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Crime e Relações Internacionais | Monções – Revista de Relações Internacionais | 2020
“Crime”. Essa palavra nos remete quase imediatamente a transgressões penais que acontecem dentro dos Estados, nas cidades, nos bairros, nas ruas, naquilo que é entendido como local e doméstico. E, de fato, esse espaço interno foi historicamente o espaço privilegiado para compreender o crime e para definir políticas para o seu combate. Os trabalhos de criminologia, cuja interdisciplinaridade incorporou abordagens sociológicas, antropológicas, jurídicas, entre outras, evoluíram ao longo do século XX por tais parâmetros (LOADER; SPARKS, 2007).
No entanto, as últimas décadas presenciaram novas dinâmicas da criminalidade, da percepção política sobre esse fenômeno e da produção de conhecimento a seu respeito. Nesse novo momento, o internacional ganhou proeminência, tornando-se um espaço social crescentemente relevante. Isso repercutiu na importação de conceitos da área de Relações Internacionais pela Criminologia, como é o caso do “transnacional”, ao mesmo tempo em que estudos de Relações Internacionais passaram a incorporar parâmetros criminológicos nos seus referenciais analíticos (LOADER; PERCY, 2012). Tráfico de drogas, armas e pessoas, contrabando, comércio ilegal de vida selvagem e de bens culturais e lavagem de dinheiro são alguns dos tópicos que passaram a ter o “internacional” como qualificador. Leia Mais
Relações entre crime e gênero: um balanço | História (Unesp) | 2019
O presente dossiê reúne artigos que discutem crime e gênero em diferentes perspectivas, espaços e temporalidades. Recentemente, estudos que buscam problematizar as questões de gênero nas pesquisas históricas com fontes criminais têm ganhado destaque, significando a retomada de trabalhos que foram pioneiros na década de 80 do século XX. A importância de análises sobre os delitos femininos no cotidiano dos grupos populares, os papéis femininos, a constituição das masculinidades e o controle por parte das instituições estatais foram temas que ganharam destaque em pesquisas que hoje são consideradas referências sobre crime e gênero.
Nesse sentido, um dos primeiros trabalhos que pensou a relação entre tais temas através das fontes criminais foi o de Martha de Abreu Esteves (1989), Meninas Perdidas. Este estudo, bastante inovador na utilização das fontes criminais, analisa os padrões normatizadores da conduta sexual sugeridos por juristas e médicos, bem como os valores e normas presentes no cotidiano das relações amorosas dos grupos populares no Rio de Janeiro do início do século XX. Além do citado livro, destacam-se também, no campo da história e antropologia, os estudos de Raquel Soihet, Sidney Chalhoub, Magali Gouveia Engel, Sueann Caulfield e Marisa Corrêa. Todos eles já indicavam para a participação das mulheres nas ocorrências criminais, centrando a análise nas situações de controle da sexualidade, uma vez que apareciam com mais frequência em fontes desta natureza. Soihet (1989), no clássico Condição feminina e formas de violência, aborda as mulheres pobres e a questão da ordem urbana nas primeiras décadas da República. Com uma proposta inovadora para a época, a autora buscou analisar os aspectos variados do cotidiano das mulheres trabalhadoras, prostitutas, homossexuais e criminosas, questionando os estereótipos e apontando novas dimensões do comportamento das mesmas. Para além de apenas apresentar as vítimas enquanto objeto de controle e dominação, Soihet aponta para o exercício de poder feminino, suas perspectivas e resistências cotidianas, colocando em xeque os conhecimentos “científicos” sobre as mulheres e “desmitificando” representações universais acerca da passividade, docilidade, dependência e a natureza maternal das mesmas. Leia Mais
História e Crime / Aedos / 2017
A Casa de detenção de São Paulo, também conhecida como Carandiru, foi fundada no início do século XX, tendo sido um dos maiores presídios da América Latina. Há 25 anos, em 02 de outubro de 1992, o Carandiru foi palco de um dos maiores massacres do país resultando em um saldo de 111 presidiários mortos e 87 feridos. Importante ressaltar que essas imagens não imprimem a totalidade de temas do dossiê “História e crime”, contudo, pode-se entrelaçar questões pertinentes tais como: crime e justiça; sistema prisional, disciplina e violência estatal; limites da justiça e direitos humanos.
Dito isso, a visualização dessas imagens nos permitem pensar variadas interpretações, nesse momento, escolhemos a primeira imagem como a perspectiva do Estado, homens uniformizados e disciplinados em prontidão para a realização de suas atribuições policiais. Foto no momento anterior a sua entrada no Carandiru. A segunda imagem, por sua vez, encaramos como ponto de vista dos detentos e, mais, dos grupos marginalizados e excluídos da sociedade.
Nesta edição, o leitor não encontrará unicamente textos que versam especificamente sobre “História e crime” e isso se deve, em grande medida, nos desdobramentos e nas potencialidades de uma reflexão mais profunda, na última década, sobre os referenciais teóricos-metodológicos acerca da documentação. Alinhando-se a esse pensamento, a escolha por entrevistar os Professores Marcos Bretas e Ivan Vellasco teve como finalidade, com base em suas largas e consolidadas experiências em pesquisas empíricas, nas quais suas falas situaram o contexto da produção historiográfica atual e o alargamento de documentos na produção do conhecimento histórico.
Foram selecionados 16 artigos para compor o dossiê “História e crime”. De início, abrimos os trabalhos com o artigo “Circulación trasandina de saberes de identificación. Dactiloscopia en Chile, 1893-1909” que, com uma proposta de análise para entender a ação de instituições policiais para a investigação de crimes, os autores buscaram entender de que forma a datiloscopia influenciou na circulação de técnicas e saberes na Argentina e Chile em fins do século XIX e início do XX. Isso nos remete ao constante esforço e processo de racionalização por parte do Estado no estabelecimento de padrões de conduta social, na qual a atuação da polícia têm destaque na ação punitiva.
Nesse sentido, o artigo “A força pública e o policiamento do estado republicano em Minas Gerais” traz à tona a atuação dos indivíduos responsáveis pela ordem pública, comandantes e chefes de polícia em Minas Gerais, exibindo uma documentação rica em detalhes, como conjunto de relatórios de gestão da Secretaria de Polícia entre outros. Contudo, o projeto de policiamento e controle da população sob disciplina não partia apenas do Estado, as elites participaram ativamente e, inevitavelmente, partilhavam seus interesses. Assim, “Controlar e reprimir: a criminalidade em Bragança-PA no início do século XX” demonstra como a marginalidade e a transitoriedade de indivíduos de classes populares eram preocupações para a elite, do mesmo modo, as estratégias de sobrevivência de um grupo de criminosos em Bragança / PA e sua margem de atuação num espaço onde sua margem de ação era limitada uma vez que sua condição social determinava suas escolhas.
Já o artigo “Um legítimo homicídio emocional”: a Justiça e o crime “passional” no Brasil dos anos 1950” apresenta outros elementos não racionais envoltos na aplicação da justiça. A motivação dos crimes podem ser justificadas a partir do ciúme e atos de honra, valores presentes quando adentramos nas questões de gênero e na construção da masculinidade. Se, nesse texto, se analisou crimes passionais cometidos por homens acusados pela morte de suas companheiras; em “Occultar a deshonra: práticas de infanticídio em Castro – Paraná (1884-1899)” consiste em identificar e revelar as mulheres que cometeram o crime de infanticídio e, assim quebraram a ordem da lei. “Processos crimes de infanticídio e saberes científicos: a busca pela verdade inscrita nos corpos (Rio Grande do Sul 1891- 1919)” explora a questão dos procedimentos de corpo de delitos nos corpos das mulheres que cometiam o infanticídio, englobando, também a relação da medicina e o judiciário.
Esses casos, por sua vez, ganhavam, muitas vezes, uma versão distorcida e assumiam uma caráter de julgamento quando publicados em periódicos. É, igualmente desse modo que o artigo “O samba da morte”. O assassinato de um soldado da Força Policial no Morro da Favela (Rio de Janeiro, 1909)” confronta, através de processos criminais o assassinato de um soldado, revelando as falas de testemunhas e acusados, o que ocasiona, finalmente, em diferenças gritantes entre o que foi repercutido na imprensa e o que, de fato, se escreveu nos processos policiais. Por seu turno, o texto “Longe de pacíficos e ordeiros”: Os crimes e os criminosos na Antiga Colônia Alemã de São Leopoldo” constata, pela investigação de processos crimes, que os alemães e seus descendentes foram, com frequência, réus ou vítimas, desmitificando um discurso que os representava como passivos e cumpridores das leis.
Os artigos “Impressões sobre a Cadeia Velha (1750-1808)” , “Dimensões e facetas do trabalho prisional: as fugas da Casa de Detenção do Recife nos tempos do administrador Rufino Augusto de Almeida (1861-1875)”, “Anatomia do crime: o perfil dos delitos cometidos por cativos no contexto de intensificação do tráfico interno (Pelotas, 1850-1884)” e “Um crime de cor, do sistema penal racista ao tribunal racial: reflexões sobre a condenação de Preto Amaral em 1927” embora com temas distintos, operam seus trabalhos seguindo o objetivo, em linhas gerais, de exibir o perfil, comportamentos e mecanismos de sobrevivência de vítimas dos delitos e de escravos. Torna-se, claro, com a leitura de seus trabalhos que as leis não eram justas, a pobreza e a origem social delineava uma situação de vulnerabilidade e racismo, nos quais descortina questões de má administração da justiça.
Desde o século XVI, com a instalação gradual de um aparato administrativo e jurídico no Brasil, agentes em nome das leis desempenharam atribuições múltiplas e concisas para regular a ordem pública. O texto “Para punir os culpados e evitar malfeitorias: a inserção do juiz de fora na estrutura judiciária brasileira no final do século XVII” e “O degredo como punição: a pena de degredo para o Brasil no Livro V das Ordenações Filipinas”, demonstram, o papel desses cargos na configuração judiciária e também as formas de punições prescritas pela lei àqueles que se desviavam da obediência.
Não obstante, recorrer à justiça nem sempre prevaleceu como primeira alternativa, é o que os leitores encontrarão na leitura dos textos como “Crimes do Oeste: os ladrões de gado em meio às transformações sociais no início do século XX no município fronteiriço de Uruguaiana”, “Honra, litigiosidade e justiça: os crimes de honra na região de Formiga – Minas Gerais (1807-1875)” e Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século XIX – estudo de casos”.
Ainda nessa edição trazemos ao leitor onze artigos livres e duas resenhas de temas e recortes variados. O primeiro artigo da seção livre é “A dimensão da ideia de civilização no contexto da reforma urbana de Pereira Passos”, que aborda a ideia de civilização no início do século XX, ou seja, no contexto das reformas do prefeito do Rio de Janeiro Francisco Pereira Passos, o autor realiza sua análise através da abordagem dos discursos propagados à época pelo referido prefeito.
Em seguida temos “Guerra e Infância: um olhar poético infantil sobre os cenários brutais da Segunda Guerra Mundial”, artigo no qual se busca conectar a produção cinematográfica aos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, são destacadas pelo autor questões como momento em que determinado filme foi produzido e a presença de imagens instantâneas que não demandam a mobilização de uma imaginação maior por parte do espectador. Desse modo, são analisados os filmes A menina que roubava livros (2013) e o Menino do Pijama Listrado (2012), ambos adaptações de livros de literatura.
Assim, seguindo um recorte cronológico segue-se o artigo “Configurações políticas, articulações e estratégias de imigrantes e descendentes diante das mudanças decorrentes do Estado Novo no Rio Grande do Sul (1937 – 1945)” que explora questões como imigração, religião e vínculos de imigrantes com a política local e regional, centrados no município de Novo Hamburgo no Rio Grande do Sul.
Em “Transição democrática na Argentina e no Brasil: continuidades e rupturas” são discutidos os conceitos de transição e consolidação, bem como as diferenças e semelhanças entre os processos de abertura política nos países Brasil e Argentina. Por sua vez, “Castigos, Revoltas e Fugas: A fundação do bem-estar do menor retratada nas páginas da Folha de São Paulo 1980-1990” realiza, através de fontes periódicas e jurídicas, a análise da construção de uma imagem negativa a respeito da população infanto-juvenil pobre e / ou infratora, com uma percepção histórica são abordadas questões como transformação ao longo do tempo do discurso propagado sobre jovens infratores diante de mudanças ocorridas na legislação a respeito da criança e do adolescente.
Na segunda parte, estão “Banco de dados e acervos digitais: o uso das TCI’s na pesquisa em História” e “Transi Tombs: pesquisa com fontes medievais através do acesso virtual”. O primeiro investiga a utilização de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s) por pesquisadores da área de história do interior do estado do Ceará. Destacam-se questões pertinentes como a dificuldade de acesso a arquivos, seja por inexistência ou má conservação de documentos, encontradas por pesquisadores que não estão nas grandes cidades e a importância do acesso às fontes de maneira digital. Além disso, o artigo destaca também a relevância do recurso virtual frente à ausência de fontes físicas em áreas como História Antiga e Medieval. Por conseguinte, temos “Transi Tombs: pesquisa com fontes medievais através do acesso virtual” que apresenta possibilidades de pesquisa de História Medieval através da análise de fontes primárias disponíveis em acervos digitais. As Transi Tombs ou tumbas cadáveres inglesas do século XV são analisadas pela autora com base no aspecto iconográfico.
Já “Os símbolos da Brigada de Infantaria Paraquedista: influências, permanências e rupturas” destacando a importância de estudos sobre a tradição, neste caso a militar, faz a análise das origens, continuidades e rupturas dos símbolos da Brigada de Infantaria Paraquedista.
Por fim, o artigo “Hermenêutica e historiografia” e “Perspectivas em História da Ciência: A Revolução Científica e sua relação com o cristianismo” desenvolvem-se ao redor dos temas: história, ciência e modernidade. Portanto, perpassam questões como a escrita e a teoria da história.
Ao longo do processo de recepção e tratamento dos artigos que compõe esse número, felizmente, contamos com a participação de pesquisadores vinculados ou formados por importantes instituições, como: Universidade Federal de Santa Maria, Universidad Nacional de General Sarmiento, Museo Nacional de Odontología, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Instituto Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Pará, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Faculdades Integradas da Vitória de Santo Antão, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade de Santo Amaro, Universidade Estadual Paulista, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Universidade Federal de São João del Rei, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Universidade de São Paulo, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Universidade do Estado de Santa Catarina, Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal do Cariri, Universidade Federal de Pelotas, Universidade Federal de Santa Catarina, Instituto Meira Mattos e Universidade Estadual de Campinas.
Michele de Oliveira Casali (Editora-Chefe)
Thaís Olegário Fleck (Editora-Gerente)
CASALI, Michele de Oliveira; FLECK, Thaís Olegário. Apresentação. Aedos, Porto Alegre, v. 9, n. 20, Ago, 2017. Acessar publicação original [DR]