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História e Literatura / História, histórias / 2020
O dossiê História e Literatura: diálogos e interações apresenta um corpus meditativo cujas reflexões procuram estabelecer pontos de contatos entre a criação ficcional e a realidade histórica nela representada. Não é de hoje que história e literatura andam de mãos dadas, as interações e divergências entre as duas encontram ecos no pensamento ocidental desde a Antiguidade.
Aristóteles talvez tenha sido o primeiro a notar a relevância desta intersecção, conferindo-lhe legitimidade ao reformular a noção de mimese proposta no pensamento platônico. Isto porque a importância atribuída ao poeta na filosofia aristotélica resulta do reconhecimento das experiências humanas no mundo sensível, algo anteriormente negado pelo idealismo platônico. Na Poética de Aristóteles, a imitação ganhou novo status por meio da noção de verossimilhança e da experiência daquele que se relaciona com o objeto artístico, bem como os efeitos sobre ele também adquiriram novos contornos, caso das reflexões acerca da catarse. Leia Mais
Manuscritos medievais da Universidade de Brasília / História, histórias / 2019
Era uma vez três belos códices, certamente produzidos em algum mosteiro português entre os séculos XIV ou XV, que muitos anos depois, por volta de 1925, foram adquiridos na Vila do Conde, em Portugal, pelo Dr. Jorge de Faria. Nessa época, já não eram mais “códices”. Eram folhas de pergaminho soltas, pouco mais de 200, oriundas certamente de algum mosteiro ou casa religiosa de que saíram, ou por causa da extinção das ordens em 1834, ou por causa de atos violentos que se seguiram relacionados aos movimentos que levaram à proclamação da República em Portugal, em 05 de outubro de 1910.
Por volta de 1925 estavam emprestados à Biblioteca Nacional de Lisboa, onde foram lidos e copiados por Pedro de Azevedo.
Quem nos conta essa história é Serafim da Silva Neto (1956), ilustre filólogo brasileiro, no seu livro Textos medievais e seus problemas.
Alguns anos mais tarde, o também filólogo e linguista Nelson Rossi nos informa que esses textos foram adquiridos pelo erudito professor Silva Neto que os teria trazido para o Brasil em 1950.
Em 1964 foram vendidos pela viúva do professor Serafim, a Sra. Cremilda de Carvalho e Silva, à Universidade de Brasília (UnB).
Nesse mesmo ano, um dos documentos foi levado para restauração na Biblioteca Nacional, do Rio de Janeiro, e os outros dois seguiram para Universidade Federal da Bahia aos cuidados do Prof. Nelson Rossi.
Em 1972 os manuscritos são levados novamente à Universidade de Brasília em razão da inauguração do atual prédio da sua Biblioteca Central (BCE), onde permanecem até hoje sob os devidos cuidados que recomendam sua importância.
Infelizmente, entre os “mais de 200 fólios” mencionados por Silva Neto e os que a Universidade de Brasília dispõem hoje, faltam algumas dezenas. O recibo de compra dos documentos não especifica a quantidade de fólios adquirida, mas atualmente, restam apenas 168 fólios e meio.
Os manuscritos aos quais nos referimos são escritos em português arcaico e configuram um tesouro histórico e linguístico incomparável posto representarem, em terras brasileiras, os primeiros monumentos da Língua Portuguesa e trazerem toda a carga da cristandade lusitana que tanto influenciou a formação da nossa sociedade.
Durante essa estada no Nordeste, esses mesmos manuscritos influenciaram, diretamente, na composição de dois núcleos de pesquisa consolidados na Universidade Federal da Bahia, nas áreas de Filologia e Linguística histórica, gerando diversos estudos sobre eles e a edição de dois dos documentos. Na Universidade de Brasília também são importantes fontes históricas exploradas pelos diversos cursos que ela mantém, mas principalmente atendendo ao Programa de Estudos Medievais do Departamento de História.
A origem exata de sua produção é ainda desconhecida, mas a tese que prevalece, baseada em referências de catálogos da biblioteca medieval do Oratório de São Clemente das Penhas, em Leça da Palmeira, Portugal, é de que sejam oriundos de algum mosteiro ao norte de Portugal, nas proximidades de Braga.
Os documentos/monumentos medievais – os famosos “manuscritos medievais da UnB” – são o fragmento de oito fólios e meio do Livro das Aves, 79 fólios dos Diálogos de São Gregório e 81 fólios do Flos Sanctorum. Pensando em difundir e dar a conhecer a um público mais amplo os manuscritos medievais da UnB, os documentos se encontram agora acessíveis através do site da Biblioteca Central da universidade, no endereço http://bdce.unb.br.
Assim, o leitor deste número especial terá acesso aos textos que abordam desde os aspectos mais exteriores dos documentos até análises mais aprofundadas das características internas dos três manuscritos.
Saul António Gomes, investigador da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, parte do universo da codicologia na qual se insere o livro religioso medieval em território português para tecer considerações relativas aos três manuscritos medievais pertencentes a Universidade de Brasília. Segundo o historiador português, “os manuscritos medievais da UnB não intermedeiam um texto originariamente em latim, mas antes um texto traduzido em língua portuguesa para melhor compreensão dos leitores a que se destinavam”.
Américo Venâncio Lopes Machado Filho, pesquisador do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia, afirmando serem os manuscritos medievais da UnB os documentos mais antigos escritos em língua portuguesa existentes no Brasil, discute aspectos linguísticos como comprobatórios do valor maior desses manuscritos, qual seja, a possibilidade de representarem a variação e os processos de mudança culturais ao longo da história refletidos nos aspectos da memória linguístico-literária, ainda livre das amarras normativas.
Cláudia Costa Brochado, também do Programa de Estudos Medievais da Universidade de Brasília, apresenta uma possibilidade de análise dos manuscritos medievais da UnB em sala de aula como fonte documental para compreender melhor a Idade Média e faz isso através do exemplo bem-sucedido de análise das personagens femininas, como Benedita e Pelágia do Flos Sanctorum.
Maria Aparecida Torres Morais, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, investiga a ocorrência de possessivos na língua portuguesa do séc. XIV e no português brasileiro contemporâneo considerando a distribuição do pronome seu pré-nominal na relação com outras estratégias de expressão da posse a partir do estudo do texto presente nos fólios do Flos Sanctorum. As conclusões da pesquisadora corroboram com as características inovadoras do português do Brasil.
Heloisa Salles, Rozana Naves e Eloisa Pilati, pesquisadoras do Instituto de Letras da Universidade de Brasília, trazem mais uma possibilidade de análise linguística dos documentos. Contextualizando a socio-história do português brasileiro, a partir dos Diálogos de São Gregório, a investigação das orações reduzidas de infinitivo no português arcaico que apresentam, demostra que, “a despeito das propriedades inovadoras em relação ao sistema pronominal e flexional, o infinitivo flexionado se mantém produtivo nessa língua”.
Todos estes temas e debates acerca dos três manuscritos medievais da Universidade de Brasília nos levam a fazer, a exemplo de Machado Filho em seu artigo aqui apresentado, uma justa homenagem “às memórias de Rosa Virgínia Mattos e Silva e Nelson Rossi e a todos os que contribuem para a preservação e divulgação de espólios documentais e, em especial, dos Manuscritos Serafim da Silva Neto”.
Referências
ROSSI, Nelson et al. Livro das Aves. Edição crítica, introdução e glossário. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1965.
SILVA NETO, Serafim. Textos medievais e seus problemas. Rio de Janeiro: MEC; Casa Rui Barbosa, 1956.
Profª. Drª. Alícia Duhá Lose. Professora da Universidade Federal da Bahia, Brasil. Doutora em Letras e Linguística pela Universidade Federal da Bahia, Brasil. Pós-Doutora em História pela Universidade de Coimbra, Portugal. E-mail: alicia.lose@ufba.br.
Organizadora
Regime de Vargas / Em Tempo de Histórias / 2018
Investigar a respeito do governo de Getúlio Vargas é um grande desafio para os pesquisadores. Em apenas 18 anos, somados os dois períodos em que ele esteve no comando do país – de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954 –, o Brasil passou por um verdadeiro turbilhão de mudanças políticas, econômicas e culturais.
Nesse período, inferior a duas décadas, passamos por uma revolução que depôs um presidente e evitou a posse de um candidato eleito, assistimos a uma guerra civil, estivemos diante de tentativas de tomada do poder tanto pela extrema esquerda quanto pela extrema direita, participamos de uma guerra mundial, observamos o crescimento da música popular, vivemos a conquista de novos direitos trabalhistas e acompanhamos uma crise que culminaria no suicídio de Vargas. E estes são apenas alguns dos fatos mais significativos.
Getúlio Vargas, talvez o governante mais marcante da história do Brasil, até hoje desperta dúvidas, simpatias e críticas. Criou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), modernizou a economia brasileira, promoveu transformações urbanas e estabeleceu um novo modelo na relação entre político e trabalhador que conceitualmente recebeu o nome de populismo e, posteriormente, de trabalhismo. Além disso, perseguiu e prendeu milhares de brasileiros, implementou uma ditadura e não teve nenhuma pena de qualquer um que se mostrasse contrário ou representasse uma ameaça aos seus planos de permanecer no poder.
Ao longo de sua trajetória, Vargas fez muitos amigos e inimigos. E muitas vezes amigos que se tornaram inimigos e vice-versa. Pedro Ernesto Baptista, revolucionário de 1930, amigo e médico pessoal, acabou acusado de ser comunista e terminou preso por mais de um ano, sendo obrigado a encerrar seu mandato como prefeito da cidade do Rio de Janeiro. João Neves da Fontoura, companheiro de Vargas em 1930, passou a líder da oposição em 1934 e depois voltou a apoiá-lo na ocasião do golpe de 1937. Flores da Cunha, conterrâneo do presidente e também participante de 1930, passou a principal inimigo do presidente entre 1935 a 1937, fugindo do país poucas semanas antes do início da ditadura. Tais exemplos servem para demonstrar a fluidez das relações políticas e a enormidade de mudanças que ocorreram no cenário nacional de ano a ano, o que força o pesquisador a examinar com atenção, sensibilidade e de forma detalhista esse importante período de nossa história.
É necessário estudar a figura de Getúlio Vargas e todas as nuances nacionais e regionais dos vários momentos de seu governo com senso crítico e tomando o máximo de cuidado a fim de manter o distanciamento tão importante à pesquisa histórica. Algumas armadilhas devem ser evitadas como, por exemplo, a naturalização do uso da expressão “República Velha”, criada pelo governo Vargas para desvalorizar o passado, mas que lamentavelmente ainda é usada em alguns estudos historiográficos. Da mesma forma, a visão de Vargas como “doador” das leis trabalhistas é uma aceitação passiva do discurso criado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), apagando todo o passado de lutas históricas dos trabalhadores que culminou na pressão sobre o Estado para o atendimento das reivindicações das ruas.
Outro ponto interessante nos estudos sobre Vargas é o abrandamento que algumas vezes se faz da ditadura vivida entre 1937 e 1945, período tão violento e repressor quanto a Ditadura Civil-Militar de 1964. É imprescindível lembrar que muitas práticas de tortura e o arcabouço jurídico utilizado no tempo de Vargas foi aproveitado pelos militares na ditadura seguinte, inclusive com a participação de personagens em comum, como Francisco Campos, central na ditadura estadonovista e um dos redatores dos atos institucionais 1 e 2, respectivamente em 1964 e 1965.
Dentro desse vasto campo de investigações se insere este dossiê temático da Revista Em Tempo de Histórias, composto por artigos que tratam de diversos vieses do período Vargas e que, consequentemente, traz importante colaboração para a historiografia brasileira. Em Carnaval é política: a criação da Federação Carnavalesca de Pernambuco (1930-1950), Rosana Maria dos Santos mostra a interferência da elite no carnaval popular recifense de modo a transformá-lo de acordo com os interesses da alta sociedade pernambucana. A intervenção e regulação estatal da cultura popular é um traço marcante do governo Vargas, seja na esfera federal ou por meio da ação dos governadores estaduais, o que realça a pertinência do texto.
Já Mayra Coan Lago, em Conflitos e pedidos de terra nas cartas dos trabalhadores para Getúlio Vargas e Juan Domingo Perón, analisa a correspondência enviada pelos trabalhadores para os líderes brasileiro e argentino pedindo doação de terras e a intermediação deles em conflitos pela posse das mesmas, mostrando muito sobre o imaginário político da época e a relação estabelecida entre líder político e população.
Em O Distrito Federal e a Guerra de 1932: a construção de um front interno pelo Governo Provisório, Felipe Castanho Ribeiro procura analisar a mobilização do Governo Provisório durante a Guerra de 1932. Para isso, o autor recorreu ao conceito de front interno conforme o entendimento do historiador Roney Cytrynowicz. Neste sentido, o historiador apresenta a hipótese de que o Governo Provisório precisou mobilizar diferentes setores da sociedade com o intuito de assegurar a sua vitória diante do movimento militar irrompido no estado de São Paulo. Cabe ressaltar que a cidade do Rio de Janeiro, enquanto sede administrativa e política do país, serviu como uma vitrine para o resto da nação e que por isso o Governo de Getúlio Vargas precisou garantir a manutenção da ordem, conquistar o apoio da população carioca e consequentemente auferir a sua legitimação. A imprensa, censurada durante a guerra, foi um importante meio de comunicação do governo durante o conflito e foi amplamente utilizada para alcançar os seus objetivos.
No artigo A criação de uma Diplomacia Anticomunista no governo Vargas, em 1937, Maria Nepomuceno estuda a formação de uma agência anticomunista, no momento que precedeu à implantação do Estado Novo, envolvendo um serviço de inteligência na América Latina que objetivava a cooperação supranacional para monitoramento das conexões dos comunistas brasileiros além das fronteiras do país. O anticomunismo, essencial para o fortalecimento do Poder Executivo em dezembro de 1935 e, depois, para o golpe de 10 de novembro de 1937, foi um aspecto importante e que se manteve vivo durante todo o primeiro governo Vargas.
Daniela Teles da Silva, no texto Eugenia, saúde e trabalho durante a Era Vargas, traz dois aspectos centrais do período: a questão sanitária, que ia além do cuidado com a saúde a partir da construção de hospitais e casas de saúde, se expandindo para a discussão eugênica, que suscitou acalorado debate entre especialistas desde finais do século XIX até as primeiras décadas do século XX. Além da eugenia, os ideais sanitaristas e higienistas também tiveram a atenção do Estado durante o governo Vargas, a fim de atingir a meta de uma sociedade saudável, apta ao trabalho e que levaria o país ao desenvolvimento.
Em A aproximação luso-brasileira nos tempos do Estado Novo e a Revista Atlântico (1942-1945), Guilherme Nercolini Miranda estuda as relações internacionais entre Brasil e Portugal a partir da Revista Luso-brasileira, criada no contexto da Segunda Guerra Mundial. Miranda analisa os discursos que permeavam as relações entre os dois países e mostra a participação dos intelectuais brasileiros e portugueses no estabelecimento dessa diplomacia.
O Estado Novo por Getúlio Vargas: a verdadeira democracia é a democracia social?, de Claudio Alcantara Meireles Junior, traz a importante questão de como Getúlio Vargas, em seus discursos, conseguiu justificar a aparente contradição de querer estabelecer uma democracia social e, ao mesmo tempo, manter um governo ditatorial. A ideia de democracia social, representada pelo ganho de direitos trabalhistas, foi colocada como mais importante do que a democracia liberal, que não se adequaria à realidade do país e que seria improdutiva no que tange aos avanços sociais e econômicos, segundo o presidente.
André Barbosa Fraga, em O segredo das asas: a colaboração fílmica do INCE para a construção de uma mentalidade aeronáutica durante o governo Vargas, analisa o filme O segredo das asas, produzido em 1944 pelo Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE). No contexto da criação do Ministério da Aeronáutica, a película fez parte de um projeto governamental de construção de uma mentalidade aeronáutica, de modo a incentivar o engajamento de pilotos comerciais e militares e o consequente desenvolvimento da aviação no Brasil.
Encerrando o dossiê, Thiago Fidélis escreve Samuel Wainer: entre Diretrizes e Ultima Hora, que discute parte da trajetória do importante jornalista, que tivera fechada sua revista Diretrizes durante a ditadura, mas que a partir de uma entrevista realizada com Vargas, em 1949, cada vez mais se aproximou do político gaúcho. Wainer fundou, em 1951, o famoso jornal A Última hora, que seria o principal periódico de apoio a Getúlio Vargas durante seu governo democrático, de 1951 a 1954, rivalizando com jornais de oposição como o Tribuna da Imprensa, de Carlos Lacerda.
Agradeço à equipe da Revista Em Tempo de Histórias pelo convite para organizar esse importante dossiê e os parabenizo por todo o esforço em prol do desenvolvimento desse valioso periódico científico, o que demanda muita dedicação e trabalho árduo diário. Desejo a todos uma boa leitura e que os textos que aqui estão sejam objeto de reflexão e possam fomentar novos debates, assim como contribuir para a difusão do conhecimento científico sobre esse que é um dos mais importantes períodos da história do Brasil, o governo de Getúlio Vargas.
Thiago Cavaliere Mourelle – Doutor em História Social (UFF). Supervisor da Equipe de Pesquisa do Arquivo Nacional. Editor-científico da Revista Acervo – Arquivo Nacional. Professor associado do Núcleo de História Contemporânea (NEC/UFF). Coordenador e Professor de História – Educafro. E-mails para contato: thiagocavaliere@an.gov.brthiagocmourelle@gmail.com; .
História Social da Arte / História, histórias / 2018
Este dossiê reúne artigos que analisam criações artísticas (visuais e literárias) de acordo com os pressupostos teórico-metodológicos da História Social da Arte, cujo princípio fundamental é a indissociabilidade do estudo da obra de arte, do artista e da sociedade na qual, ou para a qual, foi concebida. Os sete textos que compõem o presente dossiê cobrem, juntos, um extenso período histórico: do século XVI ao XXI.
O artigo de Maria Leonor Garcia da Cruz apresenta reflexões sobre o pensamento político, social e espiritual do século XVI a partir do cruzamento de criações das belas-artes e das belas-letras, tendo como fontes de pesquisa obras de Hieronymus Bosch (c.1450-1516), Hans Holbein, o Moço (1497/98-1543), César Ripa (c.1555/60-1622), Alciato (1492-1550), Gil Vicente (1460/70-c.1536), Thomas More (1478-1535) e Maquiavel (1469-1527). Considerando que “o homem do século XVI é naturalmente crente”, a autora investiga os discursos quinhentistas – principalmente as criações textuais e visuais de cunho sarcástico e irônico – destacando os seguintes aspectos: a) a soberba e a ambição voraz , “ou seja, a opção pelo fraudulento e efêmero, em lugar de uma elevação da alma e de conduta ética, moral e política”; b) “a arbitrariedade do governante, contrapondo a tal conduta objectivos que lhe são superiores, limites morais e práticos, das modalidades de escolha ao uso do conselho e de outras técnicas de governo”; c) a “crueldade do exercício da justiça e sobretudo o desvio (não por incapacidade, mas intencional) de uma prática regulada por lei, sussobrante a subornos e favoritismos”. Seu estudo demonstra que a prédica do período, seja por meio da ironia, da idealização, ou mesmo da utopia, esforça-se “por endireitar um mundo que parece irremediavelmente invertido”.
Sabrina Mara Sant’Anna examina em seu artigo a importância do decoro do sacrário eucarístico no Bispado de Mariana, verticalizando a investigação de casos ocorridos entre 1745 e 1779 em que o Santíssimo Sacramento precisou ser transferido para uma casa provisória por estar a sua casa indecente. Debruçando-se sobre a legislação eclesiástica americana portuguesa, as cartas provenientes de visitas pastorais e a documentação confrarial setecentista, a autora apresenta “a teia de relações que envolvia os devotos, os artistas/artífices, as autoridades eclesiásticas e o padroado régio” quando o assunto era a fatura de um altar-retábulo com sacrário destinado ao armazenamento da reserva eucarística. Nos três casos analisados no artigo – Matriz do Ribeirão do Carmo (elevada à Catedral de Mariana em 1745), Matriz de Santo Antônio do Ribeirão de Santa Bárbara e Matriz das Congonhas do Campo – Sabrina verifica a indispensabilidade do decoro da casa do Santíssimo, “inclusive quando a referida casa era apenas provisória (normalmente um sacrário de altar confrarial localizado na nave dos templos usado enquanto o tabernáculo eucarístico estava impedido, isto é, em obras, ou indecente e precisando de obras)”.
Camila Fernandes Guimarães Santiago analisa em seu artigo a produção do Missal Romano e suas estampas editados em Portugal a partir 1760, época em que as políticas econômicas protecionistas adotadas pela coroa favoreciam as concessões de privilégios de impressão aos naturais do reino e proibia a importação de missais estrangeiros, sobretudo os advindos de casas tipográficas localizadas em Veneza e Antuérpia. O primeiro beneficiário foi o editor lisboeta Francisco Gonçalves Marques, cuja concessão foi renovada três vezes desde de 1760 até que, por decreto da rainha D. Maria I, em 1779 o monopólio foi transferido para a Regia Officina Typpographica. A autora destaca que na Capitania das Minas, região interiorana da América Portuguesa, a política de reserva de mercado operada pela coroa ocasionou a predominância dos missais editados após 1780, “o que interferiu, por sua vez, no universo de insinuações artísticas europeias ali disponíveis, uma vez que suas estampas apresentavam pendores classicizantes, de origem italiana”.
O artigo de Roselene de Souza Ferrante apresenta um estudo sobre Pasquale De Chirico, escultor italiano que se formou na Real Academia de Belas Artes de Nápoles e que imigrou para o Brasil durante a Primeira República. A ele atribui-se a primeira fundição artística de São Paulo, cidade onde morou e realizou bustos e estátuas públicas de José Bonifácio (em Santos), Coronel José Joaquim (em São João da Boa Vista) e Nossa Senhora da Conceição (fachada da antiga Catedral em Aparecida do Norte). Em Salvador, onde passou a residir a partir de 1905, Pasquale de Chirico executou diversos conjuntos de estatuária pública: Barão do Rio Branco, Visconde de Cairú, Dom Pedro II, Conde dos Arcos, Padre Manoel da Nóbrega e Castro Alves, além de lecionar escultura na Escola de Belas Artes da Bahia e contribuir, portanto, para a formação de artista locais. Também foi na Bahia que o imigrado italiano realizou em 1936 uma exposição apresentando o negro como objeto artístico. Embora os estudos raciais estivessem na pauta de discussão dos intelectuais brasileiros, inclusive na Faculdade de Medicina e no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, Roselene enfatiza que “em Pasquale De Chirico não há o desejo de retratar o tipo negro como um dado científico. Existe interesse em registrar o sujeito cotidiano, possivelmente, o que lhe parecia exótico”.
Em seu artigo Dagmar Manieri analisa a estrutura mitológica de Macunaíma – romance de autoria do modernista Mário de Andrade – tendo como referência os estudos de Lévi-Strauss e o contexto histórico, social e político do Brasil na década de 1920. Discorrendo sobre as razões da dissidência ocorrida no interior do Partido Republicano Paulista (PRP) e a consequente formação do Partido Democrático (PD), Dagmar destaca a atuação de Mário de Andrade como líder cultural dessa nova elite política que se opunha ao modelo de modernização urbana implementado no Rio de Janeiro, capital federal à época. O PD defendia a renovação democrática (tanto do pensamento político, quanto dos grupos dirigentes), a participação popular e, sobretudo, “a difusão do ensino em todos os graus”, pois só assim o Brasil se tornaria de fato moderno. Para Dagmar Manieiri o romance que Mário de Andrade publicou no final da década de 1920 sob o título Macunaíma “deve ser entendido como parte de uma reação ao modelo de modernização autoritária executada na Presidência de Rodrigues Alves (1902-1906) na Capital Federal”.
O artigo de Liszt Vianna Neto destaca a carência de pesquisas sobre a influência de artistas modernistas imigrados de países de língua alemã na gênese do modernismo carioca e apresenta um estudo sobre a trajetória e a produção artística de Leo Putz, pintor austro-húngaro que chegou ao Brasil em 1929 já sexagenário. Liszt discute a reforma modernizante implementada na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA) no início da década de 1930 pelo então diretor Lúcio Costa e as críticas nacionalistas que recaíram sobre sua atuação, agravadas ainda mais pela contratação de três professores estrangeiros, entre eles Leo Putz. A admissão deste reconhecido mestre da pintura moderna alemã como professor de Composição na ENBA foi apoiada e defendida por Cândido Portinari, Hernani de Irajá e José Marianno Filho. Durante os quatro anos em que esteve no Brasil (passou por São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia) Putz se entregou “ao basbaque e à maravilha da natureza e da luminosidade dos trópicos”, alterando completamente sua paleta de cores. Em 1933 ele voltou para a Alemanha, onde faleceu em 1940. Sua passagem pela ENBA, conforme destaca o autor, contribuiu para a formação da primeira geração de modernista cariocas.
O artigo de Sandra de Cássia Araújo Pelegrini e Gustavo Batista Gregio apresenta investigação sobre o engajamento artístico e social na obra de Vik Muniz, tendo como objeto principal de estudo as séries de retratos The Sugar Children (Crianças de Açúcar) e Pictures of Garbage (Retratos do Lixo) realizadas respectivamente em 1996 e 2008. Os autores discutem a influência da Pop Art na obra de Vik Muniz, em especial a produção artística de Andy Warhol que criticava “o consumismo exacerbado da sociedade contemporânea”. Para os autores, “artistas como Andy Warhol ou Vik Muniz devem ser abarcados como agentes sociais que interagem e dialogam com suas realidades, representando suas próprias visões de mundo em uma linguagem própria”. Sandra e Gustavo consideram que para Vik Muniz “a arte tem como ‘função’ interferir no cotidiano das pessoas” e modificar a perspectiva delas em relação a si mesmos e aos outros e é exatamente isso que os autores discutem ao analisarem as séries The Sugar Children e Pictures of Garbage. Na primeira o artista utilizou o açúcar para retratar a “doçura pueril” de crianças, cujos pais trabalhavam em canaviais localizados no Caribe, chegando a jornadas exaustivas de mais de 16 horas e, na segunda, usando de material reciclado, retratou sete catadores de lixo do maior aterro sanitário da América Latina: o Jardim Gramacho.
Na esperança que este dossiê inspire novas pesquisas e contribua para o avanço da História Social da Arte, subscrevo-me desejando a todos uma boa leitura.
Prof ª Drª Sabrina Mara Sant’Anna
Setembro de 2018.
História, Gênero e Sexualidade: Abordagens Interdisciplinares / História, Histórias / 2015
“História, Gênero e Sexualidade: Abordagens Interdisciplinares” é o título deste dossiê. Nos tempos atuais, constitui-se em grande valentia publicar tal edição. Vivemos em tempos de retrocesso político e social em que falas e atos comprometem o estado democrático de direitos civis. O debate teórico proposto aqui visa reunir pesquisadoras e pesquisadores dos estudos de gênero que discutem questões que envolvem poderes sociais, políticos, econômicos e culturais, suas disputas e efeitos sobre os corpos, as subjetividades, os comportamentos sexuais e as relações de gênero. As diferenças e hierarquias entre o masculino e o feminino, produzidas historicamente através de jogos de significação e de relações de poder, marcam as desigualdades nas relações de gênero e as possibilidades de inserção e interdição dos indivíduos na vida social. Assim, este dossiê busca de maneira interdisciplinar articular pesquisas e reflexões preocupadas com as construções das sexualidades, das masculinidades e das feminilidades na história, a fim de desvelar os seus processos de difusão, construção e funcionamento, e os poderes que atravessam e mantêmessas construções.
O primeiro artigo desse dossiê, de autoriadeNatanael de Freitas Silva (UFRRJ), apresenta reflexões sobre a necessidade de investigarmos, no campo da história, as experiências de masculinidades e suas implicações em uma política de gênero. Desse modo, à luz dos estudos de Richard Miskolci e Albuquerque Júnior, o autor tece algumas considerações sobre o estudo das masculinidades e discute a articulação de uma histórica concepção de masculinidade na elaboração de projetos de poder engendrados em fins doséculoXIX e início do XX.
Já o segundo artigo, de Pollyana Dourado (UFG) e Ana Carolina Eiras Coelho Soares (UFG), apresenta uma análise das representações do feminino e dos mitos construídos sobre a Amazônia na minissérie “Amazônia –de Galvez a Chico Mendes”.
Ao abordar temas relativos à homossexualidade e à heterossexualidade compulsória, o terceiro artigo, de Elias Veras (UFSC) e Oscar Andreu (Universidad de Barcelona), analisa a invenção do estigma travesti no Brasil, destacando sua construção discursiva na mídia, especialmente em enunciados produzidos em Fortaleza (Ceará),nos anos de 1980. Seus olhares são precisos ao sugerir o quanto as representações dominantes constituídas pelos modelos de masculino e feminino encontram-se fragilizadas com a emergência de imagens e sentidos ancorados na experiência travesti.
do envelhecimento, da memória e das condutas homossexuaisna região do Pantanal de Mato Grosso do Sul, nas cidades de Corumbá e Ladário,nas cercanias da fronteira com a Bolívia.
Ao adentrar nos arquivos da Polícia Militar, Andrea Schactae (UEPG), no sexto artigo, propõe uma reflexão sobre as feminilidades e masculinidades na Polícia Militar do Paraná, através de um estudo de caso de transgressão disciplinar praticado por uma agente da Polícia Feminina e por um oficial da PMPR, em 1979.
No sétimo artigo, Marilia Rodrigues de Oliveira (PUC-RIO) discute “narrativas de crimes” presentes na imprensa carioca da Primeira República, com o objetivo de mostrar como os jornalistas lançavam mão de uma gramática emocional e de uma estética melodramática para criarem diferentes representações de gênero que transgrediam e reiteravam padrões normativos de moralidade até então considerados bem definidos.
Lindsay Jemima Cresto (UTFPR) e Marinês Ribeiro Dos Santos (UTFPR), no oitavo artigo, discutem as representações de gênero na decoração de interioresdomésticos. Analisando um blog de decoração (Homens da Casa) voltado para um público masculino, as autoras observam como os textos eimagensque circulam nesse blog estão carregadosderepresentações de feminilidade e masculinidade que reforçam os estereótipos e desigualdades de gênero em nossa sociedade.
O nono e último artigo do dossiê, de Caetana de Andrade Martins Pereira (UnB), analisa o modo como a feminilidade é construída na revista Jornal das Moças,nos anos 1960, destacando o seu funcionamento como uma “tecnologia de gênero”, heteronormativa e racializada.
Os estudos de gênero adquirem novos contornos frente à insuficiência e às críticas em abordagens discursivas que não consideramas persistências das desigualdades entremulheres e homens,e que tratam a heterossexualidade, assim como a feminilidade e a masculinidade como dados biológicos e naturais. Os estudos de gênero não podem ser vistos apenas como sinônimos de estudos sobre as mulheres. Em volta do termo há o reconhecimento do caráter relacional e de sua constituição histórica, social e cultural, além de instâncias de poder que atribuem valores e características às subjetividades e às relações entre os sexos. Nesse sentido, os estudos feministas trazem importantes contribuições ao abordar o gênero como uma categoria que se relaciona com outros marcadores de diferenças (classe, raça, etnia, religião, idade, nacionalidade, orientação sexual, etc.) na constituição das subjetividades e experiências e, desse modo, buscam problematizar e desnaturalizar as concepções de sexo/gênero fundadas em preceitos universais e essencialistas.
As diferenças são históricas e socialmente forjadas e construídas. Portanto, as sensibilidades, comportamentos, valores, organizações e posicionamentos sociais dos indivíduos são construções. Nesse sentido, gênero, como categoria de análise, pode também contribuir no enriquecimento da historiografia, colocando em debate as verdades, convicções e poderes em torno de discursos e práticas baseados na existência de uma natureza humana imutável que rege as ações e pensamentos de homens e mulheres na história.
Não somos universais. Somos compostos da mesma matéria que as nuvens. Clivados, densos, leves e únicos: somos históricos. Esperamos que as leitorase os leitores desfrutem e se inspirem com esse dossiê.
Goiânia, 06 de agosto de 2015.
Profa. Dra. Ana Carolina Eiras Coelho Soares (UFG)
ORGANIZADORA
Variações em torno da Modernidade / Em Tempo de Histórias / 2015
É com satisfação que apresento o dossiê – Variações em torno da modernidade. Os artigos resultam de trabalhos de alunos do curso de graduação em História da Universidade de Brasília, apresentados na disciplina História Moderna. Após o término do curso, em 2012, propus aos alunos que aprofundassem o trabalho, sob minha orientação, como participantes do grupo de pesquisa do CNPQ Tradição e Modernidade. Diante do entusiasmo, passamos a nos reunir regularmente para discussões conjuntas e aprofundamento das pesquisas. Desse trabalho, dois resultaram em monografias de graduação e um em pesquisa desenvolvida no âmbito do Programa de Iniciação Científica. As reuniões propiciaram um contato produtivo entre alunos da graduação e da pós-graduação.
Além da disciplina obrigatória História Moderna, esses alunos cursaram disciplinas optativas da área, por mim oferecidas, e atuaram como monitores. Ao longo de dois anos, o desenvolvimento intelectual dos alunos foi significativo. E para mim, o acompanhamento dos seus trabalhos foi uma experiência gratificante.
Finalmente, diante de amadurecimento dos textos, pensei ser estimulante para os alunos a publicação do resultado das suas pesquisas. Atualmente, alguns desses alunos estão cursando a Pós-Graduação na Universidade de Brasília outros se preparam para o ingresso neste ano.
Os textos apresentados inserem-se na área de História Intelectual e tratam da diversidade de ideias desenvolvidas na Europa moderna. Todos apresentam uma reflexão baseada na historiografia recente sobre os temas tratados, suscitando novas questões e desdobramentos. A preocupação com o contexto histórico de produção dos autores examinados caracteriza uma opção metodológica no âmbito da reflexão sobre ideias.
Os textos de Eduardo Ubaldo Barbosa – O momento Burke. Notas para a história de um Iluminismo contrarevolucionário –, e o de Pedro Henrique Soares Santos – Adam Smith e a sociedade comercial -, dialogam criticamente com determinadas correntes historiográficas e examinam o pensamento dos autores em seus respectivos contextos histórico-intelectual.
Pedro Eduardo Batista Ferreira da Silva, no artigo James Harrington e a tradição republicana na Inglaterra do século XVII, recupera a tradição republicana inglesa no século XVII.
José Lourenço de Sant’Anna Filho no artigo Inimigos da Luz examina o pensamento do editor do jornal pernambucano A Voz da Religião, padre Tavares da Gama, identificando-o como um representante do pensamento antifilosófico no Brasil oitocentista.
Finalmente, Guilherme Domingues Gonçales, no artigo Iluminismo nos livros didáticos brasileiros, analisa o tema Iluminismo nos livros didáticos brasileiros e sugere o distanciamento dos conteúdos presentes nos livros didáticos em relação às pesquisas acadêmicas.
Dra. Tereza Cristina Kirshner
Universidade de Brasília
Discursos da História e Linguagens da História da Arte / História, Histórias / 2013
A história e a história da arte, embora possam parecer tão próximas, possuem cada uma objetos e métodos próprios. Nos trabalhos que se seguem, não se pretende “chover no molhado” retomando os limites e problemáticas que são próprios a cada uma das disciplinas. Nossa intenção, ao nos aproximarmos dos discursos produzidos pela história e pelas linguagens expressadas pela história da arte, é a de nos determos mais atentamente ao tempo, ao espaço e à representação, categorias que são caras a ambas as disciplinas.
A partir dos anos 70, a história passou a encontrar no objeto de arte testemunhos importantes dos eventos históricos. No deslanchar desse processo, vivido paralelamente com a crise dos paradigmas, os historiadores da arte Aby Warburg, Erwin Panofsky e Meyer Schapiro tornaram-se referências teóricas essenciais para os historiadores, em especial os medievalistas. A história da arte por sua vez, ao organizar a pesquisa e o ensino, apoderou-se, não sem alguma resistência, das “idades” da história – antiga, medieval, moderna e contemporânea – como marco temporal na escolha dos temas de estudo. Não se tem conhecimento de que os historiadores e os historiadores da arte tenham se reunido para discutir os possíveis pontos de interseção das duas disciplinas.1
Para os historiadores, as possibilidades abertas por Warburg, Panofsky, e Shapiro permitiram o acesso a uma nova dimensão da história, constituída pelo imaginário e o simbólico, o que renovou em especial a história política.2 Para os historiadores da arte, a despeito da reação de alguns profissionais com relação a uma periodização que atrela a história da arte à história, alguns historiadores da arte têm se mostrado inflexíveis quando o objeto de arte analisado escapa aos padrões temporais ou mesmo regionais impostos tradicionalmente.3 A opção por uma história da arte que ignore as balizas temporais da história e busque nos estudos regionais, ou estilísticos, uma temporalidade longa revelada pelas formas, enfrenta quase sempre uma reação desfavorável. Enfim, para muitos, a história da arte continua a ser vista como uma sucessão de ciclos de vida, morte e renascimento. “O discurso histórico não ‘nasce’ nunca. Ele sempre recomeça”.4
Desde o final do século XX, nos anos 90, Georges Didi-Huberman sacudiu com veemência as velhas certezas dos historiadores da arte e dos historiadores. Dentre elas, a crença inabalável na vitória sobre o anacronismo. Em Devant le Temps. Histoire de l’art et anachronisme des images, Didi-Huberman demonstrou com clareza que o tempo da imagem não é o mesmo da história.5
Este dossiê se inspirou em questões que tocam a história e a história da arte. Mais precisamente, o discurso da história e a linguagem da história da arte. O ponto de partida é Brasília, cidade capital, por excelência, dos espaços. Um espaço que foi pensado, segundo Elisa de Souza Martinez, para o “florescimento de um metadiscurso sobre a história do pensamento brasileiro”, um “laboratório de novas ideias” que, no entanto, não se concretizou. Estudando os escritos de Mário Pedrosa, a autora colheu uma questão, Brasília ou Maracangalha? e a transformou no fio condutor de suas reflexões, onde buscou abordar o confronto entre a utopia e a realidade a partir das proposições de Lúcio Costa, “o inventor de Brasília”.
A proposta deste dossiê se inspirou, portanto, no espaço idealizado, ou se preferirmos, na utopia da nova capital federal. Uma espécie de terra nova, prenhe de criatividade e reprodutora dos mais variados discursos e linguagens. Uma oportunidade única para traçar “os limites e os intercâmbios entre as artes plásticas e/ou visuais, rompidos no início do século XX”, conforme lembra Roberto Conduru ao abordar a realização do Congresso da AICA (Associação Internacional de Críticos de Arte) em Brasília, cujo tema foi “A cidade nova e a síntese das artes” – um tema rebatido por Lúcio Costa, que ponderou tratar-se de “integração mais do que síntese”. Em Razões da Nova Arquitetura, o arquiteto urbanista afirmou que “arquitetura, escultura, pintura, formam um só corpo coeso, um organismo vivo de impossível desagregação.
As preocupações utópicas que cercaram a construção de Brasília, tão contemporâneas e presentes, fazem, ao mesmo tempo, parte do passado. Giulio Carlo Argan escreveu que “a ideia de cidade ideal está profundamente arraigada em todos os períodos históricos, sendo inerente ao caráter sacro anexo à instituição e confirmado pela contraposição recorrente entre cidade metafísica ou celeste e cidade terrena ou humana”.6 Em História da Cidade como História da Arte, Argan afirma que “cenário e sujeito da história, construída a partir de um modelo no qual as tradições culturais expressam valores, a cidade projeta a sua própria história através de múltiplas facetas que revelam o que são, o que deixaram de ser e o que pretendem vir a ser”.7 Assim, tendo Brasília como inspiração inicial, as palavras de Argan foram tomadas por empréstimo, buscando-se “no cenário e sujeito” as múltiplas facetas que permitam compreender os discursos da história e as linguagens da história da arte.
A ideia do espaço urbano construído “de acordo com modelos e tradições que expressam valores que oscilam no que são, no que deixaram de ser e no que pretendem vir a ser” é evidenciado por Françoise Vergneault-Belmont, para quem a planta de uma cidade é o testemunho de um passado. Cartógrafa por formação, Vergneault-Belmont decifra nos traçados das ruas uma lógica de um itinerário ou de um limite. Para ela, as plantas da Paris permitem compreender as relações entre a sociedade e o espaço. Debruçando-se com um rigor fino sobre três séculos de planos traçados para a capital francesa (séculos XVI, XVII e XVIII), ela concluiu que as plantas são denominadas de portrait8, do verbo pourtraire. No sufixo da palavra, composta por dois elementos, o verbo traire, tirer, assume seu antigo sentido, dessiner, tirer un trait. Isto é, segundo a autora, a planta é como um retrato de uma pessoa, ou do rei, ultrapassando a descrição para revelar a natureza e a essência do que é representado. Isto significa que desde a sua origem, em suas palavras, estabeleceu-se um “estreito parentesco semântico e simbólico entre a planta e o retrato como efígies do poder”. Os sucessivos planos da cidade de Paris procuraram interferir diretamente na sua urbanidade, eram projetos urbanos nos quais Vergneault-Belmont enxergou um testemunho da história.
É sobre testemunhos que nos fala Susani Silveira Lemos França, referindo-se aos cronistas quatrocentistas e viajantes estrangeiros que passaram por Lisboa no século XV. Esses escritos contribuíram de forma decisiva para a “consolidação de um passado selecionado” que fez de Lisboa “a cabeça” de Portugal. Susani França os vê como “peças-chave” na configuração da imagem e da história de Lisboa. Ela chama atenção para o fato de que em uma época em que outras cidades marítimas, tais como Veneza, Gênova, Ceuta e Constantinopla, eram descritas minuciosamente, Lisboa não era vinculada ao oceano: a sua história interna se sedimentava na memória religiosa e nas condições comerciais. No discurso da crônica, Lisboa aparece como o palco de cenas memoráveis que envolvem o rei e a corte régia. Ressalta-se, igualmente, o valor bélico e os eventos memoráveis, tais como as procissões e outras manifestações sagradas ou políticas vinculadas às cortes. Mas, como se sabe, a corte era itinerante, passando, portanto, por outras cidades. A beleza das cidades associava-se então, ao que nelas acontecia e a como os seus habitantes atuavam. A ordenação dos edifícios e a arquitetura (tão cara aos historiadores da arte) só eram citadas pelos cronistas enquanto cenários de acontecimentos extraordinários, tais como o sepultamento de relíquias e o albergamento das cortes. São, portanto, questões internas memoráveis que promovem Lisboa como “cidade grandíssima e cabeça de Portugal”, e não como cidade marítima.
A memória religiosa e comercial das cidades modernas é fruto de um movimento longo da memória coletiva. Memória, aqui, compreendida como vida em permanente mudança. A chamada modernidade não renasceu das cinzas de um passado sepultado, e, muito menos, rompeu com a Idade Média. Para os medievais, a notoriedade de uma cidade estava vinculada às suas catedrais, nas quais se guardavam um tesouro de objetos preciosos, incluindo as relíquias de um santo. A riqueza ostentada pela catedral e a importância das feiras realizadas na praça da cidade asseguravam a grandeza e a celebridade da cidade.
Clara Bargellini e David J. Weber, estudando o território das missões na América Espanhola, demonstram com propriedade como franciscanos e jesuítas transportaram para o Novo Mundo práticas religiosas que foram constituídas ao longo da Idade Média e continuaram vivas até o século XVIII. Em La Maison Dieu, Dominique Iogna-Prat pergunta: por que e quando Deus se tornou de “pedra”; e por que, e quando, a Igreja se impôs na paisagem do Ocidente? A partir de quando a Igreja passou a ocupar espaços e territórios? Para Iogna-Prat, a doutrina sozinha não explica a reunião dos cristãos em um “edifício de pedra” que recebe a mesma denominação da comunidade dos fiéis. Ele considera que a Igreja é também um conjunto de bens eclesiásticos, o que permite que se interrogue de forma mais ampla a relação dos homens com o espaço em uma época onde os termos Igreja e sociedade são coextensivos no lugar das estruturas eclesiásticas de fixação e controle das populações.9
Analisando os bens eclesiásticos da missão jesuítica de Becerac no norte da Nova Espanha, Clara Bargellini inventariou um impressionante acervo constituído de altares, ornamentos diversos, prataria e outros objetos de adorno do culto. Tais objetos apontam, ao mesmo tempo, para o uso de materiais preciosos e para a habilidade dos artífices, permitindo que sejam identificados como objetos de arte, de função comemorativa permanente. Trata-se de comemorações importadas para a América pelos franciscanos e jesuítas. A suntuosidade dos ornamentos e objetos tem como cenário uma arquitetura magnífica tanto nas fachadas exteriores, quanto no interior.
Apesar da semelhança entre as duas ordens, Bargellini chama atenção para diferenças que apontam para a história de cada uma delas. Enquanto os franciscanos recordam o “seu papel missionário como fundadores da Igreja na Nova Espanha, apoiados pela monarquia dos Habsburgos, os jesuítas insistiram na individualidade dos membros da Companhia, ativos e heroicos representados na iconografia da Igreja, seguidamente sozinhos, ou em grupo, mas sempre identificados. Ambas as ordens, em todas as etapas da produção artística, imprimiram um valor simbólico aos objetos. Ao estabelecerem uma missão, as necessidades artísticas se centravam especificamente nos ornamentos, na prataria e nos objetos de uso na missa. Para os jesuítas, as imagens ganhavam uma função especial voltada para a catequese (uma resposta aos ídolos indígenas). A arquitetura do edifício da igreja e as coleções interiores de objetos de importante valor material e artístico respondiam à necessidade vital da identidade e da transcendência, conforme afirma a autora. Porém, guardando as devidas proporções de tempo e espaço, poderíamos dizer que são seguidamente, “coextensivas”, conjugando seguidamente os poderes da Igreja e da monarquia.
David J. Weber ressalta a importância da arquitetura na forma de igrejas missionais, assim como da pintura, da escultura, da música, dança e teatro para impressionar os indígenas com o poder e a glória de Deus. Adverte, todavia, que o uso das artes pelos missionários para promover conversões e sustentar a fé fez, das mesmas, coadjuvantes na pedagogia do medo.
Em síntese, os trabalhos de Bargellini e de Weber, que integram um projeto institucional que reuniu estudiosos dos dois lados da fronteira, México e Estados Unidos, evidenciam como os fins doutrinários e expansionistas da Igreja, apoiada nas monarquias ibéricas, promoveram uma integração das artes, arquitetura, escultura, pintura, ourivesaria, música, dança e teatro no território das missões. Se ousássemos pensar em termos contemporâneos e rompêssemos as barreiras do tempo, poderíamos ver nas Missões da Nova Espanha a realização da síntese das artes que veio a ser almejada alguns séculos mais tarde. A realização dessa “síntese” com base na doutrina cristã prometia, aos que se convertessem, a salvação, isto é, o Paraíso: lugar, que vários historiadores veem como uma utopia medieval10, uma espécie de lugar idealizado, sempre almejado e jamais encontrado.
Considerando as abordagens feitas aos espaços, aos tempos, aos discursos e às linguagens, este dossiê espera favorecer o debate entre historiadores e historiadores da arte. Foram convidados historiadores de diferentes formações, que enriqueceram o dossiê, possibilitando a sua publicação. Agradecemos a generosidade, presteza e paciência de cada um. A Elisa Martinez, Roberto Conduru e Susani França, participantes fiéis desde o início desta “empreitada”. Nossa gratidão, em particular, à viúva de David Weber, que permitiu a publicação do seu trabalho, bem como a Clara Bargellini, que intermediou o consentimento. Nossos sinceros agradecimentos a Françoise Vergneault-Belmont, pela inestimável contribuição prestada aos historiadores de várias partes do mundo. Nosso muito obrigado a Flávio Fonseca e Matheus Silveira pelo auxílio essencial na transposição e configuração dos textos em língua estrangeira.
Brasília, novembro de 2013.
Maria Eurydice de Barros Ribeiro (Universidade de Brasília)
Notas
1 Os historiadores e historiadores da arte encontram-se ou em simpósios temáticos ou em participações isoladas de historiadores ou historiadores da arte em eventos específicos promovidos pelas associações das disciplinas (Associação Nacional de História – ANPUH, Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas – ANPAP, Comitê Brasileiro de História da Arte – CBHA). Não há registro de que historiadores e historiadores da arte tenham promovido um evento específico visando discutir questões pertinentes às duas disciplinas.
2 Foram os medievalistas os primeiros a chamar a atenção para a importância das imagens como fonte para o historiador. A renovação da história política partiu também de um grupo de medievalistas liderados por Jacques le Goff pelo viés de uma nova disciplina, a Antropologia Histórica.
3 Ver MARTINEZ, Elisa de Souza; RIBEIRO, Maria Eurydice de Barros. Anti-medieval ou anti-moderno? As fronteiras do estudo da história da arte na contemporaneidade. In: História da Arte: 50 anos. Rio de Janeiro. http://wordpress.com/
4 DIDI-HUBERMAN, Georges. L’image survivante. Histoire de l’art et temps des fantômes selon Aby Warburg. Paris: Minuit, 2002, p.11.
5 DIDI-HUBERMAN, Georges. Devant le temps. Histoire de l’art et anachronisme des images. Paris: Minuit, 2000.
6 ARGAN, Giulio Carlo. História da arte, como história da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 73-74.
7 Idem, p. 74.
8 Portrait, retrato, em português, vem do italiano ritratto, originado do latim retractus: significa fazer a efígie de uma pessoa. Sugere, assim, os mesmos significados apontados por Françoise Vergneault. Conferir no texto da autora.
9 IOGNA-PRAT, Dominique. La Maison de Dieu. Une histoire monumentale de l`Église au Moyen Âge. Paris: Seuil, 2006, p. 17-18.
10 Deve-se naturalmente, tomar cuidado com a palavra utopia, pelo fato da mesma não existir na Idade Média (como se sabe, a palavra foi utilizada pela primeira vez por Thomas More em 1516). Todavia, os medievais idealizaram vários lugares, frequentemente, ilhas, onde o clima seria ameno, com abundância de frutos e fartura de alimentos, e onde a natureza seria bela e clemente.
Memória, Identidade e Historiografia / Textos de História / 2002
Tempo e Memória
A tarefa de assenhorear-se do tempo pela memória, de o inserir na consciência histórica e de dar-lhe um sentido aceitável é uma constante da atividade humana. O agente racional humano busca, ininterruptamente, atribuir sentido ao que faz. Isso ocorre no plano intencional: valores, idéias ou interesses fundamentam e orientam o agir. Esse plano antecede, ao menos logicamente, o agir concreto. No plano interpretativo, existe a mesma preocupação com o estabelecimento de um sentido plausível para o agir constatado pela pesquisa. Em ambos os casos, dá-se o esforço por construir um tempo histórico em que a existência e a ação tenham sentido e produzam sentido. Esse sentido atribuído à memória histórica ou construído para ela desempenha um papel decisivo para a identidade de cada um, do grupo a que pertence e da sociedade que forma. Origem cultural, estratificação social, sistema de produção, linguagem, religião, organização e hierarquia, e tantos outros elementos consagrados nesse processo são definidos, delimitados, investigados, interpretados, estruturados e articulados.
A memória e a identidade estabelecem uma encruzilhada em que as diversas perspectivas do senso comum como do conhecimento científico se encontram. História, psicologia, literatura, economia, sociologia, filosofia, antropologia e tantas mais concorrem, umas e outras, para que se constitua um feixe de fatores em cuja intersecção se reconhece o sujeito. Nesse ponto focai, memória individual, tempo coletivo e espaço social se associam para formar a cultura histórica com a qual a identidade se forja, consolida, atua e reproduz. A memória pessoal, associada à memória coletiva inscrita na historicidade do espaço social em que cada indivíduo emerge, marca não apenas a identidade particular do sujeito agente, mas também a coletividade identitária com que cada um se depara e que cada um quer assumir, modificar, transformar e mesmo rejeitar. Está-se aqui inserido em uma dinâmica que se pode chamar, com Jõrn Rüsen, de constante antropológica da cultura histórica. O que significa isso? Tal realidade é a de todos, e a de cada um: a cada instante todos os instantes precisam (ou são, de fato) processados idealmente em um construto significativo que apelidamos “história”. Passado, presente e futuro são fatores da cultura histórica operado pela síntese ativa do agente racional humano como cenário, encontrado e produzido, da vida concreta. Independentemente de essa operação ser efetuada por um “leigo” ou por um “profissional”.
Entender como a memória histórica se compõe e forma, como ela é operada e que efeitos provoca, como ela é entendida e administrada pelos homens de cada tempo e de todos os tempos, é um efeito, no campo da ciência histórica, da dinâmica da história de todos os campos. Como, de que forma e porquê ficam registrados — tirando a obviedade dos documentos e monumentos — pessoas, objetos, acontecimentos? Essa memória histórica, que parece tão personalizada (tão subjetiva, diriam alguns), é forjada também pela experiência coletiva e pelas representações públicas. Meio-ambiente familiar, língua, cultura, meios de comunicação, celebrações e comemorações influenciam, e mesmo marcam, não apenas o quê os indivíduos e as sociedades são, mas certamente também o que foram, o que serão e em que contexto vivem e viverão.
O 19° Congresso Mundial de História realizado em 2000, em Oslo, dedicou um amplo espaço de discussão ao tema da memória e da consciência histórica. Organizados a cada cinco anos pelo Comitê Internacional de Ciências Históricas, os congressos mundiais reúnem expressivo número de historiadores de todo o mundo, representando a suma da historiografia e de seus avanços. Foi-me dado organizar um tema especializado sobre “Memória e Identidade Coletiva: como as sociedades constróem e administram seu passado.” A vinculação da memória à representação coletiva da identidade sugere a perspectiva de uma percepção social da inserção das pessoas no plano da identidade. Evitar-se-ia, por conseguinte, a tentação de deslizar para o campo da subjetividade individual como eixo de referência, embora não se a possa excluir. A segunda parte do título apresenta à reflexão a questão ativa, mutante, dos processos sociais de elaboração da consciência histórica.
A intenção foi a de provocar o debate em torno do aspecto empírico e ficcional subsumidos nos sistemas de memória — pública e privada — das sociedades, e acerca da sua gestão no quotidiano.
Para permitir um amplo leque de alternativas de análise, o tema foi tratado por especialistas de diversas procedências e de diferentes opções teórico-metodológicas. Brasil (Estevão de Rezende Martins), Argentina (Dora Schwarzstein), Alemanha (Jórn Rüsen), Israel (Moshe Zimmerman), Espanha (Joseba Agirreazkuenaga), índia (Shradda Sahasrabuddhe), Austrália (Joan Beaumont), Bélgica (Chantal Kesteloot), França (Henry Rousso), Holanda (Frank Ankersmit) trouxeram sua reflexões a um público de mais de 500 pessoas que lotou o auditório em que teve lugar o debate, na Universidade de Oslo. A Universidade de Brasília, por seu Programa de Pós-Graduação em História, traz agora a lume, na primeira parte deste volume, o conjunto dos textos preparados pelos participantes, oferecendo essas contribuições a um círculo ainda mais largo de interessados e estudiosos.
As questões de fundo suscitadas e debatidas desde Oslo vieram também à discussão no 21° Simpósio Nacional de História, organizado pela Associação Nacional de História (ANPUH), na Universidade Federal Fluminense, em julho de 2001. O papel da organização mental da consciência histórica, sob a forma da narrativa historiográfica e de suas variantes ao longo do tempo foi objeto de debates intensos, com forte participação. Os textos apresentados à reflexão por Estevão de Rezende Martins (Brasília), José Carlos Reis (Belo Horizonte), Astor A. Diehl (Passo Fundo) e Jurandir Malerba (então João Pessoa, hoje Washington), estão reunidos na segunda parte deste volume, consolidando mais uma etapa da contribuição brasileira para a análise e a crítica teórica e historiográfica contemporâneas. A inserção internacional da produção historiográfica brasileira recebe, com o presente volume, um significativo campo de ressonância. Essa difusão é assim apoiada pela iniciativa do Programa de Mestrado e Doutorado em História da Universidade de Brasília, de publicar este 10° volume da “Textos de História” coligindo essas contribuições.
Estevão Chaves de Rezende Martins
Organizador