Let’s Misbehave. La naciente cultura de clase media. Modernización y cultura de masas en Chile 1919-1931 | Alejandro Osorio Estay

Las masivas jornadas de protestas iniciadas en octubre de 2019 y la crisis económica de 2020, producto de los efectos de la pandemia del COVID-19, son acontecimientos recientes que al unísono han puesto en la palestra a la clase media chilena. La prensa escrita y televisada difundió notables reportajes sobre los grupos medios y las dificultades que atravesaban por la falta de trabajo, el endeudamiento y la desprotección social. Lo interesante fue que nuevamente, como cada vez que aludimos a la clase media, aparecía la pregunta: ¿Qué es ser de clase media? Variados estudios y estadísticas han identificado a la clase media como un grupo social con cierto ingreso económico, nivel educativo y acceso al consumo, pero la clase media comprende un importante componente cultural que la distingue de los demás sectores sociales según su capital simbólico. En esta línea, el trabajo de Alejandro Osorio es una contribución valiosa para la historiografía chilena, porque ofrece novedosas respuestas a esta pregunta a través de una investigación bien documentada, amena y elástica que se hace cargo de los aspectos culturales que han conformado la clase media chilena desde inicios del siglo XX. Let’s Misbehave ve la luz en un escenario nacional idóneo y propone un relato que revela la mayor riqueza de la disciplina histórica, invitando al lector a desplazarse desde la actualidad a los albores del siglo pasado, identificando características propias de los grupos medios y cómo ellos fueron construyendo su identidad en una trayectoria histórica que también integra elementos políticos y económicos, pero por sobre todo culturales. Leia Mais

Makers of Democracy. A Transnational History of the Middle Classes in Colombia | Abel R. Lopez Pedreros

LÓPEZ PEDREROS Ricardo www youtube com Makers of Democracy
Retrato de Abel Ricardo / www.youtube.com

LÓPEZ PEDREROS Ricardo A Makers of democracy Makers of DemocracyEl libro de Abel Ricardo Lopez Pedreros, egresado de la carrera de Historia de la Universidad Nacional de Colombia, sede Bogota, y ahora profesor de la Western Washington University en Estados Unidos, busca reflexionar criticamente sobre la comun asociacion entre clases medias y democracia, pensando en los sectores medios de Bogota en las decadas de 1970 y 1980. Dicha asociacion es algo que hace tanto el pensamiento de derecha como el de izquierda, ambos exigiendole el deber ser de ponerse al servicio de la democracia, bien sea la liberal o la revolucionaria. Por clase media, Lopez Pedreros entiende no necesariamente un hecho social, mas bien, es el cruce entre condiciones existentes, racionalidades de poder —en terminos de clase y genero—, y la formacion subjetiva, a traves de las practicas y discursos. Desde esta propuesta, el autor construye en dos partes y 8 capitulos su reflexion critica. En la primera parte se centra en los discursos que delimitan y crean —hasta cierto punto— a las clases medias bogotanas de mitad del siglo pasado. En la segunda seccion mira las decisiones de actores concretos para conformar la identidad de esas clases.

Asi, el autor va mostrandonos las particularidades de nuestra democracia y por ende de nuestras capas medias, para verlas distintas, cuando no “bastardas”, de las europeas y norteamericanas. Esas capas, supuestamente, son simbolo de la lucha contra las oligarquias criollas y exigen una lectura de la sociedad no en terminos binarios de dos clases opuestas, pues hay una mas en la mitad. Las clases medias alimentan y son alimentadas por las pequenas y medianas industrias que reciben credito del Estado y de las agencias norteamericanas vinculadas a la Alianza para el Progreso, el famoso programa anticomunista lanzado en la presidencia de John F. Kennedy (1961-1963). Finalmente, en esa primera parte, las capas medias tambien estan vinculadas al sector de servicios o terciario, en el que se dan procesos de seleccion, segun estereotipos comunes de clase y genero. Leia Mais

O mito da grande classe média: capitalismo e estrutura social – PROCHMANN (TES)

POCHMANN, Marcio. O mito da grande classe média: capitalismo e estrutura social. São Paulo: Boitempo Editorial, 2014. 148p. Resenha de: CASTRO, Ramón Peña. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v.12, n.3, set./dez. 2014.

O redescobrimento das classes sociais representa uma mudança positiva, cada vez mais presente em descrições das novas estruturas sociais dos ‘centros’ e ‘periferias’ do capitalismo globalizado. Repare-se que até recentemente a categoria ‘classe social’ tinha desaparecido do léxico analítico referido à distribuição da riqueza e do poder, ocupando o primeiro plano as problemáticas de gênero, raça, etnia, religião, nacionalidade etc., cuja importância não deve ser subestimada, dada a persistência de odiosas formas de discriminação, desigualdade, violência e criminalidade.

Ao mesmo tempo, não pode ser considerado casual que esse cenário controverso coincida com o declínio das utopias históricas (derrubada do socialismo real e do Estado de bem-estar social, hoje idealizado) concomitante com a expansão da contrarrevolução neoliberal, por um lado, assim como a erosão dos paradigmas culturais através dos quais interpretamos a complexa realidade social, por outro lado.

É, justamente, este cenário controverso o que serve de inspiração para o livro de Marcio Pochmann que passamos a resenhar.

Dividido em quatro partes, cada qual composta de seções que abrangem 15 subtemas, o livro faz jus ao título, pois por sua leitura constatamos que a noção de ‘nova classe média’ não passa de uma construção quimérica do mercado político.

Na primeira parte, intitulada “Classe média em quatro tempos”, o eixo da exposição consiste em um diálogo entre conceituação sucinta das etapas de desenvolvimento histórico do capitalismo e a origem incerta de diferentes usos espaço-temporais do termo ‘classe média’. Concluindo com uma reflexão crítica sobre a extemporaneidade deste termo no Brasil, porque a “adoção”, escreve Pochmann, “de uma medida descontextualizada da base original da sua materialização pode se revestir apenas e simplesmente de um voluntarismo teórico inconsistente com a realidade, salvo interesses ideológicos específicos ou projetos políticos de reconfiguração da redução do papel [social do] Estado” (p. 45).

A partir deste último raciocínio parece pertinente pensar que a utilização descontextualizada do termo classe média, em substituição do termo classe trabalhadora, também serviria para incutir no ânimo dos trabalhadores a ideia de que seu vínculo unitivo não é o trabalho, mas sim o seu ‘novo padrão’ de consumo e o correspondente nível de rendimento, descolado da sua origem: a alienação da força de trabalho pelo capital. Por extensão, tudo isto implica a individualização e destruição das solidariedades de classe e das capacidades de (re)ação coletiva.

A segunda parte do livro, intitulada “Classe média: fatos e interpretação no Brasil”, contém uma argumentada exposição da origem e características do modelo fordista de desenvolvimento e da composição social do capitalismo avançado do segundo pós-guerra. Na sequência, examina as particularidades da industrialização tardia brasileira e sua relação com as condições de subconsumo da classe trabalhadora, derivadas da resistência das classes dominantes a admitir as reformas estruturais (‘civilizatórias’) que foram conquistadas (no período 1945/1975) pela esquerda político-sindical nos países desenvolvidos, sem que isso implicasse reversão da ordem capitalista. Pelo contrário, o atual processo de destruição acelerada do ‘Estado de bem-estar’ demonstra que as conquistas sociais, ligadas a essa denominação otimista (Estado de bem-estar), representam um fenômeno absolutamente excepcional na história do modo de produção capitalista.

Nesta segunda parte do livro, cabe destacar como uma linha de reflexão e debate em aberto a tese de Pochmann sobre “a combinação, na última década, de crescimento econômico brasileiro com distribuição de renda, o que permitiu a retomada da mobilidade social, especialmente aquela associada à base da pirâmide social” (p. 71), incluindo “ascensão dos trabalhadores pobres [no] projeto social desenvolvimentista” (p. 62-70).

Registremos alguns elementos que achamos importantes para compreender o alcance da reflexão de Pochmann sobre a presente trajetória econômica e social do Brasil:

  • Ampliação da base da pirâmide social com forte expansão do emprego, com três quartos dos novos empregos remunerados até l,5 salários mínimos;
  • Quase 40% de queda da pobreza em vinte anos: l988-2008 (p. 67);
  • Aumento de quase 80% do gasto social no PIB, em 25 anos: 13,3% em 1985 para 22,7% em 2010 (p. 66).
  • Incorporação ao ‘mercado de consumo barato’ de quase um quarto dos brasileiros, em que “parcela considerável da classe trabalhadora foi incorporada no consumo de bens duráveis, como TV, fogão, geladeira, aparelho de som, computador, entre outros” (p. 71).

Destacamos a sua própria conclusão: “esse importante movimento social”, escreve Pochmann, “não se converteu, contudo, na constituição de uma nova classe social, tampouco permite que se enquadrem os novos consumidores no segmento de classe média” (p. 71).

A terceira parte, intitulada “Cadeias globais de produção e ciclos de modernização no padrão de consumo brasileiro”, contém análise, assente em numerosos dados estatísticos resumidos em gráficos e tabelas, da dinâmica da economia política de consolidação do capitalismo monopolista transnacional e seus impactos nas estruturas sociais, especificamente no Brasil.

Fazendo um balanço das informações obtidas pela sua consistente exploração bibliográfica e elaboração estatística, Pochmann expõe com singular clareza as três principais razões explicativas da evolução histórica do grau de desigualdade no padrão de bens e serviços civilizados.

A primeira razão explicativa é a globalização como novo paradigma da produção das empresas transnacionais. Assente não apenas nas novas tecnologias, mas sobretudo em políticas neoliberais de liberalização dos mercados e privatização do setor público, assim como na ampliação da base de recursos produtivos, matérias e humanos, como decorrência da restauração do capitalismo na União Soviética, Leste europeu e China, principalmente. Essa enorme expansão geográfica dos mercados significou um aumento de l,5 para 3,9 bilhões do exército de força de trabalho fragmentada em estados competidores. Tudo isso tornou possível a produção massiva de todo tipo de mercadorias de baixo custo e sobre esta base a emergência das sociedades de consumo de baixo custo (low cost).

A segunda razão explicativa é a especificidade da inserção do Brasil na divisão internacional do trabalho, mostrada por meio da sucessão dos ciclos de modernização do padrão de consumo das distintas faixas de renda, ocupação setorial e grau de escolaridade, assim como a alteração sucessiva dos preços relativos. Trata-se de uma análise aprofundada de informação estatística abrangente, apresentada em tabelas e gráficos elucidativos.

A terceira razão explicativa da evolução das desigualdades, num sentido positivo, são as políticas sociais compensatórias, a bancarização de setores de menor renda, incluindo a expansão do crédito para consumo de bens duráveis e novos serviços. Na contraface dessas alterações encontra-se, sem dúvida, a mercantilização da vida e a financerização da sociedade.

Sabendo que a sociedade envolve muitas atividades e relações (de poder, de consciência, culturais, nacionais, sexuais, normativas etc.) que não concernem à Economia Política, o autor concentrou-se na temática da estrutura social, nitidamente transbordada da realidade por força do superdimensionamento fictício quando se fala de uma grande e nova classe média.

A quarta e última parte do livro concentra-se no exame da superação relativa da imobilidade social na primeira década deste século. Após a longa fase de regressão e estagnação da estrutura social das duas décadas anteriores, parece consolidar-se uma onda de novas ocupações e uma incerta política de rendas que visa à curva de distribuição da renda de 40% da população mais pobre. A identificação desses segmentos e o estudo da evolução geral da ocupação e do rendimento mostrariam, segundo Pochmann, sinais significativos da “volta da mobilidade social ascendente, sobretudo, na base da pirâmide social brasileira, que nada tem de nova, tampouco de classe média” (p. 139).

Ramón Peña Castro – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio,Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: rpena@fiocruz.br

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Os batalhadores brasileiros: nova classe média ou nova classe trabalhadora? – SOUZA (TES)

SOUZA, Jessé de. Os batalhadores brasileiros: nova classe média ou nova classe trabalhadora?. Editora UFMG, 2010, 354 p. Resenha de: TEIXEIRA, Marcia de Oliveira. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v.11, n.2, maio/ago. 2013.

Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
(Maria, Maria – Milton Nascimento)

Economistas e sociólogos debatem a emergência de uma nova fração da classe média no Brasil; para muitos, efeito das políticas de transferência de renda e acesso ao microcrédito, enquanto para outros, da estabilidade econômica. A contribuição de Jessé de Souza e da equipe do Centro de Estudos sobre Desigualdade ao debate é parte de um projeto de pesquisa de maior fôlego. Os batalhadores brasileiros: nova classe média ou nova classe trabalhadora?, somado a outras publicações, é uma tentativa de construir uma teoria de classes sociais para o Brasil contemporâneo. Para tanto, destaca a reprodução dos privilégios de classes e das desigualdades sociais duráveis, as dimensões simbólicas e não-econômicas constituintes da reprodução das classes, bem como a dinâmica entre relações fordistas e pós-fordistas em uma sociedade periférica.

O quadro interpretativo de Batalhadores foi construído no diálogo com Max Weber, Pierre Bourdieu, Bernard Lahire e Richard Senneth. Ele enfatiza o passado incorporado dos atores individuais e sua posição na compreensão prática do mundo, as disposições construídas e operadas em diferentes situações de vida; os contextos de socialização e de atuação significativos na trajetória de vida dos indivíduos de determinada classe. O diálogo ácido com Sérgio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro e Roberto DaMatta, aprofundado em outras publicações, não foi abandonado. O intuito é criticar as interpretações do Brasil assentadas na negatividade da herança ibérica, no personalismo, no patrimonialismo e na caracterização de uma modernidade incompleta.

Há um diálogo secundário com a produção etno-metodológica, com as concepções da teoria ancorada e com o interacionismo informando o desenho da pesquisa, a prática de campo e a análise das concepções de mundo formadas e operadas pelos batalhadores. Especificamente com relação à teoria ancorada, destaco o zelo pela empiria.

Um aspecto valorizado por Jessé de Souza (para contrapor-se à ideia da nova classe média no Brasil) é o fato de Batalhadores resultar de uma extensa pesquisa de campo. Entretanto, em nenhum momento o leitor conhece as condições de realização da pesquisa de campo, tampouco sobre os instrumentos de pesquisa. Pouco foi dito sobre a escolha das regiões, das cidades e sobre os entrevistados. A descrição das condições de realização da pesquisa fortalece o argumento, além de ser tópico obrigatório em face do quadro teórico-metodológico utilizado.

Ao contrário dos economistas, para Jessé de Souza as análises centradas na renda não permitem compreender os processos constitutivos das ‘classes sociais’ e suas fronteiras. Ele parte da economia política, privilegiando as dinâmicas entre as relações de produção e as classes sociais para construção de sua teoria sobre classes no Brasil. Essa opção é essencial para entendermos porque batalhadores não formam nova fração da classe média.

Classes sociais são constituídas por aportes ideológicos, éticos, morais, educacionais, compreendidos pela noção de cultura. Mas não é possível gerar uma teoria do processo de produção do mundo social (e sua compreensão pelos indivíduos) e da formação de classes centrada na matriz cultural. O desafio de Jessé de Souza é construir uma análise não hierárquica capaz de considerar os diversos fluxos entre as dimensões cultural e material.

Batalhadores distinguem-se, e, portanto, autorizam Jessé de Souza a reivindicar sua condição de classe, pela “pequena incorporação dos capitais impessoais mais importantes da sociedade moderna, capital econômico e capital cultural” (p. 327). A burguesia define-se pela reprodução de ambos, enquanto a classe média pela reprodução do capital cultural.

Como ‘renda’ não é um elemento delimitador de ‘classe’, observamos uma enorme diversidade entre os indivíduos caracterizados como ‘batalhadores’. Há ‘batalhadores empreendedores’ constituídos por pequenos comerciantes (lojinhas de garagem, barracas de rua ou em feiras, lojinhas de bairro e comunidades populares), donos de indústrias de pequeno porte (confecções, serralheria, carpintaria) e pequenos agricultores. De modo geral, são ex-trabalhadores rurais, ex-empregados do comércio ou do setor industrial, os quais perderam seu emprego por demissão ou fechamento das empresas. No caso das mulheres, o abandono dos maridos as transforma em única fonte de geração de renda da família. Há também os batalhadores ‘assalariados’ dedicados ao trabalho em pequenas e médias indústrias, vendedores, técnicos, profissionais do setor de serviços como telemarketing.

Jessé de Souza destaca mobilidade entre frações de classe e classes (batalhadores, empreendedores e ralé). Muitos depoimentos tratam de mudanças bruscas no nível de renda, acesso a trabalho permanente e a moradia. Mesmo os ‘batalhadores empreendedores’ não se afastam significativamente de situações de vulnerabilidade. Patrão ou empregado portam as mesmas marcas constitutivas da classe, a dinâmica das interações sociais, as visões de mundo e o modo de operá-lo e, principalmente, estão sujeitos às mesmas práticas de dominação do capital financeiro. O trabalho desempenha uma posição essencial na reprodução material e na concepção de mundo do batalhador.

É preciso compreender o mundo que autoriza o ‘batalhador’ a se reproduzir como classe. Para Jessé, não se trata do mundo dominado pelas sobrevivências coloniais ou por arranjos pré-capitalistas, tampouco pelo fordismo. Ao contrário, há uma correlação entre a emergência dos batalhadores e o processo de transição para o capitalismo financeiro. Processo de transição situado na periferia, na qual a produção fordista foi severamente excludente, mantendo parte da força de trabalho à margem. Ele explica assim o grande impulso que os batalhadores conheceram nos últimos anos. O mundo social dos batalhadores é formado por trabalhos flexíveis, pela provisoriedade de estratégias de vida, pela necessidade de adaptar-se rapidamente às condições de trabalho mutantes e a mercados reconfigurados por tendências da estação. Os batalhadores são efeito do processo de incorporação de trabalhadores pobres excluídos da sociedade fordista às novas formas de organização do trabalho e da produção.

Os batalhadores asseguram inserção no mundo do trabalho do capitalismo financeiro (como proprietário de pequenos negócios e/ou empregados) pela constituição de um conjunto de disposições, entre outras, para disciplina, autocontrole e pensamento prospectivo. Estamos lidando, por conseguinte, com uma classe social apta e pronta para trabalhar em jornadas extensas, em pequenos negócios realizados em ambiente improvisados, sem garantias e direitos trabalhistas; onde o dono e o empregado, em geral de uma mesma família, labutam lado a lado e estão sujeitos às mesmas condições de trabalho pouco salubres; onde as relações de trabalho e a produção são imprevisíveis, pois dependem de mercado de consumo de produtos sazonais, formados por consumidores de pequeno poder de compra, recentemente fortalecido pelos programas de transferência de renda, além da previdência social; onde muitos ‘patrões’ estão sujeitos a tornarem-se empregados pela escassez de créditos, mudanças bruscas no mercado de consumo, aumento da concorrência, ação da fiscalização. Digo que os batalhadores estão aptos e prontos porque possuem os conhecimentos práticos e intelectuais (disposição), além do potencial para desenvolvê-los, e admitem as condições do trabalho flexíveis. Eles (in)corporam essas condições como naturais, porque as relacionam com condições herdadas ou compreendem que por intermédio delas poderão assegurar para si e para sua família condições de vida mais dignas. Nos relatos, “condições de vida mais dignas” significam acesso permanente a trabalho, moradia, comida e educação. Os batalhadores não se afastam definitivamente de situações de vulnerabilidade, afastam-se apenas das mais extremas.

Para compreendermos a disposição para o trabalho dos batalhadores é preciso olhar com mais atenção os processos de construção e reprodução de concepção de mundo e das ‘disposições’. Jessé de Souza considera a religião como um dos elementos fundamentais na construção de mundo dos batalhadores e, nesse sentido, de sua reprodução como classe social no capitalismo periférico. A religião opera por intermédio das trajetórias exemplares (mescladas aos exemplos familiares); da valorização do trabalho árduo (‘trabalho duro’ no roçado, no pequeno comércio ou pequena oficina), no desenvolvimento e exercício de uma solidariedade com familiares, vizinhos e membros da congregação; na reprodução de uma concepção herdada de família; na valorização de atitudes em prol de uma vida melhor. Cabe aqui observar a conexão entre ‘vida melhor’ e futuro (inexistente na ralé). Para os batalhadores, projetar o futuro implica não voltar a viver situações de extrema vulnerabilidade. A concepção de mundo fruto da vivência religiosa (em uma ‘comunidade’ congregada em torno de uma igreja e seu pastor) associa-se às percepções forjadas na vivência prática em diferentes situações de vida regulada pelo trabalho.

A formação das dimensões éticas e morais essenciais ao trabalho duro nos batalhadores com origens rurais, notadamente no nordeste, estão imbricadas com ações de entidades ligadas à Igreja Católica. Nas periferias urbanas e, mais recentemente na região rural, as religiões pentecostais dominam. De fato, Jessé de Souza chama atenção para como religiões pentecostais, desde sua origem nos Estados Unidos da América na primeira metade do século XX, capturaram as demandas sociais e religiosas de migrantes do campo, trabalhadores da pequena indústria e do comércio das periferias urbanas.

Outro elemento constitutivo da concepção e interações sociais dos batalhadores é a família. Família e relações familiares que transcendem o modelo pais e filhos, cuja lógica de estruturação é o direito sucessório na propriedade do capital. Trata-se de famílias com configurações bastante diversas, mas firmemente amarradas pela valorização do ‘trabalho duro’, do compromisso com a manutenção da reprodutibilidade da própria família, o estímulo para investir na melhoria da educação, mas sempre conciliada com o trabalho.

A conclusão decepciona, mesmo considerando que o volume de dados exige prazos mais dilatados (necessidade que não é acompanhada pelo imperativo da publicação mais célere dos resultados). Mas ao final de 248 páginas de apresentação e análise de material empírico, o leitor espera mais do que uma retomada à crítica do livro A classe média brasileira: ambição, valores e projetos de sociedade de Bolivar Lamounier e Amaury de Souza. Esse livro é importante enquanto representativo de estudos comprometidos com ideologias de classes e partidos políticos. A crítica à incapacidade desses estudos colaborarem para a compreensão da dinâmica das classes sociais no Brasil na periferia do capitalismo financeiro era o ponto de partida de Batalhadores. A conclusão deveria retomar exatamente o projeto de produção de uma teoria original, apresentado na introdução, agora à luz dos dados sistematizados.

O trabalho de Jessé de Souza tem o mérito de preservar a complexidade das relações sociais e das interações entre classes (simplificadas ou desconsideradas por outros estudos). Mas é necessário aprofundar a análise dos fluxos e fronteiras entre a classe média, os batalhadores e a ralé; bem como ampliar os estudos empíricos para testar a capacidade explicativa do modelo proposto por Jessé de Souza. Será que ele seria diverso em espaços onde encontramos relações de produção fordistas e dinâmicas econômicas diferentes das encontradas no Norte, Nordeste e mesmo na zona da mata mineira?

Marcia de Oliveira Teixeira – Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: marciat@fiocruz.br

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A Sense of Their Duty: Middle-Class Formation in Victorian Ontario Towns.

HOLMAN, Andrew C. A Sense of Their Duty: Middle-Class Formation in Victorian Ontario Towns. McGill-Queen’s University Press: Montreal & Kingston, 2000. 265p. Resenha de: WILLIE, Richard A. Canadian Social Studies, v.38, n.2, p., 2004.

This is an important book about an elusive and neglected subject in Canadian social history. The Victorian middle class, everyone acknowledges, emerged at a time of rapid economic change in Canada and did so alongside various calls for significant political and moral reform. There is much more, however, to this story than the lingering characterization of the middle class as an amorphous, even shadowy, collection of overbearing respectables (p. ix), writes Holman. In his examination of the Ontario towns of Galt and Goderich between the 1850’s and 1890’s, he sets out to uncover this elusive group and finds them located in well-integrated and identifiable occupational roles, each exhibiting a sense of collective identity and a set of developing ideals. By focusing on businessmen, professionals and other white-collar workers who did not work with their hands, Holman reveals the processes by which each occupational group became aware of themselves as a distinct stratum in society and how the more public roles they played in defining an approach to volunteerism and in reinforcing the dictates of moral order, a role which they played along with their wives in Victorian Ontario, further assisted in securing their special place in society.

Holman rejects static structural analysis and conflict group approaches and instead adopts Anthony Giddens’ concept of ‘structuralism’ which is more directional than formulaic. This affords him, he argues, the necessary latitude to allow this social category the middle class to define itself against the distinctive characteristics of Canada’s unfolding demographic make-up and against the values of its unique political economy. By examining the workplace as an arena of stratification and as an incubator of attitudes towards types of work, he is able to suggest that while up to the 1850s and 1860s all kinds of work were equally laudatory and moral (p. 22), already subtle changes were underway. By the 1870’s a new perspective had arrived which drew perceptible lines between manual and non-manual labour (p. 26).

The most representative of this new perspective were the businessmen, local merchants, manufacturers and artisans, of small-town Ontario. In the case of Galt, success as a regional service and market centre combined with the positive character of the town’s businessmen in a Creightonesque sort of way, and provided them with the ability to claim an elevated authority for the commercial members of their occupational group. In Goderich, on the other hand, situational problems, chronic economic challenges and low credit ratings saw an insular and protective attitude develop among this business group. Relations with labour were also quite different in the two centres. In Galt, Holman found that constant labour strife and strong labour organizations actually contributed to strengthening the agendas and identity of middle class businessmen and their Board of Trade. Labour relations were less of a factor in Goderich. Galt businessmen, in particular, had come to believe that their special place in society arose from their being champions of community economic success.

A second and important element in Holman’s study were the brain workers whose main claim to special status and authority derived from their learnedness and occupational independence. Lawyers, doctors and clergymen each developed their own patterns of professionalism in Ontario which included educational institutions, professional associations, codes of ethics, and informal networks of fraternal value sharing. In this professionalization project, Holman again found that experiences differed in Galt and Goderich, but that lawyers in both towns enjoyed the greatest social prestige of all the professions. While their association with a legal culture that included the sanctity of courts and the rule of law made lawyers respected intellectual and moral arbiters in society, the emergence of industrial capitalism gave legal work and law offices greater utility. Interestingly, the locations of the county court houses powerfully influenced the local collective identity of lawyers. Lawyers in Goderich, which had a courthouse, were more prominent in community life than those in Galt, which had no courthouse. In the case of medicine, this period witnessed a medical practitioners’ monopoly organizing to exclude alternate methods (homoeopathy) while at the same time gaining greater control of education, innovation, and hospitals. Medical practitioners competed for control in both towns. In Galt the battle was much more prolonged and pronounced simply because of the pressure, created from the start, of having a wider variety of practitioners and methods available. In Goderich, Holman found that the greatest challenge to medical practitioners came from itinerant physicians. Differences between Galt and Goderich similarly resulted in the clergy in each centre having to meet various professional challenges with non-uniform patterns of response.

Holman is perhaps at his best when he identifies this nascent middle class project among white-collar workers. As commercial, government, and professional clerks these employees aspired to become middle class on the basis of their non-manual work. They received salaries rather than wages and their proximity at work to their employers, who were established middle class claimants in the community, allowed them to indulge their often-youthful anticipation of temporarily occupying a stepping stone on the way to greater prominence. Holman notes regrettably, that the entry of women into this segment of the workplace resulted in white-collar work losing its value for many young men. A generalized anxiety or fear of never rising also hampered the project for many of these in-between men and motivated many, according to Holman, to seek opportunities of advancement elsewhere.

Having obtained a measure of authority in their respective communities by virtue of the work they performed, members of this emerging middle class began to broadcast their values regarding personal deportment and social responsibility primarily through the agency of voluntary organizations devoted to charity, fraternalism and self- improvement. That these associations were visible, gendered, exclusive, and adhered to rules of order in their meetings, allowed members to reflect and to model the ideals of social order that the towns’ growing middle class valued. In both towns, work of benevolence, Holman argues, was mainly overseen by women while fraternal orders restricted membership to men, thus ensuring that proper spheres were maintained. Self-improvement societies had fewer gender boundaries and general social aims. The YMCA, for instance, sought especially to direct young men away from immoral temptations towards purposeful pastimes and to provide training grounds for cultivating the appropriate behaviours the middle class expected.

According to Holman, by the 1870s middle class interest in the cause of temperance reform in Ontario had shifted as this emerging class latched on to the cause as a means to powerfully effect societal change. Earlier in the century, those concerned over alcohol abuse had defined the problem as one of individual character deficiency. Increasingly, however, reformers from this class saw the problem as society’s moral failing and they therefore championed change as a collective response to both the danger it imposed and the negative impact it had on persons and families; they especially supported legislative remedies required to curb it. Holman is quite correct about the shift in thinking he describes, however, his view that this change was largely due to the influence of the middle class is not as developed or persuasive as it might have been since his conclusion is more asserted than systematically proved. His study also begs, but does not answer, the question of whether genuine advocacy of reform in this area was perhaps more gendered than he might suggest.

Class identity was also formed and reproduced inside the home. The ideal middle-class male was expected to be a public beacon of proper deportment in his personal conduct as well as a family man; his wife was thought of as the jewel of the home. In private as in public, the middle class cultivated an ideal image of belonging to a class set apart by its prescribed behaviours from the vulgar rich above them and barren poor below. Manners, grooming, dress, speech, carriage, and respectable recreations were all included as aspects of the self-control that the progeny of middle class parents were expected to mirror and exhibit.

In A Sense of Their Duty, Holman accurately describes an important time of class formation in Victorian Ontario and explains some of the structural and ideological mechanisms involved in the change. His book will be a necessary addition to all post-secondary libraries containing sections on Canadian studies or history.

Richard A. Willie – Concordia University College of Alberta. Edmonton, Alberta.

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