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Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação – KENSKI (Bo)
KENSKI, V. M. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas: Editora Papirus, 2012. 141p. Resenha de: ASSIS, Luciana M. Elias de. BOLEMA, Rio Claro, v.29, n.51, p. 428-434, abr., 2015.
Em seu livro, Vani Moreira Kenski aborda a relação entre educação e tecnologias utilizando uma linguagem acessível para que, além dos estudantes e profissionais da educação, outros leitores de diferentes áreas, interessados pelo tema, possam compreender conceitos e questões relacionados à educação e às tecnologias.
A autora trata o tema educação e tecnologias de forma abrangente, buscando elucidar, historicamente, os sucessivos avanços tecnológicos ao longo dos tempos, destacando seus reflexos na educação. O livro é composto de seis capítulos e, ao final, apresenta algumas questões relativas a cada capítulo, além de um glossário de nomenclaturas específicas utilizadas na obra.
No primeiro capítulo, Kenski busca situar as relações existentes entre os avanços tecnológicos e as alterações de seus usos nas sociedades em diferentes épocas, pautando-se no conhecimento, no poder e nas tecnologias. Inicia sua abordagem enfatizando que, desde tempos antigos, o homem já utilizava as tecnologias de sua época, garantindo um processo crescente de inovação através de materiais mais potentes, o que possibilitou, para povos mais desenvolvidos tecnologicamente, o domínio e o acúmulo de riquezas.
Ao relacionar presente e passado, Kenski salienta que a relação de ampliar domínios e acumular riquezas não mudou e pode ser retratada através das grandes potências mundiais como, por exemplo, dos países e corporações multinacionais que se preocupam em manter e ampliar poderes políticos e econômicos, investindo grande parte de seu orçamento em pesquisas de inovações para garantir sua hegemonia.
Há, também, uma relação entre educação, poder e tecnologia feita na indicação de que o meio cultural familiar de uma pessoa determina seu comportamento de forma similar ao modo com a escola exerce seu poder em relação aos conhecimentos e ao uso das tecnologias. Nesse contexto, a escola representa o espaço de formação de todas as pessoas, possibilitando o domínio de conhecimentos necessários para uma melhor qualidade de vida das pessoas. Com a evolução das tecnologias, as qualificações profissionais são alteradas, bem como a forma com que as pessoas vivem, informam-se e comunicam-se.
Por fim, Kenski conceitua tecnologia de duas formas distintas: por meio da relação existente com técnicas e equipamentos; e por meio das novas tecnologias, levando em conta o conceito de inovação.
No capítulo 2, intitulado Tecnologias também servem para informar e comunicar, a autora discorre sobre as TICs para a produção e propagação de informações e, ainda, sobre as novas tecnologias de informação e comunicação, as NTICs, conceituando-as por meio da linguagem oral, da linguagem escrita e da linguagem digital.
Assumindo o fato de que as TICs provocaram mudanças radicais ao convergir para uma nova tecnologia, a digital, Kenski apresenta as redes, citando a internet como sendo o “espaço possível de integração e articulação de todas as pessoas conectadas com tudo que existe no espaço digital, o ciberespaço” (KENSKI, 2012, p.34)
Relata que o avanço das tecnologias digitais define poderes baseados na velocidade de acesso às informações disponíveis nas redes. Além disso, apresenta exemplos concretos de inovações tecnológicas destacando as mudanças que ocorrem socialmente, nas relações econômicas, políticas, financeiras, educacionais e culturais, resultantes do uso intensivo das tecnologias digitais.
No capítulo 3, intitulado Tecnologias também servem para fazer educação, a autora procura estabelecer a relação entre educação e tecnologias, focando a socialização da inovação, ressaltando que “a presença de uma determinada tecnologia pode induzir profundas mudanças na maneira de organizar o ensino” (KENSKI, 2012, p. 44). Como exemplo, associa mídias e educação, uma vez que as tecnologias como a televisão e o computador provocaram novas mediações entre a abordagem do professor, a compreensão do aluno e o conteúdo veiculado, isto é, a imagem, o som e o movimento oferecem informações mais realistas em relação ao que está sendo ensinado. Acrescenta ainda que, mais importante do que as tecnologias e os procedimentos pedagógicos mais modernos, é a capacidade de adequação do processo educacional aos objetivos que levam as pessoas ao desafio de aprender. Nessa direção, traz exemplos de novas formas de aprender apoiando-se nas redes digitais, cuja dinâmica e capacidade de estruturação colocam os participantes de um determinado momento educacional em conexão, aprendendo e discutindo coletivamente de forma igualitária.
No que tange os espaços coletivos do uso educacional, Kenski enfatiza a necessidade de manutenção e segurança por parte das instituições de ensino, a fim de se evitar um colapso em suas atividades online. Para tanto, faz algumas considerações sobre experiências em que o uso das mídias digitais permite a jovens autodidatas da nova geração digital facilidades de acesso às informações disponíveis nas redes para pesquisar e aprender o que lhes interessa. Além disso, faz críticas quanto ao uso inadequado da tecnologia no âmbito educacional, utilizando exemplos de projetos de ensino pouco eficazes, de profissionais despreparados para o uso pedagógico das tecnologias, de projetos de educação a distância oferecidos via broadcasting1 e de cursos a distância em bases digitais que não levam em conta as especificidades educacionais e comunicativas, não atendendo às necessidades de aprendizagem dos alunos.
No capítulo 4, A educação serve para fazer mais do que usuários e desenvolvedores de tecnologias, explora a “contradição existente na educação escolar que forma cientistas, pesquisadores e desenvolvedores de tecnologias, mas que também forma usuários e os que se colocam contra o seu bom uso na educação” (KENSKI, 2012, p.9)
Segundo a autora, a escola é a instituição social de maior importância, pois em todos os momentos de mudanças sociais fornece a escolaridade mínima que permite a uma pessoa o letramento necessário para mantê-la atualizada e informada quanto à utilização das informações disponíveis. Faz uma reflexão sobre a função da escola na sociedade atual que, segundo ela, consiste em garantir aos alunos-cidadãos a formação e aquisição de novas habilidades, atitudes e valores na chamada Sociedade da Informação2. Cita, como exemplo, o Livro Verde, documento em que são apresentadas as bases para a discussão de um novo projeto social em todas as áreas do conhecimento, afirmando que, em relação à educação, deve-se “considerar um leque de aspectos relativos às tecnologias de informação e comunicação. A começar pelos papéis que elas desempenham na construção de uma sociedade que tenha a inclusão e a justiça social como uma das prioridades” (TAKAHASHI, 2001, p. 45 apud KENSKI, 2012, p.65).
Apresenta exemplos de projetos e propostas de ensino, mediadas pelas TICs e realizadas em sistemas públicos de ensino, evidenciando o quão criativo e dinâmico pode ser o processo educacional em redes, e analisa o centro do processo educativo nesse contexto, indagando se é o conhecimento, o aluno ou são as tecnologias. Outro ponto interessante presente nesse capítulo é a apresentação de como se deu a trajetória da educação, desde o final do século XX até os dias atuais, focando as diferenças entre a educação a distância e a educação presencial, principalmente na forma em como ambas foram e são ofertadas. No que concerne à educação a distância, a autora faz uma associação da possibilidade de deslocalização espaçotemporal possível pelas novas tecnologias digitais, sobretudo, a internet. Para compreender a educação a distância, caracterizada pelas mídias digitais, isto é, utilizando e-mails, fóruns, chats, tele e videoconferência, por exemplo, apoia-se em Jacquinot (1993), que analisa a questão da distância em educação a partir de cinco aspectos diferentes: o geográfico, o temporal, o tecnológico, o pisicossocial e o socioeconômico. Por fim, esclarece dúvidas sobre as diferentes terminologias utilizadas para a realização de projetos educacionais por meio das tecnologias digitais, por exemplo, educação online, educação a distância e e-learning, além de apresentar certas características da educação a distância.
No capítulo 5, intitulado Das salas de aula aos ambientes virtuais de aprendizagem, a autora fala em como as TICs são utilizadas em atividades de ensino, destacando o uso do computador e da internet ao citar os cursos de autoaprendizagem. Nesses cursos, o computador desempenha o papel de professor eletrônico através de programas tutoriais que funcionam como livros. Cita, ainda, cursos oferecidos em cbt (computer based training) e wbt (web based training), que treinam os alunos com base na resolução repetitiva de exercícios. Para Kenski, essa forma de utilização das TICs baseia-se em uma visão tradicionalista de ensino, na qual o aluno e o contexto em que ocorre a educação não são levados em conta.
Para discutir o grau de interação em atividades educativas, a autora apoia-se em Moore (2004), que apresenta o conceito de distância transacional com o qual tematiza a distância física e comunicativa que toma lugar em sala de aula. Moore considera que a aprendizagem será mais significativa quanto maior for o grau de interação e comunicação entre os participantes do processo. A exemplo disso, visando obter o máximo de aproximação nas atividades realizadas a distância, por exemplo, Kenski cita Romero Tori (2002):
Enquanto vemos muitos cursos tradicionais sustentando-se única e exclusivamente na proximidade natural de suas aulas presenciais, a educação mediada pelas tecnologias não para de evoluir e de criar condições para a efetiva redução de distâncias. Esse avanço tecnológico pode ser utilizado não apenas em cursos a distância, mas em cursos presenciais (TORI, 2002 apud KENSKI, 2012, p.89).
Nesse contexto, Kenski discute possibilidades que podem ser utilizadas tanto no ensino presencial como no ensino a distância, concluindo que o uso intensivo de tais possibilidades fortalece a interação comunicativa e a relação entre ensino e aprendizagem. Comenta sobre as mudanças de percepção sobre as TICs no ambiente escolar, usando como exemplo a inserção do computador quando isso ocorria de forma isolada, considerando-o como mais um equipamento similar à televisão, ao retroprojetor e a outros recursos utilizados nas atividades pedagógicas nas escolas. Com o passar do tempo, após o aparecimento de programas e softwares, os professores e alunos foram treinados de modo a, no contexto de atuação dos professores e de interesse dos alunos, planejarem projetos para a inserção dessas tecnologias nas atividades de ensino. Além disso, os CDs, DVDs, programas interativos, enciclopédias, imagens e sons tornaram o computador um recurso para auxiliar nas pesquisas e trabalhos diferenciados, surgindo novas demandas, inclusive a realização de projetos interdisciplinares.
Entretanto, para a autora, o grande salto entre educação e tecnologias acontece em um terceiro momento, com as possibilidades de comunicação entre os computadores e o surgimento da internet, quando se possibilitou o acesso à informação em qualquer lugar do mundo, ou seja, o ensino mediado pelas tecnologias digitais redimensiona os papéis de todos os envolvidos no processo educacional.
No contexto atual, Kenski afirma que a sala de aula é redesenhada pela evolução tecnológica em um novo ambiente virtual de aprendizagem. Nesse viés, menciona os ambientes virutais de aprendizagem, apoiando-se em Derrick Kerckhove (1999), que caracterzia os ambientes virtuais de aprendizagem como o “modelo idealizado de processo de aprendizagem cooperativo, característico da sociedade digital”. (KERCKHOVE, 1999 apud KENSKI, 2012, p.95)
Kenski cita exemplos de ambientes virtuais de aprendizagem brasileiros como o Teleduc, Aulanet e, ainda, alguns que são de propriedade de empresas e universidades estrangeiras. Explica ainda, de forma detalhada, como ocorre o funcionamento do Teleduc (desenvolvido no Brasil pelo Nied – Núcleo de Informática Aplicada à Educação da Unicamp), bem como suas ferramentas. Para encerrar o capítulo, faz uma reflexão e propõe questionamentos sobre o papel e a função a serem desempenhados pelas nossas atuais escolas e pelos seus professores e alunos, diante das novas realidades educacionais evidenciadas pelo uso das TICs e dos ambientes de aprendizagem.
No último capítulo, Caminhos futuros nas relações entre novas educações e tecnologias, Kenski apresenta uma reflexão sobre as novas gerações caracterizadas por jovens que, desde muito cedo, utilizam meios digitais para todos os fins tendo forte influência no futuro da escola e da educação de modo geral. Comenta como os jogos eletrônicos contribuem para desenvolver certas habilidades e raciocínios nos alunos, a exemplo do espírito de equipe, da escrita e do desenho realizado com ambas as mãos, das capacidades sensoriais e da percepção de determinados aspectos em um ambiente amplamente variado. No âmbito escolar, tais competências e habilidades desenvolvidas pelos alunos podem contribuir para uma educação com novos desafios, exigindo da escola uma reorganização curricular e pedagógica. A autora comenta, também, sobre escolas reais em espaços virtuais, ou seja, formas híbridas e interativas de uso das tecnologias digitais incorporadas em tipos de aparelhos que contenham telas, transformando-os em espaços virtuais de aprendizagem em redes. Faz uma reflexão a respeito do futuro das relações entre a educação e as tecnologias no Brasil, discutindo questões que envolvem a democratização do acesso às tecnologias digitais, como é o exemplo dos softwares livres que “dão origem a comunidades para o desenvolvimento partilhado de programas, objetos de aprendizagem, bibliotecas virtuais e arquivos temáticos em todas as áreas do conhecimento, para o uso nas mais diferentes situações, incluindo o ensino” (KENSKI, 2012, p. 124). Faz, ainda, uma discussão sobre como será a garantia de fluência tecnológica para todos os brasileiros no futuro, enfatizando a necessidade em investimentos em equipamentos, pesquisas permanentes para atualização das tecnologias e uso intensivo de vários tipos de tecnologias, programas e softwares. Ressalta que a escola, nesse contexto, precisa ser vista a partir de uma nova mentalidade, exigindo mudanças em sua estrutura e seu funcionamento, bem como necessita de uma ampla reformulação curricular. A autora encerra o capítulo, fazendo um alerta de que a maioria dos países transformaram a educação em prioridade nacional e que, no Brasil, mudanças já ocorrem no movimento cotidiano de professores, alunos e das pessoas em geral que acessam os novos espaços virtuais de interação, comunicação e aprendizagem, devendo as escolas incorporarem, o quanto antes, essas mudanças no cotidiano de seus cursos.
O livro de Vani Moreira Kenski é uma leitura obrigatória não somente para os interessados em compreender as questões atuais relacionadas com a educação e o uso das mais novas tecnologias, mas também para profissionais de todas as áreas que necessitam compreender o olhar dos jovens que estão, desde muito cedo, inseridos em uma sociedade cuja linguagem predominante é a digital.
Acreditamos que, quando bem utilizadas, as ferramentas virtuais podem trazer inúmeros benefícios para o ensino e a aprendizagem. Entretanto, não basta utilizá-las de forma adequada sem considerar a necessidade de um novo fazer, ensinar e aprender quando tratando das novas gerações. É preciso considerar as novas tecnologias como essenciais no âmbito escolar aos aprendizes dessa nova geração, tornando claro qual papel desempenharão diante do compromisso com a educação e com o futuro da nação, atrelados às transformações sociais cotidianas.
Não podemos deixar de ressaltar uma das conclusões de Kenski ao mencionar que, seja qual for o grau de ensino, as escolas precisam acordar e incorporar os novos movimentos voltados para a tecnologia digital em seus cursos ou, como diz Umberto Eco (2003), ficarão estagnadas e condenadas à obsolescência.
Referências
ECO, U. Alguns mortos a menos. O Estado de São Paulo. Editorial, 10/2008, 2003. JACQUINOT, G. Apprivoiser la distance et supprimer l’absence? Ou les defies de la formation à distance. Revue Française de Pédagogie. Paris, n.102, p.55-67, jan./fev./mar. 1993. KENSKI, V. M. Educação e Tecnologias: o novo ritmo da informação. 8ª ed. Campinas, SP: Papirus, 2012. KERCKHOVE, D. Inteligencias en conexion. Hacia una siciedad de la web. Madri: Gedisa, 1999. MOORE, M. Teoria da distância transacional. Trad. Wilson Azevedo. 2004. Disponível em: <www.abed.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=23 &sid=69&UserActiveTemplate=2ing>. Acesso em 20 de fev. de 2004. TAKAHASHI, T. Livro verde da sociedade da informação no Brasil. Disponível em: <www.socinfo.org.br/livro_verde/download.htm>. 2001. Acesso em: 20de fev. de 2004. TORI, R. A distância que aproxima. Revista Brasileira de Aprendizagem Aberta e a Distância. Disponível em: www.abed.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/s tart.htm?infoid=608&UserActiveTemplate=1por, 2002. Acesso em: 26 de mar. de 2002.
Notas
1 Broadcasting é uma modalidade em que o professor fala em rede para centenas de alunos que estão nas mais diferentes regiões (KENSKI, 2012, p. 57). 2 Fruto da associação do desenvolvimento científico e tecnológico, sobretudo da indústria eletroeletrônica ao processo de globalização econômica (KENSKI, 2012, p. 64).
Luciana M. Elias de Assis – Mestre em Matemática pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Docente da Faculdade de Ciências Exatas e Tecnológicas do Campus Universitário de Sinop da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Sinop, MT, Brasil. E-mail: lucianam@unemat-net.br
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