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Ensino de História: fundamentos e métodos | Circe Maria Fernandes Bittencourt
Circe Bittencourt | Imagem: BM Comunicação
Ensino de História: fundamentos e métodos, escrito por Circe Bittencourt, é um livro que trata da atividade docente no Ensino Fundamental sob os pontos de vista histórico, epistemológico e metodológico (História e Pedagogia). Sua quinta edição foi lançada em 2018 e conserva o mesmo objetivo de 2004: subsidiar a formação inicial e continuada dos professores da escolarização básica e dos docentes do ensino superior, formadores dos futuros licenciados em História.
O livro faz sucesso desde a primeira edição. No site Resenha Crítica, a avaliação da obra é o post mais consultado neste ano de 2021, entre os, aproximadamente, 6.000 disponíveis (resenhas e apresentações de dossiês de artigo). São, em média, 50 acessos semanais (Bueno; Urban, 2019). No Google Acadêmico, a quinta edição já ultrapassou a marca das 2000 citações. É uma pena que depois de tantos ganhos empresariais, políticos e acadêmicos, essa versão, publicada em 2018, venha a público com as mesmas imperfeições detectadas há mais de uma década.
Ensino de História: fundamentos e métodos – BITTENCOURT (REH)
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. 5ed. São Paulo: Cortez, 2018. BUENO, Dioury de Andrade; URBAN, Ana Claudia. Resenha de: . Revista de Educação Histórica, Curitiba, n. 19, p.83-87, jul./dez., 2019.
Mestre e Doutora em História Social (1993) pela USP, Circe M. F. Bittencourt é professora de pós-graduação na Faculdade de Educação da mesma instituição onde pesquisa a respeito da preservação de documentos da história escolar e compõe a organização do Centro de Memória da Educação da FE/USP. No mais, suas pesquisas se relacionam com o ensino e aprendizagem de História e com a trajetória do livro didático no Brasil. O livro “Ensino de História: fundamentos e métodos” faz parte da Coleção Docência em Formação a qual busca contribuir para a formação inicial e contínua dos professores. Em sua 5ª edição de 2018, Bittencourt busca trazer reflexões em relação ao ensino de História, dividindo sua obra em três partes: a 1ª Parte consiste em um debate sobre a própria ideia de disciplina bem como sua trajetória ao longo do tempo dentro da educação;a 2ª Parte aborda de maneira teórica e metodológica as ciências que respaldam a História escolar, partindo de uma conceitualização sobre a historiografia e as diferentes vertentes relacionadas com o ensino e a aprendizagem de História;a 3ª Parte expõe os dilemas com os materiais didáticos como mediadores na relação entre ensino e aprendizagem, trazendo discussões sobre os materiais considerados tradicionais e os ditos inovadores, respaldados pela produção historiográfica e teorias de aprendizagem. Cada capítulo traz sugestões de atividades que, segundo a autora, tem o intuito de estimular os professores à maiores debates em sala de aula ou em sua formação continuada.
O questionamento “O que é disciplina escolar?” abre o primeiro capítulo da obra, apresentando uma discussão sobre diferentes pontos de vista em relação ao que consiste uma disciplina escolar, seja uma “Transposição didática”, assim denominada por Yves Chevallard como uma adaptação do conteúdo da academia para transmitir ao aluno ou como uma ciência própria ancorada na em sua própria epistemologia. Assume-se então que a disciplina escolar é uma produção coletiva das instituições de ensino e com isso, o método não deve ser a única preocupação, entrando em discussão também o que se ensina e o que se deixa de ensinar. Nessa esteira, o ensino de História entra em discussão com seus conteúdos e metodologias, sendo apontadas pesquisas que retratam, a partir da década de 1980, um caráter ideológico da disciplina em questão, como também contradições das histórias e problemas epistemológicos. Nesse ponto, Circe Bittencourt apresenta um breve percurso da disciplina nas escolas brasileiras, com suas características e influências a partir do contexto social, político e econômicos que passamos. Primeiramente, entre o século XIX e XXI, o ensino de História foi marcado pelo patriotismo e civismo exacerbado, a fim de querer garantir uma homogeneização da cultura com um predomínio de uma visão eurocêntrica. Após o final da década de 1930 com a criação do Ministério da Educação, houve maior centralização nas tomadas de decisões e os conteúdos escolares de maneira geral, começaram a passar por normas mais rígidas. Nesse sentido, houve uma consolidação do enaltecimento dos “heróis nacionais” e a memorização no processo de aprendizagem começou a tomar cena ao passo em que testes eram utilizados como medidores de sucesso escolar: “Aprender era memorizar.” (BITTENCOURT, 2018, p. 52)
A mecânica da memorização começa a ceder ao passo em que resistências a essa metodologia começam a surgir, dando abertura para os Estudos Sociais e os “métodos ativos” com o intuito de integrar o aluno na sociedade, e com isso, ter como ponto de partida o aluno. Entretanto, dava-se maior importância à técnica do que ao conteúdo, exigindo do professor uma neutralidade no ato de ensinar, tomando como referência disciplinas exatas, como a Matemática. Posteriormente, com a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais em 1996 pelo MEC, o ensino foi destinado para a grande massa populacional e com isso exigiu-se adaptação dos conteúdos escolares. Com influência de outros países, o Brasil busca atender camadas sociais antes não favorecidas pela educação ao passo que a elaboração dos PCNs foi seguida pelo debate de uma base nacional, a atual BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Bittencourt ressalta a influência das avaliações em larga escala na elaboração desses currículos enfatizando as grandes influências políticas/econômicas que pressionaram essas mudanças.
Como então, selecionar o que estará presente nas discussões em sala de aula? Esse é o questionamento que abre a 2ª parte do livro, a partir do qual Bittencourt faz breves reflexões a respeito das tendências historiográficas presentes no cotidiano escolar. Primeiramente a ideia de História como narrativa, foi influenciada ferrenhamente pelo positivismo o que trouxe a ideia de um passado cristalizado. Após essa onda, os conteúdos começam a fundamentar-se em questões sociais e não apenas econômicas, o que, paralelamente, foi acompanhada de um movimento que defendia a História social, que abarcava discussões em relação à macro e micro cultura. De acordo com Bittencourt (2018) após essas tendências a História do tempo presente entra em voga. A autora aprofunda-se um pouco mais na discussão dos conteúdos escolares baseados no cotidiano e na história local.
Ancorando-se nos pressupostos psicológicos que norteiam a educação, Bittencourt resgata brevemente as concepções e os confrontos entre Piaget e Vygotsky ao passo em que evidencia suas influências para o ensino de História. Posteriormente, apresenta as concepções de tempo e espaço e sua construção no intelecto humano, noções consideradas indissociáveis nessa perspectiva. A autora retoma a defesa de Piaget no que tange a necessidade de uma maturação biológica para a compreensão do tempo, o que já havia causado uma “postergação” no ensino de História antigamente.
Como esses conceitos (tempo/espaço) são pilares no ensino de História, Bittencourt (2018, p. 174) afirma que:
Um dos objetivos básicos da História é compreender o tempo vivido de outras épocas e converter o passado em “nosso tempo”. A História propõe-se reconstruir os tempos distantes da experiência do presente e assim transformá-los em tempos familiares para nós.
Com isso é posto a importância do espaço em consonância com as ações humanas o que leva Bittencourt a discursar sobre a metodologia do estudo do meio como uma possibilidade a ser seguida em sala de aula a fim de se afastar do método tradicional extremo de ensino e trilhar práticas interdisciplinares para enriquecer as aulas de História. Marc Bloch, Fernand Braudel e Le Roy Ladurie são alguns pesquisadores citados que utilizam do meio ambiente para suas pesquisas e trabalhos pertinentes ao ensino de Históriae que contribuem para a interdisciplinaridade e compõe um grupo de pensadores que trabalham na vertente de práticas de ensino de História ambiental.
O patrimônio cultural entra em voga na medida em que o estudo do meio passa a ser compreendido como uma metodologia rica para ser trabalhada em sala de aula. A ideia de se utilizar dos bens culturais, seja material ou imaterial, passa por debates acerca de qual memória está sendo lembrada e qual tem sido esquecida. De acordo com Bittencourt há um compromisso educacional das escolas perante o patrimônio cultural num sentido de preocupação com os bens locais que são referência de identidades múltiplas para os alunos.
A 3ª e última parte da obra aborda as concepções e usos dos materiais didáticos, especialmente nas aulas de História. Os livros acabam sendo o objeto de discussão num primeiro momento onde é entendido como um material didático mais evidente nas escolas e que demanda dos professores um posicionamento político em suas escolhas. Se, é apoiando-se nos livros que professores e alunos muitas vezes percorrem um ano letivo, acaba sendo ele determinante para a formação do indivíduo ao final de seus estudos. Com isso, Bittencourt deixa claro o livro como um objeto cultural e político, o qual também sofre influências do mercado corporativo no que toca a produção e venda em massa desses materiais para as redes de ensino.
Uma proposta de análise dos livros didáticos é mencionada, o qual divide o método em três partes: uma análise da forma que o livro é apresentado; uma análise do conteúdo histórico escolar que evidencia as correntes historiográficas e demanda uma explicação sucinta dos fatos históricos; uma análise dos conteúdos pedagógicos onde, a partir das atividades propostas, evidencia-se as concepções de aprendizagem e os objetivos propostos para os alunos naquele livro. Como ponto de partido, o livro é posto como um veículo que carrega ideologias e difunde saberes de maneira branda. Como grande ponto de apoio de professores e alunos em sala de aula, o uso dos manuais deve ser cauteloso.
A última discussão do livro é referente ao uso de documentos, escritos e não escritos, como fontes históricas para os debates em sala de aula. Bittencourt submetidos pelos professores e posteriormente pelos estudantes, a fim de habilitar os alunos para verbalização e escrita de suas concepções dos materiais apresentados. No mais, a utilização de materiais não escritos também devem estimular senso crítico no aluno, seja a partir de uma visita em museu, a apresentação de fotografias e produções cinematográficas ou músicas devem estar articulados com o ensino de História na mesma medida em que o planejamento de um professor esteja aberto para as análises dos estudantes em relação a esses materiais.
Dioury de Andrade Bueno – Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná. Bacharel em Administração pelo Centro Universitário OPET e licenciado em Pedagogia pela UFPR. Professor na Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de Curitiba e Fazenda Rio Grande. E-mail: diouryab@hotmail.com
Ana Claudia Urban – Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal do Paraná – Setor de Educação. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação, do Mestrado Profissional em Ensino de História e Professora de Metodologia e Prática de Docência de História. E-mail: claudiaurban@uol.com.br
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