As últimas testemunhas: crianças na Segunda Guerra Mundial | Svetlana Aleksiévitch

Introdução

A obra intitulada “As Últimas Testemunhas: crianças na Segunda Guerra Mundial” trata-se de um livro traduzido do russo em sua 1° edição no ano de 2018, pela editora Schwarcz S.A, São Paulo e publicado pela Companhia das Letras. A autora, Svetla Aleksivitch, jornalista, nasceu em 1948, na Ucrânia, dedicando a sua vida literária/profissional de forma única à observação, escuta e transcrição de relatos a respeito de momentos factuais da história. Momentos dos quais teve forte vínculo afetivo: após a desmobilização de seu pai do exército, a família retornou à sua cidade natal, na Bielorrússia. Aleksievich, estudou na Universidade de Minsk, entre 1967 e 1972. Por causa de sua crítica ao regime, viveu periodicamente no exterior. Em 2015, recebeu o prêmio Nobel de literatura, mesmo escrevendo originalmente em língua russa. Desde então, algumas de suas obras emblemáticas: “Vozes de Tchernóbil (2016)”, “A Guerra Não Tem Rosto de Mulher (2016)”, “Fim do Homem Soviético (2016)” e o mais atual “Meninos de Zinco (2020)” passaram a ser traduzidas para diversas línguas, dentre elas o português (THE NOBEL PRIZE, 2015).

A obra em questão é o resultado de um trabalho com cerca de cem entrevistas realizadas entre os anos de 1978 e 2004. O que esses adultos tinham em comum? Sobreviventes, com memórias do horror da Segunda Guerra Mundial, afinal, eram “apenas crianças”. Particularmente, crianças são afetadas de maneiras diferentes na Guerra. Fisicamente: quando há falta de comida ou água. Psicologicamente: quando expostas a grandes cenas de horror da guerra, como bombardeios, brigas e deixar suas próprias casas. Emocionalmente: quando pode estar diretamente na guerra, como membro servindo, ou tendo outra ocupação nas forças (MOCHMANN, 2008). Leia Mais

As últimas testemunhas: crianças na Segunda Guerra Mundial | Svetlana Aleksiévitch

No livro As últimas testemunhas, Svetlana Aleksiévitch, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 2015, apresenta uma centena de relatos de adultos que vivenciaram a Segunda Guerra Mundial durante a infância. Com apenas duas pequenas citações “Em lugar de prefácio…”, o restante do livro é todo marcado pelas vozes dos entrevistados, e as conclusões da leitura ficam a cargo de cada leitor.

Os relatos, coletados entre os anos de 1978 e 2004 e somente traduzidos para o português em 2018, trazem o modo como cada adulto, na época criança, viu, sentiu e viveu a guerra. Tratava-se, na maioria, de crianças de 2 a 14 anos, com exceção de algumas que nasceram a partir de 1941, e de um garoto que nasceu no ano em que o conflito acabou (1945), mas que parece ter vivido a guerra tão intensamente quanto os demais, quando afirma: “Nasci em 1945, mas lembro da guerra. Conheço a guerra”, nos remetendo ao conceito de “acontecimento vivido por tabela” (Pollak, 1992). Leia Mais

Historica racialized toys in the United States – BARTON; SOMERRVILLE (RA)

BARTON, C. P.; SOMERVILLE K.. Historica racialized toys in the United States. Walnut Creek, Califórnia: Left Coast Press, 2016. 102p. Resenha de ALVES, Daniela Maria. Revista de Arqueologia, v.31, n.2, 2018. Especial: Arqueologia da Infância.

O livro Historical Racialized Toys in the United States, de Barton e Somerville, recentemente publicado, apresenta uma abordagem multidisciplinar, contemplando um estudo arqueológico, sociológico e antropológico da cultura Vitoriana nos Estados Unidos, a partir do estudo da cultura material. Os autores compilaram 172 brinquedos advindos de dados de colecionadores e antiquários, de catálogos e coleções de museus. Esses brinquedos foram datados entre os anos de 1865 a 1930.

A obra contempla seis capítulos, distribuídos ao longo de 102 páginas. Primeiramente, Barton e Somerville conceituam a ideologia de raça e argumentam sobre a teoria de habitus de Pierre Bourdieu (1997, 1984). O trabalho é um exame de como os brinquedos produzidos em massa geraram visões preconceituosas a respeito de populações asiáticas, irlandesas, negras e nativas americanas. Tais estereótipos funcionaram como método de socialização das crianças entre a última metade do século XIX e início do século XX, em uma visão de mundo racializada e racista. A priori, atenta-se à ideologia de raça, que sugere haver diferenças inatas na espécie humana. Essa categorização é hierárquica e possivelmente conduz à práticas de racismos, isto é, um ou mais grupos raciais recebem privilégios em detrimento da desumanização dos “outros”. Similarmente a qualquer construção social, raça é uma ideologia que tem sua origem fabricada, assim como sua manutenção e reprodução realizadas por meio da socialização da criança.

Os brinquedos não foram os únicos objetos a mostrar representações do “outro”, no entanto talvez sejam os mais chocantes para a sensibilidade moderna, pois são objetos especificamente feitos para crianças. Como explica Bourdieu, os indivíduos não aderem cegamente às estruturas sociais, mas operam dentro de uma “área cinza” que aplica, rejeita e modifica tradições pré-existentes. A habilidade de mediar a estrutura social é baseada sobre a socialização de um indivíduo que cultiva um habitus. O habitus permite e restringe as práticas individuais dentro das situações de mudança social. As práticas individuais diárias causam reações nas relações sociais, um habitus individual é alterado para conformar as situações de mudança e depois transformar a estrutura social. O resultado é uma relação dinâmica na qual as estruturas sociais coletivas influenciam as práticas individuais, e as práticas individuais podem afetar a estrutura social, o que possibilita a continuação e modificação da sociedade através do tempo e do espaço. Desse modo, as relações sociais não são estáticas, mas são constantemente sujeitas à renegociação. Assim, a teoria de Bourdieu possibilita entender as relações entre estrutura, habitus e prática, facilitando o modelo teórico no qual pode-se interpretar a disposição reflexiva e constitutiva da cultura material analisada.

Em seguida, as discussões giram em torno de conceitos como raça, classe e capitalismo na América. Barton e Somerville retomam o conceito de raça, afirmando tratar-se de construção ideológica para promover a hegemonia de classes dominantes por meio da criação falsa de uma percepção entre e dentro dos grupos marginalizados. No século XIX até o início do século XX da era capitalista, a possibilidade de qualquer união solidária entre esses grupos marginalizados era negada. Assim, essas ideologias posicionavam as “raças” como competidoras umas com as outras, ao contrário de desafiar o poder das classes dominantes. Tal poder ideológico da raça sugere que as classes trabalhadoras brancas tinham mais em comum com as elites brancas. Durante o período de institucionalização da escravidão nos Estados Unidos, houve uma associação semiótica direta entre pele negra e percepção biológica e social de inferioridade. A combinação entre escravidão e ideologia racial expandiu-se nas sociedades escravocratas do Sul e depois invadiu todo o país. No nordeste dos Estados Unidos, o medo do crescimento da população negra, entre os séculos XVIII e XIX, resultou em estratégias institucionais e práticas diárias usadas para minar a influência negra na política, na economia e na sociedade. Com o fim da escravidão, o país experienciou uma grande expansão do racismo. Um aspecto marcante da influência suscitada pela ideologia racista, popularizada por volta da década de 1830, era os espetáculos de interpretação, performance e música, denominados de blackface minstrel show. Nessas performances figuravam homens brancos como atores interpretando atitudes e comportamentos tidos como característicos dos negros. Muitos desses atos apresentavam comportamentos infantis ou pessoas negras felizes com a escravidão. Homens afro-americanos eram representados como jovens trapaceiros ou como empregados bem preguiçosos. Tais estereótipos racistas foram cultivados não somente por meio de interações com pessoas negras, mas também pela socialização em uma visão de mundo racista.

O texto também perpassa pela temática da criança e da infância. A infância é descrita como um período prolongado de dependência, durante o qual as crianças tornam-se socializadas e aceitas na sociedade em que nasceram e isso varia de acordo com a cultura, assim como as atividades e comportamentos considerados permitidos. Essas atividades e comportamentos estão relacionados à construção de gênero e encontram-se centradas nas categorias de biologia, sexo e idade. Os adultos costumam usar diferentes estratégias, como leituras, premiação/punição, exposição/restrição a certas experiências, para incutir nas crianças valores e comportamentos considerados culturalmente aceitos.

Em seguida, são expostas definições e reflexões sobre o brinquedo e a brincadeira, além da análise sobre a influência da Era Vitoriana britânica na sociedade americana. Os autores salientam a perspectiva comportamental do brincar como um comportamento orientado e ativo, cuja estrutura é altamente variável, na qual aparentemente não há intenção imediata e há acompanhamento específico de sinais que incluem odores, sons, ausência de submissão, inversão das relações de dominação, mudanças nas atitudes motoras individuais, etc. Na época Vitoriana, os brinquedos tinham uma função utilitária e serviam como instrumento para desenvolver habilidades físicas e mentais, além de incutir valores culturais nas crianças. Enfatizavam diferenças de gênero e refletiam a crença da época de que a infância é um período fundamental para o desenvolvimento da moral e da ordem no ser que futuramente será adulto. O período vitoriano foi sinônimo de capitalismo industrial, rápida industrialização e sistema socioeconômico baseado em classes. Com isso, os brinquedos manufaturados rapidamente se tornaram um grande negócio nos Estados Unidos e na Europa. O desenvolvimento tecnológico facilitou a produção em massa de brinquedos de ferro, lata, de bonecas, livros, jogos de tabuleiro e tornou possível aos pais de todas as classes sociais a compra de brinquedos para seus filhos em diferentes graus de qualidade.

Posteriormente, é apresentada a metodologia, bem como os resultados da análise da cultura material. Os 172 brinquedos foram classificados do seguinte modo: 53 cofres mecânicos (possuíam mecanismos que eram acionados quando ali se colocava uma moeda), 18 cofres não mecânicos, 63 brinquedos de corda, 9 brinquedos de puxar e empurrar, 6 jogos de alvo, 6 pistolas, 12 bonecas/conjunto de bonecas, 3 fantasias e 2 jogos de tabuleiro. Muitos desses brinquedos em sua aparência e nas descrições dos rótulos das embalagens sugerem inferioridade e falta de autocontrole do “outro”, particularmente considerando as representações dos brinquedos afro-americanos. Observa-se a fascinação das pessoas com a novidade, com a inovação e com o desejo de estimular a vida pelo significado mecânico. Os brinquedos automatizados da época representam intrincada convergência da concepção vitoriana do corpo do outro e da performatividade do corpo, que servia para criar e recriar estruturas racializadas e de racismo, além de socializar as crianças nessas estruturas.

Quatro raças não brancas foram representadas nos brinquedos, quais sejam: os nativo-americanos, os asiáticos (japoneses e chineses), os irlandeses e os negros.

Os nativo-americanos foram representados em 10 brinquedos examinados. Dois tipos de estereótipos foram destacados pelos autores: o guerreiro violento e o “nobre selvagem”. O guerreiro violento foi notado nos jogos de tiro ao alvo, cujo objetivo era acertar com espingarda figuras de homens nativo-americanos, juntamente com leões, bisões e tigres. Como exemplificação para o estereótipo do “nobre selvagem”, os autores relatam um cofre mecânico, no qual encontrava-se a figura de Cristóvão Colombo fumando um cachimbo. Além da mensagem de paz, o brinquedo apresenta a posição de subjugados dos indígenas em relação aos europeus.

Os chineses foram representados em 14 brinquedos, enquanto os japoneses foram representados em apenas 4 deles. A partir de 1849 a imigração chinesa nos Estados Unidos cresceu vertiginosamente. Os chineses foram os primeiros a serem empregados no trabalho manual nos campos minados e nas ferrovias do Oeste. Nos brinquedos, os homens chineses eram especialmente associados a uma longa trança. Outra associação perigosa era baseada na religião. No século XIX, qualquer prática religiosa fora da visão protestante era considerada ameaçadora para a sociedade. Os chineses foram vistos como incapazes de boa moral, por causa das práticas religiosas e sociais, e, por fim, acreditava-se que eles poderiam arruinar a seguridade econômica da classe trabalhadora.

Os irlandeses foram representados em 2 brinquedos. Um deles trata-se de um cofre mecânico, no qual um homem irlandês é retratado com testa proeminente, queixo símio, prognatismo facial, pele e cabelos claros. O homem segura um porco entre as pernas. Isso porque a maioria dos imigrantes irlandeses vivia na zona rural e com limitado capital social e econômico. Exerciam trabalhos manuais, eram relegados ao empobrecimento, à vida nos guetos, convivendo com altas taxas de criminalidade e poluição. A aparência e os movimentos do homem que parece lutar com o porco por dinheiro mostra o elemento de classe associado aos irlandeses no século XIX e XX, imigrantes malvestidos realizando qualquer trabalho degradante para conseguir poucos ganhos.

Os afro-americanos foram representados em 142 brinquedos. Um dos mais impressionantes são as bonecas topsy-turvy, uma boneca com cabeça e torso de menina branca atada na cintura à cabeça de uma menina negra, com uma longa e ampla saia separando as duas. Alguns pesquisadores afirmam que as bonecas foram feitas por mulheres escravas como significado de contestação à repressão sexual pelo homem branco; outros sugerem que as bonecas foram utilizadas para socializar garotas negras a fim de entender a dualidade da maternidade e assim ensiná-las a importância do cuidado com suas próprias crianças e com as crianças de seus donos brancos.

Para concluir, Barton e Somerville ressaltam que não havia sistema social à parte das práticas sociais padronizadas. Essas práticas eram criadas e reproduzidas conforme eram postas em ação, como afirma Bourdieu. Os brinquedos do período Vitoriano se preocupavam em ensinar valores e moralidade. Esses valores formavam as bases para o capital social e cultural da classe média e os brinquedos racializados foram os meios pelos quais a classe média gerou capital simbólico. Nesse sentido, esses objetos foram analisados não apenas como produtos para o divertimento, mas também como diálogo e locus frequente de conflito entre adultos e crianças e entre crianças e seus pares. Os brinquedos da era Vitoriana tentavam impor ordem entre garotos e garotas para que eles se tornassem modelos, indivíduos que conhecessem seus papéis tão bem quanto conhecessem o papel e o lugar do outro na sociedade. Os brinquedos racializados de todos os tipos e de todos os períodos de tempo revelam muito mais sobre os adultos que ofereceram os brinquedos às crianças do que sobre as crianças que os receberam.

É certo que o trabalho dos autores é de suma relevância para a temática da criança e da infância. Apesar de se tratarem de objetos desassociados de seu contexto arqueológico, o livro explora as interconexões entre a cultura material e a identidade social da época Vitoriana nos Estados Unidos, tão marcada pelas desigualdades sociais. Os brinquedos reunidos pelos autores contribuem ainda para aclarar sobre tipos de artefatos do período histórico mais recente, além de revelar as crianças como componentes do registro arqueológico e histórico, e como agentes nas relações sociais da época abordada.

Daniela Maria Alves – Mestre em Arqueologia pelo Museu de Arqueologia e Etnologia MAE/USP. E-mail: danymalves@gmail.com.

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Três 3-6-9-12 Diventare grande all’epoca degli schermi digitali – TISSERON (REi)

TISSERON, Serge. 3-6-9-12 Diventare grande all’epoca degli schermi digitali. Brescia: La Scuola, 2016 (153p). Resenha de: FATIN, Monica. Revista Entreideias, Salvador, v. 5, n. 1, p. 123-127, jan./jun. 2016.

O livro 3-6-9-12 Diventare grande all’epoca degli schermi digitali,1 de Serge Tisseron, ainda não traduzido no Brasil, reafirma algumas ideias sobre tecnologia e crianças a partir dos usos das telas nas diferentes “idades da infância”, que constam no título do livro, 3-6-9-12. A discussão já se anunciava na trajetória do autor, que foi um dos responsáveis pelo relatório da pesquisa “A criança e as telas”, publicado pela Academia das Ciências, em 2013 na França, e pelo Manifesto “Il bambini e gli schermi”.2 O interesse do autor não é discutir o que as mídias fazem com as crianças ou o que as crianças fazem com as mídias, mas o que acontece nesse “meio”, com uma abordagem que foge da simplificação e renuncia às tentações de “idealizar ou demonizar” as tecnologias. Um convite para educadores conhecerem as mídias e discutirem com as crianças ensinando-as a distinguirem contextos e situações.

Em tempos como estes, em que certas polêmicas se forjam em argumentos dicotômicos, a contundente voz do autor ao falar das “idades da infância” em relação às telas – da televisão, do videogame, do computador, do tablet e do celular/smartphone – é muito coerente com o lugar que o psiquiatra, doutor em psicologia e pesquisador da Universidade Paris VII ocupa. Consciente da complexidade que envolve a relação mídia e infância, ele defende a mediação adulta na negociação com a criança sobre suas escolhas e esclarece que as modalidades de uso de telas a partir da fórmula 3-6- 9-12, que além de se referir às idades e etapas da vida das crianças, também se relaciona às fases da escolaridade infantil e representa um ponto de partida para discutir quando e como introduzir as telas na vida das crianças para aprender a usá-las corretamente.

Embora a reflexão tenha como ponto de partida perguntas de pais e professores, Tisseron não lhes diz o que fazer e convida o leitor a mobilizar-se, a ler, a buscar entender, a estar com as crianças, a observá-las, a compreender suas necessidades e seus medos, pois “o problema das mídias digitais se resolve juntos, não sozinhos”, como responsabilidade nossa, da sociedade civil e das instituições.

Na introdução, Tisseron chama atenção para quatro pontos: “Nunca deixar uma criança com menos de 3 anos diante de televisores; não permitir o uso de videogame em console antes dos 6 anos; acompanhar as descobertas da internet entre 9 e 12 anos; não deixar navegar de forma ilimitada sem que tenha alcançado a idade para poder fazê-lo sozinho”(2016, p.16). Tal radicalidade inspira-se no pensamento arendtiano, sem excluir as crianças do mundo nem abandoná-las a si próprias retirando delas a oportunidade de fazer algo novo, e sim preparando-as para a tarefa de renovar o mundo que compartilhamos com elas.

No capítulo um, a ineficácia das campanhas contra os riscos ligados às telas é discutida diante do forte apelo comercial e de interesses de grupos de comunicação que se apoiam em publicidades enganosas, além do argumento das telas representarem também uma forma de fuga dos problemas da vida cotidiana. Para Tisseron é mais importante encorajar boas práticas que denunciar os perigos, sempre considerando a complexidade de nossas relações com as telas, para além de ser contra ou a favor, e reforça suas indicações em 3 direções: autorregulação; alternância; e acompanhamento.

O apelo é para transformar nossas relações com as telas de forma conjunta, sem responsabilizar ou culpar crianças ou adultos mas explicitando os discursos e trabalhando juntos.

No capitulo dois, o autor defende a fórmula 3-6-9-12 ponderando o quanto a tecnologia digital tem transformado a vida pública, os hábitos familiares e a nossa própria intimidade. Enfático, afirma que antes dos 3 anos a criança precisa construir suas referências espaciais e temporais, seu conhecimento de mundo e de si própria em interação com o ambiente, e os novos objetos digitais fazem parte desse aprendizado tanto no ambiente familiar como escolar. Diferencia as possibilidades de uma tela interativa e não interativa, o papel dos jogos tradicionais, da oralidade, e da cultura do livro nas experiências sensório-motoras e na construção narrativa das crianças pequenas, e apresenta pesquisas feitas com crianças com menos de 3 anos sobre as desvantagens do uso de telas não interativas e suas incidências sobre a linguagem e aprendizagem. Enfatiza as necessidades da criança em cada etapa: descobrir as possibilidades da compreensão de mundo (3 a 6 anos), descobrir as regras do jogo social (6 a 9 anos), explorar a complexidade do mundo e das relações (9 a 12 anos) e questionar as referências familiares (12 em diante). Elenca vantagens e perigos das telas em cada etapa e como elas podem contribuir e preparar a criança “para a sociedade da informação em que a reflexão estratégica, a criatividade e a cooperação são faculdades essenciais”.

(TISSERON, 2016, p. 40) Entre os riscos que o autor aponta, dos 6 aos 9 anos o uso da internet pode fragilizar certas referências que a criança está construindo e que são indispensáveis, entre elas a distinção entre espaço íntimo e espaço público e a noção de ponto de vista do outro. A violência nas telas é um risco para todas as idades, e 9 dos aos 12 anos o autor se refere ao uso excessivo das telas que pode ser indício de outros problemas subjacentes, como baixa autoestima, ansiedade social, violência escolar, etc. que podem desencadear outros problemas.

No capítulo três, ao propor de um percurso para todas as idades, Tisseron enfatiza que “a educação não consiste em proteger e controlar uma criança, mas em ensiná-la, progressivamente, a defender-se e orientar-se por si” (2016, p.45). No entanto, para conseguir tal propósito, enquanto a criança pequena precisa ser protegida e distanciada dos perigos, a capacidade de assumir certos riscos é essencial para o adolescente desenvolver a autonomia, pondera o autor. Em ambos os casos, o diálogo sempre é importante.

As propostas fundamentam-se nas possibilidades de aprendizagem em cada idade e no confronto com certos discursos do senso comum. Em qualquer idade é importante escolher os programas junto com as crianças, limitar o tempo de consumo, convidá-las a falarem sobre o que veem ou fazem encorajando as suas produções.

No capitulo quatro, as redes sociais são entendidas como instrumento que favorece a construção da individualidade e a descoberta das regras do jogo social entre os adolescentes. Tisseron busca desconstruir ou validar certos discursos sobre as práticas no facebook, problematiza o mito que considera os adolescentes extraordinariamente criativos na internet, destaca a falta de conhecimento da natureza do contrato que firmam sem ler, e adverte sobre o grande número de sintomas de depressão e insônia entre os adolescentes que se intensificam em quem já possui tais tendências. Entre as explicações possíveis, o autor menciona a dificuldade do adolescente administrar a própria identidade, por vezes apresentada de modo idealizado e em comparação com outros perfis, questão relacionada ao capital social e às diversas formas de pertencimento nas redes.

As ponderações sobre “o bom uso da rede” são discutidas no capítulo cinco, a partir dos mecanismos do “desejo de extimidade”.

(TISSERON, 2016, p. 75) Diante da exposição da intimidade que torna público alguns elementos da vida íntima, o autor discute as razões do querer mostrar-se, a busca de aceitação nos diferentes clicks, os modelos de autoestima, as “virtudes” da invisibilidade, o anonimato, e outros modos de ver, seduzir e relacionar que as redes propiciam. Tensiona argumentos sobre renuncia à vigilância dos filhos/alunos, e sobre os usos sociais das redes nas instituições educativas, discutindo diversos espaços, regras, formatos e critérios a serem construídos conjuntamente para ampliar as possibilidades do dispositivo. Diante da educação indireta das redes sociais, ressalta o papel da mídia-educação.

No capítulo seis, o autor redimensiona as transformações discutidas nos capítulos anteriores num quadro mais amplo da cultura, relacionando as práticas da cultura do livro às da cultura das telas – para além da contraposição ligadas aos saberes, às aprendizagens, ao funcionamento psíquico e à construção de relações. Destaca as “quatro revoluções da tecnologia digital”, ou seja, revolução “nas relações com os saberes”, “em relação à aprendizagem”, “revolução psicológica” e “revolução das relações e da sociabilidade” e a suas complementariedades.

No capítulo sete, o autor destaca o papel da educação voltada à dimensão do digital desde a infância e as formas de aprendizagem em cada idade, sugerindo a construção de propostas como uma sucessão de momentos capazes de remotivar os estudantes de todas as idades.

Nas conclusões uma síntese sobre o dispositivo tratado no livro com destaque à mediação adulta: “seria inaceitável que as crianças hoje com três anos devessem aprender sozinhas a apropriar-se das telas, exatamente como fez a maioria dos adolescentes de hoje, a seu risco e perigo”. (TISSERON, 2016, p. 133) Certamente, as ideias do autor inspiram muitas reflexões.

Poderíamos questionar a radicalidade de evitar as telas antes do 3 anos e a provável discussão diante dos diversos interesses que movem a cadeia produtiva das produções televisivas para crianças pequenas. Importa notar que o autor nem chega a ponderar sobre a qualidade que tais programas deveriam ter nessa idade, diferente de quando se refere às idades das telas. É na tensão entre “vantagens e perigos” que se expressa a complexidade dessa relação, para além da discussão semântica. Se é notável o ineditismo de tal reflexão em relação às faixas etárias referidas, não podemos perder de vista a importância de relativizar certas fronteiras. Muitos argumentos sobre a mediação entre crianças e telas e papel da família/escola dependem sempre do contexto sócio-econômico-cultural em que se inserem, bem como das diferentes formas de acesso e apropriação das tecnologias, que são diferentes de uma cultura para outra. Interessa vislumbrar a possibilidade de diálogo a partir do nosso lugar e da nossa singularidade cultural, inclusive para “estranhar o familiar” e problematizar certas práticas que nos parecem tão naturais, mas que só o distanciamento crítico possibilita por em questão.

Notas

1O original foi publicado em francês, em 2013 com o título 3-6-9-12 Apprivoiser les écrans et grandir, que pode ser traduzido por Domesticar as telas e crescer.
Na tradução italiana feita por P. C. Rivoltella, em que se baseou esta resenha, o título pode ser traduzido por Tornar-se grande na época das telas digitais.
2Pode-se fazer download do manifesto e do cartaz original no site do autor . Na versão italiana está disponível em: .

Traduzimos o manifesto para língua portuguesa e está disponível no site do Grupo de Pesquisa Núcleo Infância Comunicação Cultura e Arte, NICA, UFSC/CNPq .

Monica Fantin – Professora Associada do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Catarina.

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Etnografia e educação: culturas escolares, formação e sociabilidades infantis e juvenis – DAUSTER et al. (REi)

DAUSTER, T.; TOSTA, S. P.; ROCHA, G.(Org.). Etnografia e educação: culturas escolares, formação e sociabilidades infantis e juvenis. Rio de Janeiro: Lamparina, 2012. Resenha de: SANTIAGO, Flávio. Revista Entreideias, Salvador, v. 1, n. 1, p. 117-122, jan./jun. 2012.

A obra em destaque traz como temática principal a articulação entre os estudos da antropologia e educação, apresentando, através de experiência etnográficas, os encontros entre os aportes de ambas as ciências. Os autores e as autoras unem esforços no sentido de possibilitar a compreensão do significado da antropologia enquanto ciência que contribui para o entendimento dos processos educativos para além dos limites físicos da escola. Nesse sentido, tratam de questões como pluralidade cultural, discriminação e outras temáticas relevantes no campo pedagógico, explicitando as relações existentes entre a antropologia e a educação enquanto um desafio e uma necessidade de ambos os campos frente a princípios e práticas especificas destinadas a sujeitos concretos que por sua vez, são também portadores de singularidade e especificidades.

A atual relação existente entre antropologia e educação tem por meta responder às questões postas pela cultura no tempo presente, procurando o reconhecimento da diversidade social e cultural de diferentes grupos, possibilitando a abertura de um debate, reflexão e intervenção, que acolhe desde o contexto cultural da aprendiza¬gem, os efeitos sobre as diferenças culturais, raciais, étnicas e de gênero, até os sucessos e insucessos do sistema escolar em foco na ordem social em mudança. (GUSMÃO, 2011) A partir deste contexto conceitual pesquisadores/as e professores/as, com base em pesquisas etnográficas, são provocados a escrever ensaios que apresentem processos de sensibilização para a compreensão de outras formas de representação, classificação e organização do cotidiano, promovendo um exercício prático da interfase do encontro entre a antropologia e a educação.

Raúl Iturra inicia o livro com o capítulo “A epistemologia da infância: ensaios de antropologia e educação” desenvolvendo uma análise sobre a infância, a partir das relações sociais e da cultura a qual a produz, observando os processos de formações conceituais que baseiam as teorias sobre a infância. Segundo Iturra, epistemologia não são apenas um debate filosófico da origem inata, racional, empírica e dialética do saber dos conceitos e da realidade e seus fatos, trata-se de uma metáfora teórica de acadêmicos que devem lembrar as formas e maneiras que essa realidade é organizada e como é aprendida e transmitida entre gerações. A partir desta premissa, Iturra faz seu estudo da infância e da criança, verificando o direito canônico que é um documento que “educa” moralmente as relações e julga as formas em que o individuo deve se comportar na sociedade. Vale lembrar que as leis sociais surgiram desse documento. Com isso, as relações, a maneira que as crianças estão na sociedade são reflexos da maneira que os adultos as enxergam e julgam como elas têm que ser e estar na sociedade.

Para Iturra, a infância recebeu sua epistemologia conforme a cultura a qual vive e que toda criança nasce sobre os signos desta cultura, não se constituindo somente como um indivíduo isolado, mas sim sendo a síntese de sua ancestralidade, assim como mais tarde será também dos seus descendentes.

Gilmar Rocha nos apresenta a importância dos estudos de Margaret Mead, que percebe os processos de alteridade como forma de aprendizagem para o campo da antropologia e da educação. Para o autor, as etnografias de Margaret Mead são mais do que descrições dos costumes de povos primitivos, como sugere o sentido comum da palavra; são também vias de acesso à cultura do outro, às suas visões de mundo, e aos seus sistemas de significados. Do ponto de vista pedagógico, elas fornecem modelos alternativos de experiências para problemas relativamente semelhantes vividos nos Estados Unidos e nas sociedades contemporâneas. Se Mead elegeu a educação como um caminho possível para se aprender, e aprender com a cultura do outro, no sentido inverso, descobrimos em suas etnografias um caminho fecundo capaz de nos levar a pensar sobre nós mesmos e sobre nossa cultura educacional. No capítulo: Aprendendo com o outro: Margaret Mead e o papel da educação na organização da cultura, Rocha discute a importância dos estudos de Mead para o campo da antropologia e da educação.

Para Mead a educação utiliza uma metodologia que permite penetrar na cultura e na personalidade de uma sociedade e serve como instrumento de “engenharia social” a serviço da construção do caráter nacional.

Em seguida, Tânia Dauster, no capítulo “Escrever: formação e identidade num universo de escritoras”, faz um mapeamento dos processos de formação, construção de identidades e representações práticas de escritas de oito escritoras. A autora faz entrevistas em diferentes locais e ouve desde a vida pessoal das autoras até as suas publicações, desenvolvendo seu estudo a partir da metodologia etnográfica.

Lucilena Ferreira apresenta no capítulo “Sinal fechado: representações e práticas de leituras de alunos do ensino médio de uma escola pública carioca” um estudo etnográfico das representações e práticas de leitura de alunos do ensino médio de uma escola pública do Rio de Janeiro, tendo como foco, a influência do ensino de língua e literatura na relação dos alunos com a leitura. A abordagem teórica utilizada tem como base os trabalhos de Roger Chartier, na perspectiva da história cultural, que conceitua as identidades como esquemas construídos de classificação e julgamento que organizam a apreensão do mundo, sendo sempre determinadas pelos interesses dos grupos que as geram.

Ricardo Viera no capítulo “Do lar à escola: a hegemonia das práticas escolares e a antropologia da educação em Portugal” apresenta a importância da antropologia para a compreensão de processos educativos e faz uma exposição do desenvolvimento da antropologia da educação em Portugal, com particular relevo para os de Raúl Iturra.

Na perspectiva de Viera a antropologia da educação deverá alertar e sensibilizar professores, agentes educativos, políticos e sociedade civil para a necessidade de construção de pedagogias devidamente contextualizadas, capazes de permitir o sucesso escolar para todos. Viera se aproxima muito ao pensamento de Gusmão (2011), quando afirma que existem grupos que devem ser reconhecidos em sua diversidade sociocultural, distinguindo qualitativamente as diferenças, ou seja, levar o olhar bem longe e tão profundo, de modo que se compreendam as propriedades do que é diferente, ou seja, a natureza do que seja diferente e o que constitui a diferença.

Viera apresenta as singularidades das crianças, demonstrando o processo pelo qual elas constroem e reconstroem o mundo. Salientamos que este processo não se trata de uma cópia, mais sim de uma reinterpretação do mundo, a qual se constroem a partir dos referenciais culturais de cada criança. A criança não é socializada num único contexto cultural.

Alexandre Barbosa Pereira, no capítulo “Jovem e ritual escolares” com base em uma pesquisa etnografia realizada no interior de escola pública, busca evidenciar as múltiplas relações empreendidas pela juventude contemporânea no ambiente escolar, abordando a questão do ritual como dispositivos de transmissão e perpetuação de conhecimentos. Em sua experiência etnográfica, Viera percebe que existe uma grande tensão entre a lógica dos docentes e a dos estudantes, a primeira prezando mais ordem as regras das instituições escolares e a disciplina, a segunda se pauta mais pela divisão, a gozação e a busca de quebrar regras institucionais. Um ponto fundamental para a compreensão destas tensões situa-se na questão da autoridade: Como se impor, como se fazer ouvir, como chamar a atenção e como motivá-la, essas eram as indagações mais levantadas pelos professores em sua tarefa de ensinar os jovens e inquietos alunos.

Em seguida no capítulo “Pelos mares da baía de Ilha Bela”, Anderson Tibau escreve um ensaio metodológico e etnográfico acerca do seu encontro com os professores e estudantes de ilha bela. O itinerário de formação de um pesquisador é repleto de desafios, surpresas, aspectos extraordinários, solidão, muitas situações de contato. Nadando a favor da corrente das experiências da cultura. Dentro desse processo metodológico, o olhar e o ouvir estão para a percepção assim como o escrever está para o pensamento. A investigação empírica pode ser dividida em duas etapas: a pri-meira seria o próprio trabalho de campo “a atividade in loco”, e a segunda corresponderia à escrita a distância dos fatos observados, o plano do discurso. No trabalho de campo, Tibau utiliza a fotografia como uma forma etnográfica de observação da cultura estudada. A fotografia é concebida como representação da realidade e suporte às anotações do diário de bordo, o que favorece a construção de uma narrativa visual que seja eficaz e contenha informações interpretativas acerca de uma determinada realidade. No capítulo seguinte “Cultura e cor na escola”: uma etnografia com adolescentes negros de elite, Sandra Pereira Tosa e Pollyanna Alvez apresentam uma etnografia realizada com adolescentes negros de elite, alunos do ensino médio de uma escola da rede particular do município de Belo Horizonte.

O estudo teve como objetivo central, compreender o processo de construção da identidade de adolescentes negros de elite. Identidade étnica como um caso particular de identidade social, sendo ela própria uma ideologia e uma forma de representação coletiva. Objetivou-se também compreender o sentido de pertença num jogo dialético entre a semelhança e a diferença – a identidade contrativa que abrange semelhança e diferença nos tempos com o/a ou outros/as. Para as autoras, a construção de etnografia na educação ou em qualquer outro campo, requer a realização de três atos de conhecimento, não necessariamente subsequentes, mas na maior parte do tempo integrados: dos saberes das antropólogas que lá chegarem, ou do olhar; dos saberes dos nativos com os quais convivemos e dialogamos, ou do ouvir; dos saberes resultantes desse encontro etnográfico, ou do escrever.

As autoras concluem com a pesquisa etnográfica, que as representações sociais em relação aos negros são carregadas de estereótipos negativos, sobretudo no que se refere sua corporeidade. O sentimento de pertencimento a uma identidade étnico-racial implica a aceitação de uma origem e a recusa do branqueamento, impregnada de valores eurocêntricos, como ocorreu no caso brasileiro. Por fim, o último capítulo “Educação quilombola entre saberes e lutas”, escrito por Neusa Gusmão e Márcia Lúcia de Souza, apresenta educação quilombola como uma demanda social que se insere nas políticas públicas brasileiras, se constituindo como uma luta por igualdade nas diferenças. Para as autoras pensar a educação quilombola seria buscar uma escola para a diversidade, em que professores e gestores tivessem em sua formação condições para o trabalho pedagógico com toda e qualquer expressão da diversidade cultural.

O conjunto de capítulos que compõe o livro Etnografia e educação: culturas escolares, formação e sociabilidades infantis e juvenis nos permite uma reflexão sobre as múltiplas interfaces entre a educação e a antropologia, possibilitando através dos aportes metodológicos de experiências etnografias, perceber as diferentes construções sociais relativas à cultura e ao processo de diferenciação dos indivíduos. Esse olhar antropológico voltado para o campo da educação permite uma ampliação de sentidos na medida em que as relações sociais na escola, os processos de transmissão de saberes no cotidiano, a formação de docentes atravessam as fronteiras dos espaços e das práticas educativas formais e não formais.

Referências

GUSMÃO, Neusa M. M. Antropologia, diversidade e educação: um campo de possibilidades., São Paulo, v. 10, p. 32-45, 2011.

Flavio Santiago – E-mail: flavio.fravinho@gmail.com

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