Análise de Discurso Crítica e Comunicação: percursos teórico e pragmático de discurso, mídia e política | Laerte Magalhães

MAGALHAES Laerte Análise de Discurso Crítica e Comunicação
Laerte Magalhães | Imagem: MeioNorte.com

MAGALHAES Analise de discurso Análise de Discurso Crítica e ComunicaçãoO livro Análise de discurso crítica e comunicação: percursos teórico e pragmático de discurso, mídia e política, organizado por Laerte Magalhães, é fruto das experiências desenvolvidas e discutidas no I Encontro Nacional – Discurso, Identidade e Subjetividade (I ENDIS), realizado de 27 a 29 de abril de 2016 na Universidade Federal do Piauí. O evento foi promovido pelo Núcleo de Pesquisa em Estratégias de Comunicação (NEPEC) através do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) / UFPI com o intuito debater sobre os conceitos de Língua, linguagem, discurso.

A obra publicada em 2019 possui 246 páginas e traz textos produzidos por conferencistas que participaram do evento com diversas temáticas do âmbito da comunicação midiática e embasadas na Análise do Discurso Crítica (ADC). Cada texto corresponde a um capítulo, sendo assim, o livro é composto de 5 capítulos escritos pelos seguintes pesquisadores: Izabel Magalhães (UFC/UnB/CNPq), Viviane Vieira (UnB), Expedito Wellington Chaves Costa (IFCE), Michelly Santos de Carvalho (UESPI/FAR), Francisco Laerte Juvêncio Magalhães (UFPI), Viviane de Melo Resende (UnB/CNPq) e Rosimeire Barboza da Silva (UnC-PT). A coletânea objetiva estimular o debate acadêmico científico entre pesquisadores, alunos e profissionais da comunicação, letras e áreas afins. Leia Mais

O Pensamento de Pierre Lévy – comunicação e tecnologia | Guaracy Carlos da Silveira

Há algumas décadas, muito se tem refletido e discutido sobre a importância e as aplicabilidades da comunicação e sua simbiose com a tecnologia, principalmente em tempos de disseminação das redes de comunicação digital. Porém, o que vinha sendo debatido de forma parcimoniosa, numa tentativa de compreender de forma mais profunda, ganhou certa notoriedade nos últimos dias, visto a urgência de atender as demandas sociais.

Almejando reflexionar as reivindicações da sociedade sobre essa temática que se insere a obra: O Pensamento de Pierre Lévy – comunicação e tecnologia, de Guaracy Carlos da Silveira, publicada em 2019 pela Editora Appris. A presente composição, tem como escopo, apresentar a evolução das ideias de Pierre Lévy a uma recente geração de leitores que já nasceram imersos em um cenário de constantes mudanças tecnológicas, cotejando a pertinência do seu pensamento no contexto atual. Leia Mais

Geschichte im Internet – DANKER; SCHWABE (ZG)

DANKER, Uwe; SCHWABE, Astrid. Geschichte im Internet. Stuttgart : Verlag W. Kohlhammer, 2017. Resenha de: HODEL, Jan. Zeitschrift für Geschichtsdidaktik, Berlin, v.18, p. 201-202, 2019.

Acesso somente pelo link original

[IF]

Der rückstoss der methode: Kierkegaard und die indirekte mitteilung SCHWAB (ARF)

SCHWAB, Phillip. Der rückstoss der methode: Kierkegaard und die indirekte mitteilung. Berlin/Boston: Walter de Gruyter, 2012. Resenha de: BARROS, Wagner. Argumentos – Revista de Filosofia, Fortaleza, n. 17, jan./jun. 2017.

O livro de Phillip Schwab, intitulado Der Rückstoss der Methode, se apresenta como uma importante contribuição e indispensável para as pesquisas que versam sobre a comunicação indireta no pensamento de Kierkegaard. Ainda que inúmeros trabalhos tenham desenvolvido reflexões sobre o assunto, frequentemente o problema da comunicação é tratado de forma tangencial ou coadjuvante, dificilmente desempenhando um papel central. É neste contexto que a interpretação de Schwab se torna particular, pois o autor não concebe o discurso indireto como estilo literário ou um recurso utilizado por Kierkegaard para trazer a discussão sobre a existência, mas como elemento constitutivo do próprio processo de análise filosófica. Para Schwab, a comunicação indireta não é só principio estrutural, mas também o modo de realização essencial e a forma necessária do pensamento kierkegaardiano: A comunicação indireta não é uma peculiaridade estilística da forma, também não é uma roupagem literária do pensamento filosófico. A comunicação indireta não é […] uma tática maiêutico-pedagógica que serve ao objetivo de alcançar um resultado para o receptor da comunicação. A comunicação indireta é o método de Kierkegaard […] (p.12 – nossa tradução) Percebe-se, portanto, que a interpretação proposta não visa reduzir a comunicação indireta ao uso de pseudônimos, como sugere a explicação de Ponto de vista1. A leitura se afasta também da tese segundo a qual a comunicação indireta ou o discurso religioso adquirem sua significatividade mediante o reconhecimento da práxis religiosa, como apresenta Schönbaumsfeld2. Schwab entende o discurso indireto como um elemento central da filosofia de Kierkegaard que está articulado com todo o seu pensamento e se faz presente mesmo em obras que não exploram o tema de forma explícita, principalmente porque a comunicação indireta apontaria para um método que se auto revoga diante da tentativa de analisar a existência.

O objetivo da primeira seção do livro é realizar uma leitura “sistemática”, ou seja, explorar a estrutura da comunicação indireta e compreendê-la enquanto método. Embora não se encontre uma análise textual, o autor elabora um esquema conceitual que permite compreender a função do indireto. Assim, é destacado que a comunicação indireta representaria um contra-movimento [Rückstoss] do método, um movimento contrário a qualquer tentativa de definição. O contra-movimento do método descreveria o movimento fundamental de um método que trabalha contra si mesmo: é a tensão do pensamento. Este contra-movimento seria a primeira característica da comunicação indireta, uma vez que a busca de sua definição resulta em fracasso, ou melhor, é o próprio fracasso da representação que a comunicação indireta porta em si. Este fracasso da abordagem direta indicaria a inconclusividade [Unabschlossenheit] ou um contra-projeto que se opõe a qualquer pensamento sistemático.

Ainda na primeira parte do trabalho, o autor faz uma distinção entre o conceito [Begriff] e a realização [Durchführung] da comunicação indireta. No primeiro caso, trata-se das reflexões explícitas de Kierkegaard sobre a comunicação, enquanto o segundo diz respeito à comunicação indireta executada, ou seja, quando Kierkegaard a emprega. Por exemplo, Pós Escrito (1846) seria um texto que não só teoriza, mas também executa o método indireto.

É preciso ressaltar que, assim como o termo contra-movimento do método, a diferenciação entre realização e conceito não se encontra nos textos de Kierkegaard. A elaboração destes conceitos extrapola a análise textual e assinala o trabalho interpretativo de Schwab. Estes “conceitos” assumem a função de expor o discurso indireto enquanto método no interior das próprias obras de Kierkegaard. Desta forma, o livro de Schwab revela a unidade entre a leitura estrutural, histórica e exegética das obras, e a elaboração conceitual do próprio intérprete.

A segunda parte do livro se dedica a uma análise do discurso indireto em diversos períodos do pensamento kierkegaardiano e tem como objeto o conceito de comunicação. Schwab parte de Pós Escrito, onde o contra-movimento do método é descoberto na impossibilidade de uma representação da existência, sobretudo devido à incomensurabilidade entre interior e exterior. Para o autor, nesta obra a comunicação indireta não estaria restrita ao domínio religioso, mas abrangeria toda esfera existencial, uma vez que o existir não se deixaria representar pela linguagem. Segundo Schwab, Pós Escrito coloca a impossibilidade de uma comunicação objetiva sobre a existência devido à própria incapacidade de acesso direto à efetividade existencial. Assim, qualquer comunicação existencial direta é negada, visto que o existir não se deixa representar.

O próximo objeto de análise é a comunicação em Ponto de Vista explicativo da minha obra como escritor (1848). Neste texto, haveria um conceito maiêutico- -teológico da comunicação indireta, uma vez que comunicar indiretamente seria descrito por Kierkegaard como “enganar para a verdade”, retirar o indivíduo de uma falsa concepção de religiosidade para colocá-lo diante do verdadeiro cristianismo.

Schwab conclui então que o discurso indireto é considerado por Kierkegaard como algo transitório, pois o que é dito indiretamente poderia ser comunicado de forma direta. Assim, observa-se que Pós Escrito e Ponto de vista assumiriam concepções de comunicação divergentes, dado que, na primeira obra, o indireto diz respeito à impossibilidade da representação da existência, enquanto no segundo texto, o indireto é transição para o direto ou um simples recurso.

Enquanto a comunicação indireta, em Pós Escrito, tem como referência a existência que não pode ser pensada, em Ponto de vista Kierkegaard estaria preocupado com a explicação da totalidade de sua obra, ou seja, expor qual foi seu objetivo desde as primeiras publicações. Deste modo, Schwab considera um erro comparar ou estabelecer uma unidade entre as definições de discurso indireto, pois as estruturas e contextos de ambas as obras são totalmente diferentes. Em Pós Escrito, por exemplo, o uso do pseudônimo criaria um distanciamento e impediria qualquer relação direta com o escritor. Neste livro, não seria possível concordar ou discordar do autor porque não há a expressão da opinião daquele que redige o texto. Já em Ponto de vista, Kierkegaard se apresentaria como autoridade e explicaria como ele deve ser lido. Consequentemente, o espaço da apropriação do leitor é reduzido. Destarte, Schwab não tem a intenção de apresentar um conceito definido e determinado sobre a comunicação diante da totalidade das obras de Kierkegaad. Seu trabalho visa antes apresentar o contexto em que cada concepção é elaborada, trazendo assim os elementos que ocupam as reflexões de Kierkegaard. Para o autor, as obras são como constelações, autônomas entre si e possuem uma pergunta determinada que deve ser considerada quando se pretende interpretar as obras. Por estas razões, não seria possível estabelecer uma definição geral, uma vez que isso já implicaria em retirar o conceito de um texto e generalizar, esquecendo que cada livro se volta para um problema determinado: “ele [o indireto] se manifesta nos contextos respectivos de sua forma concreta e não se deixa determinar abstratamente e esquematicamente com antecedência.” (p. 301 – nossa tradução).

Entre os trabalhos que exploram o tema da comunicação indireta, é comum constatar a tentativa de defender uma concepção geral. Nos trabalhos de Clair (1997), Fahrenbach (1997) e Diep (2003), por exemplo, a comunicação indireta é apresentada como uma comunicação voltada para a existência e interioridade.

Trata-se de uma comunicação que não se pauta na objetividade, porém de uma comunicação aberta capaz de expressar o movimento do devir que caracteriza a efetividade existencial. É possível assumir ainda que comunicação indireta se caracteriza principalmente pelo uso dos pseudônimos, um recurso estilístico que está a serviço de um objetivo mais amplo, como o aprofundamento existencial ou retirar o leitor de um falso cristianismo3. Seguindo o quadro exposto por Schwab, observa-se que, caso a comunicação indireta seja compreendida como uma comunicação existencial que tem o sentido da existência como problema, então toma- -se Pós Escrito como ponto de partida. Por outro lado, Ponto de vista ofereceria a base para se interpretar a comunicação indireta como emprego de pseudônimos ou instrumento maiêutico-teológico. Neste contexto, o discurso indireto não estaria relacionado com a inexpressividade do existir, mas a um artifício que auxilia o leitor a sair de um erro.

Quando Schwab enfatiza a importância da avaliação das estruturas interna das obras e a necessidade em considerar sua autonomia, portanto não confundir o conceito comunicação proposto por Pós Escrito com aquele de Ponto de vista, o autor visa desfazer o embate entre as tentativas conflitante que procuram estabelecer um conceito universal do indireto. De acordo sua leitura, as diferentes abordagens de Kierkegaard sobre o tema da comunicação revelariam uma reflexão em movimento, uma reflexão e que é retomada em diversas fases. Cada texto do filósofo dinamarquês apresentaria elementos distintos no que diz respeito à comunicação. Por estes motivos, as reflexões de Kierkegaard não possuiriam uma unidade conceitual fixa.

Após expor e discutir as concepções divergentes de Pós Escrito e Ponto de vista, a próxima tarefa é elucidar como esta transformação ocorreu. O trabalho se concentra nos textos escritos por Kierkegaard durante os anos de 1846 até 1848.

Neste momento, o livro apresenta uma rica análise histórico-interpretativa sem perder do horizonte a tese defendida. Manuscritos e esboços de Kierkegaard pertencente a esta época, como os NB3, NB 4, NB 5, NB 6, NB 7, além de obras publicadas, como Obras do amor, a terceira versão de Livro sobre Adler e a segunda parte de Exercício no cristianismo, que foi concebida em 1848, são comentados e explorados detalhadamente. Estes textos apresentariam diferentes abordagens sobre a comunicação indireta, indispensáveis para a formulação final de Ponto de vista. Schwab evidencia que, se em Pós Escrito o tema da impossibilidade da representação da existência perpassa a comunicação, nos anos posteriores o filósofo dinamarquês começa a questionar o seu lugar pessoal em relação à totalidade das obras, sobre a produção pseudonímica e se ele próprio, enquanto pessoa, poderia ou deveria comunicar diretamente.

As explicações de Ponto de vista se tornam questionáveis principalmente devido à publicação, anos mais tarde, de Doença para morte e Exercício do cristianismo, cujo autor é o pseudônimo Anti-Climacus. Ora, Ponto de vista defende que toda comunicação indireta pode ser transformada em comunicação direta. Quais foram os motivos que levaram Kierkegaard a retornar os pseudônimos ou o indireto? Por que o filósofo, após explicar como deveria ser lido, volta a se expressar indiretamente? Esta dificuldade é explorada no final da segunda seção do texto de Schwab, que tem o objetivo de se aprofundar no conceito de comunicação após os anos de 1848. Para realizar esta tarefa, o autor se concentra nos escritos dos anos de1848-9, incluindo as anotações não publicadas. Estes textos enfatizariam a dúvida de Kierkegaard no que diz respeito à publicação de Ponto de vista e se tanto Doença para morte quanto Exercício do cristianismo deveriam ser assinados por algum pseudônimo. Schwab defende que, durante este período, a comunicação indireta não pode ser desvinculada do auto-questionamento de Kierkegaard. O conceito de comunicação estaria atrelado à decisão de como e se realmente as obras deveriam ser publicadas.

A segunda seção da obra de Schwab termina analisando as observações finais de Kierkegaard sobre comunicação. O autor ressalta que, nos últimos anos, o discurso indireto é submetido a diversas reformulações e reinterpretações.

Schwab conclui assim que, diante da ausência de uma definição fixa, a indeterminação seria um dos traços essenciais da comunicação indireta, pois significa que não é possível pensá-la in abstracto, mas apenas em situações específicas e contextualizadas, reforçando a independência dos textos e a necessidade de situar cada definição.

Esta pesquisa “histórica” de Schwab, que recorre principlamente aos NB e busca apontar os problemas singulares que cada obra enfrenta, merece destaque.

Algumas passagens apresentada pelo autor são traduções inéditas e revelam elementos fundamentais para um entendimento do tema da comunicação em Kierkegaard. Sem dúvida, havia a necessidade de um estudo que percorresse os desdobramentos da comunicação indireta no corpus kierkegaardiano e o trabalho de Schwab assume não só esta responsabilidade, mas realiza a tarefa de forma bem sucedida. Além disso, seu livro é um dos poucos estudos que procuram adentrar nas estruturas internas dos textos e realizar uma comparação sistemática durante os diversos períodos da produção de Kierkegaard, verificando em que medida há ou não modificações conceituais e como estas são concretizadas.

Após explorar os diferentes escritos kierkegaardianos que problematizam diretamente a comunicação indireta, a quarta parte do livro se volta para a relação entre ironia e comunicação. O foco passa a ser O conceito de ironia constantemente referido a Sócrates. Apesar de Kierkegaard não mencionar o termo comunicação indireta no estudo dedicado a Sócrates, Schwab defende que a forma indireta realizada já se encontra presente naquele texto. Os traços do indireto poderiam ser localizados na figura de Sócrates, que expressaria a incomensurabilidade entre o interior e o exterior. Esta incomensurabilidade é o que aproximaria a ironia com o discurso indireto, pois o aspecto da representação do método indireto apontaria para a ambivalência de uma forma de representação que se volta contra si e é inconclusa, indicando a representação essencial do irrepresentável.

Um detalhe interessante é que, para Schwab, este elemento seria constatável também na ironia romântica. A comunicação indireta se negaria a um acesso direto, sistemático, tal como a ironia romântica escaparia de toda tentativa de uma determinação abrangente, direta, não irônica. Mas se é possível afirmar que o contra-movimento do método já se encontra pré-figurado nos românticos, a diferença fundamental consistiria em que, enquanto a ironia romântica a representação do absoluto é impossível, a comunicação indireta kierkegaardiana traz o particular como o irrepresentável.

O último tópico do livro traz a realização da comunicação indireta para o debate. Este capítulo se delimita a análise de três textos de Kierkegaard: A repetição, O conceito de Angústia e Doença para morte. Em A repetição, Schwab diagnostica processo indireto a partir do momento em que a própria obra não busca o conceito, mas como e se a repetição é atingida ou pode ser executada. Esta efetivação, porém, não se deixaria representar ou descrever, mas assumida. Neste aspecto, o autor entende que A repetição coloca o problema do querer dirigir-se a algo (repetição) que não pode ser representado diretamente, pois a repetição consiste exatamente na execução. A obra de Kierkegaard apresentaria um duplo movimento, o querer-dizer e não-poder-dizer, o falar e a frustração constante da fala que deve garantir paradoxalmente a efetividade da realização existencial que emerge no espelho da possibilidade.

Já no caso de O Conceito de Angústia, Schwab descobre o contra-movimento do método ou a realização da comunicação indireta quando Virgilius estabelece um limite para a ciência. Este limite seria o particular que permanece inacessível para método abstrato cientifico. O que poderia ser constatado, nas explanações de Virgilius, é o processo cientifico apontando sempre para algo que reside fora da especulação, como o “não lugar do pecado” ou a incomensurabilidade entre a esfera das ciências e a efetividade [Wirklichkeit]. Apesar de o texto ter a aparência de uma comunicação de saber ou teórico, Schwab defende que o indireto está presente na forma do tratamento conceitual do problema da angústia, posto que Virgilius levaria o leitor para a fronteira da abordagem científica.

Por fim, Doença para a morte apresentaria o indireto a partir do momento em que desespero não é descrito por Anti-Climacus como transição, mas diferentes formas auto-realização que é estática e contínua. A análise do desespero é horizontal e isto revelaria o processo indireto, dado que as múltiplas formas de desespero se revela incomensurável com a oposição conceitual abstrata.

No que diz respeito à estrutura do livro de Schwab, percebe-se a ausência de uma conclusão ou considerações finais. Porém, é necessário ressaltar que o texto não analisa as singularidades para chegar a uma tese geral conclusiva, mas apresenta o movimento inverso, ou seja, parte primeiro de uma concepção sistemática e, em seguida, expõe como o contra-movimento do método se realiza em cada obra. O leitor perceberá também a falta de uma discussão sobre os Discursos edificantes. O autor não investiga em que medida o indireto poderia estar (ou não) presente nestas obras e muito menos adentra na polemica travada por Pattinson (2002, p.12-34). segundo a qual os discursos edificantes também podem ser concebidos enquanto indireto, contrariando assim as afirmações de Ponto de vista. Todavia, apesar do silêncio, Schwab pode indicar caminhos para solucionar esta questão quando enfatiza a necessidade de se considerar o contexto específico de cada obra e evitar generalizações. Enfim, se o livro não encerra as controvérsias sobre o tema da comunicação indireta ou um conceito definitivo, a análise sistemática e histórica realizada por Schwab deve servir de modelo para os próximos estudos.

Referências

CLAIR, A. Kierkegaard, existence et éthique. Paris: PUF, 1997.

CONANT, J. Kierkegaard’s Postscript and Wittgenstein’s Tractatus: Teaching how to pass from disguised to patent nonsense. Wittgenstein Studies, 1997, v. 2, 1997. Disponível em: http://sammelpunkt.philo.at:8080/520/ Acesso em: 12 abr. 2016.

DIEP, P. Ética y sinsentido. Kierkegaard y Wittgenstein. Topicos, 2003, n. 24, p. 9 – 29.

SCHÖNBAUMSFELD, G. A Confusion of the Spheres: Kierkegaard and Wittgenstein on Philosophy and Religion. Nova York: Oxford Press, 2007.

FARENBACH, H. Grenzen der Sprache und indirekte Mitteilung: Wittgenstein und Kierkegaard über den philosophischen Umgang mit existentiellen Argumentos, ano 9, n. 17 – Fortaleza, jan./jun. 2017 165 Der rückstoss der methode: Kierkegaard und die indirekte mitteilung – Wagner Barros (ethischen und religiösen) Fragen. Wittgenstein Studies, v. 2, 1997. Disponível em: http://sammelpunkt.philo.at:8080/520/ Acesso em: 12 abr. 2016.

PATTISON, G. Kierkegaard’s Upbuilding Discurses: Philosophy, Theologie and Literature. Londres/Nova Iorque: Routledge, 2002.

HONG, H. V., & HONG, E. H. (1998). Historical introduction. In: KIERKEGAARD; S. The point of view. Nova Jersey: Princenton University Press, p. 9-27.

Notas

1 Maiores detalhes, C.f. HONG, H. V., & HONG, E. H. (1998)

2 Maiores detalhes, C.f. SCHÖNBAUMSFELD (2007).

3 Algo semelhante pode ser encontrado na leitura de Conant. O autor compreende a comunicação indireta enquanto tática que visa atingir determinado fim, embora critique a possibilidade do indireto apresentar algum tipo de verdade “inefável”. C.f. Conant, J. (1997). Kierkegaard’s Postscript and Wittgenstein’s Tractatus: Teaching how to pass from disguised to patent nonsense. Wittgenstein Studies, v. 2, 1997. Recuperado de: http://sammelpunkt.philo.at:8080/520/ Acesso em: 12 abril 2016.

Wagner Barros – Doutorando em Filosofia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Acesso à publicação original

 

Letra de índios: cultura escrita, comunicação e memória indígena nas Reduções do Paraguai – NEUMANN (RBH)

NEUMANN, Eduardo. Letra de índios: cultura escrita, comunicação e memória indígena nas Reduções do Paraguai. São Bernardo do Campo: Nhanduti, 2015. 240p. Resenha de: FELIPPE, Guilherme Galhegos. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.

Os estudos sobre a experiência missionária vivenciada por indígenas e catequizadores na região da Bacia do Rio da Prata colonial beneficiam-se da profícua produção textual que acompanhou toda a época da empresa missional. A grande quantidade de registros, apesar de marcada pela diversidade e riqueza de informações contidas em relatos, é caracterizada por ser predominantemente uma escrita produzida pelos estrangeiros. A escrita, para os membros da Companhia de Jesus, era prática de obediência às determinações da Ordem – que remontavam às Constituições de Inácio de Loyola – e ratificação da hierarquia que determinava a eficácia da circulação da correspondência e, consequentemente, das informações merecedoras de serem compartilhadas, a fim de estabelecer a união dos seus membros (Arnaut; Ruckstadter, 2002, p.108).

A escrita epistolar jesuítica, essa “laboriosa persistência na missão” (Hansen, 1995, p.99), garantia a contínua construção da retórica da evangelização do selvagem americano por meio do discurso edificante: escrever não era apenas registrar para manter a comunicação; era, também, justificar a conversão. O trabalho catequético, no cotidiano do meio reducional, implicava aos missionários uma aproximação com os indígenas que deveria ir além do ensino diário de bons comportamentos e das genuflexões nas missas. Os membros da Companhia de Jesus destacaram-se dos missionários de outras Ordens pela imersão que realizaram no contato e convívio com os índios reduzidos por meio da linguagem. A conversão, souberam desde o início, só seria uma possibilidade se os obstáculos da língua fossem superados com o desenvolvimento de meios materiais e simbólicos pelos quais os nativos se incorporassem às relações coloniais por seus próprios termos (Montero, 2006, p.41). Em dois movimentos vetoriais aparentemente contraditórios, os jesuítas aprenderam a língua dos índios para depois ensiná-los a escrevê-la (Agnolin, 2007, p.293).

O domínio da escrita foi, pode-se arriscar, o maior legado que os jesuítas deixaram aos Guarani na época das missões platinas. Contudo, isso não quer dizer que houve uma simples transmissão de conhecimento, em que o indígena, receptor passivo, tenha adquirido os manejos de uma tecnologia da qual não dava conta a não ser no âmbito da repetição e da cópia. É o que Eduardo Neumann procura demonstrar em seu livro Letra de Índios: os Guarani não só aprenderam a escrever – em espanhol e em sua língua nativa -, como, também, apropriaram-se dos métodos, técnicas e funcionalidades que a escrita possibilita para adaptarem-na às suas necessidades.

Publicado pela Nhanduti – editora especializada em estudos indígenas -, o livro de Eduardo Neumann apresenta a sua pesquisa realizada no Doutorado em História Social pela UFRJ, defendida em 2005. Em exaustiva pesquisa em arquivos do Brasil, da Argentina, do Paraguai, de Portugal e da Espanha, o autor coletou dados empíricos que lhe forneceram evidências suficientes para compreender “como os guaranis reorganizaram suas atitudes e seus costumes diante das novas demandas e desafios da sociedade colonial” (Neumann, 2015, p.30).

Para isso, o autor desconstruiu duas considerações que por muito tempo foram tomadas como dados irrefutáveis da história das reduções jesuítico-guaranis: que os poucos indígenas que tiveram acesso ao papel e à pena só haviam conseguido exercer a função de copistas, anulando-se, assim, qualquer possibilidade de uma atuação deliberativa por parte dos índios; e, em decorrência disso, que os missionários foram os únicos a produzirem registros que poderiam ser usados como fontes de pesquisa sobre as Missões. A documentação cotejada por Eduardo Neumann comprova não apenas uma intensa e contínua produção textual realizada pelos indígenas durante o período tardio das missões platinas (segunda metade do século XVIII), como, também, uma importante atuação no que competia aos trâmites internos da administração e da burocracia das reduções, principalmente naquilo que cabia às responsabilidades do Cabildo.

A partir disso, o autor ressalta que quase toda a produção escrita pelos indígenas foi produzida, fundamentalmente, por uma elite missioneira composta por membros que ocupavam cargos administrativos. Isto é, o ensino da escrita foi uma atividade restrita àqueles indígenas cuja apreciação, por parte dos missionários, posicionava-os em um grupo seleto, com prestígio e responsabilidades específicas. Escrever possibilitou a essa elite destacar-se dentro das reduções, principalmente para atuar na organização e definições dos expedientes da administração local, mas, também, “adquirindo competências e habilidades que os credenciam como mediadores e protagonistas nesse novo mundo letrado” (Neumann, 2015, p.53).

O acesso à escrita permitiu aos índios a produção de uma variedade de obras, dentre as quais o autor destaca as memórias, as atas administrativas, os vocabulários, as gramáticas e uma importante participação na elaboração de textos devocionais – sem contar os inúmeros bilhetes e cartas, escritos em guarani ou espanhol (algumas vezes, nas duas línguas), que as lideranças indígenas fizeram circular entre si, diminuindo as distâncias entre as reduções e dinamizando a comunicação oficial com as autoridades. Esse intenso trânsito epistolar demonstra “o quanto os guaranis não eram passivos, e como atuavam a partir de dinâmicas emanadas da interação com a sociedade colonial” (Neumann, 2015, p.90).

O livro, dividido em cinco capítulos, inicia apresentando o problema do contato linguístico, em que os jesuítas, que pretendiam fundar as reduções na Bacia do Rio da Prata, buscaram normatizar a língua guarani por meio de uma “redução gramatical” (Neumann, 2015, p.49). Ao definir a escrita como um instrumento a serviço da conversão, os esforços dos missionários voltaram-se para traduzir os signos linguísticos do Guarani a fim de torná-lo o idioma oficial da sociedade missioneira. Como consequência imediata, os índios apropriaram-se da escrita sem, com isso, inferiorizar a importância da oralidade enquanto tradição coletiva. Apesar disso, escrever não foi uma tarefa difundida entre todos os Guarani, restringindo-se apenas à elite que ocupava cargos administrativos nas reduções.

Assim, o Cabildo é descrito como espaço de atuação dos índios que possuíam a habilidade da escrita. A instrução escolar era oferecida a um seleto grupo de meninos e homens nos quais os jesuítas depositavam a expectativa de virem a ser colaboradores no funcionamento e bom andamento da redução. Não demorou muito para que os índios alfabetizados passassem a ter autonomia no envio de correspondências e, por isso, revelassem seu engajamento às causas que lhes eram pertinentes. Exemplo disso foi a época da assinatura do Tratado de Madri, em 1750, e a consequente Guerra Guaranítica. Não só os conflitos armados e as diferenças ideológicas potencializaram a troca de correspondência, como o próprio fato de a aliança entre os jesuítas e as lideranças indígenas ter se enfraquecido em razão das desavenças no que competia à administração das reduções: “a escrita, nesse momento, conferia uma identidade comum no modo de fazer política por parte dos índios rebelados, ao expressarem suas insatisfações com os acontecimentos em curso” (Neumann, 2015, p.125).

Se, por um lado, o uso da escrita esteve reservado a um grupo restrito de índios, por outro, o formato dessa escrita não ficou preso às demandas da burocracia missioneira. Fica evidente que “qualquer novo sistema de escrita constitui-se e é reformulado na dependência de fatores que, além de serem de natureza ‘técnica’ ou ‘científica’, são políticos, ativos ou reativos” (Franchetto, 2008, p.32). Ainda que grande parte dos textos escritos pelos índios fosse de cunho administrativo, os indígenas letrados escreveram memoriais e diários que se tornam fontes para “avaliar os modos pelos quais os índios percebiam os acontecimentos e o seu interesse em estabelecer um registro dos mesmos” (Neumann, 2015, p.144).

Com a expulsão dos jesuítas do território da América espanhola, em 1767, a instalação de uma administração laica nas reduções alterou consideravelmente a forma como a elite indígena passou a se comportar frente à gestão reducional. O novo contexto retirou as reduções e suas lideranças do isolamento político, elevando o grau de relação que os indígenas instruídos passaram a manter com as autoridades coloniais, refletindo-se em um aumento da correspondência trocada – até mesmo em um maior número de cartas bilíngues. Ainda assim, mesmo que a expressão escrita tenha sido fundamental para que as lideranças pudessem deixar registradas as suas opiniões e descontentamentos em relação à nova ordem administrativa, não houve uma disseminação do aprendizado da escrita entre os índios, mantendo-se restrita a uma elite que escrevia entre si, mas assinava por todos.

Referências

AGNOLIN, Adone. Jesuítas e Selvagens: a negociação da fé no encontro catequético-ritual americano-tupi (século XVI-XVII). São Paulo: Humanitas, 2007. [ Links ]

ARNAUT, Cézar; RUCKSTADTER, Flávio M. Martins. Estrutura e organização das Constituições dos jesuítas (1539-1540). Acta Scientiarum, v.24, n.1, p.103-113, 2002. [ Links ]

FRANCHETTO, Bruna. A guerra dos alfabetos: os povos indígenas na fronteira entre o oral e o escrito. Mana, v.14, n.1, p.31-59, 2008. [ Links ]

HANSEN, João Adolfo. O Nu e a Luz: Cartas Jesuíticas do Brasil. Nóbrega – 1549-1558. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, v.38, p.87-119, 1995. [ Links ]

MONTERO, Paula. Índios e missionários no Brasil: para uma teoria da mediação cultural. In: _______. (Org.) Deus na aldeia: missionários, índios e mediação cultural. São Paulo: Globo, 2006. p.31-66. [ Links ]

Guilherme Galhegos Felippe – Doutor em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Pós-doutorando, PUC-RS. Professor Colaborador (PNPD/Capes) do Programa de Pós-Graduação em História da PUC-RS.

Acessar publicação original

[IF]

 

Cena cosplay: comunicação, consumo, memória nas culturas juvenis – NUNES (RTA)

NUNES, Mônica Rebeca Ferrari (Org.). Cena cosplay: comunicação, consumo, memória nas culturas juvenis. Porto Alegre: Sulina, 2015. Resenha de: CUBA, Rosana da Silva. Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v.8, n.18, p.457-462, maio/abr., 2016.

O último Estado da Arte sobre a temática da(s) juventude(s) na produção da pós-graduação brasileira, nas áreas de Educação, Ciências Sociais e Serviço Social foi publicado em 2009 e coordenado por Marília Sposito. Na época, a autora celebra o aumento das pesquisas sobre as juventudes, mas ressalta a necessidade de abarcar os jovens em suas múltiplas inserções: para além dos seus itinerários formativos escolares é possível empreender investigações numa perspectiva mais transversal e compreender como se dão as sociabilidades juvenis na rua, em suas intersecções e atuações em grupos religiosos e família, enfim, abarcar os diversos aspectos que compõem a vida cotidiana juvenil. Neste sentido, o livro organizado por Mônica Rebecca Ferrari Nunes, intitulado “Cena Cosplay: comunicação, consumo, memórias nas culturas juvenis” contribui para enriquecer o mosaico das pesquisas sobre jovens ao conjugar, em diferentes espaços e tempos, as categorias empíricas para uma compreensão dos jovens e a sua inserção no espaço urbano nas grandes cidades do sudeste do Brasil.

Mônica Rebecca Ferrari Nunes é docente e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Práticas de Consumo, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), na cidade de São Paulo. Sua área de atuação envolve as áreas de comunicação, nas interfaces de produção midiática, cultura do consumo, processos de memória e cenas da cultura contemporânea.

O livro, segundo a autora, é uma proposta de cartografia, ainda que incompleta, sobre a prática cosplay entendida na tríade prática comunicativa, cultura e consumo. O livro é resultado de trabalho desenvolvido em grupo de estudos (Grupo de Pesquisa, Comunicação, Consumo e Entretenimento) da ESPM e vinculado ao CNPQ, e é organizado em seis partes: Cosplayers e poetas; Percepção, cognição e pertencimento; Moda e estilo urbano; Matérias sonoras; Games e colecionismo; Flânerie. Os textos que compõem a obra são de pesquisadores vinculados ao Grupo de Pesquisa e situados em diversos percursos acadêmicos, desde mestrandos a pós-doutores, imbuídos de um olhar comum: entender as relações dos jovens do Sudeste do Brasil com o cosplay, suas escolhas pelas representações, a relação com o consumo e a memória que se deseja construir.

A primeira parte é composta por dois trabalhos, de autoria da organizadora – Mônica Rebecca Ferrari Nunes – e de Marco Antônio Bin. Os dois textos versam sobre a compreensão da cena cosplay e da poesia marginal como formas de resistência ao cotidiano, materializadas em performances, sejam elas constituídas pelo prazer de encenar e pela captura dos ídolos para se fazerem ver e ouvir – caso dos cosplayers – ou pela ruptura com as mídias tradicionais e busca de uma visibilidade coletiva – caso dos poetas marginais. Os dois textos denotam para a necessidade de uma compreensão do cosplay juvenil como uma manifestação processual e cultural híbrida, entrelaçando formas de sociabilidades e constituição de identidades e fugindo de um olhar maniqueísta, segundo o qual os jovens cosplayers seriam meros consumidores e/ou reprodutores de ídolos midiáticos.

A segunda parte apresenta dois trabalhos que buscam se debruçar sobre as escolhas dos jovens que desejam e optam por serem cosplayers e a consciência que têm de si mesmos e de seus corpos. Ana Maria Guimarães Jorge e Gabriel Theodoro Soares assinalam o quanto o cosplay deve ser como interpretado não só como prática social, mas também como manifestação social, na medida em que o processo de constituição das identidades na contemporaneidade é marcado pela liquidez (Bauman, 2004). Assim o cosplay é uma possibilidade de constituir grupos para compartilhar vivências e, ainda, escolher representar um personagem que corresponda a determinados valores e significados com os quais há afinidade. Os dois textos constatam a relação entre o cosplay e a busca por um sentido à vida, numa espécie de jogo que propicia um tipo de fuga à vida cotidiana e promove o encontro consigo mesmo e com os seus pares. Essa fuga, contudo, não seria simplesmente fugir à ordem social vivida, mas a construção de outro espaço-tempo com uma ordem própria e condições de pertencimento.

A terceira parte compõe-se de dois textos que tratam sobre moda e sobre como o estilo cosplay influencia e se expande para outros campos. O texto de Tatiana Amendola Sanches aponta vários exemplos de apropriação, por parte de grandes marcas, de estratégias similares aos cosplayers, com modelos vestidos de determinados personagens. Michiko Okano, por sua vez, apresenta as características da “Lolita”, prática que é definida pelos participantes muito mais como um estilo de vida do que como uma subcultura ou cosplayers, seja no Japão ou no Brasil. São analisadas as particularidades e o que há de comum em Lolitas nos dois países e salienta-se que há processos ambíguos que conjugam espetacularização, contestação e a procura de lugar e identificação em uma sociedade que se mostra hostil. As autoras destacam a articulação de consumo e ludicidade que parece constituir-se numa resistência ao mundo adulto e moderno desencantado.

A quarta parte, intitulada Matérias sonoras traz as contribuições de Luiz Fukushiro e Heloísa de Araújo Duarte Valente, em texto que discute a presença da música no universo cosplay: muitos dos cosplayers, ao se apresentarem, adquirem, não apenas as vestimentas, mas, também, as vozes dos seus personagens. Além das vozes, a música constitui-se num elemento chave dos eventos cosplay, e, embora o mercado, de forma geral, não aceite o j-pop (uma apropriação japonesa do pop do Ocidente), ele é abarcado pelos cosplayers. Vera da Cunha Pasqualin, no texto seguinte, destaca o quanto é importante atentar-se para as onomatopéias maciçamente presentes nos mangás e tão importantes quanto as imagens para a compreensão do texto. A autora também analisa as performances de “vocaloides”: pessoas que utilizam um programa para computadores denominado Vocaloid, com vozes gravadas e que podem ser recombinadas, para se apresentarem e cantarem em uma língua que não conseguiriam falar, por exemplo.

A penúltima parte é formada pelos textos de Davi Naraya Basto de Sá e Wagner Alexandre Silva, em torno da temática dos games e do colecionismo. Sá analisa o quanto os games redefinem a memória da mitologia, atualizando estereótipos em um processo constante de reedição. O autor também faz referência à constituição identitária daqueles cosplayers que escolhem determinados personagens: as pessoas são aquilo que desejam consumir. Silva irá mostrar como o colecionismo ligado aos cosplayers difere, em certa medida, da tradição das coleções já estudada pelo filósofo Benjamin. A aquisição dos objetos ocorre também por seus usos e aproximações com determinado personagem, pavimentando a relação de transição de cosplayer a colecionador, relação esta que pode tornar-se mais estreita quando se aumentam os cosplayers que se deseja assumir.

A sexta parte, Flânerie, propõe um passeio por fotografias feitas pelos pesquisadores ao longo de suas pesquisas.

O livro pode ser comparado, imageticamente, a um caleidoscópio que fornece combinações diversificadas à luz do cosplay. Além de proporcionar um aprofundamento ao universo cosplay juvenil presente na região Sudeste do Brasil, contribui para pensar também nas metodologias para se estudar as juventudes. A organizadora cita, por exemplo, a experiência de ter entrevistado duas pessoas que fazem cosplayers via Facebook. Ainda, apresenta uma alternativa à Antropologia, área na qual não tem formação, combinando uma flanêrie e um “engajamento narrativo” com origem em Benjamin e, posteriormente, McLaren.

Por fim, a obra também contribui para debater o consumo na contemporaneidade e o quanto é preciso calibrar o olhar ao debruçar-se sobre a semiosfera cosplay: em tempos modernos – ou pós-modernos – já não é possível compreender as culturas juvenis e a sua relação com o consumo buscando uma motivação linear e unívoca. Temos sujeitos de habitus (Bourdieu) híbridos e, portanto, com identidades que se mesclam e metamorfoseiam, confundindo olhares mais aligeirados.

Referências

NUNES, Mônica Rebecca Ferrari (org.). Cena cosplay: comunicação, consumo, memória nas culturas juvenis. Porto Alegre: Sulina, 2015.

SPOSITO, Marilia Pontes (coord.) Estado da arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: educação, ciências sociais e serviço social (1999-2006), volume 1. Belo Horizonte, MG: Argvmentvm, 2009.

Rosana da Silva Cuba – Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina. Brasil. E-mail: rosana.cuba32@gmail.com

Acessar publicação original

[IF]

 

 

Uma dobra no tempo: um memorial (quase) acadêmico – PRETTO (REi)

PRETTO, Nelson de Luca. Uma dobra no tempo: um memorial (quase) acadêmico. Ilhéus-BA: Editus, 2015. Resenha de SOMBRA, Laurenio Leite. Revista Entreideias, Salvador, v. 5, n. 1, jan./jun. 2016.

Ler Uma dobra no tempo, de Nelson Pretto, é uma experiência particular. O subtítulo do livro aponta para um “memorial (quase) acadêmico”. De fato, tudo partiu do Memorial Acadêmico, escrito por ele, como requisito para progressão de carreira na Universidade Federal da Bahia (UFBA), para professor titular. Mas o próprio Pretto lembra que recebeu uma crítica em sua defesa do mestrado: “apesar da linguagem jornalística, está bom” (p. 80). Lendo o livro, percebo que o examinador acertou meio sem saber: a linguagem é “jornalística” porque ela tem uma imensa e desavergonhada capacidade de comunicação: se as “regras da ABNT” estão aqui, nem nos lembramos delas, apenas entramos numa conversa longa e animada em que a gente se enreda numa vida verdadeiramente repleta de construções de diversas ordens, de sucessos e fracassos que são contados com a mesma verve, com um jeito gostoso que não nos poupa sequer de sorrisos e algumas gargalhadas. E qual a regra que diz que um texto acadêmico não pode ser assim? A comunicação de verdade é muito mais do que aquelas regras de “mensagem-emissor-receptor-resposta” com um pouco de ruído: ela pressupõe um nó imenso e complexo de pessoas que contribuem mutuamente, que compartilham ideias, que entram também em conflito. Pressupõe, enfim, uma polis que não se traduz em uma assembleia geral, mas em uma rede de pessoas interagindo e construindo coisas. O que a torna, inevitavelmente política.

Se isso se dá em um casamento indissolúvel com a educação, o propósito de formação ganha um colorido novo: significa incluir o educando nessa rede, escutar o seu desejo, dar-lhe possibilidades que ele não teria de outro modo, lhe conectar. Significa a abertura de não saber o que vai resultar disso, mas a imensa convicção de que esta rede aberta só pode ser profícua, só pode resultar em pessoas melhores, mais interessantes, quem sabe mais cidadãs.

Pois bem: esse casamento indissolúvel de educação (ampliada) e comunicação (ampliada) parece que une a múltipla vida profissional desse físico que se tornou cada vez mais educador, desse educador que foi sempre um comunicador. É nesse contexto que a gente pode ver aquele jovem de 20 e poucos anos “gastando” um período inteiro da disciplina de Física para ensaiar Galileu de Brecht com os alunos do Colégio Marista (p. 50); ou promovendo semanas de debates, no mesmo Colégio, para “julgar” a aventura nuclear do governo militar com os alunos, experiência que, claro, mereceu uma bronca dos próprios militares (p. 51-52). É nesse mesmo contexto que o vemos, desde cedo, inserido num processo de “despelegação” do Sindicato dos Professores no Estado da Bahia (Sinpro) (p. 60-61), inserção política que iria se desdobrar numa participação ativa no Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), no futuro exercício como assessor do reitor e parceiro Felippe Serpa, nos oito anos como diretor da Faculdade de Educação (Faced) da UFBA, e mesmo nas duas campanhas (fracassadas?) para reitor na mesma Universidade.

Por fim: esse casamento de educação e comunicação produziu os vários modos de conexão com os quais estamos a acostumados a acompanhar Nelson Pretto. Nele se inseriu sua atuação no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em Brasília, para pensar o livro didático (p. 89-96); lá, a derivação para outras temáticas, como a educação a distância, a discussão da educação via satélite, a televisão educativa; a sua passagem para a FUNTEVÊ no Rio de Janeiro (p. 97-109); o doutorado na Universidade de São Paulo (USP), onde participou ativamente de projeto de TV e vídeo, embrião da futura TV USP (p. 113-118); na volta para casa, na atuação como assessor de Felippe Serpa, o esforço de construção de uma rede na UFBA como embrião do acesso à internet (p. 151-158), os esforços para conectar as diversas universidades; como diretor (p. 185-228), participou da elaboração de um plano diretor para a Faced, da reforma da Biblioteca Anísio Teixeira, de uma adaptação arquitetônica do próprio espaço da Faced, depois o projeto Tabuleiro Digital em Salvador e em Irecê. No meio de tudo, uma ampliação cada vez maior dessa articulação educação-comunicação e a ideia, cada vez mais consolidada, de uma “ética hacker” (p. 245-250), que viraria currículo, aprofundamento teórico, participação em comitês políticos e muita discussão.

Ler o livro de Pretto é perceber, de modo muito concreto, que é possível articular seriedade acadêmica, compromisso político, articulação permanente com os pares da mesma e de outras universidades, e tudo isso sem perder o humor. Quem não quiser se comprometer, sugiro que não o leia.

Laurenio Leite Sombra – Doutor em Filosofia (UFBA) e Mestre em Filosofia (Unb).

Acessar publicação original

História da Mídia | ABPHM | 2012

Historia da Midia Análise de Discurso Crítica e Comunicação

A Revista Brasileira de História da Mídia -RBHM (São Paulo, 2012-) é uma publicação em formato eletrônico com periodicidade semestral da Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia (São Paulo-SP). Lançada em 2012, tem como objetivo principal divulgar pesquisas que enfoquem a relação mídia e história de forma a incentivar a pesquisa nesta área do conhecimento.

Publica a produção acadêmica de pesquisadores da área da comunicação, da história e outras visando também aprimorar as discussões em torno de questões históricas dos meios de comunicação em geral.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 2238-5126

Acessar resenhas

Acessar dossiês

Acessar sumários

Acessar arquivos

 

 

Línguagem e comunicação – PAVIANI (C)

PAVIANI, Neires Maria Soldatelli. Línguagem e comunicação. Caxias do Sul: Educs, 2008. Resenha de: ROSA, Marcelo Prado Amaral. Conjectura, Caxias do Sul, v. 16, n. 2, Maio/Ago, 2011.

O livro Linguagem e educação é uma produção textual vinculada a projetos de pesquisa que possuem temática dirigida a considerações sobre leitura e gêneros discursivos, aspectos socioculturais e regionais da linguagem. A organização em forma de livro visa a alcançar a homogeneidade temática, pois alguns desses ensaios já foram publicados, na íntegra ou parcialmente em revistas especializadas. É destinado diretamente aos docentes do Ensino Fundamental e do Médio e, do mesmo modo, para acadêmicos de cursos de graduação em licenciaturas e de programas de pós-graduação.

A autora da obra, professora Neires Maria Soldatelli Paviani, é Doutora em Educação, na área de Metodologia de Ensino, pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar-SP). Atualmente, é professora no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS), vinculada às linhas de pesquisa educação, linguagem e tecnologia. Tem experiência na área de Linguística, com ênfase em Sociolinguística e Dialetologia, atuando principalmente nos seguintes temas: professor de Português, situações de bilinguismo, formação do professor. É autora e coautora de outras sete obras, entre elas, Universo acadêmico em gêneros discursivos (2010), Práticas de linguagem: gêneros discursivos e interação (2009) e Linguagem e práticas culturais (2006).

A obra em questão se apresenta dividida em oito capítulos estruturalmente independentes, podendo cada texto ser usado de forma individualizada sem prejuízo nenhum de compreensão por parte do leitor; ao mesmo tempo, são textos que podem vir a se complementar.

Os capítulos da obra são: (i) “Situações de bilinguismo e variação linguística no ensino”; (ii) “Estudos sociolinguísticos e valores”; (iii) “Estigma social da pronúncia no ensino do Português”; (iv) “Linguagem literária e os saberes”; (v) “A função do professor e o ato de ler do aluno”; (vi) “A leitura na formação científica do profissional”; (vii) “O meio cultural na formação do leitor”; e (viii) “A linguagem do teatro e a educação”. A obra completa apresenta 129 páginas.

O primeiro capítulo, “Situações de bilinguismo e variação linguística no ensino”, que contém os seguintes subtítulos: i.i) conceito de língua; i.ii) variação linguística; i.iii) noções de norma e (dialeto) padrão; i.iv) situações de bilinguismo; i.v) comunidades bilíngues e tipos de bilinguismo; i.vi) intereferências, empréstimos e influências de bilinguismo; e i.vii) referências, tem como base um estudo realizado no município de Flores da Cunha – RS, uma vez que esta localidade é caracterizada por apresentar diferentes modos de composição da fala bilíngue. Ainda apresenta como objetivo principal as definições operacionais dos seus tópicos secundários acima expostos. Procuro, assim, mencionar aqui diferenças, identidades e outras operações analíticas e interpretativas no desenvolvimento da temática. Tais definições se evidenciam como de suma importância devido à diversidade de pontos de interpretação, que os conceitos tratados neste estudo podem vir a ter.

Assim, o redimensionamento de conceitos gerais e amplos, como no caso de língua e de conceitos mais específicos, como de bilinguismo, podem vir a mostrar variedade ou graus de bilinguismo social, estando entre as principais referências utilizadas para as construções teóricas os textos de Câmara Júnior, Saussure, Titone, Savedra e Heye.

O objetivo do segundo capítulo, “Estudos sociolinguísticos e valores”, com os subtítulos: ii.i) “Interdisciplinaridade da sociolingüística”; ii.ii) “Definição de sociolingüística, segundo Berruto”; ii.iii) “Objeto e campos de ação da sociolinguística, conforme Berruto”; e ii.iv) “Referências”, é verificar que aspectos sociolinguísticos e culturais estão inter-relacionados na variedade do Português falada em uma região de descendentes de imigrantes italianos (Nordeste do Rio Grande do Sul). A importância deste estudo vem ao encontro de aspectos que nem sempre, nas diferentes pesquisas linguísticas, se dão conta da língua como um fenômeno global, fazendo com que a língua deixe de ser vista como prática cultural. Nesse capítulo também é abordado, de forma muito bem-amarrada com a história da própria sociolingüística, a questão da importância interdisciplinar da sociolinguística e que, devido a esse aspecto, é possível a realização de estudos sobre fenômenos culturais extralingüísticos, que interferem e influenciam no uso da língua e não somente dos aspectos linguísticos em si. As principais referências neste capítulo são Labov, Santos, Tarallo e Berruto.

No terceiro capítulo do livro em questão, “Estigma social da pronúncia no ensino do Português”; é tratada a questão da importância da pronúncia (sotaque de uma língua) sobre a perspectiva da atuação do Professor no ensino de português em situações de bilinguismo e em grau relativo (falantes que falam línguas de imigrantes, ou que não falam, mas entendem). Para ilustrar a situação da abordagem desse capítulo, são apresentados trechos de depoimentos de professores do Ensino Fundamental de uma região colonizada por imigrantes italianos, o que traz para o texto um sentido de empatia com o público-alvo da região onde está localizada a Universidade de Caxias do Sul. É notória, nesse texto, a relevância desses aspectos para a comprovação de que o ensino de Língua Portuguesa deve ter suas peculiaridades em regiões marcadas pela imigração, pois o bilinguismo é um traço antropológico que vai além do mero “erro de pronúncia lingüística”. Vale destacar os textos de Bisol, Câmara Júnior, Titone, Mescka e Weinreich, que compõem o quadro referencial deste capítulo.

O quarto capítulo “Linguagem literária e os saberes” versa sobre o fato de a literatura ficcional servir de momento de aprendizagem para o leitor, devido à sua característica primeira de entretenimento. O texto expõe, de forma clara e simples (sem ser simplória), a relação entre literatura ficcional, saberes e vida acadêmica. A autora afirma categoricamente que “o ato de ler obras literárias é algo fundamental para as funções sociais e profissionais, pois amplia a visão e a compreensão dos problemas do homem e do mundo”. (p. 69). Nesse capítulo, friso a diferenciação entre leitura técnica e literária, dada pela autora, via palavras de Giannetti. Existe ainda o cuidado da autora em não mascarar, nem tampouco sobrepor um tipo (ficcional) de leitura sobre outro tipo (técnico), deixando claros os saberes que cada leitura proporciona ao leitor. Para ilustrar as experiências trazidas pela leitura literária, a autora ilustra com depoimentos informais de leitores. Ainda é destaque, juntamente com Giannetti na construção teórica, os autores Barthes, Bourdieu e Merleau-Ponty.

Na sequência, no Capítulo 5, “A função do professor e o ato de ler do aluno”, com os subtítulos: v.i) “Nos bastidores: as providências”; v.ii) “As expectativas do público”; v.iii) “Primeiro ato: sala de aula”; v.iv) “Segundo ato: aplicação (é fazendo que se aprende)”; v.v) “Desce a cortina: aplausos”; e v.vi) “Referências”, a autora, fazendo uma analogia com a linguagem teatral, trata especificadamente sobre o ato de selecionar textos e como trabalhá-los com finalidades didático-pedagógicas. Por meio das palavras de Braga e Silvestre, a autora traz para a conversa a identificação generalista e vaga da intencionalidade na seleção de textos. Dessa forma, são apresentadas, no texto, questões norteadoras que servem para o esclarecimento de decisões sobre ações de leitura. Nesse capítulo, ainda, enfatiza como é importante que o professor tenha consideração com as expectativas do público-alvo para quem é destinada a escolha das leituras, pois é preciso criar condições favoráveis de leitura ao leitor, para que a experiência de leitura textual seja agradável, prazerosa, enfim que a leitura não seja um mero exercício, uma vez que “o papel do professor é semelhante àquele que pretende acender uma fogueira” (p. 84) que, uma vez acesa, queima sozinha. Ainda, no decorrer da leitura, são apresentadas atividades de leitura em três etapas que podem vir a auxiliar as atividades dos docentes, desde que processadas de forma integrada.

Nesse capítulo, são destaques as referências a Braga e Silvestre, Freire, Martins e Merleau-Ponty. Já no texto do Capítulo 6, “A leitura na formação científica do profissional”, com os subtítulos: vi.i) “Como transformar o estudo da língua em modos de formação”; e vi.ii) “Referências”, o foco de abordagem da autora recai sobre a necessidade de atribuições de sentido ao que se ensina e de sensibilidade no ato de ensinar, pois a leitura é uma atividade social que possibilita o desenvolvimento e o amadurecimento da criticidade e da criatividade. Nas palavras de Martins (1993, p. 102), o professor “precisa mostrar ao aluno que ler significa inteirar-se do mundo, sendo também uma forma de conquistar autonomia, de deixar de ler pelos olhos de outrem”. Mais ao fim do texto, são expostas de forma sutil as teorias de argumentação, aspecto que saliento como valioso no texto devido à sua importância, uma vez que a língua é, por excelência, comunicação. Entre as referências usadas pela autora para a construção do texto, destacam-se os estudos de Duranti, Paviani, Perelman e Oldrechts-Tyteca, Silva e Toulmin.

Em “O meio cultural na formação do leitor”, Capítulo 7, cujos subtítulos são: vii.i) “O meio cultural e a leitura”; vii.ii) “Leitura e aspectos socioculturais”; vii.iii) “Uma fotografia sociolinguística”; vii.iv) “Considerações finais”; e vii.v) “Referências”, tem como importantes as influências que o meio cultural exerce sobre os hábitos de leitura como prática cultural, partindo de dados coletados entre estudantes ingressantes no Ensino Superior. Os dados foram coletados no ano de 2002 (Tear1), aprendizes matriculados na disciplina de Língua Portuguesa Instrumental, da Universidade de Caxias do Sul, totalizando uma amostra composta por 144 alunos. Os instrumentos para obtenção dos dados foram: um questionário socioeconômico e cultural e um teste de leitura em que se verificou: dominância explicativa e argumentativa de gêneros textuais, respectivamente, reportagem e editorial. Os dados revelam que a família desses ingressantes é de etnia italiana, em sua maioria, não passando de 15% os pais que possuem formação em curso de nível superior. Sobre o incentivo à leitura, o dado levantado de maior destaque é o fato de a figura da mãe ser a grande incentivadora, ficando em segundo plano a escola. Os referenciais de destaque nesse trabalho são Bourdieu e Marcuschi, além de outros.

No oitavo, e último capítulo da obra em questão, “A linguagem do teatro e a educação”, com os subtítulos: viii.i) “Experiência humana”; viii.ii) “Atividade educativa”; e viii.iii) “Referências”, em forma de relato, são abordados as consequências e os resultados de uma experiência teatral como atividade educativa, que, por aproximadamente uma década, foi realizada em uma escola. Essa experiência lúdica tem, em sua essência, objetivos pedagógicos (expressão e comunicação) mais que objetivos técnicos e profissionais relacionados ao teatro. A autora toma o cuidado de examinar que atenção é dada ao tipo de texto para a peça teatral, devendo esse ser adequado às peculiaridades do grupo e da escola. Ao final do texto, é ratificado o emprego do teatro na escola como recurso potencial e acessível para que o aluno venha a “perceber e a expressar a si mesmo o mundo que o rodeia”. (p. 127). A referência usada nesse capítulo é Montenegro.

Os textos que compõem o livro Linguagem e educação apresentam como características de escrita a clareza e a preocupação de servirem de subsídios diretos para a prática pedagógica, o que pode ser atestado pela ordem dos textos que basicamente se dirigem da teoria para a prática em sala de aula. Ainda: enfatizo a importância do livro com base na ampliação dos fundamentos e conceitos que se circunscrevem à área educacional, a partir, especificadamente, de aspectos relacionados à linguagem, à educação, à leitura, à literatura, à variação linguística, à sociolinguística, entre outros. Com base na análise geral do livro, evidencia-se o imbricamento existente e que a autora clarifica entre linguagem e pensamento, interação, expressão corporal, o outro, com as origens e com o mundo que nos cerca, implicando, de tal maneira, o entendimento do ser humano como um ser social. Assim, justifica-se a frase de Guimarães Rosa, que serve de epígrafe à obra: “A linguagem e a vida são uma coisa só”.

Devido ao supraexposto, é reiterada aqui a recomendação da leitura deste livro por professores, acadêmicos de cursos de graduação em licenciaturas e acadêmicos de Pós-Graduação vinculados à linha de pesquisas da área de educação, linguagem e tecnologia, devido ao fato de essa obra se apresentar como geradora de ideias, de propor soluções de problemas ou de instigar a leituras complementares e diálogos.

Marcelo Prado Amaral Rosa – Licenciado em Química pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), campus de Frederico Westphalen/RS. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). E-mail: marcelo.pradorosa@yahoo.com.br

Acessar publicação original

Do meb à web: o rádio na educação – PRETTO; TOSTA (ES)

PRETTO, Nelson de L.; TOSTA, Sandra P. (Orgs). Do meb à web: o rádio na educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. Resenha de: REIS, Magali. “Radinho de pilha”: sintonia fina entre educação e comunicação. Educação & Sociedade, Campinas, v.32 n.114 jan./mar. 2011.

Os fios da trama que unem os estudos que compõem o livro são tecidos por José Peixoto Filho, já no primeiro ensaio, ao recuperar a experiência do Movimento de Educação de Base (MEB) e suas contribuições para a educação popular. O meb surgiu no âmbito das mudanças em curso no país, durante a década de 1950, como uma das possibilidades educativas que buscavam soluções para os problemas enfrentados pela população pobre. No âmbito das mudanças no cenário político e econômico, confluíram interessas e alianças entre o poder público e a hierarquia católica para que ações efetivas fossem realizadas, com os segmentos mais carentes da sociedade.

Segundo Peixoto Filho, o MEB realizou um amplo espectro de trabalho no campo da educação popular, na alfabetização de jovens e adultos e na mobilização social dos trabalhadores rurais. Na prática, prossegue o autor, a educação popular desenvolvida pelo Movimento, entre 1961 e 1966, empregou técnicas, métodos e recursos, simples e artesanais, porém criativos e inovadores para a época, visando à comunicação com a população do campo. Porém, um aspecto que chama a atenção é que o meb teve como instrumento pedagógico básico o rádio, que possibilitou ao mesmo tempo o uso de técnicas de comunicação associadas com atividades presenciais, realizadas em sala de aula nas comunidades. A utilização do rádio deu-se por sua abrangência, possibilitando chegar a regiões mais distantes do país, utilizando para tanto recursos da tradição oral.

Ainda que tenha sido esta uma experiência bem sucedida de educação popular, permanece pouco estudada e pouco difundida no meio acadêmico. Portanto, o mérito da obra é colocar em evidência a díade novas-e-velhas tecnologias que, combinadas, podem redundar em uma experiência educativa contemporânea e promissora.

Assim, o uso de diversas formas de expressão, em meados do século passado, por profissionais de rádio, sejam eles programadores, locutores, escritores e produtores de programas, abriu caminhos para a construção de novas linguagens pedagógicas e didáticas, ainda pouco assimiladas pela estrutura escolar brasileira, em especial a pública.

O rápido avanço no desenvolvimento e aprimoramento das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) coloca em relevo um universo de possibilidades para a comunicação entre populações distintas, antes inimagináveis, desafiando as ciências sociais e humanas com a abertura de campos de indagação que oferecem oportunidades de pesquisa e aplicação num universo que se renova a cada momento.

A coexistência do rádio hertziano e do analógico configura-se como um universo em que a comunicação se amplia de forma inexorável. Cria-se assim um conjunto de possibilidades trazidas pela era digital, abrindo caminhos para inovações pedagógicas do meb à web, a fim de buscarmos não apenas a compreensão dos novos contextos nos quais se inserem as tecnologias, mas o entendimento de fato das possibilidades das rádios na web.

O livro está organizado em doze capítulos, que apresentam ao leitor uma gama de pesquisas de alta qualidade teórico-metodológica e que reúnem uma diversidade de pesquisadores de diferentes origens, expressando a pluralidade de pensamento, orientação teórica e experiências vivenciadas com o fenômeno radiofônico, nacionais e internacionais.

Estudos comparados entre Brasil, Portugal e Espanha mostram a relação entre a educação contemporânea e a rádio na web, como importante apoio didático, combinando aulas, debates e formação on-line. Seguindo esta linha de pensamento, destaca-se na obra o artigo de Marcelo Mendonça Teixeira, Juan José Perona Paez e Mariana Gonçalves Daher Teixeira, que analisam a rádio web universitária como modalidade educativa e audiovisual em contexto digital, especialmente o caso da Espanha e Portugal, com duas experiências marcadamente bem sucedidas desenvolvidas pela Radio Universitária do Minho (RUM), em Portugal, e pela Radio uned (Universidade Nacional e Educação a Distância), na Espanha. Os autores enfatizam o baixo custo das rádios universitárias, comparado com outros meios. Neste mesmo artigo, destaca-se ainda a distinção entre diferentes modalidades de rádio educativa, tais como: emissoras de centros educativos, emissoras formativas, socioinformativas, programas educativos e “edu-webs” radiofônicas, as quais se configuram de forma bastante diferenciada das chamadas rádios comerciais ou generalistas.

As rádios comunitárias, objeto da atenção de Lílian Mourão Bahia, também cumprem um papel específico que, segundo a autora, tem fundamental importância na construção e no exercício da cidadania. A programação das rádios comunitárias em geral chama a atenção para temáticas de interesse da coletividade e inserem a comunidade no contexto dos municípios onde atuam. De tal modo, a relação estabelecida entre emissora comunitária e a própria comunidade é caracterizada pelo dinamismo da localidade, respeitando os sujeitos sociais locais e oferecendo oportunidades de aprender com as vivências de cada grupo social.

Aparentemente mais democrática que o aparelho hertziano, a web rádio é interessante, porém ainda exige um aparato tecnológico mais caro, isto é, o computador, como também requer certo domínio do software, algo inatingível para a maioria da população brasileira ou, dito de outro modo, ainda não há nada como o bom e velho radinho de pilha, cujos custos tendem a ser muito menores, embora do ponto de vista geográfico seja menos abrangente que a web, que permite ouvir a programação nacional e internacional de qualquer ponto fixo. O rádio convencional, neste aspecto, é limitado a frequência das ondas. Porém, distingue-se de outras tic pelo despojamento do sujeito frente ao aparelho, prendendo-o apenas pelo imaginário, uma vez que a programação pode ser ouvida em qualquer lugar, sem a necessidade de interromper tarefas cotidianas, proporcionando, não obstante, ao sujeito a reflexão, a formação de imagens mentais e o exercício da criatividade.

O que está em evidência no conjunto de artigos que compõem a obra, contudo, é o caráter educativo da radiodifusão, sua vertente mais democrática, de um lado, e seu potencial revolucionário, de outro. Seu potencial transgressor possibilita uma educação capaz de apontar caminhos para a superação das desigualdades sociais, oferecendo uma possibilidade de coesão social, articulada, obviamente com outras políticas públicas que visem a população historicamente excluída da apropriação de bens sociais e direitos que lhes são continuamente expropriados, em favor de um só grupo social, isto é, aquele que conduz a economia, a política e a cultura do país, agindo em seu próprio favor.

Indico a leitura desta obra para aqueles que têm em mente que a educação não ocorre apenas nos espaços restritos da sala de aula, mas também no campo, na lavoura, no canteiro de obras. Esse é o potencial eminentemente transgressor do rádio, que, no entanto, é pouco teorizado na pesquisa e pouco utilizado como componente didático nas escolas.

Olhar e ouvir o rádio de outra maneira, compreendendo-o como ferramenta complementar à educação formativa e informativa das pessoas, este é o desafio que a obra nos coloca. Não deixem de ler!

Magali Reis – Doutora em Educação e professora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS). E-mail: magali_reis@pucminas.br

Acessar publicação original

Escritos sobre educação/ comunicação e cultura – PRETTO (RF)

PRETTO, Nelson De Lucca. Escritos sobre educação, comunicação e cultura. São Paulo: Papirus, 2008. 240 p. Resenha de: OLIVEIRA, Rosa Meire Carvalho. Revista FACED, Salvador, n.15, jan./jul. 2009.

Escritos sobre educação, comunicação e cultura, de autoria do professor Nelson De Luca Pretto, doutor em Comunicação pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado em Londres, Inglaterra, foi editado em 2008 pela Papirus. De cunho aparentemente despretensioso, a obra reflete, no entanto, a militância do educador Nelson Pretto, que, com o próprio exemplo, demonstra como construir uma prática que defenda a atuação do professor como intelectual da cultura.

É essa perspectiva que vemos consolidada ao longo de todo o livro, que apresenta um conjunto de textos datados entre 1983 e 2006. São artigos – publicados ou não – e entrevistas em diversos órgãos de imprensa local e nacional, além de discursos e escritos de antigos panfletos. É por meio deles que vemos reiterados, não só o espírito transformador que tem animado as práticas acadêmicas, universitárias e do cidadão Nelson Pretto, mas as ideias que vêm consubstanciando ao longo de mais de duas décadas a que os textos nos remetem, a ação de um educador ocupado em transformar pela práxis, a realidade de processos vitais para a educação, a comunicação e a cultura.

O alcance dessa práxis é revelada nas 240 páginas do livro, que é dividido em sete partes. E como bem aponta o educador português António Nóvoa, a quem coube a apresentação da obra: “Nelson Pretto exerce um olhar crítico e obriga-nos a pensar para além das esquadrias habituais. Este livro não deixa ninguém indiferente.
Faz-nos pensar. Dá o que pensar. Não será esse o objetivo primeiro de um intelectual? E, ao mesmo tempo, convida-nos a agir. Não será essa a missão principal de um educador?” (p. 11), indaga.

Nóvoa observa não ser à toa que o livro começa com um texto de Paulo Freire para quem o ato de educar é um ato de comunicação. É dessa mesma estirpe que se revela Pretto em suas itinerâncias, ao trabalhar a perspectiva de aproximar a educação da comunicação, trazendo desde seus primórdios um novo olhar que recoloca os cidadãos, em primeiro plano, e os professores como mediadores de uma cultura estruturalmente tecnologizada, em um novo patamar de ação. É nesse sentido que Pretto constata: “[…] Imaginava e continuo imaginando – hoje mais ainda! – que um professor deve ser, antes de tudo, uma liderança comunitária e intelectual […] fazer o processo educativo algo questionador, que extrapole o espaço das edificações escolares, uma ação que ganhe, literalmente, o mundo”. (p. 13) Nesse sentido, ganha espaço entre as várias seções do livro princípios defendidos por Pretto que compreende os imensos desafios colocados aos professores nesses tempos de comunicação em redes digitais globalizadas, cuja internet é o marco, e da imensa distância entre a cultura escolar e a cultura produzida fora dos muros da escola. Para ele, há dois pontos “importantíssimos” a considerar: primeiro, que a rede traz a possibilidade de interação entre o local e o não-local, a partir da valorização da cultura de origem; depois, pela “ocupação” dos espaços midiáticos, sejam os tradicionais (jornal, televisão, rádio, etc.) ou das novas mídias (a internet) por parte da escola. “Temos, portanto, de fortalecer os nós de conexão, de forma a fazer com que local e não-local interajam em pé de igualdade. Por isso sempre digo que não queremos internet nas escolas, mas sim escolas na internet” (p. 39), diz.

A Educação pelos meios e para os meios (BELLONI, 2001), ganha assim nas ideias de Pretto em Escritos em educação, comunicação e cultura a atualidade necessária à compreensão crítica dos fenômenos mediáticos da contemporaneidade, especialmente aqueles que envolvem a Teoria da Cibercultura e sua aproximação com a Educação, quando marca bem a qualidade dos processos comunicativos em redes digitais, suas características e o imenso potencial que é oferecido aos professores como mediadores da cultura, na tarefa de produzir coletivamente conhecimento em sala de aula, em lugar de simplesmente reproduzi-lo.
Daí que, para Pretto, as tecnologias digitais promovem um novo modo de ser e de agir da sociedade e ampliam os desafios de professores em sua missão diária. “[…] Apropriar-se dessas tecnologias como uma mera ferramenta, do meu ponto de vista, é jogar dinheiro fora. Colocar computador, recursos multimídia e não sei mais o que para a mesma educação tradicional, de consumo de informações, é um equívoco” (p. 49), observa. Na defesa de uma educação que contemple o local e o não local, as culturas de dentro e fora da escola e as possibilidades dos professores como intelectuais da cultura, Pretto acredita ser necessário uma maior presença da escola nos meios de comunicação, não apenas como consumidor, mas como produtor de informação. “Precisamos preparar professores que trabalhem na formação de uma juventude que possa atuar de forma plena na sociedade. Não apenas como consumidora mais qualificada, mas como produtora. Esse é o desafio!” (p. 40) O livro Escritos em educação, comunicação e cultura é revelador, portanto, da práxis que anima o pensamento instigante do educador Nelson Pretto. Quem, como nós, acompanha de perto um pouco da dinâmica de seus processos, consegue enxergar na obra a sua alma de pesquisador, de intelectual envolvido com questões que lhe são caras, seja na possibilidade de intervenção discursiva, a partir de suas convicções externadas em suas diversas produções textuais, seja pela capacidade de ocupar espaços acadêmicos, universitários e sociais, como cidadão comprometido com processos de mudanças.

É assim que nas sete seções de Educação, comunicação e cultura essas itinerâncias se constituem e revelam as diversas facetas do irrequieto professor. “A atitude de Nelson Pretto é coerente com a perspectiva de um intelectual que questiona aquilo que “já sabe” para, assim, abrir caminho a novas possibilidades e novos desígnios”, observa António Nóvoa em seu prefácio. (p. 11) Na primeira seção do livro, intitulada Entrevistas e Discursos, é assim que Pretto surge a nos abrir novas possibilidades reflexivas em relação a temas como o avanço das tecnologias de informação e comunicação (TIC) e sua relação com a educação, a partir da criação da Rede Bahia – uma “perna baiana” da internet; o futuro da escola e as transformações exigidas nos métodos e modelos de ensino-aprendizagem impelidas pelas TIC, como a relação com as novas gerações de nativos digitais (ou geração alt tab); inclusão digital; e a construção de uma escola “sem rumo”. Esta buscaria dialogar com os complexos e rápidos processos de um novo tempo social, cultural e econômico, na tentativa de promover novas educações.

Sua base epistemológica ancorar-se-ia na pedagogia da diferença, em lugar de uma pedagogia da assimilação, com o firme propósito de eliminar o que Pretto chama de “apartheid social”.

Em Escritos: Educação, que intitula a segunda seção do livro, o autor agrupa os textos que considera mais voltados para a educação, publicados ou não em forma de artigos para jornais. É nesse espaço também onde aparece a forte veia política e ativista, de um intelectual preocupado com temas caros aos rumos da educação brasileira e baiana, como a formação de professores, as condições da escola e da Universidade Pública, especialmente da UFBa, seus problemas e sua expansão. São textos datados a partir de 1983, que traduzem a preocupação de Pretto com a qualidade das políticas públicas para a educação, dentre as quais aquelas relacionadas ao livro didático, assunto que por muito tempo ocupou as reflexões do autor.

A temática dos livros didáticos, inclusive, intitula a terceira seção do livro, chamada Educação: Livros Didáticos. A parte é formada por seis artigos escritos por ocasiões e fins diversos – um deles publicado em 1996 pelo jornal Folha de São Paulo – e resume a preocupação do autor com as políticas (ou sua falta) para o livro didático. O tom dos textos é sempre de perplexidade e denúncia, com reflexões envolvendo pontos como a falta de inclusão dos professores nos debates realizados pelo governo sobre a questão e as posturas dos editores, que estariam mais preocupados, segundo o autor, em termos de quantidade e não na qualidade do livro didático produzido no Brasil. “Sabíamos que um programa de governo teria de contemplar a questão da quantidade, mas considerando que a questão da qualidade era fundamental, ela teria que ser atacada com a mesma firmeza com que se atacou a questão da quantidade” (p. 129), sustenta no texto que prefacia o livro Que sabemos sobre o livro didático, editado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e publicado em 1989 pela editora da Unicamp. Na ocasião da pesquisa que resulta no livro, o autor ocupava a coordenação do órgão (1986/1987).

A Cultura: o cuidado com a cidade e as gentes é o título da seção quatro, que resgata a produção do autor no campo da cultura.

Editado em ordem cronológica de aparecimento dos textos em jornais baianos, especialmente em A Tarde, e de outros estados, além de orelha de livros – como é o caso de Homem satélite, texto escrito em 2000 e publicado em livro homônimo do professor Edvaldo Couto. Buscou-se uma articulação entre os textos que tratam das mais variadas abordagens, tendo como afirma o autor, um “enorme” vínculo com a educação. Em verdade, os textos, muitos em estilo de crônica, traçam uma espécie de visão do autor e seus vínculos com a cultura baiana.

A seção é aberta com uma crônica de uma viagem à cidade de Lençois (BA), em busca de uma certa Cachoeira Glass. Relata percalços e encontros inusitados, como aquele estabelecido com seu Biça. Também circulam por ali lembranças da apresentação da Banda Afro Olodum, no Circo Voador, do Rio de Janeiro, A lavagem (festa típica baiana) da localidade de Jauá, no litoral Norte de Salvador, entre referências a outras festas populares, entre outros aspectos da típica cultura baiana. São ao todo 15 crônicas da vida da cidade, repletas de baianidade, onde o autor não deixa de manifestar o amor à cidade – que adotou aos 11 anos com a mudança da família de Porto Alegre para a Bahia. Neste particular, a crônica Velhos tempos que não voltam mais homenageia a cidade onde viveu até os cinco anos, Joaçaba, em Santa Catarina.

Na quinta seção, três textos compõem a parte dedicada à Ciência e Tecnologia. O primeiro deles trata de Ciência e televisão, refletindo sobre o papel educativo da televisão, seja pública ou comercial. O autor reflete sobre o que são em verdade programas educativos e o surgimento dos mesmos na TV brasileira.
Num panfleto sobre o Globo Ciência, programa produzido pela Globo, Pretto faz uma crítica à qualidade do que se considera ciência, aludindo à espetacularização da ciência pela produção do programa. A seção é encerrada com artigo sobre a realização da Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Salvador.

A sexta seção, penúltima do livro Escritos em educação, comunicação e cultura, apresenta uma série de 22 artigos sobre a presença das tecnologias de informação e comunicação no mundo contemporâneo. O título A tecnologia da informação: e chegaram os bytes, traz embutido seu valor, especialmente memorial, por registrar o desenvolvimento da rede internet na Bahia, com a reunião de um consórcio para este fim, com a participação da UFBA, governos estadual e municipal, antiga Telebahia e órgãos e entidades do estado. No artigo intitulado A Bahia já caiu na rede, publicado em 18/5/1995 – primórdios da internet comercial no Brasil – Pretto informava: “Hoje nosso número de usuários gira em torno de dois mil. Já temos uma estrutura descentralizada como é a filosofia da internet.” (p. 177) Os textos abordam pontos de vista variados sobre o desenvolvimento das novas tecnologias de comunicação e informação (TIC), descrevendo avanços na comunicação digital e de sua relação com a cultura e a educação. Nesse último aspecto, que viria a se tornar objeto do pensamento e da reflexão de Nelson nos últimos 15 anos, o autor nessa seção, sustenta mais uma vez a filosofia de uma educação democrática e inclusiva. Cobra políticas de democratização e acesso às TIC, como a aplicabilidade dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), que prometia destinação de recursos oriundos das empresas de serviços de telecomunicações para financiar a ampliação do espectro de acesso dos brasileiros à internet.

“Conectar as escolas públicas à internet é o caminho para fortalecer a produção de conhecimento e de cultura das crianças, jovens, adolescentes, professores e comunidade (p. 197)”, sentencia.

É esse conjunto de reflexões que resume o livro Escritos em educação, comunicação e cultura, que se encerra com a sétima seção, intitulada Escritos Com…. A seção não recebe ares de conclusão, mas, ao contrário, insinua uma continuidade, seja nas parcerias que os textos apresentam, seja nas temáticas discutidas, temáticas essas que se mantêm atuais na agenda de reflexões daqueles que cotidianamente lidam com os “caminhos cruzados” da educação e da comunicação.
É esse compromisso que parece apontar Pretto, ao escolher para fechar o livro textos que demonstram sua opção por melhores rumos para a Sociedade da Informação, a formação de professores, a inclusão digital, novas educações com escolas e universidade sem rumos. Esta última bem aos moldes do que idealizava o companheiro de itinerâncias, professor Luiz Felippe Serpa, reitor da UFBa por dois períodos, em sua incansável defesa da pluralidade, diversidade e de novas educações, a quem homenageia postumamente ao longo do livro e em dois artigos nesta seção final.

Referências

_________ BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. 116 p.

Rosa Meire Carvalho de Oliveira – Doutoranda em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). E-mail: rosameire8@uol.com.br

Acessar publicação original

Canadian Society: A Changing Tapestry – BAIN et al (CSS)

BAIN, Colin; COLYER, Jill; NEWTON, Jacqueline; HAWES, Reg. Canadian Society: A Changing Tapestry. Toronto: Oxford University Press, 1994. 284p. Resenha de: MANDZUK, David. Canadian Social Studies, v.35, n.4, 2001.

Canadian Society: A Changing Tapestry is an appealing textbook that introduces secondary school students to the social sciences, in general, and human behavior and social trends, in particular. The book is comprised of nine chapters that cover the following broad areas: the human species; social behavior; human communication; the impact of culture; social institutions; alienation and conformity; aggression and violence; social issues; and, the future. The authors introduce each of the major issues explored in these chapters with key words and terms and conclude with relevant follow-up activities that involve skills like interpreting, analyzing, communicating, and synthesizing. In addition, each of these chapters concludes with a discussion of careers in the social sciences and active learning opportunities such as debating, observation, and research possibilities.

In my mind, three of the nine chapters are particularly relevant for secondary school students; they are Chapters 5, 6, and 8 on social institutions, alienation and conformity, and social issues respectively. Chapter 5, for example, addresses social institutions such as the Canadian school system, the Canadian justice system, and the Canadian military. Teenagers’ feelings about peer groups and family influences are also explored. Chapter 6 discusses the concepts of alienation and conformity. In this chapter, the authors examine how teenagers experience alienation in school and in the workplace and the social pressures that cause them to conform. In addition, the concepts of obedience and deviance are also examined.

I believe that one of the most engaging and extensive chapters is Chapter 8, which addresses social issues. Some issues that are examined are illegal drug use, family violence, and gun control. Bain, et. al. point out that social issues like these have a variety of solutions which are frequently incompatible with one another; in other words, if one solution is adopted, the others are automatically ruled out. The authors, for example, pose the dilemma of what to do with first-degree murderers. Some people believe that they should be rehabilitated while others believe that they should be executed; therefore, because people who have been executed obviously cannot be reformed, these solutions come into direct contact with one another. The authors use this scenario to argue that, in order to solve the important social issues of the day, we must follow a structured process. They go on to describe a detailed 12-step process for solving such issues.

In step 1, Bain, et. al. explain how to translate general concerns into defined problems. In step 2 students are asked to identify alternative solutions. In step 3 the students are expected to decide among the alternatives and develop criteria for evaluating them; and, in step 4 students are asked to rank the criteria according to importance. For example, criteria such as protection of society, reforming offenders, and financial cost to society are suggested when considering what to do with people who commit serious crimes. Step 5 involves another stage of the problem solving process where students begin to collect data using strategies such as content analysis, anecdotal notes, and focus groups.

Step 6 highlights organizing data using tools such as Venn and tree diagrams, classification charts, and cross-classification charts. Step 7 encourages the predicting of consequences. Step 8 focuses on forming conclusions; and, step 9 moves into assessing conclusions. The final stages of the problem solving process, steps 10 through 12, involve preparing, presenting, and evaluating conclusions.

Although I find this extensive process to be worthwhile, I wonder if it might be too lengthy given the audience for which it is intended. In other words, my hunch as an experienced teacher is that students would still gain an appreciation of the complex nature of social issues if the process were simplified. In spite of this criticism, however, I do believe that the authors are right on the mark with this approach to introduce the social sciences to secondary students. They have tried to make this text as relevant for Canadian readers as possible and they have tried to appeal to a younger audience by integrating cartoons and other visuals such as photographs, tables, and graphs. I strongly recommend this text for secondary schoolteachers who are interested in introducing their students to the social sciences in a balanced and thoughtful manner.

David Mandzuk – Henry G. Izatt Middle School. Winnipeg, Manitoba.

Acessar publicação original

[IF]

 

Contextos Estudios de Humanidades y Ciencias Sociales | UMCE | 1998

Contextos Estudos de Humanidades Análise de Discurso Crítica e Comunicação

Revista Contextos, Estudios de Humanidades y Ciencias Sociales (Santiago, 1998-) es una publicación semestral, editada de forma ininterrumpida por la Facultad de Historia, Geografí­a y Letras de la Universidad Metropolitana de Ciencias de la Educación desde 1998. Su principal misión es la difusión de trabajos en los que se discuta, analice y reflexione en torno a la literatura, lenguaje, filosofí­a, artes plásticas, música, comunicación, historia, geografí­a y semiología.

Periodicidade semestral

Acesso livre

ISSN 0717 7828 (Impresso)

ISSN 0719 1014 (Online)

Acessar resenhas

Acessar dossiês

Acessar sumários

Acessar arquivos

Pagu | Unicamp | 1993

Pagu3 Análise de Discurso Crítica e Comunicação

Cadernos Pagu (Campinas, 1993-), publicação quadrimestral interdisciplinar, tem como objetivo contribuir para a ampliação e o fortalecimento do campo interdisciplinar de estudos de gênero, dando visibilidade à produção realizada no Brasil e promovendo o intercâmbio de conhecimento internacional sobre a problemática. Publica artigos inéditos com contribuições científicas originais, que colaborem para a inovação teórica, metodológica e/ou agreguem conhecimento empírico inovador, e debates em torno de textos teóricos relevantes no campo dos estudos de gênero, viabilizando, assim, a difusão de conhecimentos na área e a leitura crítica da produção internacional.

Tem publicado contribuições das seguintes áreas: Antropologia, Sociologia, História, Ciência Política, Letras e Linguística, História da Ciência, Educação. Mais recentemente, também de áreas como Direito, Psicologia, Comunicação, Saúde Coletiva e Serviço Social. Estimula a publicação de artigos de diferentes áreas disciplinares, desde que estabeleçam uma discussão com as teorias de gênero e feministas, buscando articulações entre gênero e outras diferenças (raça/etnia, cultura, classe, idade/geração, sexualidade e outras). São bem-vindas contribuições em língua portuguesa, espanhola ou inglesa.

A publicação dos cadernos pagu iniciou-se em 1993 e desde então vem contribuindo para a constituição do campo de estudos de gênero no Brasil. A revista foi criada em um momento em que os estudos de gênero já contavam com alguma legitimidade acadêmica no país e a intenção era ampliar sua visibilidade, difundindo e estimulando a produção de conhecimento na área.

A criação do cadernos pagu foi resultado de mais de dois anos de leituras, pesquisas e debates, nos quais integrantes do Núcleo de Estudos de Gênero – Pagu mapeavam os avanços na produção sobre gênero e seus impasses. O primeiro número foi inteiramente redigido por integrantes do Núcleo, cujos artigos esboçavam essas inquietações. Entre o segundo e o terceiro número, a publicação redefiniu sua política editorial e, simultaneamente, abriu para contribuições de pesquisadoras/es brasileiras/os e estrangeiras/os. Para tanto, constituiu-se um corpo de pareceristas ad-hoc e foram criados o Comitê e o Conselho Editorial. A partir do quinto número, a revista contou com financiamento externo à universidade.

De fato, há dois momentos na história da publicação, visíveis em diversos aspectos da revista, que estão ligados à obtenção do apoio de diversas agências -FAPESP, FAEPEx (Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e à Extensão, da Unicamp) e, sobretudo, CNPq, que concedeu o apoio mais relevante em termos de recursos e de continuidade a partir de 1996. Esses financiamentos foram cruciais para o crescimento da publicação, não apenas no que se refere à melhoria da qualidade gráfica e à incorporação de maior número de textos, mas também à adequação às normas editoriais, à ampliação do Conselho Editorial, ao registro em diversos indexadores nacionais e internacionais.

Periodicidade quadrimestral.

Acesso livre.

ISSN 1809 4449 (Impresso)

ISSN 0104-8333 (Online)

Acessar resenhas

Acessar dossiês

Acessar sumários

Acessar arquivos

Estudos Feministas | UFSC | 1992

Estudos Feministas Análise de Discurso Crítica e Comunicação

A Revista Estudos Feministas, sediada no Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH) e no Centro de Comunicação e Expressão (CCE) da Universidade Federal de Santa Catarina, é um periódico indexado e interdisciplinar, de circulação nacional e internacional, e tem o objetivo de divulgar a vasta produção de conhecimento no campo dos estudos feministas e de gênero, buscando dar subsídios aos debates teóricos nessa área, bem como instrumentos analíticos que possam contribuir às práticas dos movimentos de mulheres.

A Revista Estudos Feministas foi criada em 1992, tendo sido inicialmente editada pela Coordenação Interdisciplinar de Estudos Contemporâneos da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Num segundo momento, o Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais e o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro assumiram a responsabilidade pela edição da Revista. A partir de 1999, passou a ser sediada pelo Centro de Filosofia e Ciências Humanas e pelo Centro de Comunicação e Expressão da Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente, está integrada ao Instituto de Estudos de Gênero, órgão que agrega pesquisadoras oriundas de distintas áreas de conhecimento e atuação da UFSC, tendo como denominadores comuns os estudos feministas e a perspectiva de gênero. [Foco e escopo em 2024]

A Revista Estudos Feministas (Florianópolis, 1992-) é uma revista trimestral indexada que circula nacional e internacionalmente, com o objetivo de divulgar textos cientificamente originais nos idiomas português, espanhol e inglês, na forma de artigos, ensaios e resenhas sobre gênero e feminismos que possam estar relacionados a um disciplina particular ou interdisciplinar em sua metodologia, teoria e literatura. Os artigos publicados contribuem para o estudo de questões de gênero e derivam de diferentes disciplinas: sociologia, antropologia, história, literatura, estudos culturais, ciência política, medicina, psicologia, teoria feminista, semiótica, demografia, comunicação, psicanálise, entre outras.

Trabalha em regime de rotação institucional desde 1992 e foi publicado pela primeira vez pela Coordenação Interdisciplinar de Estudos Contemporâneos da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Posteriormente, o Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais e o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro assumiram a responsabilidade pela edição da Revista. Desde 1999, o Centro de Filosofia e Ciências Humanas e o Centro de Comunicação e Expressão da Universidade Federal de Santa Catarina abrigam a revista. Atualmente, é incorporado ao Instituto de Estudos de Gênero, órgão que reúne pesquisadores de diferentes disciplinas [áreas de conhecimento e atividade] da UFSC, que têm como denominadores comuns os estudos feministas e as perspectivas de gênero. [Foco e escopo em 2020]

Periodicidade quadrimestral

Acesso livre

ISSN 0104-026X (Impresso)

ISSN 1806-9584 (Online)

Acessar resenhas

Acessar dossiês

Acessar sumários

Acessar arquivos