos de aprendizagem com base em ações interativas e colaborativas e, em seu livro, literalmente convida outros autores e pesquisadores para conversarem com ele sobre esse assunto, buscando respaldo teórico e científico para o que ele entende ser o modo com que os nativos digitais aprendem. Para ele, o game é muito mais do que uma atividade lúdica: pode ser um recurso didático a favor da educação, focado no processo de construção, cujo caminho pode ser determinado pelo próprio aluno, em conjunto com seus pares e sob a orientação atenta de professores e educadores.

Assim, o autor convida seu leitor/educador a pensar e a repensar suas próprias práticas diárias, a refletir sobre a importância dos estilos de aprendizagem e das peculiaridades dos jovens que chegam às nossas salas de aula hoje e dos paradigmas que surgem com essas mudanças. Sua viagem pelo amplo universo de pesquisas, realizadas na área, lança uma luz sobre novas ideias e considerações em direção a um novo design instrucional, a partir do qual se possa dar voz aos “nativos digitais” nas discussões e buscar atender à necessidade de preparar profissionais para trabalharem em educação com esses novos desafios a enfrentar.

Mattar nos convida a manter a mente aberta a mudanças e reconhece que há uma concordância mais ou menos generalizada quanto à necessidade de que essas mudanças ocorram. As mídias digitais podem ser uma nova direção a tomar, especialmente o game, mas, para isso, ele afirma que “é preciso um trabalho de evangelização” (p. 148), trabalho que ele toma para si, na tentativa de divulgar não apenas sua própria visão de possibilidades voltadas a um ensino simultaneamente sério e divertido e que leve em consideração os estilos de aprendizagem dos alunos da geração dos “nativos digitais”, mas também de fornecer ao leitor curioso novas fontes de consulta e, quem sabe, conquistar adeptos para sua proposta de mudar o futuro, respeitando as capacidades e os potenciais dos alunos.

Nota

1 Termo utilizado para se referir à tentativa de construir uma boa rede de relacionamentos dentro da sua área de atuação.

Referências

MATTAR, João. Games em educação: como os nativos digitais aprendem. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010. 181 p.

Cristina M. Pescador – Professora de Inglês no Programa de Línguas Estrangeiras (PLE) da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Especialista em Educação a Distância. Mestre em Educação pela UCS. E-mail: cristina.pescador@ucs.br

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Abecedário: educação da diferença – CORAZZA (ER)

AQUINO, Julio Groppa; CORAZZA, Sandra Mara (Org.). Abecedário: educação da diferença. Campinas, SP: Papirus, 2009. Resenha de: MENEZES, Antonio Basilio Novaes Thomaz de. Abecedário: educação da diferença. Educação & Realidade, Porto Alegre, v.35 n.2, p.323-326 maio/ago., 2010.

Vocábulo da língua portuguesa, abecedário significa alfabeto: um “conjunto de signos gráficos, letras e diacríticos utilizados para representar os sons de uma língua”, ou, ainda, na forma vernacular, “qualquer sistema de signo gráficos, visuais ou sonoros”, de acordo com o Dicionário Larrousse. Isto por si só bastaria para enunciar todo o conteúdo pressuposto no título, não fosse o livro um esboço da construção coletiva e individual de todo um vocabulário inerente àquilo que lhe complementa o significado com a expressão educação da diferença. Entretanto, não se trata aqui de mais uma simples coletânea que reúne textos de diversos autores ou uma coleção de vocábulos e temas dispersos agrupados num volume. Trata-se, antes de tudo, de uma obra, um constructo que traduz, na decomposição da ordem vocabular, a composição da multiplicidade, dos múltiplos significados dos verbetes e do próprio léxico, daquilo que emerge cifrado como a composição de muitas vozes, no desafio de uma nova forma de pensar a educação.

A referência à forma típica dos dicionários, inclusive daqueles específicos à Filosofia e à Educação, revela uma inversão do significado do termo abecedário, subvertendo o estatuto estabelecido na sua própria lógica de ordenação. Heterogênea e heterotópica, a série alfabética das noções, dos conceitos e dos temas rabisca as primeiras letras daquilo que se experimenta como educação da diferença frente à concepção modal da educação vigente.
A capa negra com letras brancas apresenta o Abecedário na forma invertida de um espelho refletido nas letras negras das suas páginas brancas. Seus detalhes gráficos em cinza e em vermelho apontam para a norma e seu avesso, seja num retângulo cinza destacando o prefixo ab, neste caso prefixo da ausência na ordem do alfabeto, seja nas letras em vermelho que singularizam a educação da diferença. Isto que, na última capa às costas do volume, já prenuncia “33 autores imaginando e fabulando em 46 verbetes, as questões: O que é a educação? O que é a pedagogia? O que é pensar?”.

Urdidura em rede, a coletânea dos temas que lhe servem de conteúdo desenha um labirinto cujo descentramento das diferentes formulações constitui um ponto de fuga no quadro dos postulados teóricos. Neste, o pensamento se lança livre, formando constelações de noções e conceitos em torno do que se pode chamar de um plano projetivo da educação pela diferença. As questões apontam marcos de referência, sem qualquer pressuposto de identidade, numa cartografia de imaginações e fabulações que descrevem a leitura como um espaço da produção do pensamento.

A leitura do Abecedário constitui um desafio para o leitor que caminha pelas primeiras letras e se introduz na dinâmica de construção do pensamento. O livro produz novas séries de sentidos, configurados no uso dos parênteses, por exemplo, em verbetes como: “(o) Fora”, “(o) Que é a Filosofia?”, “(o) Que é a Pedagogia?”, “(o) X da questão”, que correspondem às diferentes formas de subversão do código ou de elisão da ordem na gramática do significado em verbetes como “Regimento (escolar)”, “(des)Territorialização” ou “(trans)Valoriz- ação do magistério”.

O livro exige do leitor colocar-se na condição da criança que, frente ao fascínio quase mágico das letras, põe-se a brincar com elas, não fossem elas imaginações e fabulações experimentadas como conceitos nas diferentes dimensões do seu conteúdo. O Abecedário tem como precondição de leitura a liberdade de pensar.

Universo tridimensional das constelações de noções e conceitos que lhe dão volume à perspectiva da educação da diferença, a obra compõe as peças de um quebra-cabeça nos seus diferentes modos de montar. Tomada sob o eixo tríplice das suas questões centrais, a perspectiva da diferença é aquela do múltiplo, daquilo que se lhe apresenta como superfície e se lhe configura como dado, expectativa ou probabilidade de um significado. O Abecedário resiste à redução dos cânones, incapsulável na sua totalidade fragmentada.

Muitas são as matrizes encontradas na construção da obra: Filosofia, Literatura, Semiótica, cinema… Desde a inspiração do título, no “Abécédaire” de Deleuze, cujo pensamento perpassa a obra, até as vozes recorrentes de Nietzsche, Platão, Bergson, Foucault, Espinosa, que ressoam em algumas páginas; bem como nas passagens ocasionais por Kafka, Barthes, Pessoa, Borges, Pasolini e Artaud, apenas para citar algumas notas; o livro mostra a sua originalidade na dodecafonia da sua composição. Antes, daquilo que num primeiro movimento nos parece inaudível.

Uma após a outra as letras se sucedem no Abecedário, e os verbetes multiplicam-se, incitando as imaginações às novas fabulações. Há uma superfície na qual se organizam os enunciados dispersos. Auto-organização da vida, da matéria do pensamento… Há, na forma de interação das partículas, uma correspondência entre os diferentes níveis de organização da matéria e aqueles que são possíveis na leitura do livro.

As questões centrais do livro (“O que é a educação?”; “O que é a pedagogia?”; “O que é pensar?”) divisam o horizonte de um enquadramento teórico, matriz histórica do pensamento educacional e fundamento da sua concepção moderna. As perguntas pelo significado da Educação e da Pedagogia como propostas do seu conteúdo remetem à distinção destas em fins do século XIX e início do século XX, tal como aparece, por exemplo, em 1885, no “Cours de pédagogie theórique et pratique”, de Gabriel Compayré. Deste modo, a pergunta pelo significado de ambas recoloca a questão do caráter da Educação como formação e da prática que define o ensino como ato pedagógico na sua acepção genérica.
De outro modo, na esteira da tradição consolidada, a divisa da educação da diferença produz a ruptura com a épistèmé moderna, quando no seu próprio quadro de definições coloca a pergunta pelo significado do pensar: “O que é pensar?”. A pergunta se põe à própria condição do pensamento como exercício e de invenção da Educação como esforço de criação do novo. Ela parte da existência do pensamento na Arte, na Ciência e na Filosofia, possibilitando, por um lado, interferências, repercussões e ressonâncias; ressaltando, por outro lado, as especificidades dos saberes, suas questões e condições próprias. Exercício do pensamento… Jogo de adivinha… Experimento mental… Afinal… O que o livro tem a dizer?

A composição da obra corresponde às variações possíveis em torno da leitura e aproximações do que se pensa diferença. Fragmentos da criação de um mosaico, totalidade fragmentada, possibilidades de séries e séries de possibilidades, o Abecedário se define nos modos de usar.
Lê-lo é colocar-se sob a perspectiva da exterioridade, do exercício do pensar a educação da diferença, a partir dos encontros, das conexões, das intercessões, das articulações e dos agenciamentos, tanto no domínio educacional quanto em conceitos, noções e elementos de outros domínios.

A leitura constitui-se num jogo probabilístico; dentre muitos, uma possibilidade de se estabelecer uma gramática própria ao Abecedário, a partir das suas redes de relações. Estas que relacionam os conceitos aos vocábulos do pensamento; as áreas de vizinhança aos outros domínios do saber; os substantivos à produção da materialidade do processo; as adjetivações à expressão das especificidades, às aproximações; e, por fim, os próprios verbos, a todo o processo da criação. Assim, a gramática fragmentada articula na forma da sintaxe vocabular a instância da criação de novos significados, assinalados em verbetes como “Rizoma”, cujo conceito aponta para o duplo aspecto do modelo e decalque transcendente, da configuração da identidade simultânea ao processo imanente da produção da diferença e da singularidade no domínio educacional.

Paralelo aos conceitos, a mesma gramática permite áreas de vizinhança nas quais as intercessões reverberam nos verbetes, a exemplo de “Plano” e “Zero”, oriundos de outros domínios, estabelecidos numa nova perspectiva, em torno de problemas específicos postos em relações topológicas e de variação de posições. Ei-los então, os conceitos de “Plano” e “Zero”, que atravessam o domínio da educação naquilo que concerne à prática e à vivência.

De outro modo, verbetes como “Sala de aula”, “Universidade”, “Máquina”, “Xerox” denunciam os substantivos na materialidade das práticas, daquilo que se faz por materializar a produção de objetos ou de um sistema d objetos que compõem o quadro da Educação. Emolduramento de uma percepção da realidade, aos substantivos se seguem as adjetivações como forma de sintaxe do que se apresenta e decorre da materialidade dos objetos em sistema, isto é, os referenciais da identidade avaliados na superfície em que se encontram, a exemplo dos verbetes “Sociedade de controle”, “Tecnologia educacional”, “Metodologia do ensino”, “Formação de professores”, “Inclusão escolar” etc.
A gramática fragmentada dos verbetes possibilita ainda uma leitura na direção daquilo que o Abecedário indica como “Zona de variação contínua”, de diferentes forças que interagem, constituem e atravessam o espaço da produção. Outros verbetes, como “Univocidade do ser”, “Geologia da moral” e “Esquizoanálise” são expressão de agenciamentos e conexões sobre aquilo que o pensamento suscita na prática educacional, por meio de novas aproximações, que permitem vislumbrar a perspectiva da diferença.

Assim, na diferença e na repetição dos verbetes, encontram-se os verbos “Aprender”, “Brincar”, “Ensinar”, fragmentos centrais nesta gramática de leitura processos afirmativos que caracterizam a singularidade no cerne da criação, daquilo que se reúne em torno da educação da diferença: devir.

Antonio Basilio Novaes Thomaz de Menezes – Editor da Revista Saberes: Filosofia e Educação. É chefe do Departamento de Filosofia, professor do Programa do Pós-Graduação em Educação, membro do Grupo de Pesquisa Fundamentos da Educação e Práticas Culturais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: gpfe@ufrnet.br

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EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Em Foco EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A revista EaD em Foco (2010-) é uma publicação científica em formato eletrônico, sem custos envolvidos no processamento ou publicação, com periodicidade contínua da Fundação Cecierj e do Consórcio Cederj. Tem como principal finalidade difundir a produção acadêmica de pesquisadores da área de educação a distância (EaD), inseridos em instituições do Brasil e do exterior.

Estão entre suas atribuições:

  1. Abordar as questões conceituais e metodológicas, bem como os desenvolvimentos da pesquisa, aplicada ou teórica, na área de educação a distância (EaD);
  2. Difundir a produção científica de pesquisadores da área de educação a distância (EaD), inseridos em Institutos de pesquisa e de educação superior no Brasil e no exterior;
  3. Propiciar um espaço para o debate teórico acerca de áreas de enfoques específicos.

Periodicidade anual (fluxo contínuo)

Acesso livre

ISSN 2177 8310

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Do MEB à WEB: o rádio na educação – PRETTO; TOSTA (RF)

PRETTO, Nelson De Luca; TOSTA, Sandra Pereira (Org). Do MEB à WEB: o rádio na educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. 207p. Resenha de: CASTRO, Fernanda Carla. Revista FACED, Salvador, n.17, p.123-127, jan./jun. 2010.

“A rádio, como nunca antes, é muito mais que somente rádio”, afirma o pesquisador Guillermo Orozco Gómez (Universidade de Guadalajara), no prefácio do livro Do MEB à WEB: o rádio na educação. Organizado pelos pesquisadores Nelson De Luca Pretto e Sandra Pereira Tosta1, a publicação reúne pesquisas nacionais e internacionais que tratam do rádio e do seu potencial educativo. O livro discute o Movimento de Educação de Base (MEB), que na década de 1960 incorporou o rádio como um recurso educativo, a WEB, que impôs mudanças na maneira tradicional de se fazer Educação por meio desse veículo, que se tornou “muito mais que somente rádio”. Conforme destaca Gómez, hoje o rádio oferece uma “dinâmica de possibilidades inéditas para o intercâmbio informativo, a produção de conhecimento e a própria Educação”. Mas o grande desafio que deve ser buscado em todas as experiências radiofônicas educativas é “propiciar a interação real dos usuários da rádio com os próprios conteúdos para a expressão, transcendendo a mera recepção radiofônica”.

Segundo os organizadores, Do MEB à WEB surgiu “com o objetivo de contribuir com a discussão e práticas dos usos do nosso velho e bom companheiro rádio e de sua reinvenção digital, web rádio, na Educação”. Para isso foram convidados autores com experiências educativas diversificadas com o rádio no Brasil e em outros países. Os organizadores também destacam a necessidade de incorporar à publicação o debate sobre a adoção de softwares livres na rádio web, entendida por Pretto e Tosta como de importância estratégica para a Educação e a Cultura, por “contribuir com a emancipação do País em termos científicos e tecnológicos”.

O artigo que abre a publicação, O Rádio e a Educação: a experiência do MEB e as contribuições para a Educação popula, é de José Peixoto Filho – Universidade Federal Fluminense (UFF), que resgata o surgimento2 do MEB e como sua decisão de incorporar o rádio como meio e instrumento educativo e pedagógico contribuiu para a Educação popular e a alfabetização de adultos, entre 1961e 1966. Os programas de rádio do MEB em Goiás, destacados no artigo, embora censurados pelo contexto político da época, enquanto estiveram no ar, funcionaram com êxito na interação com o trabalhador do campo, extrapolando sua alfabetização e levando-o a uma atitude crítica diante da exploração e da dominação.

O pesquisador José Marques de Melo da Universidade de São Paulo (USP), em seu artigo, Mídia, Educação e Cultura Popular: notas sobre a revolução sem violência travada em Pernambuco no tempo de Arraes (1960-1964), discorre sobre um projeto que se entrelaça com o MEB. O pesquisador narra, do lugar de “observador participante”, como funcionou o Movimento de Cultura Popular (MCP), fundado em 1960, em Pernambuco, no governo de Miguel Arraes. Melo lembra que, desde sua fundação, o MCP, além da valorização de diversas manifestações culturais, buscou desenvolver nas comunidades do Nordeste, uma apreciação e uma leitura crítica dos meios de comunicação. O artigo faz um resgate documental das atuações do MCP, apresentando pontos de convergência e divergência com o MEB, e convidando os educadores da nova geração a revisarem criticamente tais projetos.

No terceiro artigo, Rádio web na Educação: possibilidades e desafios, os pesquisadores Nelson De Luca Pretto, Maria Helena Silveira Bonilla e Carla Sandeiro, partindo da experiência de implantação de uma rádio web na Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA), chamam a atenção para perspectivas e dificuldades trazidas com a transposição do rádio para o ciberespaço. Com a rádio web abre-se um leque de novas possibilidades para atividades educacionais, demandando uma participação ativa de alunos, que passam de meros consumidores de informações a produtores de conteúdos. Por outro lado, o grande desafio é garantir o pleno uso desses novos recursos. Os pesquisadores denunciam que a pressão política dos grandes grupos empresariais das comunicações impede uma transformação da legislação que regulamenta as rádios comunitárias, restringindo sua apropriação pela comunidade e pelo campo educacional: “com a população pobre distante da possibilidade de uso efetivo desses recursos, o discurso torna-se vazio”.

Cicília M. Krohling Peruzzo (USP) dá continuidade ao debate lançado pelos pesquisadores da UFBA no estudo, “Rádios livres e comunitárias, legislação e educomunicação”, no qual esclarece em que se convergem e em que se diferenciam os dois tipos de rádio no Brasil, e enumera os benefícios trazidos às comunidades que se envolvem na produção radiofônica. Aprendendo as técnicas e linguagens e mesmo os mecanismos de manipulação a que podem estar sujeitos, os envolvidos “melhoram a autoestima e um possível interesse em crescer e colaborar para que mudanças sociais ocorram”. Mas, novamente, as comunidades têm que lutar contra as limitações impostas ao direito de exercitar a comunicação e as políticas “favoráveis aos grandes grupos de mídia e ao mercado das comunicações do ponto de vista prioritário do negócio”.

O quinto artigo, A rádio comunitária na construção da cidadania e da identidade, traz a pesquisa desenvolvida por Lílian Mourão Bahia da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), sobre o papel das rádios comunitárias União, de Belo Horizonte, e Inter- FM, de Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. Partindo da noção de esfera pública de Jurgen Habermas, a pesquisadora ouviu líderes comunitários, agentes, trabalhadores e dirigentes dos veículos e concluiu que as experiências, mesmo que de maneira embrionária e descontínua, reconfiguraram a esfera pública midiática, formando e consolidando identidades locais e abrindo espaço para o exercício da cidadania.

Mauro José Sá Rego Costa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), discorre, no artigo Para criar o site Radioforum, em busca de um rádio inventivo, sobre as motivações que o levaram, juntamente a um grupo de radioartistas, produtores e teóricos do rádio, a formatar, na internet, um espaço de discussão e experimentação. Os envolvidos no projeto dão seus depoimentos e mostram com quais gêneros radiofônicos irão trabalhar, buscando devolver a inventividade às ondas do rádio.

Em Rádio como política pública: uma experiência paradigmática em educomunicação, Ismar de Oliveira Soares (USP) apresenta aos leitores o projeto3 que, a partir de 2001, levou o rádio a 455 escolas da rede municipal de São Paulo, envolvendo cerca de 11 mil pessoas. Com uma proposta de produção colaborativa, envolvendo democraticamente educadores e educandos, Soares acredita que a grande ousadia da Educom.rádio foi sua implantação “em uma rede formal de ensino, regida por normas que atravessam gerações de educadores e que garantem a tradicional verticalidade do processo de ensino”.

Das escolas de São Paulo, o rádio chega às de Belo Horizonte, por meio de Fábio Martins da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que registra algumas experiências radiofônicas educativas na capital mineira, não sem antes evocar a figura de Roquette- Pinto e sua crença no rádio “como veículo capaz de provocar mudanças na mentalidade popular”. No artigo intitulado O rádio dos meninos, o pesquisador discute os conceitos de “educomunicação” e “educomídia”, além de dar voz a alguns dos alunos envolvidos em um dos projetos radiofônicos de Minas Gerais.

Dos alunos a discussão salta para os moradores de uma favela de Belo Horizonte, principais ouvintes de Ana Paula Bossler (FaE/UFMG) e sua proposta de falar sobre ciência no rádio. Em Divulgação Científica na Rádio Favela FM4:percursos discursivos e a ciência na ausência da imagem, a pesquisadora discute os desafios do projeto e descreve a rotina de produção do programa Ciência na Favela. Bossler apresenta ainda considerações acerca dos programas com finalidade educativa na mídia.

No décimo capítulo, Nelson De Luca Pretto, Maria Helena Silveira Bonilla, Fabrício Santana, Bruno Gonsalves, Mônica de Sá Dantas Paz e Hilberto Mello retomam a discussão sobre os softwares livres. Em Soluções em software livre para rádio web, os pesquisadores da UFBA apresentam indicações de como usar e instalar rádios web com software livre em projetos educacionais e comunitários.

As experiências de Espanha e Portugal estão no artigo A rádio universitária como modalidade educativa audiovisual em contexto digital. No estudo, os pesquisadores Marcelo Mendonça Teixeira (Universidade do Minho), Juan José Perona Páez, da Universidade Autonoma de Barcelona (UAB) e Mariana Gonçalves Daher Teixeira (Universidade do Minho) analisam e comparam as rádios universitárias mais significativas dos dois países, concluindo que o caráter alternativo das emissoras possibilita a veiculação de temáticas dificilmente encontradas em outras rádios, “como a problemática da exclusão social; a popularização da ciência e o conhecimento; assim como a música, o cinema, a literatura e arte”.

Quem encerra a publicação é Maria Luz Barbeito Veloso (UAB), que também traz uma experiência da Espanha. Em Publiradio.net: desenho, desenvolvimento e avaliação de materiais didáticos on-line para a formação em comunicação, Veloso apresenta uma plataforma on-line que permitiu aos alunos de publicidade da UAB gerar seus próprios produtos publicitários radiofônicos e acabou por se transformar em uma web rádio educativa.

Acredita-se que Do MEB à WEB, ao reunir todos esses estudos, pode iluminar não só outras pesquisas sobre o rádio em seu papel educativo, como todas as comunidades envolvidas com esse veículo que, em tempos de Internet, abre um extenso campo de experimentação.

Notas

1 Nelson De Luca Pretto é doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo e professor associado da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. Sandra Pereira Tosta é doutora em Antropologia Social pela USP. Professora da PUC Minas; coordenadora do Grupo de Pesquisa em Educação e Culturas (Educ); pesquisadora do CNPq.

2 O MEB foi instituído em março de 1961, por meio de um convênio entre a Presidência da República e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), durante o governo Jânio Quadros.

3 O projeto Educom.rádio surgiu em 2001, numa parceria entre a Secretaria de Educação da Prefeitura de São Paulo e o Núcleo de Comunicação e Educação (NCE) da USP. Em 2005 e 2006, o projeto foi levado a escolas do ensino médio do Centro-Oeste do Brasil, incluindo aldeias indígenas e comunidades quilombolas.

4 Criada em 1981, por iniciativa dos moradores de uma comunidade do Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, a Rádio Favela foi legalizada em 1996 e condecorada duas vezes pela ONU por suas ações a favor da cidadania e do combate à violência.

Fernanda Carla Castro – E-mail: fernandaccastro@yahoo.com.br

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Discursos, tecnologias, educação – BARRETO (ES)

BARRETO, Raquel Goulart. Discursos, tecnologias, educação. Rio de Janeiro: Editora da UERJ, 2009. 186p. Resenha de: SCHAPPER, Ilka. Por entre discursos, tecnologias e educação. Educação & Sociedade, Campinas, v.31 no.110 jan./mar. 2010.

No livro intitulado discursos, tecnologias e educação, Raquel Goulart Barreto, logo na primeira linha da Apresentação, demarca o território em que a obra transita: “é um livro teórico-metodológico”. Este binômio já prepara o leitor para um texto circunscrito na fronteira do trabalho de pesquisa. Seus diálogos, nos dez capítulos, são tecidos a partir de cursos, percursos e discursos inscritos no grupo de pesquisa “Educação e Comunicação”, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Tendo como eixo a educação, a obra trata da análise crítica dos discursos (ACD) sobre as apropriações das tecnologias da informação e da comunicação (TIC).

O discurso pedagógico contemporâneo é o elemento que articula a tríade do título. Fundamentada em Norman Fairclough, Barreto estabelece significativa interface com autores como Mikhail Bakhtin e Eni Orlandi, que possibilitam ampliar o debate dos diferentes aspectos dos recortes selecionados.

Os capítulos estão organizados em três partes, que trazem o movimento entre fundamentação teórica e sua aplicação em “exercícios analíticos”. Na primeira parte, três capítulos traçam o horizonte teórico-metodológico da obra. Em “Para começo de conversa: texto, discurso(s), intertextualidade”, o leitor tem notícia das trilhas percorridas no livro: dimensiona o discurso como conceito teórico-metodológico, nas acepções discutidas por Fairclough. Essa discussão toma corpo no segundo texto, “Análise crítica do discurso (ACD): realismo crítico, performatividade e ideologia”, em que Barreto aborda as relações dialéticas entre elementos semióticos (“discurso”, no sentido mais amplo) e as outras práticas sociais, demarcando, em oposição ao idealismo, o realismo crítico na objetivação da linguagem. No terceiro texto, a autora, trazendo também Felinto e Mattelart, discute a tese de que as TIC têm sido fetichizadas no imaginário tecnológico, no enredo dos discursos nodais da globalização e da “sociedade do conhecimento”.

Na segunda parte do livro, o leitor tem um interessante encontro que é um interregno entre o primeiro e o terceiro momento da obra. No texto “O discurso da inclusão”, Barreto, em coautoria com Leher, discute os sentidos atribuídos ao termo, com base no materialismo histórico-dialético. Em “Cenários enunciativos no Admirável Mundo Novo“, em parceria com Ramos, há uma aproximação entre Bakhtin e Fairclough, a partir do recorte de cenas enunciativas do livro de Huxley.

Na terceira parte da obra, temos os exercícios analíticos em que podemos encontrar interessantes pesquisas que retomam a tríade do título. Em “Não só palavras: dos textos multimidiáticos à ressignificação das práticas escolares”, Barreto e Guimarães discutem a configuração multimidiática dos textos contemporâneos, focalizando, no conjunto das tendências discursivas transnacionais, as linguagens articuladas na produção, circulação e legitimação dos sentidos.

O debate se aprofunda no texto “Formação de professores: entre o discurso da falta e propostas de substituição tecnológica”, em que Barreto analisa a tendência a desqualificar a formação e o trabalho docente, no movimento de produzir alternativas centradas apenas nas TIC. O encaminhamento parte do conceito de recontextualização e assume como parâmetros as ressignificações de ensino e aprendizagem.

Os capítulos seguintes tratam de aplicações do referencial teórico-metodológico. Em “Dualidade escolar: os sentidos das TIC”, Barreto e Magalhães trazem o conceito gramsciano para a discussão dos sentidos atribuídos às TIC nas vozes de coordenadores, professores e alunos de dois contextos escolares caracterizados pelo atendimento a classes sociais desiguais. Em “Discursos de professores do ensino público noturno: entre o cotidiano e o imaginário”, Barreto e Fernandes abordam possibilidades de acesso ao imaginário tecnológico de professores, procurando detectar reflexão-refração do sentido hegemônico atribuído às TIC, nos territórios demarcados pelo título. Em ambos, a ACD é desenvolvida a partir de pontos de entrada que remetem a Fairclough: pressupostos, modalidade e escolhas lexicais.

No último capítulo do livro, a autora traz como título uma pergunta: “Ponto final?”. Barreto destaca que o que cabe no desfecho “deste desmonte das tramas constitutivas da ideologia como hegemonia de sentido, na objetivação das relações entre as TIC e a educação, é a aposta na produção de possibilidades outras” (p. 177). Uma aposta que traz as marcas de outra interrogação: o que fazer com tudo isso? E, na tentativa de responder à questão, mais uma vez, a autora presenteia o leitor com uma importante reflexão: pensar um projeto “que aponte para o redimensionamento da formação de professores a partir de alternativas de formação-trabalho docente que estão sendo forjadas nas universidades e nas escolas” (idem). Nas produções do grupo de pesquisa “Educação e Comunicação”, a autora desenvolve, junto com os demais pesquisadores, estudos que buscam compreender essas tensões e trazer possibilidades outras para o encaminhamento de questões que atravessam a relação entre os discursos presentes na díade tecnologias/educação.

No entremeio das discussões sobre discursos, tecnologias e educação, Barreto traz importantes contribuições para o debate das TIC no cenário educacional. Trata-se de uma obra de densidade teórico-metodológica que instiga a importantes reflexões e, por isso, a pergunta no último capítulo: Ponto final? A dúvida procede, já que, da maneira como a autora dialoga e instiga o leitor a novas construções, não há ponto final na obra, mas uma vírgula, materializada como reticências, uma pausa em um diálogo que continua com você, leitor.

Ilka Schapper – Doutoranda em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (PUC-SP) e professora adjunta da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). E-mail: ilkaschapper@gmail.com

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Antropologia Brasiliana: ciência e educação na obra de Edgard Roquette-Pinto – LIMA (RBH)

LIMA, Nísia Trindade; Sá, Dominichi Miranda de (Org.). Antropologia Brasiliana: ciência e educação na obra de Edgard Roquette-Pinto. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2008. 327p. Resenha de: OLIVEIRA, Lucia Lippi. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.29, no.58, DEZ. 2009.

Durante o século XIX ainda existiam dúvidas sobre como deveria ser chamado o nascido no Brasil. Não por acaso o principal jornal do Império denominava-se Correio Brasiliense. Já no início do século XX, ao apresentar um panorama da evolução da ciência no país, Roquette-Pinto se referia à contribuição científica dos ‘brasilianos’ e ao Brasil ‘brasiliano’, aquele depois de Ron-don. Essa mesma designação foi usada por Nísia Trindade Lima e Dominichi Miranda de Sá, organizadoras da coletânea Antropologia Brasiliana.

As quatro partes do livro mapeiam a ciência – a Antropologia – e a área de atuação – a educação – de Edgard Roquette-Pinto. A primeira parte, como diz seu título, trata do “Perfil e trajetória”; a segunda, de “Positivismo e nação”; a terceira, de “Antropologia e população”, e a última, de “Ciência e ação”. Na “Apresentação”, as organizadoras ressaltam que Roquette-Pinto é mais lembrado e reconhecido por suas realizações no rádio e no cinema educativos, ou seja, como divulgador da ciência, e é relativamente esquecido como cientista, estudioso das raças e dos tipos antropológicos brasileiros. Destacam, também, um ponto central presente na maioria dos artigos: Roquette-Pinto, com base em pressupostos da antropologia física e da biologia mendeliana, refutou as teses da inferioridade dos mestiços brasileiros.

Os artigos da coletânea procuram, cada um à sua maneira, situar a trajetória e a obra de Roquette-Pinto no contexto da época e mostrar como as questões-chave dos anos iniciais do século XX envolviam o fortalecimento da República e da nação. A ciência da época – o Positivismo – prometia progresso e civilização, e nesse quadro sobressaía o papel dos engenheiros, dos médicos e dos educadores. As figuras de Oswaldo Cruz, Paulo de Frontin, Aarão Reis, Pereira Passos, Euclides da Cunha e Cândido Rondon, entre outros, podem iluminar os diagnósticos, as expectativas, as atuações, e também os desencantos dos primeiros anos da República no Brasil. Essa era a reação dos desiludidos, que procuravam respostas para a questão: “como explicar o atraso do Brasil?”. Os intelectuais cientistas entraram no debate lançando mão do que tinham à disposição: leis biológicas, eugenia, mestiçagem, ‘branqueamento’, imigração. Tudo isso foi acionado, com diferentes combinações, para explicar a formação do povo, da ‘raça’ brasileira, do ‘tipo’ nacional, e tentar responder ou resolver a questão mencionada.

O “Prefácio”, de Robert Wegner, assim como o artigo “Roquette-Pinto e sua geração na República das Letras e da Ciência”, das organizadoras do livro, oferece um bom guia de leitura. Então, como reapresentar aqui o livro aos leitores? O que selecionar? Como a seleção se faz guiada por motivações derivadas do trabalho do leitor/resenhador, esclareço as questões que guiaram minha leitura.

A construção de um regionalismo no Brasil durante o Estado Novo, reiterada pela atuação do IBGE na redefinição do mapa do país, ao estabelecer em 1941 a divisão regional do Brasil, foi acompanhada pela apresentação e divulgação de desenhos que representavam ‘tipos brasileiros’, como o seringueiro, o vaqueiro, o pescador, a baiana e o gaúcho, entre outros. Percy Lau, desenhista e funcionário do IBGE, foi o autor dos desenhos dessas figuras que frequentaram os livros de Geografia por muitas décadas. Durante a leitura, eu me perguntava: essa história de ‘tipos brasileiros’ teria a ver com sociologia de Oliveira Viana? Lendo Antropologia Brasiliana pude entender melhor a matriz dessa classificação e conhecer o papel dos estudos de Roquette-Pinto no debate sobre a unidade ou pluralidade da ‘raça’ brasileira. Os artigos de Giralda Seyferth, de Jair de Souza Ramos e de Vanderlei Sebastião de Souza, que compõem a terceira parte do livro e analisam a Antropologia do autor, oferecem a chave explicativa do debate em questão.

Giralda Seyferth, no magnífico artigo “Roquette-Pinto e o debate sobre raça e imigração no Brasil”, analisa a obra antropológica do autor confrontando-a com a antropologia da época, em especial com o que já se dizia nos Estados Unidos (sobretudo Franz Boas). Roquette-Pinto produziu uma classificação dos ‘tipos nacionais’, assunto de destaque da antropologia física, que importava até mesmo para assuntos demográficos. Suas categorias se reportavam à cor da pele: leocodermos (brancos), melanodermos (negros), xantodermos (mestiços de branco e índio, indicativo da cor amarela) e faiodermos (mestiços de branco e negro). As classificações foram elaboradas com base em amostragem significativa de homens jovens oriundos de todos os estados brasileiros. Segundo Giralda, Roquette-Pinto, mesmo com uma bibliografia cheia de paradoxos, de classificações ambíguas, foi capaz de mostrar “a falácia da desigualdade racial, a heterogeneidade da população, a normalidade dos mestiços e a impossibilidade de vaticinar a formação de um tipo nacional” (p.161).

O artigo de Vanderlei Sebastião de Sousa, “‘As leis da eugenia’ na Antropologia de Edgard Roquete-Pinto”, também aborda a pesquisa “Notas sobre os tipos antropológicos do Brasil”, cujo texto foi publicado em 1928 no Boletim do Museu Nacional e apresentado em 1929 no Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia. Ali Roquette-Pinto concluía que nenhum dos tipos da população brasiliana apresentava qualquer estigma da degeneração antropológica. Negava assim os supostos efeitos negativos que derivariam da miscigenação social. Reafirmaria em Ensaios de antropologia brasiliana (1933) que não havia mal algum no processo de mestiçagem, na combinação de fatores biológicos que levaram à formação de um tipo híbrido, e que haveria mesmo, nessa formação, uma eugenia saudável. Assim, o homem brasileiro precisava era ser educado, e não substituído.

Jair de Souza Ramos, no artigo “Como classificar os indesejáveis?”, acompanha a participação de Roquette-Pinto no debate da seleção racial suscitado pela política de imigração. Explora os passos dados na identificação e restrição aos imigrantes indesejáveis e reafirma que Roquette-Pinto – convocado a participar nos debates das políticas de imigração por sua condição de antropólogo, autor de Rondônia (1917) e diretor do Museu Nacional (de 1926 a 1936) –, usando os caminhos da antropometria, abordando a questão da mestiçagem sob o ângulo da eugenia, ou seja, como portador de um discurso racialista, foi crítico da superioridade das raças. O uso da categoria ‘racioalismo’ como o autor do artigo esclarece, é feito no sentido explicitado por Todorov:

As doutrinas racialistas têm três pressupostos: 1) os homens se diferenciam em grandes grupos chamados raças, os quais possuem certa unidade física, que lhes confere determinadas características psicológicas e culturais; 2) o predomínio do grupo sobre o indivíduo (isso significa supor que o comportamento do indivíduo é determinado, em grande medida, pelo grupo racial ao qual ele pertence); 3) as ‘raças’ não seriam apenas diferentes, mas também desiguais. (p.206)

Para além dos artigos que tratam da questão das raças e dos ‘tipos nacionais’, gostaria também de ressaltar o artigo de Regina Horta Duarte, “Rumo ao Brasil: Roquette-Pinto viajante”, que enfoca a viagem como uma vitória sobre a rigidez dos costumes, como algo capaz de forjar uma abertura no caráter do indivíduo e de operar uma transformação em cada brasileiro. As via-gens de Euclides, de Rondon, dos médicos sanitaristas, dos modernistas paulistas às cidades mineiras e de Mário de Andrade ao Norte e Nordeste vêm merecendo atenção de inúmeros analistas. No caso de Roquette-Pinto o foco da transformação tem a ver com o impacto produzido pelo encontro com os Nhambikuáras em 1912, quando, acompanhando Rondon, fez sua viagem de descoberta do Brasil. Roquette-Pinto fez anotações e fotografou os índios, seus enfeites, seus apetrechos, suas habitações. Gravou a narração de lendas e cantigas, filmou o preparo da mandioca, os trabalhos de tecelagem e fiação. Observou, desenhou, documentou tudo, como prova e também como fonte de conhecimento a ser utilizado na educação.

Para Roquette-Pinto, a constituição da nação implicava vencer distâncias, e as estradas eram referidas como ‘vasos nutridores’ do Brasil. Se os ‘tipos brasileiros’ precisavam e podiam ser melhorados pela educação, o país enfrentava dificuldades adicionais derivadas da grande extensão territorial. Pode-se então compreender o papel do rádio e do cinema como projetos de divulgação do saber, como meios eficazes de vencer distâncias, de ultrapassar os limites do espaço e do tempo, possibilitando que os homens do povo realizassem suas viagens transformadoras. Daí sua frase: “Para nós o ideal é que o cinema e o rádio fossem, no Brasil, escolas dos que não têm escola”. Tanto suas ações envolvendo o rádio e o cinema quanto sua atuação como editor da Revista Nacional de Educação, fundada em 1932, falam de uma mesma estratégia de partilhar o conhecimento entre os brasileiros espalhados pelo território nacional, nos informa Regina Horta Duarte.

A concepção de nação como domínio sobre os territórios e suas populações, as ideias sobre a importância do saber geográfico na construção da nação, estavam na ordem do dia. A premiação de Rondônia e de A expansão geográfica do Brasil Colonial, de Basílio de Magalhães, em 1917, pelo IHGB, falam dessa tendência. A repercussão de Os sertões já indicava isso. A relação entre ocupação do território e população também está fortemente presente na historiografia de Capistrano de Abreu. Se nação é combinação entre território e população, Roquette-Pinto estudou, escreveu, atuou nos dois campos, e procurou responder ao desafio de vencer dificuldades de ambos: vencer distâncias e demonstrar que o povo mestiço não era inferior. Seu compromisso com a nação, sua missão de construir a nacionalidade guiou sua trajetória e sua obra.

Ao discutir e apresentar a obra de Roquette-Pinto, Antropologia Brasiliana oferece um importante panorama das teses e dos confrontos de posições entre os intelectuais e cientistas que compunham a geração que pensou o Brasil na Primeira República. Mostra também a complexidade e a riqueza do pensamento da época ao fazer uso das categorias ciência, desigualdade, mestiçagem, branqueamento, imigração e democracia. Se alguns dos temas são questões do passado, outros estão presentes nos dias de hoje, quando políticas de ação afirmativa baseadas em critérios raciais vão se tornando correntes nas ações do Estado brasileiro. É importante que historiadores, sociólogos e antropólogos tomem conhecimento das experiências anteriores, quando a raça foi a principal moeda para condenar o mestiço brasileiro e para classificar os imigrantes desejados.

Lucia Lippi Oliveira – Socióloga, pesquisadora e professora do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC/FGV). Praia de Botafogo, 190. 22250-900 Rio de Janeiro – RJ – Brasil. lucia.lippi@fgv.br.

Não violência na educação – MULLER (C)

MULLER, Jean-Marie. Não violência na educação. Trad. de Tônia Van Acker. São Paulo: Pala Athena, 2006. Resenha de: ZANOTTO, Karin. Conjectura, Caxias do Sul, v 14, n. 3, p. 209-215, set/dez, 2009.

Jean-Marie Muller, filósofo francês é pesquisador há mais de trinta anos da teoria da não violência, é autor de 27 livros relacionados ao tema e coloca em prática o que prega. Dentre os quais destacam-se aqueles já traduzidos para o português: Não-violência na educação e O princípio da não-violência: uma trajetória filosófica, ambos editados pela Editora Palas Athena, e Princípios e métodos de intervenção civil pela Editora Piaget. Em 1970, para protestar contra a venda de aviões Mirage ao governo militar brasileiro, fez greve de fome. Participou da ação do Batalhão da Paz, que conseguiu pôr fim aos testes nucleares a céu aberto realizados pela França, em 1972.

Muller é fundador e diretor do Instituto de Pesquisas sobre a Resolução Não-Violenta de Conflitos e participa das reuniões da Defesa Nacional Francesa. A ideia de não violência defendida por Muller não é sinônimo de passividade ou covardia. Na maioria das vezes, há mais coragem na não violência do que na violência. Um exemplo disso foi o que aconteceu com Rosa Parks, a mulher negra que, no início da década de 50, lançou a resistência dos negros nos EUA, ou seja, os ônibus, na época, tinham lugares reservados para brancos. Certa vez, ela se sentou em um desses lugares e permaneceu sentada, quando um branco pediu que ela se levantasse. Quando o condutor do ônibus pediu o mesmo, ela continuou lá e não se moveu nem quando os policiais chegaram. Permanecer sentada exigia muita resistência, energia e coragem. Para Muller, principalmente por não se dar de forma natural, a construção de uma sociedade não violenta é tarefa difícil.

O livro Não-violência na educação faz parte das iniciativas promovidas para a Década Internacional para uma Cultura de Paz e Não Violência para as Crianças no Mundo (2001-2010) pela Unesco que, originalmente, o publicou. Nele Muller recomenda uma abordagem muito prática de como resolver confrontos violentos nas escolas. Explica que a cultura da violência já está instalada nas sociedades de nosso tempo e é diariamente reforçada por todos os meios de comunicação. Quando uma criança toma o brinquedo de outra, a sociedade vê como perfeitamente natural que a segunda avance e o arranque de volta ou tome outro brinquedo em retaliação ou, ainda, que bata no colega. Contudo, conforme aponta o autor, a contraviolência gera apenas mais violência – a primeira criança vai sentir-se agredida e também ela retribuirá, levando a uma possível escalada de violências que não beneficia nenhum dos participantes e poderá até causar a destruição do brinquedo originalmente disputado. Já a não violência é vista como algo utópico, contrário até à natureza humana agressiva e competitiva. O professor Muller, nesse livro, define violência não como sendo agressividade, esta sim, natural na espécie humana, mas como ameaça à vida ou à integridade do outro. A violência é um desrespeito básico do humano pelo outro, que o torna passível de ser usado ou explorado ou destruído.

No primeiro capítulo, o autor discorre sobre o conflito, explicando que nosso relacionamento com os outros forma nossa personalidade, pois que se existe somente em relação a outros. A existência individual como ser humano tem menos a ver com estar-no-mundo e mais com estar-com-os-outros. No entanto, a experiência de encontro com o outro tende a ser marcada por adversidades e confrontos, surgindo o medo dos outros, pois o aparecimento de um outro ao meu lado pode ser ou não perigoso. O medo pelo outro é duas vezes maior quando não se parece comigo, quando não fala a mesma linguagem, não tem a mesma cor de pele, não acredita no mesmo Deus. Assim, os outros me preocupam, assustam. Segundo o autor, é preciso transformar o conflito, transformar o confronto em um nível de cooperação, para que se chegue à solução de problemas conflitantes, pois a rivalidade entre os humanos somente é superada quando cada um limita seus próprios desejos, quando existe o respeito pelo outro, ou seja, quando busca o grau certo de distância, para que as pessoas possam ver, reconhecer e identificar umas às outras sem fusão nem confusão. Para formar uma comunidade humana, os homens devem manter um relacionamento de duas mãos: baseado na dádiva e na partilha, porque é na bondade que reside a hospitalidade. A violência é uma fraqueza, e a bondade é a força dos fortes.

No segundo capítulo, Muller fala sobre a agressividade, especificando que não é a violência que é natural no ser humano, mas a agressividade, pois o ser humano é instintivo e impulsivo, e a agressividade faz parte do instinto. É uma energia que pode fazer o bem ou pode fazer o mal. É uma força combativa; assim, mostrar agressividade é aceitar o conflito com o outro, sem precisar submeter-se a ele, pois, como o medo está presente em cada indivíduo, ele juntamente com a emoção, dispara o instinto de sobrevivência e mobiliza o ser humano para se proteger. De fato, é necessário que o medo seja domesticado, ou seja, que os sentimentos que ele provoca sejam dominados, a fim de que a agressividade não seja uma violência destrutiva.

No Capítulo 3, o autor discorre sobre a violência, especificando que ela surge de um desejo ilimitado que se confronta com os limites impostos pelos desejos dos outros. Ser violento, conforme Kant, é “usar a outra pessoa simplesmente como meio, ignorando o princípio de que as outras pessoas, como seres racionais, devem sempre ser consideradas também fins”.

Certamente, todos estão de acordo com o autor, posto que a violência é um abuso em si. Com certeza, pois o autor tem razão: toda violência contra o ser humano é uma violação: a violação do seu corpo, da sua identidade, da sua personalidade, da sua humanidade; ela é brutal, ofensiva, destrutiva e cruel; afeta o semblante, deformando-o em virtude do sofrimento infligido; toda violência é desfigurante, é despersonalizante.

E o pior: as pessoas violentadas pela experiência verificam que também são capazes de ser violentas com os outros. Portanto, a violência fere e marca também o semblante do perpetrador. O resultado, conforme Weil, é que a prática da violência petrifica o ser humano, transforma o perpetrador e a vítima em um “coisa”, que os despersonaliza completamente.

No quarto Capítulo, Muller escreve sobre a não violência, esclarecendo que, para Gandhi, a não violência perfeita é a total ausência de animosidade em relação a tudo quanto vive. Em sua forma ativa, a não violência se expressa como cordialidade em relação a tudo que vive.

Assim, o primeiro requisito para a não violência é a negação: é preciso que se deixe de lado toda animosidade em relação ao nosso semelhante.

A animosidade, na visão de Kant, é determinada pelo egoísmo, no sentido de amor exclusivo por si mesmo, sendo que o cuidado de si não deixa lugar algum para o cuidado dos outros. Quando o ser humano age “sempre se defronta com seu querido eu, que nunca deixa de aparecer no final, e o resultado, como se observa cotidianamente, é que, quando dois indivíduos se encontram, cada qual desejando fazer que seus próprios desejos, necessidades e interesses prevaleçam, “segue-se de modo inevitável um confronto, que tende perigosamente à violência, que nada mais é que o choque entre dois egoísmos. Por isso, com certeza, é preciso proibir-se o cometer-se violência contra qualquer pessoa. Cada pessoa deve agir de tal forma que seu comportamento e suas decisões possam ser considerados adequados para todos, ou seja, que possam ser universalizados. E é necessário que aquele que parte para a violência reflita sobre: que parte da sua natureza vai decidir cultivar em si próprio? Nos outros e especialmente nas crianças, a decisão a ser tomada envolve tanto uma escolha filosófica quanto educacional, pois o ser humano que é capaz de ser razoável e/ou violento, tem a liberdade de escolha: diante de uma provocação, ou usar a violência ou usar a razão.

No quinto capítulo, explicando sobre a democracia, o autor coloca que o que dá a cada ser humano o autocontrole e os recursos, para dizer sim ou não à violência, de acordo com sua avaliação pessoal, é a educação.

Esse autocontrole permite participação, e participação significa democracia. Por isso, as crianças, na escola, devem ter espaço para praticar a democracia, devem ser incentivadas para usar esse espaço, que pode ser expandido à medida que os alunos forem crescendo. Aprendizado esse que deve permanecer sob a autoridade de adultos que devem estabelecer limites e, em alguns casos, limites não negociáveis com as crianças.

Entretanto, democracia tem um significado mais essencial: um governo que respeita as liberdades, os direitos humanos. Ela é uma aposta na sabedoria do povo. Sabe-se que a verdadeira democracia não é o governo do povo, mas dos cidadãos, e o ideal democrático implica uma igual distribuição entre os cidadãos, não só de poder, mas de propriedade e conhecimento. O fundamento da política é o diálogo humano e não a violência, pois essa só acontece entre os seres humanos quando o diálogo é interrompido. A cidadania jamais deve basear-se na disciplina cega, mas na responsabilidade e na autonomia pessoal de cada um.

No sexto capítulo, o autor comenta a mediação, que significa um método de regulação não violento de conflitos, ou seja, é a intervenção de um terceiro que se coloca entre os protagonistas de um conflito, entre dois adversários, alguém que se virou contra, que está em oposição e podem ser dois indivíduos, duas comunidades ou duas nações que se enfrentam e se opõem uma à outra. O objetivo da mediação é levar os oponentes a se voltarem um para o outro, a fim de dialogar, entender-se mutuamente e, se possível, encontrar um acordo capaz de abrir caminho para a reconciliação. Contudo, a mediação só pode acontecer se os dois adversários concordarem em se envolver voluntariamente no processo conciliatório. O importante é saber se o papel vital do mediador é facilitar a expressão e incentivar a escuta de ambos os lados, a fim de restabelecer a comunicação, dirimir os mal-entendidos e permitir a compreensão mútua.

No sétimo capítulo, Muller esclarece sobre os maus-tratos, colocando que o mundo da escola encontra-se na intercessão de três espaços: a família, a vida econômica e a vida política. A tarefa assumida pelos educadores – de formar uma criança tendo em vista basear o plano educacional nos princípios da não violência – bate de frente com a realidade, na qual as coisas facilmente se desviam para bem longe desse ideal, pois as crianças vão à escola e levam consigo todos os problemas que encontram: situações de violência dentro da própria família ou na vizinhança, até mesmo dentro dos portões da própria escola. Isso posto, conclui-se que é importante que os professores estabeleçam relações de cooperação com os pais e pessoas com responsabilidade pessoal, porque o abuso ou maus-tratos contra crianças é uma das categorias de violência mais disseminadas na nossa sociedade. Comprovadamente, essa violência causa traumas graves, que deixam marcas duradouras em sua vida afetiva e psicológica.

Também, que as primeiras relações que a criança tem com as pessoas mais próximas e mais queridas contribuem de forma decisiva para a construção de sua identidade. A criança que experimenta a violência, muito provavelmente, se tornará um adulto violento, corre sérios riscos de se tornar incapaz de respeitar os outros e, ainda mais, estudos já comprovaram que as crianças que são respeitadas e amadas pelos mais íntimos durante sua infância ficam predispostas a respeitar e a amar os outros e têm força para resistir ao desprezo, à raiva e à coisificação por parte do outro. Por isso, erradicar a violência contra as crianças é um grande desafio, e é dever dos professores denunciar as violações, as negligências observadas nas crianças que educam.

No oitavo capítulo, o autor discorre sobre a delinquência e explica que a escola faz parte da comunidade onde está inserida. A criança é diretamente afetada pela delinquência com a qual seus alunos estão envolvidos fora dos portões da escola. A violência parece ser o último recurso dos indivíduos privados de toda e qualquer participação na vida da comunidade, e sua violência é uma demonstração de sua existência.

Ela exerce um fascínio para os que se sentem excluídos e, por isso,  humilhados. Ela é um pedido de socorro, é a expressão do desejo de comunicar-se. É obrigação da sociedade ouvir esse grito. É preciso entender a violência para também proibi-la. A violência é sinal de que os que se entregaram a ela não foram capazes de encontrar limites, e estão pedindo que lhes sejam agora impostos. As crianças e os adolescentes precisam enfrentar os limites estabelecidos pela autoridade dos adultos, pois esses oferecem a eles a segurança necessária para que consigam estruturar sua personalidade. A ausência de limites fá-los mergulhar em ansiedade, e a ansiedade gera violência. Mas os adultos só conseguirão demarcar os limites novamente se eles mesmos exibirem uma atitude não violenta. É na escola básica que um professor atento, observador, pode detectar aquela criança que está indo diretamente para a delinquência: comportamento antissocial, grosserias, agressão verbal, provocações. Já nos primeiros anos de escola, é preciso frear esse processo com a mediação de especialistas no assunto.

No nono capítulo, o autor ensina que se deve educar a criança em cidadania. Explica que, através da educação, deve-se ter em vista erradicar a violência, e, como as leis justas são o fundamento do Estado Democrático de Direito, na escola, as regras estabelecidas pelo professor devem levar as crianças a aprender a conviver num ambiente de respeito mútuo.

No décimo capítulo, o autor escreve sobre a autoridade, explicando que uma educação não violenta não decreta que os adultos devem deixar de exercer sua autoridade, pois, para que a personalidade da criança se estruture, é preciso que aprenda a obedecer, e o adulto deve exigir obediência. Nesse viés, acredita-se que a autoridade do adulto deve prevalecer sempre, mas sempre através de um processo de comunicação e diálogo que permita à criança sentir que o mundo da escola é seu, que é um lugar onde ela tem o direito de falar, onde seus pontos de vista serão ouvidos e levados em conta, pois é muito fácil uma criança passar dos limites. O essencial é que a educação fomente a autonomia ao invés da submissão; uma mente crítica em vez de obediência passiva; responsabilidade em lugar de disciplina; cooperação em substituição à competição; e solidariedade no lugar de rivalidade. Segundo o entendido, quando há submissão demais, surge um adulto sem caráter. A criança precisa entender que a não violência é lei universal, ou seja, o princípio ético que qualquer ser racional deve observar. A base da vida comunitária não é o amor, mas a justiça e o respeito pelos direitos de todos.

No décimo primeiro capítulo, ao explanar sobre a “solução construtiva de conflitos”, o autor advoga que o relacionamento entre professor e aluno jamais estará livre de conflitos, e é responsabilidade do adulto não suprimir esses conflitos em nome da submissão da criança. O educador deve buscar soluções construtivas para os conflitos que surgem, cedendo espaço para as necessidades e solicitações expressas pela criança.

Isso a ajudará a construir autoconfiança, pois o ambiente da sala de aula se torna insuportável, quando os dois extremos de uma situação levam professores e alunos a um impasse. E ninguém é beneficiado. Fato esse absolutamente visível, pois a construção da autoconfiança não é apenas o fim primeiro da educação, mas também o meio. É importantíssimo que o professor envolva os alunos na busca de soluções, devendo apelar à criatividade dos alunos e ter a ousadia de perguntar a eles que soluções proporiam. O lugar onde a violência surge com muita frequência, comprovadamente, é no pátio da escola. O professor sempre precisa ficar muito atento, pois é importante sempre que haja adultos por perto nesses momentos para garantir o cumprimento das regras no pátio: separar as crianças que brigam, terminar com a violência e descobrir, através do mediador (pai, professor ou até mesmo um aluno preparado), a origem dos conflitos, permitindo que a criança perseguida se sinta protegida, pois o seu papel é restabelecer a comunicação entre as partes em conflito, permitindo que cada um apresente seu ponto de vista. Desse modo, o adulto estará ajudando a criança a solucionar, juntamente com a outra, o desentendimento. Considera-se de suma importância a tese do professor Muller ao colocar que a não violência se apresenta como o único meio para garantir a convivência pacífica e a justiça entre todos os seres humanos. Esse princípio deve, pois, ser ensinado cotidianamente, nas escolas.

Referências

MULLER, Jean-Marie. Não violência na educação. Trad. de Tônia Van Acker. São Paulo: Pala Athena, 2006. 110 p.

Karin Zanotto – Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul. E-mail: karinquiro@yahoo.com.br

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Capitalismo, Estado e Educação – LUCENA (TES)

LUCENA, Carlos (Org.). Capitalismo, Estado e Educação. Campinas: Alínea, 2008, 217 p. PREVITALLI, Fabiane Santana. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v. 7 n. 2, p. 397-401, jul./out.2009.

Importante obra organizada pelo professor e cientista social, doutor em Filosofia e História da Educação, Carlos Lucena, lançada no segundo semestre de 2008 pela editora Alínea. Os artigos reunidos no livro apresentam um diagnóstico do processo de mundialização do capital que, na visão dos autores, ocorre sob a hegemonia das políticas neoliberais, das mudanças tecnológicas, bem como sob o discurso ideológico da valorização da educação.

Contrários às teorias que afirmam as regras do livre mercado como fatalidade ou, parafraseando Carlos Lucena, como sendo “o fim da História”, os autores analisam o intenso processo de mundialização do capital como processo histórico no âmbito das lutas de classes e problematizam seus impactos sobre o trabalho e a educação.

A obra está organizada em dez capítulos.

Os dois primeiros centram a análise na relação entre globalização e mundialização do capital e da educação. Olinda Maria Noronha, no primeiro capítulo, “Globalização, mundialização e educação”, enfatiza as ações dos organismos internacionais no sentido de promover um novo tipo de educação, de pedagogia e de formação de professores, os quais privilegiam um saber fazer pragmático e utilitário que é requerido pelo mercado. No segundo capítulo, “Globalização capitalista e apropriação”, Lucília e Janaína Machado relacionam a questão ambiental e da educação no âmbito do processo de globalização, ressaltando os desafios educacionais e ambientais em função da lógica do sistema de produção e circulação de mercadorias. Para as autoras, embora o desenvolvimento sustentável esteja sendo discutido como novo paradigma conceitual e político, são enormes as dificuldades para o cumprimento de resoluções e planos de ação em razão da racionalidade econômica capitalista à qual está subordinada a cidadania.

No terceiro capítulo, “Transformações no Estado-Nação e impactos na educação”, o autor José Luís Sanfelice faz uma síntese bastante elucidativa sobre o processo histórico de formação e transformação do Estado-Nação e demonstra como a educação, à medida que a globalização avança, vai se tornando um serviço privado e perdendo seu sentido fundamental que é permitir o acesso dos seres humanos à cultura e a conhecimentos disponíveis, assumindo assim um caráter acentuadamente mercantilizado. Nesse contexto, Sanfelice destaca o papel da ciência e da tecnologia como elementos de dominação na relação geopolítica entre os Estados capitalistas centrais e periféricos, contribuindo para que permaneçam intocadas as determinações estruturais da sociedade sob a lógica do capital.

A questão da ciência e da tecnologia também é abordada por Carlos Lucena, no quarto capítulo do livro. Sob o título “Mundialização, ciência e tecnologia”, o autor debruça-se sobre os pressupostos teóricos das crises do capitalismo e questiona a neutralidade da ciência e da tecnologia uma vez que a base das mesmas assenta-se na própria reprodução do capital.

Para Lucena, “a ciência não é uma invenção do capitalismo, até porque ela é tão antiga quanto a humanidade, mas o capitalismo inventou formas de explorá-la, subjugando seus resultados a seus interesses” (pág. 91).

O quinto e o sexto capítulos discutem a questão da reestruturação produtiva do capital era protagonizado pelos jesuítas, pautado pela aquisição do saber clássico acumulado pela civilização ocidental cristã. Era um ensino altamente refinado e eficiente para os fins sociais e culturais do poder hegemônico. Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, os autores resgatam as reformas pombalinas, as quais transferiram a educação quase que exclusivamente a cargo das famílias pertencentes à aristocracia agrária escravocrata.

Com o advento da República, o traço elitista permaneceu. Foi somente na ditadura militar que a expansão do ensino tornou-se uma realidade ou, nas palavras dos autores, “que a sociedade brasileira deixou, na realidade, de ser uma ‘sociedade sem escolas’”. Todavia, o traço característico da constituição da educação brasileira é a sua dualidade: escolas de ensino precário para as classes populares e escolas eficientes para as elites.

O quinto e o sexto capítulos discutem a questão da reestruturação produtiva do capital e seus impactos no mundo do trabalho no contexto internacional e no Brasil, respectivamente. Em “La precariedad como paradigma de la reestrutucturación capitalista em la fase de la crisis estructural”, Luciano Vasapollo demonstra o quadro do desemprego, bem como o depauperamento das condições de trabalho e do aumento da pobreza, tomando como referência os Estados Unidos e a Europa. Ao caracterizar a reestruturação produtiva do capital, o autor foca sua análise na formação de um “novo sujeito do mundo do trabalho (…) que é determinado não somente pelas transformações nas atividades produtivas, mas também por sua configuração sócio-política e sua capacidade de organizar- se em um novo movimento sindical que saiba interpretar as necessidades de emancipação” (pág. 121-122).

Ricardo Antunes, em “Riqueza e miséria do trabalho no Brasil”, apresenta, a partir de um conjunto de estudos setoriais realizados por diversos autores, as principais tendências da reestruturação produtiva no Brasil sob a égide do neoliberalismo, apontando a centralidade do desemprego global, da flexibilização e da precarização do trabalho como fenômenos dominantes e como estratégias de dominação nessa nova fase do capital.

No sétimo capítulo do livro, “Estado, políticas públicas e educação no Brasil”, Antonio Bosco de Lima analisa a crise do Estado capitalista como um processo de revigoramento da reprodução do capital por meio do recurso de fortalecimento do mercado. O autor apresenta uma interessante análise do Estado na perspectiva do pensamento político liberal e da teoria marxista, tecendo contundentes críticas ao liberalismo e neoliberalismo. No centro dessa discussão está a escola pública que, para Bosco, “(…) é um aparelho do Estado que, de acordo com os neoliberais, precisa ser controlada pelo mercado” (pág. 147). Estabelece-se, portanto, uma disputa no campo político-ideológico em que, de um lado, encontra-se a comunidade educacional para quem há a necessidade de uma escola mais democrática e, de outro lado, o pensamento neoliberal dominante pelo qual é preciso tirar o conteúdo político das escolas.

Assim, segundo o autor, não é o conteúdo da escola que está em crise, tampouco a educação formal, mas o modelo de escola na sociedade regida pela lógica do capital.

Tendo como objeto de discussão a noção de dignidade e de direitos do homem, Robson Luiz de França, no oitavo capítulo “O trabalho como princípio da dignidade da pessoa humana”, destaca a degradação das condições de vida dos trabalhadores e o aumento do desemprego estrutural no âmbito da ascensão das políticas neoliberais.

Nesse contexto de aprofundamento das desigualdades sociais, de um “estilo de vida que se estabelece pelo não-comprometimento e pela ausência quase total da solidariedade social” (p. 168), a educação tende a tornar-se, crescentemente, em um meio de transmissão de princípios doutrinários neoliberais, assumindo um caráter adaptativo. Portanto, o que está em questão para o autor é a adequação da escola à ideologia dominante assim como as formas de resistência da mesma a esse processo.

No nono capítulo, “O Estado e o mundo do trabalho em mutação”, Maria Vieira Silva analisa as relações entre Estado-Nação e as ações do terceiro setor e seus impactos na educação.

Chama-nos atenção o argumento da autora, segundo o qual o terceiro setor é um espaço político de ruptura da cidadania e dos direitos públicos historicamente conquistados. De acordo com a autora, a educação escolar na década de 1990 tem sido um campo fértil para a consolidação de ações e proposições do terceiro setor.

Nesse contexto, Vieira defende uma concepção crítica da educação, voltada para o atendimento dos interesses daqueles que, ao longo de um processo histórico, ficaram à margem dos bens sociais e materiais produzidos coletivamente pela humanidade.

No capítulo que encerra o livro, cujo título é “Entre o real e o virtual”, Andréia Galvão aborda a reforma sindical e trabalhista em debate no governo Lula. A autora discute a flexibilização da legislação do trabalho como parte da estratégia do capital mundializado, com o objetivo de derrubar as formas de regulação sobre o trabalho, ou seja, a desconstrução de direitos sociais historicamente conquistados pelos trabalhadores. Para Galvão, o governo Lula tem mantido a flexibilização trabalhista, ainda que em ritmo menor que o verificado no governo FHC. A autora ainda destaca alguns pontos da reforma sindical, para demonstrar que ela vem para restringir a liberdade e a autonomia dos sindicatos. Nesse sentido, Galvão conclui que não há no governo Lula “um compromisso em assegurar e, muito menos, em ampliar os direitos trabalhistas” (pág. 215).

Assim, tratando de temas relevantes de forma instigante, o livro organizado por Carlos Lucena constitui-se num importante instrumento teórico para cientistas sociais, educadores e demais interessados em compreender criticamente os processos socioeconômicos, políticos e educacionais que regem a sociabilidade nas nações capitalistas neste inicio do século XXI. A sua leitura é fundamental para aqueles que desejam discutir, numa perspectiva crítica radical, as inter-relações entre trabalho e educação em tempos de globalização e mundialização do capital sob a égide de políticas fundadas no neoliberalismo.

Fabiane Santana Previtalli – Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais, Brasil. E-mail: fabianesp@netsite.com.br

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[MLPDB]

Jacques Ardoino: pédagogue au fil du temps – VERRIER (RF)

VERRIER, Christian. Jacques Ardoino: pédagogue au fil du temps. Préface de René Barbier. Paris: Téraèdre, 2010. 244p. Resenha de: MACEDO, Roberto Sidnei. Revista FACED, Salvador, n.16, p.139-140, jul./dez. 2009.

Jacques Ardoino: pedagogo no fio do tempo, é um trabalho de biografia analítica realizado por Christian Verrier, como nós, ex-aluno deste provocante e refinado epistemólogo das ciências da educação e antropossociais, que por diversas vezes visitou o Brasil para debater suas ideias, vinculadas principalmente ao seu mais fecundo e principal conceito neste campo da pesquisa e da formação educacional, o conceito de multirreferencialidade.

Enquanto uma obra que caracteriza bem as biografias analíticas, Jacques Ardoino: pédagoque au fil du temps procura traçar a itinerância do epistemólogo das ciências da educação de uma forma tal que sua vida não se descola dos seus conceitos fundamentais, das suas ideias e da personalidade forte e empreendedora do formador e pesquisador, que tinha um gosto quase compulsivo pela criticidade e pela argumentação voltada para os grandes desafios epistemológicos e ontológicos produzidos pelo movimento da temporalidade a que estava implicado. Nestes termos, a obra explicita o conjunto de diálogos provocantes entre Ardoino, Morin, Castoriadis, Mafesoli, Lourau, entre outros intelectuais contemporâneos, que desafiam as fronteiras da contemporaneidade, daí sua preferência por teorizar a partir dos meios e práticas educacionais a problemática da complexidade.

Mas é a ideia de multirreferencialidade que aparece capitaneando a obra e entretecendo as inúmeras contribuições do pesquisador emérito da vanguardista Universidade de Paris 8, para se compreender a formação e intervir nas coisas da educação.

Verrier tem a competência de, através dos argumentos implicados de Jacques Ardoino, nos colocar no centro dos sentidos construídos pelo epistemólogo a respeito daquilo que mais lhe entusiasmava nas suas diversas conferências e conversas com seus alunos, ou seja, a heterogeneidade como riqueza irredutível da emergência humana e a identidade constituída por identificações fundadas na negatricidade dos sujeitos sociais em movimento de afirmação das suas alteridades, alteridades que só podem emergir, segundo Ardoino, na medida em que, em relação, alteram e ao mesmo tempo criam incessantemente inacabamentos. Dá-se aqui a inarredável e trágica necessidade do outro. É nestes termos que a pluralidade implica numa ética e numa política que vai muito além de uma “comemoração” diante da emergência da diversidade.

Entretanto, é a densidade da ideia-força de multirreferencilidade que a obra evidencia de forma intencional.

Verrier nos mostra que o grande mérito do pensamento de Ardoino e da sua práxis educacional é fazer entrar de forma original e fecunda na epistemologia das ciências da educação e antropossociais, um sistema de pensamento e uma perspectiva de práxis, onde a heterogeneidade é o ponto de partida epistemológico, ético, político e formativo, reconhecida como ineliminável para se pensar a formação do Ser do homem em sociedade. Motivo da publicação de números específicos de algumas revistas de mérito no campo das ciências da educação na Europa e no Brasil, a epistemologia e a práxis multirreferencial de Ardoino faz do seu argumento instituinte sobre a alteridade/alteração, um potente analisador crítico e um fundante dispositivo de formação, que deslocam, destrivializam e desnaturalizam as compreensões e práticas educacionais forjadas nas palavras de ordem, nas respostas pré-digeridas, nos lugares-comuns, nos conceitos protegidos, significados autoritários e nas interpretações de pretensões monossêmicas. É assim que a existência e a cultura, no plural, radical e relacionalmente concebidas, alimentam e fazem brotar uma epistemologia da educação e, a fortiori, uma compreensão da formação e da sua mediação, implicadas à emergência culturalmente singular e relacional da nossa human-idade. É este viés que identifica Ardoino como um epistemólogo das situações e ações educacionais, que prefere pensar e atuar de dentro das vibrações produzidas pelas temporalidades vividas. Aliás, é orientado por esta perspectiva, que Verrier cunha o título da sua obra, que, ademais, vai marcar o conjunto de escritos que na Europa começam a realçar a singularidade universal do pensamento inquieto e radicalmente pluralista do nosso também professor Jacques Ardoino.

Roberto Sidnei Macedo – Universidade Federal da Bahia (UFBA). E-mail: rsmacedo@terra.com.br

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Vozes femininas do Império e da República – LÔBO; FARIA (REF)

LÔBO, Yolanda; FARIA, Lia (orgs.). Vozes femininas do Império e da República. Rio de Janeiro: Quartet : FAPERJ, 2008. Resenha de: PAIVA, Kelen Benfenatti. Contar, é preciso. Revista Estudos Feministas v.17 n.2 Florianópolis May/Aug. 2009.

É fato que a história das mulheres e sua inserção no espaço público foram marcadas por uma longa trajetória de preconceitos e de dificuldades, por isso faz-se, ainda hoje, necessário contar essa história tantas vezes silenciada ao longo dos séculos. E com certeza foi essa a intenção de Yolanda Lôbo e Lia Faria quando reuniram, em Vozes femininas do Império e da República, uma coletânea de artigos com a intenção de “descortinar ideologias e utopias presentes no imaginário feminino, apontando assim para a construção histórica do gênero feminino em Portugal e no Brasil” (p. 16).

Com 368 páginas, o livro publicado pela Editora Quartet e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), em 2008, está a serviço de contar a história das mulheres por meio de experiências pessoais que ultrapassam a esfera do individual. Pode-se afirmar que a diversidade de assuntos abordados e os diferentes enfoques são perpassados e conduzidos por dois eixos centrais: educação e gênero.

Estruturalmente, o livro apresenta-se dividido em três partes: “Falas Imperiais”, “Falas Literárias” e “Falas Apaixonadas”. Na primeira constam dois artigos cuja temática é a educação no Oitocentos. Na segunda aparecem cinco textos que tratam de nomes importantes de mulheres na imprensa, na educação e na literatura. E em “Falas Apaixonadas” concentram-se quatro artigos que enfocam a atuação política e as intervenções de mulheres na educação e na cultura.

Sobre educação, é possível uma “volta” ao passado com Maria Celi Chaves Vasconcelos em “Vozes femininas do Oitocentos: o papel das preceptoras nas casas brasileiras”, em que a autora recupera parte da história das mulheres que encontraram nessa prática educativa um meio de subsistência. Como destaca a autora, as preceptoras foram, no século XIX, as primeiras educadoras “oficialmente instituídas que tornaram o seu ‘fazer’ uma ‘atividade profissional’ remunerada, representando a abertura do mercado de trabalho intelectual à condição feminina” (p. 38).

Sobre a educação feminina, cabe destacar o enfoque dado por Suely Gomes Costa em “Diário de uma e outras meninas: práticas domésticas e educação”, em que o olhar da pesquisadora se volta ao Diário de Helena Morley, publicado em 1942. A partir das experiências pessoais vividas na infância em Diamantina, narradas no diário, registra-se “um painel de trabalho de muitas mulheres a sua volta, das mais às menos instruídas, entrelaçadas em rede, nessa luta comum por sobrevivência” (p. 67). As confissões relatam a participação de meninas nos afazeres domésticos diários e a dificuldade de conciliar a casa e a escola. Destacam, ainda, como aponta Suely, a participação feminina na captação de moedas por meio do trabalho restrito ao âmbito do lar, as chamadas “prendas femininas”. Por fim, o artigo ressalta que a luta pela sobrevivência, nesses casos, criou “reiteradas restrições de acessos à educação” (p. 70).

Será a educação, ainda, pano de fundo em “Vozes católicas: um estudo sobre a presença feminina no periódico A Ordem (anos 1930-40)”. No artigo, Ana Maria Bandeira de Mello Magaldi resgata a participação de algumas mulheres na revista e destaca o caráter de “apostolado doutrinário e espiritual” da publicação. Atenta para a participação, dentre outras, de Lúcia Miguel Pereira na seção “Crônica feminina”, criada em 1932. Nas crônicas assinadas pela autora, há uma reflexão sobre os novos rumos da vida social que impactariam na condição feminina. Sobre o assunto, a cronista deixa explícita sua preocupação com risco de a mulher deixar-se seduzir por um ritmo, uma “trepidação”, própria dos tempos modernos, que a conduziria ao trabalho remunerado na esfera pública, quase sempre marcado pelo individualismo. É o foco no social a maior defesa da autora, que enfatiza a importância da educação feminina para um projeto segundo o qual a mulher deveria “pôr a serviço do bem comum as riquezas de sua psicologia materna “(p. 98), como bem destaca a autora do artigo.

É ainda pelo viés da educação e da literatura que Constância Lima Duarte nos apresenta Nísia Floresta, nome importante no avanço da educação feminina no Brasil, que traz em quase todos os seus livros “o propósito de formar e modificar consciências” e o projeto de “alterar o quadro ideológico-social” (p. 106). Em “Nísia Floresta e a educação feminina no séc. XIX”, a pesquisadora destaca o caráter inovador das ideias e práticas educativas de Nísia, como sua defesa por uma educação feminina pautada menos na educação da agulha e mais em uma formação multifacetada. Lembra ainda que, na produção da escritora, há textos que se inscrevem na tradição de uma “prosa moralista de intenção nitidamente doutrinária”, com o objetivo principal de “transformar a mulher indiferente em mãe amorosa e responsável”, contribuindo – sem o saber – para a cristalização de uma “mística feminina” (p. 140). A pesquisadora afirma que, a posteriori, “é fácil de perceber a manipulação ideológica desse discurso e as conseqüências na vida das mulheres” e destaca como o elogio da maternidade tornou-se uma “nova forma de enclausuramento” (p. 140).

Em “Carmen Dolores: as contradições de uma literata da virada do século”, Rachel Soihet e Flávia Copio Esteves se unem para apresentar ao leitor outra mulher à frente de seu tempo. Ciente das aptidões e dos papéis de cada gênero como construções sociais, Carmen Dolores usou a escrita para tratar de assuntos de interesse das mulheres, como a desmistificação da maternidade como seu único destino e a defesa do divórcio em nome da integridade familiar, da política, da educação e do trabalho feminino. Convivem nas crônicas assinadas pela autora a busca da libertação feminina pela educação e pelo trabalho e a manutenção de alguns comportamentos femininos. Tal paradoxo, claramente apontado pelas autoras, deve-se ao fato de que a escritora é, como tantas outras, uma “expressão da cultura de seu tempo e de sua classe”, sendo preciso considerar “a flexibilidade da ‘jaula’ representada pela cultura” (p. 165-166).

Pelo viés memorialístico e pelo cunho autobiográfico dos diários, dos cadernos de anotações e dos álbuns de memórias da professora Maria Luiza Schmidt Rehder, textos analisados por Marilena A. Jorge Guedes de Camargo, em “Ecos de um passado feminino: entre escritos e sentimentos”, chegam a nós relatando a trajetória de uma mulher movida pelos sentimentos que se propõe a “fazer história com sua experiência”. Assim, ao narrar sua vida, em Rio Claro, registra também acontecimentos importantes da década de 1930. Relata, por exemplo, a formação de um exército de voluntários unidos sob ideais patrióticos em defesa de São Paulo e registra a participação das mulheres paulistas na Revolução de 1932, costurando fardas e cobertores, angariando donativos para a manutenção dos batalhões, além da atuação das enfermeiras em hospitais de campanha.

Ao falar da condição feminina impressa no romance A doce canção de Caetana, de Nélida Piñon, Tânia Navarro Swain propõe uma “leitura ativa” que em nada se pretende imparcial ou distanciada, “apropriando-se” da narrativa para criar e atribuir-lhe sentidos múltiplos. Assim, em “A doce canção de Caetana: meu olhar” busca investigar as imagens e representações sociais do feminino e do masculino que habitam o romance. Discute, entre outros assuntos, a instituição do casamento como valor social na manutenção do poder masculino; a “ilusória força masculina” pautada no “fantasma da potência sexual” e na “posse de corpos alheios”; e a prostituição como “criação social”, na qual, como destaca a autora, há “violência de corpos desprovidos de subjetividade” (p. 216).

Atravessando o Atlântico, Áurea Adão e Maria José Remédios detêm-se na participação política das mulheres em Portugal de 1946 a 1961. Em “Os discursos do poder e as políticas educativas na governação de Oliveira Salazar: as intervenções das mulheres na Assembléia Nacional”, as autoras atentam para a atuação das deputadas na Assembleia Nacional bem como para a imagem do feminino que subjaz, explícita ou implicitamente, nas suas intervenções. Para tanto, analisam os discursos de seis mulheres parlamentares e observam que algumas áreas estavam restritas à intervenção pública feminina: a educação, a família, a assistência social e a saúde. Toda tentativa de ir além de tais assuntos era marcada por justificativas das parlamentares diante de seus pares. Ainda nos discursos dessas mulheres pode-se perceber, como destacam as autoras, a defesa da permanência da mulher no âmbito do lar, numa “valorização da função de mãe de família” e de “guardiã vigilante da harmonia e da felicidade do lar”, numa “verdadeira vocação de mulher” (p. 272), contribuindo para a manutenção de um questionável modelo social.

Seguindo ainda a trilha de mulheres que fizeram história, Lia Ciomar Macedo de Faria, Edna Maria dos Santos e Rosemaria J. Vieira da Silva seguem os passos da professora e historiadora Maria Yeda Linhares. De perfil “questionador e combativo” e de trajetória marcada “pela irreverência e coragem intelectual”, Maria Yeda se colocou em defesa do direito à educação e à garantia de uma escola pública efetivamente republicana, pois, para ela, segundo destacam as autoras em “Os múltiplos olhares de Maria Yeda Linhares: educação, história e política no feminino”, o sucesso da escola pública significa uma “questão de sobrevivência se quisermos existir como povo e nação” (p. 297).

A trajetória de outra professora, Myrthes de Luca Wenzel, também é abordada em “Alcachofras-dos-telhados: lições de pedagogia de uma educadora”, por Yolanda Lôbo. À frente da Secretaria Estadual de Educação e Cultura do Rio de Janeiro, a educadora reuniu em torno de si um seleto grupo de intelectuais e foi, como destaca a autora do artigo, idealizadora de uma “pedagogia libertadora”, uma proposta educacional inovadora, que buscava a felicidade dos alunos, “com liberdade de criar, de viver em sociedade e ao mesmo tempo preparados de modo completo e científico” (p. 316).

Voltando-se ao espaço sociocultural português, Zília Osório de Castro, em “Na senda do feminismo intelectual”, discute a condição feminina a partir da reflexão do papel do intelectual. Destaca a criação das revistas Pensamento, O Diabo e O Sol Nascente, na década de 1930, que “apostavam na reforma cultural” e traziam em suas páginas o tema do feminismo em meio ao “confronto de valores culturais presente na sociedade portuguesa de então” (p. 340). A participação das mulheres nessas revistas representou, segundo a autora, uma evolução, seja por sua inserção em um espaço majoritariamente masculino, seja pelo reconhecimento de suas potencialidades e sua “comparticipação na criação da nova sociedade” ou pela “conscientização de uma outra idéia de mulher” (p. 340), ser humano dotado de direitos e deveres. Por meio dessas mulheres se deu um “feminismo interventivo e não apenas participativo, um feminismo cívico e não apenas político” (p. 341). Zília lembra o nome de Ana de Castro Osório no feminismo cultural dos anos 1930, que defendia o trabalho como “carta de alforria” da mulher com o objetivo de responsabilizá-la por seu próprio destino. Observa ainda, nos periódicos analisados, dois tipos de feminismo: um “feminismo feminino”, pelo qual a mulher reivindicava uma função social, além da revisão da sua situação familiar, profissional e política; e um “feminismo masculino”, pelo qual os homens escreviam em “defesa” das mulheres.

É interessante notar, pela leitura dos artigos reunidos em Vozes femininas do Império e da República, como o lento processo de “libertação” da mulher está ligado à promoção de sua educação, de seu desenvolvimento intelectual e de seu trabalho, reafirmando o que Virgínia Woolf teorizou tão bem em Um teto todo seu. O leitor que se aventurar nas instigantes trilhas propostas pelas autoras deste livro chegará ao final de sua leitura com a visão panorâmica das principais lutas e obstáculos vivenciados pelas mulheres ao longo dos séculos, em diferentes contextos, dos quais o reconhecimento da diferença e o direito à educação foram fundamentais ao que se convencionou chamar de feminismo.

Pode-se dizer que, nas páginas deste livro, configura-se um feminismo crítico através das vozes de 13 mulheres que se unem para contar histórias de outras mulheres, que, por sua vez, superam os relatos pessoais e fazem coro com as autoras dos artigos para narrarem juntas uma história bem mais ampla: a história das mulheres.

Kelen Benfenatti Paiva – Universidade Federal de Minas Gerais.

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Mato Grosso do Sul: o universal e o singular | Gilberto Luiz Alves

“Agora a nossa realidade se desmorona.

Despencam-se deuses, valores, paredes…

Estamos entre ruínas.

A nós, poetas destes tempos, cabe falar dos morcegos que voam dentro dessas ruínas.

Dos restos humanos fazendo discursos sozinhos nas ruas.

A nós cabe falar do lixo sobrado e dos rios podres

que correm por dentro de nós e das casas.”

Manoel de Barros

Se ao poeta destes tempos cabe alertar sobre a fragmentação da sociedade e, sobretudo, sobre a fragmentação que atinge nossa visão sobre a mesma – tarefa cumprida com maestria pelo cantador do Pantanal, Manoel de Barros -, a perspectiva do pesquisador é procurar compreendê-la. Em outras palavras, como mesmo aponta Gilberto Luiz Alves na obra Mato Grosso do Sul: o universal e o singular, a importância do conhecimento está exatamente em captar a condição humana que nos aproxima, em sua relação com os singulares nos quais esta humanidade vem se expressando, em diferentes espaços e momentos da história.

Esta é a proposta central desta obra: discutir o movimento histórico de como se constituem, em permanente relação, o universal de nossos tempos, a sociedade capitalista, e suas diferentes expressões singulares, marcadas pelas particularidades próprias ao desenrolar da constituição histórica do capital em diferentes paisagens sociais. Ao adentrar tal caminho, contudo, o autor acaba por confrontar-nos com discussões centrais na historiografia atual, de interesse não só àqueles que se dedicam à temática educacional e regional, nas quais Alves tem concentrado seus trabalhos de pesquisa1.

Mais que isso, o autor nos brinda com uma reflexão acerca do próprio significado epistemológico e da importância heurística destas duas categorias, universal e singular, dentro do campo teórico marxista. Com isso, apresenta uma discussão profícua para que sejam discutidos os particularismos que ainda hoje se apresentam no campo teórico das Ciências Humanas, ainda mais quando as manifestações de um regionalismo estreito têm impregnado diferentes análises, sob o invólucro da defesa do direito à diferença.

Neste sentido, Alves rejeita qualquer análise que desconsidere o singular e sua importância enquanto espaço de manifestação das leis gerais que operam na sociedade capitalista. Já que o universal, nunca é demais lembrar, encontra aí seu espaço de materialização histórico-social; mas também alerta para o perigo de autonomizar-se o movimento do particular, tornando-o auto- explicativo, perdendo a perspectiva de que seu móvel encontra-se no próprio movimento do todo, encontra-se na sociedade capitalista do qual é parte constituinte. Como forma específica de realização do universal, portanto, os distintos singulares presentes na realidade social estão a ela subordinados, e somente nesta relação dialética serão encontradas as chaves para seu entendimento.

Tais reflexões tornam-se ainda mais interessantes quando ao exercício teórico somam-se os resultados das pesquisas de campo realizadas pelo autor, momento em que expõe seu enfrentamento com os problemas concretos trazidos pela necessidade, imperiosamente colocada ao teórico marxista, de considerar adequadamente a relação universal/singular. Necessidade esta, diga-se de passagem, que vai além do campo meramente explicativo, mas que tem raízes na própria práxis do profissional engajado nos embates sociais de seu tempo.

Como resultado deste confronto, vemo-nos frente a quatro trabalhos, escritos em distintos momentos da vida acadêmica do autor, mas alinhavados teoricamente, como declara este último, pela proposta metodológica de destacar como o marxismo se posiciona frente à relação entre o universal e o singular, objeto de suas reflexões no primeiro texto desta coletânea (Universal e singular: em discussão a abordagem científica do regional). Para a apresentação de suas conclusões, nada melhor do que evidenciar a própria trama de que resulta o processo de formação e consolidação da sociedade capitalista, materializada nas expressões singulares que conformaram esta mesma sociedade no Novo Mundo. Estas últimas são trazidas à cena histórica, por um lado, fazendo menção àquilo que universaliza a ação humana nesta parte do globo, ou seja, as manifestações do capital enquanto elemento inerente e essencial no processo societário em curso; por outro, este capital, na sua dinâmica concreta, encontrou sua materialidade nas formas distintas por meio das quais expressou-se nesta parte do mundo, manifestas na atividade jesuítica, nas diferentes formas de colonização das Américas, na maneira como se deu a utilização da força de trabalho índia, negra ou imigrante, ou mais modernamente, como se expressou no continente a doutrina de segurança nacional.

O autor destaca, contudo, a necessidade de que sejam desveladas, neste esforço teórico-metodológico, as representações ideológicas que reforçam o estranhamento entre os povos americanos, na medida em que desviam a atenção do pesquisador da relação dialética necessária entre o singular e o universal. Na verdade, os regionalismos, os nacionalismos, em seus diferentes matizes, levam ao esquecimento da necessidade de se enfatizar a subordinação dos distintos singulares ao movimento universal da sociedade capitalista, uma vez que estes singulares são formas de realização desta mesma sociedade. Na práxis política, destaca ainda, isso significa a construção das bases para uma ação política significativa para o conjunto da humanidade, isto é, capaz de colaborar para o projeto emancipatório do homem hodierno.

O segundo texto (Nacional e regional na historiografia educacional brasileira: uma análise sob a ótica dos estados mato-grossenses) promove um balanço da historiografia educacional produzida no e sobre os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, entre os anos 70 e 90. O critério a partir do qual esta parcela da historiografia regional será analisada está centrado na relação universal/singular, desta feita discutida a partir de algumas das expressões desta singularidade, a questão regional e a questão educacional.

Com base nestas premissas é discutida a historiografia sobre esta região do país, tanto aquela que teve a educação como objeto como aquela que, embora não centrada nos fenômenos educativos, é essencial para que se compreenda a constituição do processo capitalista nesta parte do Brasil. Revelam-se assim, no exercício cotidiano da pesquisa em História da Educação, os liames que permitem reconstituir os processos educativos em curso naquela determinada região do país, em determinado momento de sua história, a partir da reconstituição das relações que os processos em foco guardam com a totalidade da sociedade capitalista.

Para esta exposição, são retomadas as obras da historiografia educacional diletante, marcadas essencialmente pelo registro e reconstituição factual da história. Entre estes trabalhos que antecederam a produção acadêmica destaca-se a obra de Melo e Silva, único intelectual a lançar-se à análise do momento histórico que era foco de suas preocupações – a década de 40 do século XX, em especial na fronteira sul do então estado de Mato Grosso, obra que ainda permanece como um desafio para a historiografia regional, dada esta sua especificidade.

O surgimento da produção acadêmica a partir dos anos 70, fortalecida na década seguinte pelo aparecimento dos primeiros cursos de pós-graduação naqueles estados, dá ensejo não só ao maior conhecimento e problematização da questão educativa regional, como à sua incorporação no debate nacional. A formação de coletivos de pesquisa, o levantamento de fontes para a pesquisa, a organização de arquivos, centros de documentação, entre outras iniciativas, fortaleceu a discussão sobre os entraves representados pelo regionalismo, e a necessidade do fortalecimento da discussão acerca da relação universal/singular, no entendimento das formas assumidas pelo processo educativo nos dois estados.

Além disso, mais recentemente, como o demonstra este próprio texto, escrito por ocasião do I Congresso Nacional de História da Educação, realizado sob os auspícios da Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE), as reflexões sobre a historiografia educacional mato-grossense e sul-mato-grossense, na medida em que desvele as singularidades assumidas pelo processo educativo nestas regiões do Brasil, pode contribuir para iluminar a produção historiográfica sobre o tema em todo o país, em dois sentidos. Primeiro, ao levantar hipóteses de trabalho sobre como fenômenos produzidos nacionalmente, fruto do processo de expansão capitalista, singularizam-se nestes estados, e de como estas singularidades podem ou não tornarem-se expressões presentes em outras regiões do Brasil. Segundo, colaborando para que certas idéias que se tornaram comuns na historiografia educacional brasileira sejam confrontadas com sua materialidade, o que pode favorecer a crítica científica de certos equívocos que vem se perpetuando entre os estudiosos da área.

O terceiro texto retoma a mesma discussão sobre o singular e o universal, desta feita ao tratar sobre A trajetória histórica do grande comerciante dos portos em Corumbá: 1857-1929.

Tendo como preocupação central analisar o surgimento da casa comercial em Corumbá, na segunda metade do século XIX, o autor demonstra, em um texto de rara inspiração, os liames que fazem desta uma expressão, no distante Mato Grosso, do período de transição da fase manufatureira para aquela centrada na Revolução Industrial, ou seja, na produção de bens industrializados, no interior da etapa concorrencial do capitalismo.

Alves demonstra, recorrendo a exemplos relativos ao mesmo fenômeno em outras partes do continente sul-americano, como se deu a formação, o desenvolvimento e, posteriormente, o ocaso desta atividade comercial que marcou tão intensamente a vida daquela região de Mato Grosso2. O autor destaca ainda como essas marcas provocaram a cosmopolitização da vida em Corumbá, dando ensejo a manifestações culturais e sociais até hoje presentes naquele município fronteiriço, como é o caso do conjunto arquitetônico denominado Casario do Porto. No momento em que se discutem propostas de revitalização destas e de outras edificações em Corumbá, nada mais importante do que se ter sob os olhos este passado, base para as reflexões presentes sobre o seu uso continuado e, acima de tudo, centrado nos interesses de construção de uma sociedade cidadã.

No quarto e último texto o autor volta suas preocupações aos primórdios da atividade que, em momento histórico posterior ao comércio, virá a ser determinante na região pantaneira. Estamos falando da pecuária na segunda metade do século XIX, e sobre um de seus principais mentores no Pantanal neste período, temas do trabalho José de Barros: a formação de um pioneiro.

Sobre os destaques deste texto, é interessante assinalar, primeiramente, a utilização sistemática da obra de cronistas e viajantes para descrever aspectos da região neste momento histórico, destacando a forma como se davam as relações humanas nesta etapa da sociedade capitalista no Pantanal. Em outras palavras, como se singularizou, na região da Nhecolândia, uma determinada forma de expressão, particular a este espaço e momento histórico, da sociedade capitalista.

Num segundo momento, Alves demonstra ainda como os limites materiais impostos a esses homens neste processo de formação e consolidação das fazendas de gado levaram-nos a determinadas soluções no processo de recolonização da região. Neste sentido, por exemplo, embora valorizasse o ensino formal, – traço este que parece ter destacado a sua família frente a outros pioneiros -, José de Barros teve que abandonar a escola regular, após ter aprendido os seus fundamentos (ler, escrever e realizar as quatro operações aritméticas), dados os precários recursos materiais de sua família.

As necessidades impostas pelas dificuldades inerentes ao trabalho com a família lhe impuseram continuar sua formação na “escola do trabalho”, aquela que lhe permitiria, junto aos conhecimentos e hábitos adquiridos graças à escola regular, alguns anos depois, criar as condições concretas para o sustento e a formação de uma vasta prole, criada e ambientada na região pantaneira.

À guisa de conclusão, consideramos aqui as palavras iniciais do autor quando, na página de abertura da obra Mato Grosso do Sul: o universal e o singular, dedica seu trabalho ao poeta Manoel de Barros, “poeta que se universalizou ao cantar o Pantanal.” Da mesma forma, cremos que Alves, partindo de uma discussão centrada na temática regional, – intenção claramente exposta desde o início no próprio título dado a este trabalho, – tenha alcançado seu intento de demonstrar e discutir questões que são de interesse para pesquisadores de todas as áreas do conhecimento. Em outras palavras, o autor também se universaliza, trazendo a baila um trabalho que, pelo rigor com que discute uma questão central no universo metodológico marxista, contribui para o debate teórico enfrentado pelos estudiosos de hoje, sejam quais forem seus recortes temáticos específicos. Neste sentido, torna-se uma obra importante para quantos tenham interesse de trabalhar, teórica e ou praticamente, a relação entre o singular e o universal na pesquisa científica.

Notas

1. Eis, a título de exemplo, algumas das obras do autor nestes campos temáticos: ALVES, Gilberto Luiz. Educação e história em Mato Grosso: 1719-1864. 2.ed. rev. Campo Grande: UFMS, 1996.; Id. Mato Grosso e a história: 1870-1929 (Ensaio sobre a transição do domínio econômico da casa comercial à hegemonia do capital financeiro). Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, v. 2, n. 61, p. 5-81, 1984; Id. O pensamento burguês no Seminário de Olinda: 1800-1836. 2. ed. rev. Campo Grande: UFMS; Campinas: Autores Associados, 2001.; Id. A produção da escola pública contemporânea. Campinas: Autores Associados, 2001.

2. Trata-se aqui do estado de Mato Grosso antes do processo de divisão, ocorrida em 1979, que deu origem a duas unidades federativas: Mato Grosso e Mato Grosso do Sul

Silvia Helena Andrade de Brito – Departamento de Ciências Humanas e Sociais. CCHS/UFMS. E-mail: shbrito@terra.com.br


ALVES, Gilberto Luiz. Mato Grosso do Sul: o universal e o singular. Resenha de: BRITO, Silvia Helena Andrade de. Reconstituindo as teias da relação entre o universal e o singular. Albuquerque – Revista de História. Campo Grande, v. 1, n. 1, p. 229-235, jan./jun., 2009.

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Educação, história e cultura no Brasil Colônia – PAIVA (RBHE)

PAIVA, José Maria de; BITTAR, Marisa; ASSUNÇÃO, Paulo de. Educação, história e cultura no Brasil Colônia. São Paulo: Editora Arké, 2007. Resenha de: TOLEDO, Cézar de Alencar Arnaut de; BARBOZA, Marcos Ayres. Revista Brasileira de História da Educação, n° 19, p. 227-234, jan./abr. 2009

A presente obra é o resultado do trabalho de pesquisa de nove pesquisadores de universidades públicas e privadas brasileiras, ligados ao Grupo de Pesquisa “Educação, História e Cultura: Brasil, 1549-1759”, liderado pelo pesquisador José Maria de Paiva, professor da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP).

O grupo de pesquisa, criado em 2000, está vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UNIMEP, com núcleos de pesquisa na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR, São Carlos-SP); na Universidade Estadual de Maringá (UEM, Maringá-PR); no Centro Universitário Assunção (UNIFAI, São Paulo-SP) e na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ, Rio de Janeiro-RJ).

O objetivo do livro é apresentar ao campo científi co da área de ciências humanas, notadamente da educação e da história da educação, o resultado de pesquisas e debates promovidos nos encontro de apresentação e discussão de trabalhos do grupo de pesquisas, ocorridos em sua trajetória. Para tanto, está organizado em sete capítulos da seguinte maneira: capítulo um, “Religiosidade e cultura brasileira – século XVI”, escrito por José Maria de Paiva; capítulo dois, “Educação jesuítica no império português do século XVI: o colégio e o Ratio Studiorum”, escrito por Célio Juvenal Costa; capítulo três, “As relações epistolares: humanistas e jesuítas”, escrito por Edmir Missio; capítulo quatro, “Os exercícios espirituais e o teatro”, escrito por Paulo Romualdo Hernandes; capítulo cinco, “Educação e cultura na América portuguesa: as reformas de Sebastião José de Carvalho Melo”, escrito por Paulo de Assunção; capítulo seis, “A pesquisa em história da educação colonial”, escrito por Marisa Bittar e Amarílio Ferreira Júnior e, por último, capítulo sete, “Educação jesuítica no Brasil colonial: estudo baseado em teses e dissertações”, escrito por Maria Cristina Innocentini Hayashi e Carlos Roberto Massao Hayashi.

No capítulo um, “Religiosidade e cultura brasileira no século XVI”, José Maria de Paiva afi rma que não se pode compreender a religiosidade brasileira sem que se faça referência à cultura, considerada como a maneira de ser da sociedade e, na qual, as pessoas se expressam por meio das relações. Na primeira parte, “A religiosidade nas práticas sociais”, analisa documentos ofi ciais de um período histórico em que a cultura portuguesa, como um tudo, tinha um único objetivo, o cuidado da religião. A religiosidade cristã era a forma de ser da sociedade portuguesa. A existência humana em conformidade com a fé era uma exigência cultural e, como tal, uma obrigação pública e social. A vida em sociedade era regida pela “nossa santa fé”; os comportamentos considerados de  “bons costumes” fundamentavam-se na doutrina da Igreja e, também, na legislação do Reino. Aqueles que se desviavam dos “bons costumes”, aos olhos dos indivíduos e da sociedade mereciam reprovação social e punição pelos seus pecados. Na segunda parte, “A religiosidade na sua expressão devocional”, o professor José Maria de Paiva analisa a prática devocional e cultural dos portugueses na colônia, visando demonstrar a formação da subjetividade portuguesa alicerçada sobre a religiosidade. Ser cristão, nesse período, significava ir a missa e comungar; além disso, uma maneira de apreender e pregar os “bons costumes”. A devoção era caracterizada como o novo modo de vida que se assumia, por meio de jejuns, abstinência e disciplina para a renovação ou reformulação da espiritualidade. A fé cristã, na sociedade portuguesa, não implicava na conformidade com os ensinamentos dos padres, mas no viver uma vida em que Deus se põe presente. Assim, para não se cair em contendas com a figura do poder sagrado, a solução era ganhar as boas graças pelo cumprimento da obediência.

No capítulo dois, “Educação jesuítica no império português do século XVI: o colégio e o Ratio Studiorum”, Célio Juvenal Costa afi rma que o objetivo inicial da Companhia de Jesus era a reconquista da cidade de Jerusalém para os cristãos, mas, no decorrer dos primeiros decênios de sua existência, por infl uência dos fundamentos teológicos e fi losófi cos da escolástica, igualmente pela austera formação dos clérigos, contribuíram com os objetivos da Igreja que visavam lidar com questões novas, como a expansão do comércio e a descoberta do novo mundo. Para discutir o papel do colégio e do Ratio Studiorum no trabalho jesuítico de formação escolar no século XVI, dividiu o trabalho em quatro partes: a primeira, “O jesuíta como instrumento da Reforma Católica”; a segunda, “A racionalidade educacional jesuítica”; a terceira, “O colégio” e, por último, a quarta, “Ratio atque Institutio Studiorum Societatis Iesu”. Segundo o autor, os colégios e o programa de formação elaborado pelos jesuítas, disponíveis aos jovens em geral, desenvolviam uma educação séria e exigente, o que se observa na análise dos cursos de humanidades, fi losofi a e teologia do Ratio Studiorum. Nas colônias, os colégios não se restringiam somente à formação, eram responsáveis também pela administração de povoações, cidades, igrejas e fazendas. Desse modo, conclui que tanto o plano de estudos como os colégios foram a expressão de experiências históricas que, avaliadas e reavaliadas, instituiu a forma de ser da Companhia de Jesus.

No capítulo três, “As relações epistolares: humanistas e jesuítas”, Edmir Missio analisa o papel exercido pelas cartas como instrumento de formação, que contribuía para a educação dos filhos da família Sforza, futuros governantes do ducado de Milão. Nas cartas, os filhos relatavam suas experiências e, também, serviam como um instrumento à manutenção das relações e hierarquias. A escrita das cartas exprimia as ações e os pensamentos, exigindo um grande esforço argumentativo, com o qual se verificava a formação recebida. Tratava-se de “uma técnica de composição e elaboração [dos] estudos de retórica e poética” (p. 46); elas eram avaliadas como um instrumento, “[…] de propaganda política e difusão cultural” (p. 46). Desse modo, o aprendizado das cartas passou “[…] a fazer parte do currículo das escolas fundadas pelos humanistas, as quais proverão quadros administrativos dos governos, como secretários e diplomatas” (p. 49). Assim, no decorrer do século XVI, a expansão do comércio e a descoberta do novo mundo, transformaram as relações sociais e culturais, e exigiram o desenvolvimento de uma educação mais apropriada aos desafi os da época, isto é, uma educação de caráter utilitário.

Capítulo quatro, “Os exercícios espirituais e o teatro”, Paulo Romualdo Hernandes discute a importância histórica dos exercícios espirituais, entendidos como um exame mental criado por Inácio de Loyola que, depois de aperfeiçoado, tornou-se um manual de educação e ensino da religiosidade cristã católica. Tratava-se de um método rigoroso, constituído por quatro semanas de exercícios; na primeira, o exercitante era convidado a realizar orações, colóquios, penitências e arrependimentos para se livra de seus pecados e, assim, purgado e penitenciado, o exercitante passa para a segunda semana de exercícios. A principal característica desse período chamado de semana era a iluminação divina; nela, o exercitante seguia a Jesus em todos os seus passos. As tarefas do diretor espiritual, como um mediador pedagógico, era possibilitar as condições necessárias para que o exercitante chegasse a experiência interior. Imitar Cristo significa “morrer para a vida que se tem, realidade real, para ressuscitar e viver eternamente espiritualmente” (p. 64). Ao aceitar o caminho de imitação de Cristo, o exercitante entra na terceira semana que também é iluminativa. Nela, ele vivia intensamente a Paixão de Cristo com todas as implicações que ela pudesse causar. Segundo Hernandes, “o que faz a plástica e a didática dos exercícios são o sentir interiormente trazendo para a memória, entendimento e vontade as dores da Paixão” (p. 65). Pelo renascer com Cristo, o exercitante entrava na quarta semana, caracterizada como um momento de União com Deus. Os exercícios espirituais não eram simples experiências místicas mas, também, uma dramatização, representações interiores que possibilitaram aos que não viveram na época de Jesus, conhecer a história da salvação do povo de Deus. Enfi m, as dramatizações tinham como objetivo tornar possível, por meio das representações, o conhecimento das verdades do sofrimento de Cristo e, notadamente, viver a alegria de Cristo Ressuscitado.

No capítulo cinco, “Educação e cultura na América portuguesa: as reformas de Sebastião José de Carvalho Melo”, Paulo de Assunção analisa o contexto histórico de Portugal após a morte do monarca dom João V, em 31 de julho de 1750, com a nomeação de Sebastião José de Carvalho e Melo, como primeiro-ministro de Portugal. Ele, ao assumir suas funções, implementou um conjunto de medidas para ampliar o poder do Estado, por meio da centralização do poder monárquico em relação ao poder exercido pela Igreja e pela nobreza. O rompimento com a Igreja ocorreu entre 1760-1770, período em que o Estado português delegou aos tribunais civis poderes para legislar sobre assuntos de ordem pública, revogando o cumprimento dos documentos oficiais da Igreja. A reformulação institucional “procurou atuar por meio de leis que clarificassem o papel das instituições, bem como das relações entre elas” (p. 76). A reorganização do império português visava o saneamento das contas do Estado, debilitada pelos acordos celebrados entre Portugal e a Inglaterra. As transformações repercutiram também no campo subjetivo e social, influenciadas pela efervescência das idéias iluministas. “O pensamento iluminista foi profícuo na discussão da liberdade e autonomia do Estado em relação à Igreja” (p. 78). Esses debates ainda repercutiram na educação e nos sistemas pedagógicos, já que a afirmação do poder do Estado evidenciou um ideal progressista que exigia o estabelecimento de uma educação de base científica, sobretudo da formação recebida nas escolas e universidades, que se encontravam sobre a influência da educação jesuítica.

No capítulo seis, “A pesquisa em história da educação colonial”, os autores, Marisa Bittar e Amarílio Ferreira Júnior discutem a produção científica no campo da educação, referente ao período colonial em que os jesuítas tiveram o domínio sobre a sistematização do trabalho pedagógico na colônia brasileira. A criação de um grupo de pesquisa, intitulado “Educação Jesuítica no Brasil colonial”, desenvolvido na UFSCAR, ligado ao Diretório de Pesquisa “Educação, História e Cultura Brasileira: 1549-1759”, liderado por José Maria de Paiva, possibilitou a análise de lacunas temáticas sobre essa produção, o que objetivou o desenvolvimento de pesquisas para ampliar a historiografia da educação brasileira desse período. Os autores, para analisarem a produção científica sobre a educação colonial, entre 1549 a 1759, estabeleceram seis categorias analíticas: a primeira, “A hegemonia dos jesuítas e a presença de sua ação pedagógica nos eventos científi cos”; a segunda, “As correntes interpretativas sobre a ação pedagógica dos jesuítas”; a terceira, “O tema nos manuais didáticos”; a quarta, “O tema em artigos e capítulos de livros”; a quinta, “O tratamento teórico-metodológico” e, por último, a sexta, “A questão das fontes”. Na conclusão, afirmaram que ainda existe uma enorme gama de assuntos não pesquisados, relacionados ao tema, sendo que as chances de estudos inéditos são maiores, porém, essa temática atrai um número restrito de profissionais em razão da necessidade de afeição com a história de nossos primeiros séculos; da disciplina de estudo para trabalhar com documentos históricos, da abrangência do campo de pesquisa em educação e a exigência de um tratamento epistemológico que dê materialidade a totalidade histórica dos primeiros séculos da formação social brasileira.

E, por fim, no capítulo sete, “Educação jesuítica no Brasil colônia: um estudo baseado em teses e dissertações”, Maria Cristina Innocentini Hayashi e Carlos Roberto Massao Hayashi analisam a produção científica sobre a educação jesuítica no Brasil colônia. Omaterial de estudo constituiu-se de teses de livre docência e doutorado e dissertações defendidas em programas de pós-graduação de instituições de ensino superior; para a coleta de materiais elegeu-se as bibliotecas digitais de teses e dissertações como fonte de pesquisa com base em uma abordagem bibliométrica. Essa abordagem consiste no estudo da atividade científi ca, visando o desenvolvimento de indicadores de avaliação da produção de conhecimento. De acordo com o levantamento bibliográfi co disponibilizado em diversas fontes de dados na Internet, das instituições de ensino superior, os resultados demonstraram que a maior parte da produção científica relacionada ao tema encontra-se em programas de pós-graduação da Região Sudeste do Brasil. A distribuição das 275 teses e dissertações realizadas possibilitou verifi car que a maioria dos trabalhos encontra-se vinculados a programas de história (119 trabalhos); educação (46); letras (16) e antropologia social (12). A análise bibliométrica da produção científica relacionada ao tema da educação jesuítica no Brasil colônia possibilitou a afirmação de que, a partir dos anos de 1990, houve um aumento significativo do número de trabalhos acadêmicos sobre a temática, sendo que a maioria desta produção concentra-se nas áreas de história e educação.

O trabalho desenvolvido pelo grupo envolve pesquisas relacionadas à presença jesuítica no Brasil colônia. Tem como centro a história da educação, defi nida como a aprendizagem da maneira de ser, a qual se constitui pela formação da identidade dos indivíduos e da sociedade. A educação e a cultura são compreendidas como dois elementos de análise do mesmo processo social; nele, a educação é ligada à aprendizagem e a cultura às formas de ser. A história, nesse contexto, é analisada com base na ação dos homens, que transformam e são transformados pelo produto de sua própria atividade material.

A disponibilização das pesquisas realizadas pelo grupo de pesquisa tem o mérito de abordar uma área de pesquisa que não tem recebido a devida atenção na área de educação. A tarefa de revisitar as fontes já conhecidas e de tratar temas também conhecidos, além de descortinar novas possibilidades interpretativas, pode apontar novos rumos e novas fontes para a pesquisa acadêmica. O livro é bem apresentado e cumpre uma importante função de apresentar, de forma acadêmica, temas e assuntos conhecidos.

A editora Arké traz ao público brasileiro uma importante referência temática da história da educação no Brasil, uma vez que a história da educação colonial é uma área pouco estudada entre os pesquisadores brasileiros que, nos últimos anos, tem ganhado expressividade com o trabalho realizado pelo Grupo de Pesquisa “Educação, História e Cultura: Brasil, 1549-1759”. Além disso, contribui para a divulgação do trabalho desenvolvido por pesquisadores da área. O livro destaca especialmente a atuação dos jesuítas no Brasil e, esse destaque, mostra a proeminência incontestável da Companhia de Jesus no campo da educação e mesmo da religião.

Cézar de Alencar Arnaut de Toledo – Doutor em educação pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP, 1996), professor no Departamento de Fundamentos da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UEM

Marcos Ayres Barboza – Mestre em educação (2007) pela Universidade Estadual de Maringá (UEM)

Cézar de Alencar Arnaut de Toledo. E-mail: caatoledo@uem.br

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Escritos sobre educação/ comunicação e cultura – PRETTO (RF)

PRETTO, Nelson De Lucca. Escritos sobre educação, comunicação e cultura. São Paulo: Papirus, 2008. 240 p. Resenha de: OLIVEIRA, Rosa Meire Carvalho. Revista FACED, Salvador, n.15, jan./jul. 2009.

Escritos sobre educação, comunicação e cultura, de autoria do professor Nelson De Luca Pretto, doutor em Comunicação pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado em Londres, Inglaterra, foi editado em 2008 pela Papirus. De cunho aparentemente despretensioso, a obra reflete, no entanto, a militância do educador Nelson Pretto, que, com o próprio exemplo, demonstra como construir uma prática que defenda a atuação do professor como intelectual da cultura.

É essa perspectiva que vemos consolidada ao longo de todo o livro, que apresenta um conjunto de textos datados entre 1983 e 2006. São artigos – publicados ou não – e entrevistas em diversos órgãos de imprensa local e nacional, além de discursos e escritos de antigos panfletos. É por meio deles que vemos reiterados, não só o espírito transformador que tem animado as práticas acadêmicas, universitárias e do cidadão Nelson Pretto, mas as ideias que vêm consubstanciando ao longo de mais de duas décadas a que os textos nos remetem, a ação de um educador ocupado em transformar pela práxis, a realidade de processos vitais para a educação, a comunicação e a cultura.

O alcance dessa práxis é revelada nas 240 páginas do livro, que é dividido em sete partes. E como bem aponta o educador português António Nóvoa, a quem coube a apresentação da obra: “Nelson Pretto exerce um olhar crítico e obriga-nos a pensar para além das esquadrias habituais. Este livro não deixa ninguém indiferente.
Faz-nos pensar. Dá o que pensar. Não será esse o objetivo primeiro de um intelectual? E, ao mesmo tempo, convida-nos a agir. Não será essa a missão principal de um educador?” (p. 11), indaga.

Nóvoa observa não ser à toa que o livro começa com um texto de Paulo Freire para quem o ato de educar é um ato de comunicação. É dessa mesma estirpe que se revela Pretto em suas itinerâncias, ao trabalhar a perspectiva de aproximar a educação da comunicação, trazendo desde seus primórdios um novo olhar que recoloca os cidadãos, em primeiro plano, e os professores como mediadores de uma cultura estruturalmente tecnologizada, em um novo patamar de ação. É nesse sentido que Pretto constata: “[…] Imaginava e continuo imaginando – hoje mais ainda! – que um professor deve ser, antes de tudo, uma liderança comunitária e intelectual […] fazer o processo educativo algo questionador, que extrapole o espaço das edificações escolares, uma ação que ganhe, literalmente, o mundo”. (p. 13) Nesse sentido, ganha espaço entre as várias seções do livro princípios defendidos por Pretto que compreende os imensos desafios colocados aos professores nesses tempos de comunicação em redes digitais globalizadas, cuja internet é o marco, e da imensa distância entre a cultura escolar e a cultura produzida fora dos muros da escola. Para ele, há dois pontos “importantíssimos” a considerar: primeiro, que a rede traz a possibilidade de interação entre o local e o não-local, a partir da valorização da cultura de origem; depois, pela “ocupação” dos espaços midiáticos, sejam os tradicionais (jornal, televisão, rádio, etc.) ou das novas mídias (a internet) por parte da escola. “Temos, portanto, de fortalecer os nós de conexão, de forma a fazer com que local e não-local interajam em pé de igualdade. Por isso sempre digo que não queremos internet nas escolas, mas sim escolas na internet” (p. 39), diz.

A Educação pelos meios e para os meios (BELLONI, 2001), ganha assim nas ideias de Pretto em Escritos em educação, comunicação e cultura a atualidade necessária à compreensão crítica dos fenômenos mediáticos da contemporaneidade, especialmente aqueles que envolvem a Teoria da Cibercultura e sua aproximação com a Educação, quando marca bem a qualidade dos processos comunicativos em redes digitais, suas características e o imenso potencial que é oferecido aos professores como mediadores da cultura, na tarefa de produzir coletivamente conhecimento em sala de aula, em lugar de simplesmente reproduzi-lo.
Daí que, para Pretto, as tecnologias digitais promovem um novo modo de ser e de agir da sociedade e ampliam os desafios de professores em sua missão diária. “[…] Apropriar-se dessas tecnologias como uma mera ferramenta, do meu ponto de vista, é jogar dinheiro fora. Colocar computador, recursos multimídia e não sei mais o que para a mesma educação tradicional, de consumo de informações, é um equívoco” (p. 49), observa. Na defesa de uma educação que contemple o local e o não local, as culturas de dentro e fora da escola e as possibilidades dos professores como intelectuais da cultura, Pretto acredita ser necessário uma maior presença da escola nos meios de comunicação, não apenas como consumidor, mas como produtor de informação. “Precisamos preparar professores que trabalhem na formação de uma juventude que possa atuar de forma plena na sociedade. Não apenas como consumidora mais qualificada, mas como produtora. Esse é o desafio!” (p. 40) O livro Escritos em educação, comunicação e cultura é revelador, portanto, da práxis que anima o pensamento instigante do educador Nelson Pretto. Quem, como nós, acompanha de perto um pouco da dinâmica de seus processos, consegue enxergar na obra a sua alma de pesquisador, de intelectual envolvido com questões que lhe são caras, seja na possibilidade de intervenção discursiva, a partir de suas convicções externadas em suas diversas produções textuais, seja pela capacidade de ocupar espaços acadêmicos, universitários e sociais, como cidadão comprometido com processos de mudanças.

É assim que nas sete seções de Educação, comunicação e cultura essas itinerâncias se constituem e revelam as diversas facetas do irrequieto professor. “A atitude de Nelson Pretto é coerente com a perspectiva de um intelectual que questiona aquilo que “já sabe” para, assim, abrir caminho a novas possibilidades e novos desígnios”, observa António Nóvoa em seu prefácio. (p. 11) Na primeira seção do livro, intitulada Entrevistas e Discursos, é assim que Pretto surge a nos abrir novas possibilidades reflexivas em relação a temas como o avanço das tecnologias de informação e comunicação (TIC) e sua relação com a educação, a partir da criação da Rede Bahia – uma “perna baiana” da internet; o futuro da escola e as transformações exigidas nos métodos e modelos de ensino-aprendizagem impelidas pelas TIC, como a relação com as novas gerações de nativos digitais (ou geração alt tab); inclusão digital; e a construção de uma escola “sem rumo”. Esta buscaria dialogar com os complexos e rápidos processos de um novo tempo social, cultural e econômico, na tentativa de promover novas educações.

Sua base epistemológica ancorar-se-ia na pedagogia da diferença, em lugar de uma pedagogia da assimilação, com o firme propósito de eliminar o que Pretto chama de “apartheid social”.

Em Escritos: Educação, que intitula a segunda seção do livro, o autor agrupa os textos que considera mais voltados para a educação, publicados ou não em forma de artigos para jornais. É nesse espaço também onde aparece a forte veia política e ativista, de um intelectual preocupado com temas caros aos rumos da educação brasileira e baiana, como a formação de professores, as condições da escola e da Universidade Pública, especialmente da UFBa, seus problemas e sua expansão. São textos datados a partir de 1983, que traduzem a preocupação de Pretto com a qualidade das políticas públicas para a educação, dentre as quais aquelas relacionadas ao livro didático, assunto que por muito tempo ocupou as reflexões do autor.

A temática dos livros didáticos, inclusive, intitula a terceira seção do livro, chamada Educação: Livros Didáticos. A parte é formada por seis artigos escritos por ocasiões e fins diversos – um deles publicado em 1996 pelo jornal Folha de São Paulo – e resume a preocupação do autor com as políticas (ou sua falta) para o livro didático. O tom dos textos é sempre de perplexidade e denúncia, com reflexões envolvendo pontos como a falta de inclusão dos professores nos debates realizados pelo governo sobre a questão e as posturas dos editores, que estariam mais preocupados, segundo o autor, em termos de quantidade e não na qualidade do livro didático produzido no Brasil. “Sabíamos que um programa de governo teria de contemplar a questão da quantidade, mas considerando que a questão da qualidade era fundamental, ela teria que ser atacada com a mesma firmeza com que se atacou a questão da quantidade” (p. 129), sustenta no texto que prefacia o livro Que sabemos sobre o livro didático, editado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e publicado em 1989 pela editora da Unicamp. Na ocasião da pesquisa que resulta no livro, o autor ocupava a coordenação do órgão (1986/1987).

A Cultura: o cuidado com a cidade e as gentes é o título da seção quatro, que resgata a produção do autor no campo da cultura.

Editado em ordem cronológica de aparecimento dos textos em jornais baianos, especialmente em A Tarde, e de outros estados, além de orelha de livros – como é o caso de Homem satélite, texto escrito em 2000 e publicado em livro homônimo do professor Edvaldo Couto. Buscou-se uma articulação entre os textos que tratam das mais variadas abordagens, tendo como afirma o autor, um “enorme” vínculo com a educação. Em verdade, os textos, muitos em estilo de crônica, traçam uma espécie de visão do autor e seus vínculos com a cultura baiana.

A seção é aberta com uma crônica de uma viagem à cidade de Lençois (BA), em busca de uma certa Cachoeira Glass. Relata percalços e encontros inusitados, como aquele estabelecido com seu Biça. Também circulam por ali lembranças da apresentação da Banda Afro Olodum, no Circo Voador, do Rio de Janeiro, A lavagem (festa típica baiana) da localidade de Jauá, no litoral Norte de Salvador, entre referências a outras festas populares, entre outros aspectos da típica cultura baiana. São ao todo 15 crônicas da vida da cidade, repletas de baianidade, onde o autor não deixa de manifestar o amor à cidade – que adotou aos 11 anos com a mudança da família de Porto Alegre para a Bahia. Neste particular, a crônica Velhos tempos que não voltam mais homenageia a cidade onde viveu até os cinco anos, Joaçaba, em Santa Catarina.

Na quinta seção, três textos compõem a parte dedicada à Ciência e Tecnologia. O primeiro deles trata de Ciência e televisão, refletindo sobre o papel educativo da televisão, seja pública ou comercial. O autor reflete sobre o que são em verdade programas educativos e o surgimento dos mesmos na TV brasileira.
Num panfleto sobre o Globo Ciência, programa produzido pela Globo, Pretto faz uma crítica à qualidade do que se considera ciência, aludindo à espetacularização da ciência pela produção do programa. A seção é encerrada com artigo sobre a realização da Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Salvador.

A sexta seção, penúltima do livro Escritos em educação, comunicação e cultura, apresenta uma série de 22 artigos sobre a presença das tecnologias de informação e comunicação no mundo contemporâneo. O título A tecnologia da informação: e chegaram os bytes, traz embutido seu valor, especialmente memorial, por registrar o desenvolvimento da rede internet na Bahia, com a reunião de um consórcio para este fim, com a participação da UFBA, governos estadual e municipal, antiga Telebahia e órgãos e entidades do estado. No artigo intitulado A Bahia já caiu na rede, publicado em 18/5/1995 – primórdios da internet comercial no Brasil – Pretto informava: “Hoje nosso número de usuários gira em torno de dois mil. Já temos uma estrutura descentralizada como é a filosofia da internet.” (p. 177) Os textos abordam pontos de vista variados sobre o desenvolvimento das novas tecnologias de comunicação e informação (TIC), descrevendo avanços na comunicação digital e de sua relação com a cultura e a educação. Nesse último aspecto, que viria a se tornar objeto do pensamento e da reflexão de Nelson nos últimos 15 anos, o autor nessa seção, sustenta mais uma vez a filosofia de uma educação democrática e inclusiva. Cobra políticas de democratização e acesso às TIC, como a aplicabilidade dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), que prometia destinação de recursos oriundos das empresas de serviços de telecomunicações para financiar a ampliação do espectro de acesso dos brasileiros à internet.

“Conectar as escolas públicas à internet é o caminho para fortalecer a produção de conhecimento e de cultura das crianças, jovens, adolescentes, professores e comunidade (p. 197)”, sentencia.

É esse conjunto de reflexões que resume o livro Escritos em educação, comunicação e cultura, que se encerra com a sétima seção, intitulada Escritos Com…. A seção não recebe ares de conclusão, mas, ao contrário, insinua uma continuidade, seja nas parcerias que os textos apresentam, seja nas temáticas discutidas, temáticas essas que se mantêm atuais na agenda de reflexões daqueles que cotidianamente lidam com os “caminhos cruzados” da educação e da comunicação.
É esse compromisso que parece apontar Pretto, ao escolher para fechar o livro textos que demonstram sua opção por melhores rumos para a Sociedade da Informação, a formação de professores, a inclusão digital, novas educações com escolas e universidade sem rumos. Esta última bem aos moldes do que idealizava o companheiro de itinerâncias, professor Luiz Felippe Serpa, reitor da UFBa por dois períodos, em sua incansável defesa da pluralidade, diversidade e de novas educações, a quem homenageia postumamente ao longo do livro e em dois artigos nesta seção final.

Referências

_________ BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. 116 p.

Rosa Meire Carvalho de Oliveira – Doutoranda em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). E-mail: rosameire8@uol.com.br

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El fuego, el agua y la Historia. La dictadura en los escenarios educativos: memorias y desmemorias – KAUFMANN (CA-EH)

KAUFMANN, Carolina. El fuego, el agua y la Historia. La dictadura en los escenarios educativos: memorias y desmemorias. Buenos Aires: Libros del Zorzal, 2007. 134p. Resenha de: ALONSO, Fabiana. Clío & Asociados. La Historia Enseñada, n. 13, p.181-182, 2009.

Fabiana Alonso Universidad Nacional del Litoral El ensayo de Carolina Kaufmann convoca la relación problemática entre las memorias y la inhibición de la memoria dolorosa y traumática de nuestro pasado más cercano.

Todo ello en referencia a la escuela, entendida como uno de los ámbitos donde se construye la memoria pública y se libran disputas –manifi estas o veladas– por la imposición de determinados signifi cados. Con prólogo de Graciela Frigerio, el libro –que integra la colección “Formación docente. Historia”, dirigida por Gonzalo de Amézola– se organiza en cinco capítulos, que son reelaboraciones y reescrituras de trabajos publicados.

Las preocupaciones que dan forma al texto se inscriben en el marco más general de los debates sobre los vínculos entre historia y memoria y en el proceso de construcción del campo de la historia reciente en el ámbito académico argentino. Asimismo, se sitúan, en palabras de la autora, en el cruce de senderos trazado por políticas de la memoria, lugares de la memoria, políticas culturales, producciones estéticas y educación.

Un imperativo ético recorre el libro y es, declarado por la autora, la necesidad de ganarle a la pedagogía del silencio en las aulas, para que la dictadura no quede reducida a una efeméride. En relación con la enseñanza, Kaufmann señala la necesidad de contextualizar la dictadura en la historia argentina contemporánea así como la importancia de una perspectiva comparada que sitúe esos años en el marco latinoamericano. Pasa revista a eventos académicos y reseña producciones de organismos de derechos humanos, universidades y sindicatos, experiencias estéticas y propuestas didácticas de museos con el objeto de plantear posibles articulaciones con la enseñanza del pasado reciente.

Asimismo, no deja de puntualizar una serie de défi cits: insufi cientes producciones académicas, escasa bibliografía especializada para docentes; a los que se suman diversos tipos de condicionamientos sociales, políticos y hasta institucionales.

Respecto de la relación entre pasado reciente y educación, Silvia Finocchio señala que “(…) la historia reciente no ha sido abordada de modo sostenido por la enseñanza de la historia porque así lo pautó una larga tradición y porque a los docentes no se les proporcionaron lecturas que fortalecieran su tarea. Sin embargo, al tiempo que la escuela enfrentaba esas difi cultades, las políticas de la memoria lograron sedimentar los sentidos democráticos –y antidictatoriales– del Nunca Más entre los jóvenes y la educación abrió, lentamente, diversos espacios de mediación entre el pasado y el presente”.1

Yosef Yerushalmi advierte que un grupo o una colectividad recuerdan si el pasado es activamente transmitido a las generaciones contemporáneas y éstas pueden otorgarle sentidos propios.2

Lo que llamamos memoria se trata de un movimiento dual de transmisión y recepción de hechos y circunstancias pasados. Difícilmente en una sociedad sea posible encontrar una única versión del pasado porque la memoria está tan atravesada por tensiones y luchas como la realidad social. El imperativo de la transmisión se plantea cuando una sociedad se ha visto sometida a conmociones profundas, y esto pone en evidencia tanto la difi cultad de procesar el pasado como la necesidad de ofrecer a las generaciones futuras un nexo con su propia historia. Pero no se trata de un mecanismo automático, pues los receptores reinterpretan los hechos y las circunstancias del pasado y pueden asignarles nuevos sentidos.

Precisamente, focalizando la escuela como un espacio de mediación entre el pasado y el presente, Carolina Kaufmann plantea los desafíos de una transmisión que no remita a un sentido unívoco ni quede anclada en la repetición sino que, por el contrario, contribuya a un diálogo intergeneracional.

Hugo Vezetti sostiene que en la Argentina actual la memoria es una herencia de la dictadura y que el horizonte de expectativa ha sido la democracia.3 Por su parte, Andreas Huyssen advierte que “(…) asegurar el pasado no es una empresa menos riesgosa que asegurar el futuro”. 4 Tal aseveración nos lleva, necesariamente, a considerar que las memorias son construcciones que refi eren al pasado pero están ligadas al presente y al futuro. Al presente, porque la rememoración, como búsqueda activa, no es algo espontáneo sino que implica formas de recuperación del pasado en las que nos sentimos involucrados, pues se trata de un pasado que sigue interviniendo en el presente. Al mismo tiempo, las memorias están ligadas al futuro porque esas representaciones no se hallan escindidas de los horizontes de expectativas de los grupos que las producen.

La de la dictadura argentina es una temática en la que, como pocas, se dan cita esas cuestiones con singular intensidad. Por ello, resulta auspicioso un libro que, como éste, instala la problemática en el ámbito educativo.

Notas

1 Finocchio, S.: “Entradas educativas en los lugares de la memoria” en Franco, M. y Levin, F. (comp.) (2007): Historia reciente. Perspectivas y desafíos para un campo en construcción, Paidós, Buenos Aires, p. 266.

2 Yerushalmi, Y.: “Refl exiones sobre el olvido” en Yerushalmi y otros (1999): Usos del olvido, Nueva Visión, Buenos Aires.

3 Vezzetti, H.: “Confl ictos de la memoria en la Argentina. Un estudio de la memoria social” en Perotin-Dumon, A. (ed.): Historizar el pasado vivo en América Latina.

Publicación electrónica [http:/etica.uahurtado.cl/historizarelpasadovivo/es], 28/10/07.

4 Huyssen, A. (2001): En busca del futuro perdido. Cultura y memoria en tiempos de globalización, FCE, Buenos Aires, p. 37.

Fabiana Alonso – Universidad Nacional del Litoral

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Homofobia & educação: um desafio ao silêncio – LONÇO; DINIZ (REF)

LIONÇO, Tatiana; DINIZ, Débora (Orgs.). Homofobia & educação: um desafio ao silêncio. Brasília: Letras Livres: EdUnB, 2009. 196 p. Resenha de: SILVEIRA, Viviane Teixeira; RAIAL, Carmen. Um contributo para uma psicologia feminista crítica em Portugal. Revista Etudos Feministas, Florianópolis, v.16 n.2, may/aug. 2008.

Homofobia & educação reúne oito artigos escritos por professoras e professores de diversas universidades brasileiras, membros de organizações não governamentais (Nuances e Corsa) e pesquisadoras e pesquisadores da Anis: Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Organizado por Tatiana Lionço e Débora Diniz, este livro trata da política educacional de materiais didáticos no Brasil e busca ser uma oportunidade de diálogo entre academia, sociedade civil e governo, possibilitando reflexões de educadores, militantes em defesa dos direitos humanos e gestores de políticas públicas. O livro resulta de um extenso projeto de pesquisa denominado “Qual a diversidade sexual dos livros didáticos brasileiros?”, executado pela Anis, em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa foi financiada pelo Programa Nacional de DST e Aids, pelo Ministério da Saúde e pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).

No artigo “Qual a diversidade sexual dos livros didáticos brasileiros?”, Tatiana Lionço e Débora Diniz abrem o debate para a questão do silêncio sobre a diversidade nos livros didáticos quando se trata de sexualidade. As autoras argumentam que a escola é um espaço de socialização para a diversidade, entretanto a invisibilização da diversidade ocorre nos materiais didáticos. Mesmo que abordagens étnico-raciais, de gênero e/ou econômicas já estejam contempladas e sendo alvo de investimentos do Ministério da Educação, as dimensões social e política da sexualidade permanecem à margem. Lionço e Diniz aprofundam essa temática no artigo “Homofobia, silêncio e naturalização: por uma narrativa da diversidade sexual”, analisando como o tema da diversidade sexual foi incorporado pelos livros didáticos no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e no Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM). A amostra contemplou 67 dos 98 livros didáticos mais distribuídos pelo PNLD e pelo PNLEM (nos anos de 2007 e 2008 em livros de disciplinas que pudessem contemplar a temática da sexualidade no conteúdo programático) e 25 dicionários distribuídos pelo PNLD em 2006 e pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) em 1998. As características analisadas foram: apresentação de gênero, família e conjugalidade; sexismo; diversidade social e sexual; e relação sexual e DST/Aids. As autoras concluem retomando que o silêncio é a estratégia dominante e que não há discussão sobre homofobia nos livros dos dois últimos anos. Não há enunciados que inferiorizem a diversidade sexual, mas há uma heteronormatividade assentada na heterossexualidade compulsória.

Daniel Borrillo, em seu artigo “A homofobia”, faz uma leitura epistemológica e política desse conceito, não para compreender a origem e o funcionamento da homossexualidade, mas para “analisar a hostilidade provocada por essa forma específica de orientação sexual” (p. 16). Para tanto, Borrillo investe na discussão dos conceitos de homofobia geral e específica, sexismo e homofobia cognitiva e social. Segundo o autor, quando a homossexualidade requer publicamente sua expressão é que se torna insuportável, pois rompe com a hierarquia da ordem sexual, por isso a tarefa pedagógica deve ser questionar a heterossexualidade compulsória e mostrar que a hierarquia de sexualidades é tão insustentável quanto a de sexos, bem como incluir a ideia de diversidade sexual em livros e apostilas escolares.

Uma análise da ausência de conteúdos e imagens relacionados à diversidade sexual nas concepções de família presentes nos livros didáticos e também do papel exercido pelos discursos e pelas imagens de famílias nesses livros é o foco do artigo “A eloquência do silêncio: gênero e diversidade sexual nos conceitos de família veiculados por livros didáticos”, de Claudia Vianna e Lula Ramires. Muitos são os exemplos encontrados nos livros didáticos enfatizando a importância da família (bem como da escola) no processo de socialização. No entanto, existe uma tensão entre as concepções apresentadas: a permanência de imagens e discursos relativos à família nuclear, branca e de classe média (patriarcalismo, história, cotidiano, divisão sexual do trabalho, cuidado infantil) e algumas mudanças no modo de configuração dessas famílias (famílias monoparentais, chefiadas pela mãe, lares adotivos, intergeracionais, multirraciais). Entretanto, não há imagens ou textos que mostrem famílias homoparentais. Ao encontro da problemática levantada por Vianna e Ramires, o artigo “Ilustrações do silêncio e da negação”, escrito por Malu Fontes, mostra que 70% dos livros didáticos analisados não apresentavam imagens de homoparentalidades, homoafetividade, representações de homossexuais e de sua presença na sociedade e na diversidade sexual. Aponta que o silenciamento contribui para a manutenção do preconceito, fato acordado em todos os artigos presentes no livro Homofobia & educação. A autora também faz uma reflexão sobre os conteúdos dos livros didáticos, que ignoram a diversidade sexual e que contribuem para a manutenção dos comportamentos sociais homofóbicos, em contraste com as telenovelas brasileiras, que já incluíram a temática gay e o debate em favor da diversidade sexual.

Fernando Pocahy, Rosana de Oliveira e Thaís Imperatori iniciam seu artigo retomando a invisibilidade da diversidade sexual e a naturalização da heterossexualidade nos livros didáticos brasileiros. “Cores e dores do preconceito: entre o boxe e o balé” tem como eixo teórico as problematizações feitas por Judith Butler a respeito da heteronormatividade e da abjeção dos corpos. Butler problematiza se haveria a possibilidade do pertencimento, do reconhecimento, àqueles que escapam à heteronormatividade: “serão capazes de viver socialmente?” (p. 117). A partir de um exercício sobre os filmes “Billy Eliot” e “Menina de Ouro” extraído de um livro didático, os autores do artigo problematizam os estereótipos de gênero e os preconceitos em relação a escolhas profissionais que desestabilizam a ordem heteronormativa e caricata do masculino e do feminino na sociedade, propondo esse tipo de análise como uma boa sugestão para o trabalho com a homossexualidade em sala de aula.

Com o objetivo de analisar o PNLD, salientando a importância da visibilidade e das discussões sobre a diversidade sexual nas políticas de educação, o artigo “Diversidade sexual, educação e sociedade: reflexões a partir do Programa Nacional do Livro Didático”, de Roger Raupp Rios e Wederson Rufino dos Santos, traz uma reflexão sobre as concepções, as características, os limites e os avanços presentes na elaboração e na concretização do programa. Os autores apontam o Brasil sem Homofobia: programa de combate à violência e à discriminação contra GLBT e de promoção da cidadania homossexual como marco político das discussões sobre orientação sexual e identidade de gênero nas políticas públicas brasileiras, pois se apresentou com o objetivo de eliminar a discriminação por orientação sexual nos livros didáticos. Percorrem um caminho de análise das legislações para mostrar “que o silêncio que aparece nos livros didáticos sobre a diversidade sexual é antes percebido no próprio arcabouço legal que sustenta a política pública” (p. 135). Concluem sugerindo que os princípios do regime democrático devem permear as políticas públicas para a superação do silêncio acerca das múltiplas expressões da diversidade sexual. São eles: liberdade individual, autonomia, igualdade, respeito à dignidade humana, pluralismo e diversidade.

O artigo que finaliza esta coletânea denomina-se “Políticas de educação para a diversidade sexual: escola como lugar de direitos”. Rogério Diniz Junqueira foca sua análise nos sujeitos e nas subjetividades fabricadas na escola, argumentando que o campo da educação é historicamente constituído como disciplinador, reprodutor de desigualdades e normalizador – lançando um olhar foucaultiano sobre o tema. Dessa forma, na escola a homofobia adentra e se instala, sendo (re)produzida e, além disso, consentida, o que transforma a escola num espaço institucional de opressão. Para falar de diversidade e diferença, Junqueira trava um diálogo pertinente com Zygmunt Bauman e Homi Bhabha entendendo diversidade, diferença e identidade à luz da ideia de multiplicidade.

Este artigo encerra brilhantemente o livro, pois propõe maneiras práticas de trabalho na escola com o tema da diversidade sexual. Propõe uma educação na, para e pela diversidade que deverá levar em conta o pertencimento do outro (experiências de vida daquele tido como diferente) a todos os lugares sociais e o reconhecimento da legitimidade da diferença, refletindo acerca da sua produção e das relações de poder que presidem esses espaços. Propõe também aproveitar as potencialidades pedagógicas oferecidas pela própria diversidade, reconhecendo nisso um processo construído coletivamente. Isso pode ser trabalhado a partir de uma perspectiva queer de educação que promove possibilidades instigadoras em relação à diversidade.

Este livro nos mostra que a união de condições sociais, econômicas, políticas, educacionais e culturais é que poderá tornar possível uma promoção de educação pautada no reconhecimento da diversidade e da pluralidade dos corpos, das sexualidades e das subjetividades. Um ótimo livro para investirmos num processo de reconfiguração educacional e política pautada na diversidade.

Viviane Teixeira Silveira – Universidade Federal de Santa Catarina

Carmen Rial – Universidade Federal de Santa Catarina

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Power, Knowledge and Anti-Racism Education: A Critical Reader – SEFA DEI; CALLISTE (CSS)

SEFA DEI, George J. ; CALLISTE, Agnes (Eds.), with the assistance of Margarida Aguiar. Power, Knowledge and Anti-Racism Education: A Critical Reader. Fernwood Publishing, 2000. 188p. Resenha de: BECKETT, Gulbahar H. Canadian Social Studies, v.38, n.3, p., 2004.

Power, Knowledge and Anti-Racism Education: A Critical Reader is a volume edited by George J. Sefa Dei and Agnes Calliste. As the title suggests, this book is indeed a critical, informative, and thought provoking reader on power, race, gender, and education. The book includes eight chapters plus an introduction and conclusion that address questions of racism and schooling practices in a variety of educational settings in Canada, a country that practices multiculturalism and is considered to value and promote diversity. Most Canadians believe that the country’s multicultural policy was established with good intentions and has served the country and its people well. As such, we rarely ask ourselves questions such as: Who is benefiting from the policy and who is not? Why and why not? What are the strengths and limitations of the multicultural policy in empowering people of all origins? What more can be done to ensure equality in education and the larger society? This very well written book asks and answers these and many other very important questions.

Specifically, Power, Knowledge and Anti-Racism Education addresses critical issues such as multiculturalism, racism, equality, exclusion, and gender issues from theoretical as well as practical perspectives. It calls for a critical examination of and going beyond multiculturalism by challenging the status quo with critical anti-racist education. In Chapter 1, Dei contextualizes the book through his discussion of a critical anti-racist discursive theoretical framework that deals foremost with equity: the qualitative value of justice (p. 17). He is critical of multiculturalism arguing that it creates a public discourse of a colour-blind society and he calls for an acknowledgement of and confrontation with differences. According to Dei, confronting the dynamics and relational aspects of race, class, ethnic, and gender differences is essential to power sharing in colour-coded Euro-Canadian contexts.

In Chapter 2, Bedard continues the discussion of multiculturalism and anti-racist education through a deconstruction of Whiteness in relation to historical colonialism, imperialism, and capitalism. He reminds readers of the complexity of the race issue as we still live with the legacy of colonialism. He asserts that through their ideological and intellectual ruling of Canada, as well as many other parts of the world (e.g., Africa and Asia), white people enjoy more privileges that are not afforded to people from other racial backgrounds. In Chapter 3, Ibrahim revisits tensions surrounding curriculum relevance and demonstrates how popular culture, especially Black popular culture (e.g., Hip Hop and Rap), can be utilized to carry out anti-racism education as it relates to students identity formation, cultural and linguistics practices, and sense of alienation from or relation to everyday classroom practice. In Chapter 4, James and Mannette address issues related to visible minority students’ access to publicly funded post-secondary education. Through rich personal accounts from students, they illustrate how these students mediate systemic barriers, gain entry, and experience post-secondary education in Canada.

In Chapter 5, Henry presents a brief reflection of black teachers’ positionality in Canadian universities and schools through three vignettes: her personal experience, two teacher candidates’ experiences, and a veteran teacher’s experience. Through these vignettes, Henry makes a case that black women in Canadian universities and schools were isolated and bore the responsibility of raising the awareness and consciousness of the White people in their work environment (p. 97). She calls on all of us to reflect on every day acts of power and subordination and to use them to develop theories and workable strategies to end inequality (p. 97). In Chapter 6, Tastsoglou discusses various types of borders and the challenges and rewards of cultural, political, and pedagogical border crossing. As a transnational person who crosses various borders daily, I found the discussion to be particularly interesting. Among others, I like the points Tastsoglou makes about otherness (i.e., how all of us can be othered sometime or another) and the detailed illustration of border pedagogy (Giroux, 1991) that can enable us to engage in socially and historically constructed multiple cultural experiences.

In Chapter 7, Wright addresses issues of exclusion and engages in an anti-racist critique of progressive academic discourse in general rather than Canadian multiculturalism per se, using post-modernist, post-structuralist, post-colonialist, feminist, and Afrocentricist discourses. What I found particularly informative in this chapter is Wright’s discussion of what Afrocentricism and feminism are and how they can contribute to our understanding of inclusion and exclusion. In Chapter 8, Calliste presents and discusses some research studies on racism in Canadian universities. This chapter shows racism does exist in Canadian universities overtly as well as through hidden curriculum. As such, it supports Dei’s argument that Canada is a colour-coded society where racism and inequality exist and need to be addressed.

In summary, Power, Knowledge and Anti-Racism Education: A Critical Reader is a book that challenges us to be critical of the multiculturalism that has become part of Canadian social and public discourse. It reminds us that multiculturalism works with the notion of a basic humanness. As such, it downplays inequalities and differences by accentuating shared commonalities among peoples of various backgrounds. It advocates empathy for minorities on the basis of a common humanity, envisions a future assured by goodwill, tolerance, and understanding among all, but it also breeds complacency, creating the illusion that we live in a raceless, classless, and genderless society. For example, Dei points out that, while a raceless, classless, and genderless society is an ideal that we all aspire to and work towards, we must remember that, at present, such a society is a luxury that is only possible for people from a certain racial background, namely white people. He, therefore, urges us to acknowledge that while multiculturalism is an important first step in building an ideal nation, it is anti-racist education that seeks to challenge the status quo and aspires to excellence. According to Dei and Calliste, anti-racism education practice must lead to an understanding that excellence is equity and equity is excellence (p.164). I would recommend this book as a required text for undergraduate and graduate level sociology and educational foundations related courses.

References

Giroux, H. (1991). Post-modernism as border pedagogy: Redefining the boundaries of
race and ethnicity. In H. Giroux (Ed.). Postmodernism, feminism, and cultural
politics: Redrawing educational boundaries
 (pp. 217-56). Albany: State University of New York Press.

Gulbahar H. Beckett – College of Education, Criminal Justice, and Human Services. University of Cincinnati, Cincinnati, OH, USA.

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Educação e Sociedade na Primeira República | Jorge Nagle

No ano de 2001, à guisa de comemoração do terceiro milênio, a DP&A Editora brindou estudiosos, professores de história da educação brasileira e aos demais interessados com a publicação da obra do Prof. Jorge Nagle, Educação e Sociedade na Primeira República. Sua primeira edição (1974), bem como, a reimpressão (1976), resultado de uma parceria entre a Fundação Nacional de Material Escolar/MEC (Rio de Janeiro) e a Editora Pedagógica Universitária (São Paulo), estavam esgotadas há muito tempo. Tal situação forçava as pessoas, por necessidade de ofício, a violar os direitos autorais, xerocopiando a obra no todo ou em partes.

Trata-se de uma obra ímpar na interpretação da educação brasileira, no período da Primeira República. O Autor cunhou as categorias “entusiasmo pela educação” e “otimismo pedagógico”, para explicar a efervescência dos debates e disputas teóricas sobre a trajetória da educação, num momento em que a sociedade brasileira passava pela transição de uma sociedade agrário-comercial por outra, urbano-industrial. Leia Mais

Educação e Sociedade na Primeira República | Jorge Nagle

No ano de 2001, à guisa de comemoração do terceiro milênio, a DP&A Editora brindou estudiosos, professores de história da educação brasileira e aos demais interessados com a publicação da obra do Prof. Jorge Nagle, Educação e Sociedade na Primeira República. Sua primeira edição (1974), bem como, a reimpressão (1976), resultado de uma parceria entre a Fundação Nacional de Material Escolar/MEC (Rio de Janeiro) e a Editora Pedagógica Universitária (São Paulo), estavam esgotadas há muito tempo. Tal situação forçava as pessoas, por necessidade de ofício, a violar os direitos autorais, xerocopiando a obra no todo ou em partes.

Trata-se de uma obra ímpar na interpretação da educação brasileira, no período da Primeira República. O Autor cunhou as categorias “entusiasmo pela educação” e “otimismo pedagógico”, para explicar a efervescência dos debates e disputas teóricas sobre a trajetória da educação, num momento em que a sociedade brasileira passava pela transição de uma sociedade agrário-comercial por outra, urbano-industrial. Leia Mais

Éducation à la santé. XIXe-XXe siècle – NOURISSON (CC)

NOURISSON, Didier. Éducation à la santé. XIXe-XXe siècle. Rennes: Éditions de l’École nationale de la Santé publique, 2002. 158p. Resenha de: HEIMBERG, Charles. Le cartable de Clio – Revue romande et tessinoise sur les didactiques de l’histoire, Lausanne, n.3, p.327, 2003.

Ce volume rassemble des conférences qui ont été prononcées à l’IUFM de Saint-Étienne entre 1995 et 1997. Elles portent sur l’émergence de la santé publique dans le projet éducatif et les pratiques scolaires. Les concepts de santé publique sont nés au fil des deux hygiénismes qui ont successivement prévalu de la fin du XVIIIe siècle à 1870, puis de 1880 à 1940. C’est dans ce contexte que la propreté de l’enfant est devenue une exigence et a même fait l’objet d’un contrôle social. La leçon d’hygiène est ainsi apparue dans les écoles dans une perspective qu’on devine particulièrement normative. Cette propagande pour l’hygiène et la santé a bien sûr recouru aux images, affiches publicitaires, et plus tard à la magie des films. Dans les écoles, l’apparition de l’éducation physique est intervenue dans une perspective de promotion de la santé, comme cela a aussi été le cas avec la natation (on peut toutefois se demander si le facteur militaire, pour les garçons, ne jouait pas aussi un rôle important). Au tournant des XIXe-XXe siècle, l’enseignement antialcoolique à l’école était prescriptif, et souvent caricatural, mais il ne s’est pas révélé très efficace. Voilà de quoi nourrir une réflexion sur l’école d’aujourd’hui, son rôle effectif et la manière de répondre aux diverses injonctions, aux demandes sociales multiplex et Nouvelles, dont elle fait encore l’objet en matière d’éducation à la santé.

Charles Heimberg – Institut de Formation des Maîtres (IFMES), Genève.

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História da Educação | SBHE | 2001

Historia da Educacao SBHE EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Revista Brasileira de História da Educação – RBHE (Maringá, 2001-) é a publicação oficial da Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE).

O periódico adota a publicação contínua de artigos inéditos resultantes de pesquisas, que abordem temas associados à história e à historiografia da educação.

A RBHE tem como objetivos a ampla circulação do conhecimento e a promoção da discussão em torno dos diferentes problemas que permeiam o campo de pesquisa e ensino da história da educação, a partir de uma perspectiva interdisciplinar e plural em termos teóricos e metodológicos.

O periódico publica, também, dossiês, resenhas e entrevistas com personalidades de destaque nacional e internacional.

Periodicidade contínua.

Acesso livre.

ISSN 2238-0094 (Online)

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Ensino, Educação e Ciências Humanas | Kroton | 2000

Ensino Educacao e Ciencias Humanas EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A Revista de Ensino, Educação e Ciências Humanas (2000-) tem escopo nas Áreas de Ensino e Educação. Recebe artigos em fluxo contínuo e está hospedada no Portal de Periódicos Científicos Kroton.

Rua Marselha, Londrina,PR.

Contato Principal: Selma Ellwein – Kroton Educacional, Londrina – PR, telefone (43) 3371-7931. E-mail: selma.elwein@kroton.com.br

Acesso livre

Periodicidade trimestral

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História da Educação | ASPHE 1997

Historia da Educacao ASPHEE EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

História da Educação ([São Leopoldo], 1997-) é uma publicação da Associação Sul-Rio-Grandense de Pesquisadores em História da Educação – Asphe e e tem como finalidade disseminar conhecimentos relacionados à área de História e Historiografia da Educação.

Recebe apoio financeiro do CNPq/Capes e apoio institucional de diferentes Universidades do Rio Grande do Sul.

Aceita para publicação textos inéditos nos diferentes formatos: artigos, dossiês, traduções, sessão especial/entrevistas, resenhas, arquivos/documentos, cujas temáticas se inscrevam na referida área ou em outros campos de conhecimento que possuam intersecção com a História da Educação.

A revista está hospedada no portal de revistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no endereço http://seer.ufrgs.br/asphe, e apresenta-se em formato online.

Periodicidade anual.

Acesso livre.

ISSN 2236-3459

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Clio & Associados | UNL/UNLP | 1996

Clio e Associados EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Clío & Asociados – La historia enseñada (La Plata, 1996-) es una revista con dos números al año (enero-junio y julio-diciembre). Fue creada en 1996 con el objetivo de ofrecer un medio de comunicación especializado que contribuya a la reflexión e investigación sobre enseñanza de la Historia. Acepta artículos, entrevistas y reseñas bibliográficas. Está dirigida a un público internacional, de investigadores, docentes y estudiantes interesados en la temática.

Es editada conjuntamente por la Facultad de Humanidades y Ciencias de la Universidad Nacional del Litoral y la Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación de la Universidad Nacional de La Plata. Cuenta con el aval de los Departamentos de Historia de Universidad Nacional del Litoral, Universidad Nacional de La Plata y Universidad de Buenos Aires.

[Periodicidade semestral]

Acesso livre

ISSN 2362-3063

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Panta Rei | UM | 1995

Panta Rei2 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Panta Rei (1995-) es una revista científica digital de carácter internacional que publica investigaciones sobre Historia, Didáctica de la Historia y disciplinas afines.

Desde esa fecha la filosofía de la revista ha perseguido los mismos fines. El objetivo es recoger nuevas propuestas e investigaciones que favorezcan el avance del conocimiento histórico, siempre en constante evolución y movimiento.

Edita
Centro de Estudios del Próximo Oriente y la Antigüedad Tardía – CEPOAT
Edificio Universitario Saavedra Fajardo. Universidad de Murcia C/ Actor Isidoro Máiquez, 9 / 30007 – MURCIA – ESPAÑA / TFNO: 868883890
cepoat(arroba)um.es / Web: www.um.es/cepoat/pantarei

La periodicidad de la revista es anual.

ISSN 2386-8864 (electrónico)

ISSN 1136-2464 (impreso)

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Educação em Foco | UEMG | 1995

Educacao em Foco UEMG EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A revista Educação em Foco (1995-) é um periódico científico que tem como finalidade socializar resultados e contribuições de pesquisas e de estudos científicos sobre temáticas candentes do campo educacional na atualidade e em outros momentos históricos. Compreende as questões educacionais brasileiras e de outras partes do mundo como questões complexas, multifacetadas, que exigem abordagens e contributos de diversos campos de conhecimento das ciências humanas.

A Missão da revista é divulgar estudos acadêmico-científicos que contribuam para o avanço da pesquisa e com as reflexões da área da Educação.

Tem como público-alvo estudantes, professores da Educação Básica e do Ensino Superior, pesquisadores da Educação e demais interessados nas discussões e na divulgação da produção científica sobre temáticas da área da Educação nos contextos nacional e internacional.

A revista Educação em Foco foi criada, em 1995, pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais (FaE/UEMG) como um periódico científico impresso, com periodicidade anual, editado com o apoio do Centro de Comunicação (CenC) da FaE/UEMG. A partir de 2008 até 2015, as publicações se tornaram semestrais.

Em 2011, a revista passou a ser de responsabilidade do Programa de Pós-graduação em Educação e Formação Humana (PPGE) da FaE/UEMG, continuando com o apoio do CenC, para a sua edição.

Periodicidade quadrimestral

ISSN 2317-0093 (Online)

Acesso livre

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História & Ensino | UEL | 1995

Historia e Ensino 2 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A Revista História & Ensino: Revista do Laboratório de Ensino de História (Londrina, 1995-) foi criada pela Profª Drª MARLENE CAINELLI. Foi a primeira revista científica do país a abordar o ensino de História.

Inicialmente era destinada aos graduandos do curso de História e aos professores de História do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Ao longo de sua trajetória tornou-se um importante veículo de divulgação da pesquisa sobre ensino de história sem deixar de estabelecer um elo e um espaço de discussão entre os três níveis de ensino. A Revista História & Ensino é parte das ações do Programa de Extensão Laboratório de Ensino de História.

O campo de discussão da Revista História & Ensino engloba: ensino de história; educação histórica;  metodologias para o ensino de História; aprendizado histórico; Didática da História; construção do saber histórico escolar; história da disciplina de História (escolar ou acadêmica); estágio de História; ensino de História extraescolar; História da Educação; currículo de História (escolar ou acadêmico); cognição histórica; relações entre Ensino de História e História Pública; formação do professor de História; História da infância e da juventude.

Entende que os artigos devem veicular resultados de pesquisas e que os relatos de experiências didático-pedagógicas devem ser fundamentados em termos teóricos e metodológicos. Devem ser inéditos.

Destina-se aos alunos do curso de História, professores de História de todos os níveis de ensino, pesquisadores voltados para o ensino de História.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 2238-3018

ISSN-L 1212-3488

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Ensaio | Cesgranrio | 1993

Ensaio Avaliacao1 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A revista Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação (1993-) tem por finalidade publicar artigos relacionados à Educação, tendo como temática questões sobre avaliação e políticas públicas em educação, priorizando os resultados de pesquisas, estudos teóricos e ensaios.

A revista é mantida pela Fundação Cesgranrio (RJ) e recebe apoio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), do Programa de Apoio às Publicações Científicas (AED) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e tecnológico (CNPq), Ministério da Educação (MEC) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

Periodicidade trimestral

ISSN 0104-4036 versão impressa
ISSN 1809-4465 versión electrônica

Acesso livre

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Pagu | Unicamp | 1993

Pagu3 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Cadernos Pagu (Campinas, 1993-), publicação quadrimestral interdisciplinar, tem como objetivo contribuir para a ampliação e o fortalecimento do campo interdisciplinar de estudos de gênero, dando visibilidade à produção realizada no Brasil e promovendo o intercâmbio de conhecimento internacional sobre a problemática. Publica artigos inéditos com contribuições científicas originais, que colaborem para a inovação teórica, metodológica e/ou agreguem conhecimento empírico inovador, e debates em torno de textos teóricos relevantes no campo dos estudos de gênero, viabilizando, assim, a difusão de conhecimentos na área e a leitura crítica da produção internacional.

Tem publicado contribuições das seguintes áreas: Antropologia, Sociologia, História, Ciência Política, Letras e Linguística, História da Ciência, Educação. Mais recentemente, também de áreas como Direito, Psicologia, Comunicação, Saúde Coletiva e Serviço Social. Estimula a publicação de artigos de diferentes áreas disciplinares, desde que estabeleçam uma discussão com as teorias de gênero e feministas, buscando articulações entre gênero e outras diferenças (raça/etnia, cultura, classe, idade/geração, sexualidade e outras). São bem-vindas contribuições em língua portuguesa, espanhola ou inglesa.

A publicação dos cadernos pagu iniciou-se em 1993 e desde então vem contribuindo para a constituição do campo de estudos de gênero no Brasil. A revista foi criada em um momento em que os estudos de gênero já contavam com alguma legitimidade acadêmica no país e a intenção era ampliar sua visibilidade, difundindo e estimulando a produção de conhecimento na área.

A criação do cadernos pagu foi resultado de mais de dois anos de leituras, pesquisas e debates, nos quais integrantes do Núcleo de Estudos de Gênero – Pagu mapeavam os avanços na produção sobre gênero e seus impasses. O primeiro número foi inteiramente redigido por integrantes do Núcleo, cujos artigos esboçavam essas inquietações. Entre o segundo e o terceiro número, a publicação redefiniu sua política editorial e, simultaneamente, abriu para contribuições de pesquisadoras/es brasileiras/os e estrangeiras/os. Para tanto, constituiu-se um corpo de pareceristas ad-hoc e foram criados o Comitê e o Conselho Editorial. A partir do quinto número, a revista contou com financiamento externo à universidade.

De fato, há dois momentos na história da publicação, visíveis em diversos aspectos da revista, que estão ligados à obtenção do apoio de diversas agências -FAPESP, FAEPEx (Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e à Extensão, da Unicamp) e, sobretudo, CNPq, que concedeu o apoio mais relevante em termos de recursos e de continuidade a partir de 1996. Esses financiamentos foram cruciais para o crescimento da publicação, não apenas no que se refere à melhoria da qualidade gráfica e à incorporação de maior número de textos, mas também à adequação às normas editoriais, à ampliação do Conselho Editorial, ao registro em diversos indexadores nacionais e internacionais.

Periodicidade quadrimestral.

Acesso livre.

ISSN 1809 4449 (Impresso)

ISSN 0104-8333 (Online)

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História | UFU | 1989-2007

Cadernos de HIstoria UFU3 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A Revista Cadernos de História (1989-2007), do programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Uberlândia, foi criada pelo Laboratório de Ensino e Aprendizagem em História – LEAH, registrada sob o número ISSN: 0103-6300, indexada no INEP a partir de 2001. Atualmente, é uma publicação associada do LEAH e da Escola de Educação Básica-ESEBA, com coordenação dupla, produzida pelo Centro de Documentação e Pesquisa em História-CDHIS.

Periodicidade anual.

Acesso livre.

ISSN 1981-3104

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Clío | Proyecto Clío/UNIZAR | 1988

Projeto Clio EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

CLIO History and History teaching (Zaragoza, 1988-) es una revista electrónica editada por la Asociación “Proyecto Clío” y desde 2020 coeditada por la Universidad de Zaragoza.  Es una revista en acceso abierto con revisión de artículos por pares ciegos. Se publica on line, con periodicidad anual desde 2003. Hasta 2019 en http://clio.rediris.es y desde 2020 en https://papiro.unizar.es

La Asociación Proyecto Clío y la Universidad de Zaragoza no se responsabilizan de la veracidad de la información y opiniones expresadas por los autores del contenido y colaboradores de la revista, ni comparten necesariamente sus opiniones e interpretaciones. Los autores se responsabilizan de la gestión de derechos de imágenes publicadas.

La revista “CLIO, History and history teaching” publica artículos sobre Historia o Educación en Historia. Se pueden enviar para publicación: artículos de investigación empírica en Educación en Historia y Educación en Ciencias Sociales o en Historia; artículos teóricos, de discusión o el estado de la cuestión de un tema específico de la Historia o Didáctica de la Historia; análisis de propuestas didácticas para la enseñanza de la historia, reseñas y presentaciones de libros, webs, blogs, juegos, materiales didácticos, etc. relacionados con la Historia y su enseñanza.

Periodicidade anual

ISSN 1139 6237 (Online)

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Historia y Geografía | UCSH | 1986

Revista de Historia e Geografia EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

Revista de Historia y Geografía  (Santiago, 1986-) es una publicación periódica editada por la Escuela de Educación en Historia y Geografía de la Universidad Católica Silva Henríquez.

RHyG pretende contribuir a la divulgación de estudios originales, empíricos o teóricos de las más diversas corrientes historiográficas, de la ciencia geográfica y de la enseñanza pedagógica de ambas disciplinas, referidas al caso chileno o internacional.

Revista de Historia y Geografía agradece el patrocinio de la Universidad Católica Silva Henríquez.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 0719-4137 (Impressa)

ISSN 0719-4145 (Online)

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Educação Especial | UFSM | 1986

Educacao ESpecial1 2 EaD em Foco | Fundação Cecierj | 2010

A Revista Educação Especial (1986) da Universidade Federal de Santa Maria, publica apenas artigos originais, sendo relatos de pesquisa ou revisão de literatura, que contribuam para o campo da Educação Especial. Destina-se a estudantes, professores e pesquisadores em Educação. Os artigos devem atender a qualidade e contexto que o Conselho Editorial considera que seriam de interesse para um público nacional e internacional.

A publicação impressa começou em 1986 e foi encerrada em 2016. Atualmente, apenas a versão eletrônica está disponível. Publicamos aproximadamente 55 artigos por ano, em periodicidade de publicação contínua em volume único, com recebimento de fluxo contínuo de tema livre e também um Dossiê Temático anual. A revista tem o português (Brasil) como idioma principal e inglês ou espanhol como secundários.

Publicação contínua

ISSN 1984-686X

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