Fronteiras e Sociedade (II) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2012

Com planisférios, atlas, cartografia com paisagens e manuscritos produzidos na Europa em tempos modernos nascia uma nova forma de representar espaços políticos com temáticas voltadas para as ocupações humanas e seus territórios, integrando populações e fronteiras. Na busca por imagens para explicar as partes que formam o globo terrestre, foi possível dar ideia sobre uma unidade envolvendo continentes, ilhas, oceanos, pessoas e culturas distintas. Rotas e caminhos marítimos ligaram sociedades de Norte a Sul e de Leste a Oeste com participação de múltiplos canais de informação. A rota marítima para as Índias encontrada por Vasco da Gama, em 1497, foi possível graças ao esforço de muitos conhecimentos, incluindo o do navegador e piloto muçulmano Ahmed ibn Majib, com quem ele saiu de Malindi, na costa oriental da África para chegar a Calicut (Thrower, 2002: 73). Ao contrário, portanto, da ideia de uma cartográfica moderna como resultado de estudos e ações de apenas homens europeus, ela resulta de conhecimentos de diferentes povos e culturas que passaram a ser registradas por conquistadores, corsários e cientistas dos tempos de Colombo e Cabral. Uma cartografia da soma de conhecimentos resultantes de relações antigas e modernas, constituídas por formas de ocupar e representar espaços e ações humanas incluindo formas de diferentes partes do mundo.

As descrições narrativas de conquistadores, pilotos e escrivães, entre outros, partiram de observações sobre a natureza e seus habitantes e passaram a fazer parte das mudanças ocorridas no mundo moderno europeu envolvendo os espaços alcançados com navegações pelos oceanos. A carta de Pêro Vaz de Caminha sobre o “descobrimento do Brasil” é um exemplo sobre uma das primeiras narrativas enviadas ao rei Dom Manuel, em Portugal, para dar conhecimento sobre os feitos da expedição liderada por Pedro Álvares Cabral. Sendo o rei o leitor principal a quem se destina a carta escrita em 1500, Caminha constrói texto informativo sobre a viagem, os nativos, os animais e a flora que encontra, descrevendo o que vislumbra com poucas dúvidas. O eixo central escolhido pela Revista Clio para os dois volumes de 2012, com dossiê Fronteiras e Sociedade, permitiu a reunião e seleção de artigos e resenhas para divulgar alguns dos mais recentes trabalhos de pesquisadores no campo da história social e política que reportam diferentes períodos da história. Trata-se de artigos de pesquisadores com exercício de análise sobre espaços e territórios com suas fronteiras e paisagens que se utilizam de diferentes áreas do conhecimento como o da história, o da antropologia e o da geografia.

Seguindo as diretrizes de M. Santos e J. B. Harley, entre as quais um território representa espaços e sistemas de objetos que podem ser lidos como textos, o segundo volume do dossiê Fronteiras e Sociedade se inicia com seis artigos dedicados a diversas realidades espaciais e temporalidades: Stephanie Caroline Boechat Correia se debruça sobre a África centro-ocidental no séc. XVII, em “Nas fronteiras da cristandade: as missões como baluartes dos impérios europeus na África centro-ocidental”; Christine Rufino Dabat investiga a atuação do engenheiro francês Henrique Milet em “A produção de açúcar nas fronteiras da modernidade: o percurso de Henrique Augusto Milet (Pernambuco, século XIX)”; algumas facetas dos conflitos entre indígenas e a sociedade colonial / nacional em áreas de fronteira do Nordeste brasileiro podem ser encontradas em “Nas fronteiras da sociedade envolvente: políticas indigenistas na província da Bahia nos anos de 1820 e 1860 – comarcas do sul e extremo oeste”, de André de Almeida Rego, e em “Do litoral aos sertões de Ararobá de Pernambuco: fronteiras, poder local e sociedade na América portuguesa (1762-1822)”, de Alexandre Bittencourt Leite Marques; Jonas Moreira Vargas, por sua vez, investiga “Os charqueadores de Pelotas, o comércio de carne-seca e as suas propriedades na fronteira com o Uruguai (século XIX)”; e Patrícia Genovez, Vagner Valadare e Thiago Santos se debruçam sobre “Entre as fronteiras do poder, do cotidiano e da narrativa: a experiência da realocação da ‘nova’ Itueta”.

Na secção dedicada aos artigos livres temos cinco estudos que tratam de várias questões relacionadas à história da África – “Moçambique e o fim do tráfico atlântico no século XIX”, de Diego Zonta – e do Brasil: “Coerção e controle: a educação superior no Brasil durante a ditadura civil-militar (1964-1988)”, de Jaime Valim Mansan; “A Gênese da Editoração Protestante no Brasil: o circuito de difusão das publicações (1830-1920)”, de Micheline Reinaux de Vasconcelos; “Memórias trajadas: roupas e sentimentos no diário íntimo de uma prostituta”, de Ivana Guilherme Simili; e “A Zona da Mata Pernambucana e a Serra Gaúcha: apontamentos sobre a estrutura fundiária em meados do XIX”, de Cristiano Luís Christillino.

Este número da Clio conta ainda com duas resenhas: Tissiano da Silveira resenha a obra “O Alufá Rufino: tráfico, escravidão e liberdade no Atlântico Negro (c.1822 – c.1853)”; já a obra coletiva “Cultura, identidade e território no Nordeste indígena: os Fulni-ô”, é resenhada por Edson Silva.

A organizadora externa seus agradecimentos a todos aqueles que colaboraram para a consecução deste volume.

Bartira Ferraz Barbosa


BARBOSA, Bartira Ferraz. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.30, n.2, jul / dez, 2012. Acessar publicação original [DR]

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Fronteiras e Sociedade (I) / Clio – Revista de Pesquisa Histórica / 2012

Os artigos recolhidos neste volume são resultado do trabalho de organização e edição de professores da gestão 2012 e 2013 da Pós-Graduação em História, em continuação aos esforços dedicados por editores, conselheiros e pareceristas ad hoc em edições anteriores, desde 1973. A seleção feita para este volume, cujo dossiê intitula-se Fronteiras e Sociedade, apresenta textos de historiadores nacionais e internacionais organizados em duas secções de artigos e ainda uma secção de resenhas.

A opção de organizar um dossiê com tal temática obedeceu a uma dupla preocupação. De um lado, abrir-se para um debate que permitisse transitar pela história e as áreas disciplinares que lhe são afins com mais abertura e profundidade. De outro, possibilitar que estudos historiográficos possam refletir acerca da formação das diversas fronteiras que nos cercam: na sociedade, na política, na cultura, na economia.

Na secção Artigos do Dossiê os temas referem-se à história da América Latina e à história do Brasil. Com reflexões sobre a escravidão no Caribe, Sidney W. Mintz apresenta o artigo “A escravidão e a ascenção de campesinatos” e Izaskun Álvares Cuartero, o artigo “De españoles, yucatecos e indios: La venta de mayas a Cuba y la construcción imaginada de una nación”. Sobre populações em fronteiras na America do Sul, o dossiê apresenta quatro artigos: o de Maria Cristina Bohn Martins “As Missões de Pampas e Serranos: Uma experiência de fronteira na Pampa argentina”; o artigo de José Luis Ruiz-Peinado Alonso, “Entre aguas e fronteras de la Amazônia”; o artigo de Elizabeth Zamora Cardozo, intitulado “Mundos de Frontera: La frontera norte de México y La frontera Colombo-venezuelana. Una Mirada”; e o artigo “Navegação e Limites: Peculiaridades de uma província fronteiriça”, de Ana Claudia Martins dos Santos.

Compõem ainda o dossiê, um artigo que aborda questões relativas aos sertões nordestinos, de Maria Ferreira, “Conexões e Fronteiras de uma Rede de Sociabilidades: Sertão de Pernambuco – 1840-1880”; e outro sobre parte da história dos anos 30, “As várias fronteiras de um líder: Juarez Távora, o Norte e a construção do herói no imediato pós-30”, de Raimundo Hélio Lopes.

Na secção dedicada aos artigos livres apresentam-se cinco estudos, que tratam de várias questões relacionadas à história do Brasil: “A Arte das Corporações de ofícios: As irmandades e o trabalho no Rio de Janeiro colonial”, de Mônica Martins; “Autonomia e Separatismo” de Maria Beatriz Nizza da Silva; “Quando brigam as comadres sabem-se as verdades. Elite provincial e as origens do Partido Parlamentar de 1853”, de Suzana Cavani Rosas; “Os protocolos das modernizações urbanas na história recente da cidade do Recife”, de Luís Manuel Domingues do Nascimento; “Uma cidade (in)civilizada: elite, povo comum e viver urbano em Campo Grande (décadas de 1960-70)”, de Nataniél Dal Moro; e “História e educação: o processo civilizador em Norbert Elias”, de Severino Vicente da Silva e Claudefranklin Monteiro Santo.

Este número traz ainda três resenhas: “La cambiante memoria de la dictadura: discursos públicos, movimientos sociales y legitimidad democrática”, por Diego Omar da Silveira e Isabel Cristina Leite, “‘Foi assim que conheci meu avô…’: Autobiografia da criança que nascerá para ser carpinteiro”, por Ivaneide Barbosa Ulisses e, finalmente, “O Mundo em 2050: Como a Demografia, a Demanda de Recursos Naturais, a Globalização, a Mudança Climática e a Tecnologia Moldarão o Futuro”, por Ana Maria Barros.

Agradecemos a todos os colaboradores que contribuíram com este volume, especialmente à Professora Christine Rufino Dabat e aos estudantes José Marcelo Ferreira Marques Filho e Raíssa Orestes Carneiro, que juntos traduziram o texto do Professor Sidney W. Mintz.

Bartira Ferraz Barbosa


BARBOSA, Bartira Ferraz. Apresentação. CLIO – Revista de pesquisa histórica, Recife, v.30, n.1, jan / jun, 2012. Acessar publicação original [DR]

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