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Diálogos: Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade no Campo Historiográfico / Ofícios de Clio / 2018
Atualmente, a pesquisa historiográfica abrange o trabalho com uma diversidade de objetos e temas – tais como as Artes Visuais, a Literatura, os Estudos de Gênero – que também são, antes de tudo, campos autônomos do conhecimento. Além disso, o historiador recorre frequentemente a áreas como a Antropologia, a Teoria Literária ou as Ciências Sociais, com os quais dialoga constantemente.
Longe de ser apenas uma tendência recente, a questão da interdisciplinaridade parecenos uma questão fundamental para a historiografia, já que o diálogo com outras áreas do saber tem sempre acompanhado o fazer historiográfico. Seja através das chamadas “ciências auxiliares”, que acompanharam o desenvolvimento da historiografia tradicional do século XIX – como a arqueologia, numismática ou heráldica – ou por meio das propostas de diálogo estabelecidas pelos Annales, com a economia ou a antropologia; o historiador constantemente se vê em um diálogo com outras áreas do seu conhecimento. Com as expansões e renovações pelas quais passaram o campo historiográfico ao longo do século XX só vieram ampliar tais perspectivas interdisciplinares, colocando a História em discussão com os Estudos Culturais, as diversas Linguagens, ou mesmo com as relações entre homem e natureza.
Mais recentemente, apresenta-se ainda o debate em torno da transdisciplinaridade, ou seja, a constituição e produção de conhecimento que ultrapassa as fronteiras tradicionais entre as disciplinas, constituindo campos tais como as Teorias de Gênero, com os quais a historiografia contribui significativamente, mas também se enriquece.
Partindo disso, apresentamos o dossiê Diálogos: Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade no Campo Historiográfico que reúne trabalhos dedicados a pensar as possibilidades e os desafios motivados pela interdisciplinaridade e transdisciplinaridade entre a História e suas áreas afins.
Iniciamos esses diálogos por meio do trabalho de Valeska Oliveira Ferreira, graduada em História pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro, intitulado A ficção e a narrativa como desafios ao uso da literatura como fonte histórica: contribuições da teoria da história para o debate, que busca tecer suas reflexões em torno das relações entre História, Literatura e Narrativa. O texto retoma autores como Hayden White e Paul Veyne, cujos trabalhos estiveram no centro do debate em torno da ficcionalidade e da validade da narrativa histórica, desenvolvido, principalmente, nas décadas de 1970 e 1980. Além disso, nos instiga ao diálogo com Roger Chartier, Michel Certeau e Jörn Rüsen a fim de pensar a questão da Literatura e da ficionalidade na historiografia. A autora busca pensar, especialmente, sobre as especificidades da questão da narrativa nos âmbitos ficcional e historiográfico, pretendendo abordar algumas das contribuições da teoria da história para este debate.
A questão da escrita da história e da ficção e também é o foco do texto Diálogos entre Teoria e Literatura: a escrita de Freud, da autoria de Larissa de Assis Pimenta Rodrigues, mestranda pela Universidade Federal de Outro Preto. Neste trabalho, busca-se investigar as possibilidades suscitadas por uma escrita da história calcada em uma abordagem interdisciplinar, pensada, neste caso, a partir das reflexões de Sigmund Freud. Valendo-se das reflexões de Michel de Certeau e da noção de ficção teórica desenvolvida por Freud – recurso literário utilizado no relato de casos clínicos através da composição de contos que articulam ficção e teoria psicanalítica – o trabalho investiga as possibilidades de se interpretar e depreender traços culturais ou aspectos subjetivos de uma época a partir de tais escritos. Para a autora, a ficção teórica permite que nos aproximemos dos valores e da produção de sentido de uma época ou sociedade.
Já o trabalho intitulado Entre a História, a Literatura e a Bibliografia: a Interdisciplinaridade da História do Livro, nos propõe pensar sobre as relações interdisciplinares existentes no campo da História do Livro, que se constituiu a partir de reflexões das áreas da História, da Bibliografia e da Literatura. Nesse trabalho, as autoras Bruna Braga Fontes, mestranda em História / USP, e Verônica Calsoni Lima, doutoranda em História / USP, buscam construir um panorama sobre as perspectivas e metodologias envolvidas no trabalho de pesquisa que abordam o livro enquanto objeto, pensando a sua materialidade. Para isso, recorrem especialmente às correntes historiográficas anglo-saxãs e francesas como o centro do foco de análise. As autoras ainda destacam as contribuições de outras disciplinas para a construção desse campo de estudo.
Por fim, em Possibilidades e Perigos da Etno-história, a partir da contribuição de Maíra de Mello Silva, graduanda em Antropologia da Universidade Federal de Pelotas, nos aproximamos de uma perspectiva antropológica da História, A pesquisadora buscou pensar a Etno-história a partir das teorias descoloniais, elaborando uma revisão crítica da bibliografia relativa a Etno-história. Além disso, a prática da alteridade é proposta aqui como mediadora das perspectivas teóricas e metodológicas trabalhadas.
É com grande satisfação que apresentamos essas reflexões na Revista Discente Ofícios de Clio, buscando contribuir com os diálogos sempre tão ricos e necessários entre a historiografia e as demais áreas do conhecimento.
Boa leitura!
Thiago Destro Rosa Ferreira – Doutorando em História / Universidade Federal de Uberlândia.
FERREIRA, Thiago Destro Rosa. Apresentação. Revista Discente Ofícios de Clio, Pelotas -RS, v. 3, n. 4, jan./jun., 2018. Acessar publicação original [DR]
História e biografia: aproximações, desafios e implicações teóricas no campo historiográfico / História da Historiografia / 2012
“A distinção entre biografia e história é tão antiga quanto a historiografia grega”. A frase sintetiza o estudo célebre em que Arnaldo Momigliano (1971) demonstra como tal diferenciação originária, ao contrário de interditar, possibilitou as relações de proximidade e / ou de distanciamento entre ambas. Na conformação da história e da biografia como gêneros discursivos, entre a Antiguidade clássica e a atualidade, tal distinção tornou-se uma de suas decorrências, carreando consigo debates e tensões acerca de suas idiossincrasias e interseções.
Se, por um lado, a biografia por vezes carregou o estigma – ou, quem sabe, a virtude – de se apresentar como uma narrativa híbrida ou “bastarda”, como ponderou Virgínia Woolf e outros que apostaram no valor cognitivo de narrativas vivenciais, no alvorecer do século XX; por outro, como sabemos, a história não perdurou como modalidade discursiva “pura” e inalterável, desde que começou a ser escrita entre os antigos. Leia Mais