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Liberalismo, constitucionalismo e Parlamento: a revolução de 1820 | Almanack | 2022
O juramento de obediência à Constituição pelo príncipe D. Pedro, no Real Teatro São João (atual João Caetano), no Rio de Janeiro | Desenho aquarelado de Félix-Émile Taunay. Museu Hisórico Nacional
Repensar a memória dos acontecimentos marcantes da História constitui um exercício de rever os “lugares”, onde ela efetivamente se materializou, por meio de indivíduos, processos e práticas que se compuseram como seus símbolos e representações mais marcantes.7 Portanto, todas as datas que definem grandes comemorações devem ser pensadas não apenas como a celebração de uma efeméride, mas como a possibilidade de um novo desafio para a sua revisitação à luz dos estudos historiográficos do presente, possibilitando o surgimento de novas abordagens e perspectivas de análise.
Nesse sentido, insere-se o dossiê Liberalismo, constitucionalismo e Parlamento: a revolução de 1820, trazendo à tona temas que possibilitem analisar um período que foi fundamental para a entrada do Império português na política moderna.8 Justifica-se tal afirmativa porque foi naquele contexto da revolução liberal, iniciada no Porto em agosto de 1820,, continuada em Lisboa em setembro e propagada no Brasil em 1821, que se produziu uma grande mudança política, conhecida pela historiografia ibero-americana como Triênio Liberal (1820-1823)9 . Apesar de não ser uma conjuntura plenamente vitoriosa, ela possibilitou o surgimento de novas linguagens, novos vocabulários e imaginários que anunciavam um tempo de rutura e de aceleração10, indicando a proposta de uma ordem liberal e constitucional, legitimada na vontade e na soberania da nação e dos povos e, não mais, na “figura simbólica do rei” ou em uma ordem imemorial sancionada por Deus11. Os atores históricos, que vivenciavam aquele momento, preocupavam-se com um imaginário político e social que não se ancorava nas experiências e nos ensinamentos do passado, que davam sentido ao seu mundo, mas vislumbravam a possibilidade de uma perfectibilidade do homem e de uma crença no progresso. Leia Mais
Arte, política e cultura | Almanack | 2021
Detalhe de capa de Alponse Mucha: msterworks | Alphonse Mucha, 2007
Os registros visuais e audiovisuais de eventos, personagens e processos históricos relacionados às Independências e à formação de identidades nacionais nas Américas, vem merecendo o estudo e questionamento de pesquisadores brasileiros e estrangeiros.
As imagens, para além das representações e sentidos que lhes são atribuídos por seus autores, possuem enorme capacidade de gerar efeitos, de promover e propor intervenções sociais, o que alarga os circuitos de produção, circulação e atualização em que geralmente são inseridas. É fundamental, então, reconstituir e contextualizar historicamente não só as práticas artísticas e formais de que são o resultado mais aparente como, sobretudo, sua dimensão narrativa e o peso por ela desempenhado na construção e introjeção de conceitos e interpretações sobre as “comunidades imaginárias nacionais”, como as denominou Benedict Anderson, forjadas no Brasil e na América, desde o século XIX5. Leia Mais
Pactos políticos en Iberoamérica | Almanack | 2021
La invasión de Napoleón a la península ibérica y los sucesos que siguieron fueron coyunturas propicias para instalar en el escenario peninsular e iberoamericano un novedoso repertorio de soluciones políticas. La crisis abierta en 1808 impulsó cambios inusitados. Como es conocido y ha sido profusamente estudiado la necesidad de reformular los pactos entre los monarcas, sus reinos y sus súbditos, estuvo asociada a las posibilidades y alcance de la gobernabilidad de sus territorios. En el caso lusitano, la corona decidió cambiar la localización de su centro político desplazándolo al continente americano, concretamente a la ciudad de Rio de Janeiro en el Brasil. El caso español fue diferente. El ingreso de las tropas francesas a España dio lugar a la vatio regis, un hecho insólito que obligó a replantear las bases de sustentación de la monarquía.
Los acontecimientos referidos produjeron amplios movimientos en el seno de las sociedades iberoamericanas que comenzaron a cuestionar las nuevas bases de los poderes instituidos. A partir de formatos conocidos, aunque reformulados en el marco extraordinario de principios del siglo XIX, los cabildos abiertos, las proclamas o las peticiones, por citar algunos ejemplos, fueron recurrentes. En el espacio hispanoamericano, las novedosas experiencias políticas que habían inaugurado las revoluciones de finales del siglo XVIII se replicaron, al mismo tiempo que aparecieron nuevas prácticas como es el caso del pronunciamiento cuyos contenidos y formalización fueron muy diversos.5 Aunque su marco legal puede ser cuestionado, el estudio de estas prácticas, del vocabulario utilizado y de la sociabilidad que generaron permite mostrar su papel real en el debate político. Leia Mais
Fronteiras e relações transfronteiriças na América Ibérica / Almanack / 2021
Fronteira do Brasil com a Venezuela | Foto: Poder 360 |
As fronteiras e as relações transfronteiriças nas sociedades ibero-americanas, tema deste dossiê da revista Almanack, coloca em evidência algumas dificuldades no campo dos estudos históricos que sobre elese debruçam. Primeiro, o caráter polissêmico do próprio conceito de fronteira, principalmente quanto se tem em conta seu uso para diferentes objetos, situações e temporalidades, e sua relação com outros conceitos igualmente importantes para o estudo do espaço, como paisagem e território. Segundo, o recorte interdisciplinar em sua abordagem, tendo em vista as substanciais contribuições da outras ciências sociais, como a geografia e a antropologia, para seu estudo. Por fim, a ampla produção propriamente historiográfica que trata sobre os espaços concebidos como “fronteiras”, seja em relação ao período colonial ou ao nacional, entendidas como confins, limites territoriais, espaços lindeiros ou como zonas de expansão, de mobilidades, circulações, encontros e confrontos socioculturais.
O estudo das fronteiras, seja para os impérios modernos, seja para os Estados Nacionais a partir do XIX, ocupou uma parcela importante da produção historiográfica sobre a América ibérica. A própria montagem das sociedades coloniais no continente põe em relevo a vigência de operações de inclusão e exclusão responsáveis pela delimitação de fronteiras espaciais, culturais, políticas e econômicas. As revoluções de independência e os processos de construção dos Estados Nacionais, oriundos da dissolução dos impérios ibéricos, marcam novos projetos políticos de conhecimento e de controle dos espaços; desse modo, o discurso sobre os limites da nação assume papel de relevo nas projeções de futuro para os novos países e na formulação de ações concretas visando a “territorialização do Estado” [3].
Como dito anteriormente, esse dossiê não compreende somente as abordagens sobre fronteira, mas também propõe a discussão sobre relações transfronteiriças, entendidas como aquelas que vinculavam, de diferentes formas, populações, redes econômicas, discussões políticas e circulações de informação entre espaços imperiais ou nacionais confinantes. De modo geral, os estudos sobre as fronteiras internacionais foram produzidos nos marcos das histórias diplomáticas, valorizando-se as narrativas de constituição das territorialidades e as relações entre as esferas centrais dos poderes monárquicos e nacionais nas negociações sobre as demarcações de limites no espaço americano. De outro lado, as histórias de corte militar, destacando guerras e enfrentamentos nas zonas de litígio, também trouxeram importantes contribuições para as escritas historiográficas sobre as fronteiras. No entanto, pode-se perceber um deslocamento da discussão nesse campo, de um “paradigma estatal” no estudo das fronteiras para uma história mais atenta para as dinâmicas locais – os fluxos, as conexões, os arranjos e as disputas entre populações que habitam espaços fronteiriços – ou para a interação entre local e global noslimites territoriais [4]. É possível, além do mais, constatar uma produção crescente sobre fronteiras ibero-americanas a partir de recortes da história social e cultural, colocando em evidência a análise de fenômenos de mestiçagens e de intermediações em zonas de fronteira, entendidas muito mais como espaços de encontros e confrontos envolvendo múltiplos atores, e não apenas como limites territoriais de soberanias políticas [5].
Esse reposicionamento dos estudos sobre fronteiras não significa desconsiderar as tensões e condicionantes das relações internacionais que marcaram esses espaços, mas colocar em evidência conflitos e colaborações que também envolviam as populações fronteiriças, os sentidos de fronteira construídos por elas, e o impacto dessa dinâmica local na gestão das fronteiras a partir dos centros políticos [6].As interações entre habitantes nos espaços fronteiriços não devem ser compreendidas somente a partir das relações mantidas pelos Impérios modernos e pelos Estados Nacionais, mas também a partir do que Renaud Morieux definiu como uma “diplomacia vista de baixo”, focada na compreensão dos acordos construídos pelas comunidades fronteiriças [7]. Por outro lado, deve-se ter em contaos vínculos entre fronteiras internas e externas, no qual se tecem conexões entre esses espaços limítrofes e os centros administrativos internos, relações essas viabilizadas por diferentes mecanismos e agentes que concretizam as mediações entre poderes locais e centrais [8].
Os textos selecionados para este dossiê cobrem o recorte cronológico do final do século XVII à segunda metade do XIX, tratando sob diferentes enfoques as fronteiras internas e externas da América de colonização ibérica e posteriormente das nações latino-americanas. De modo geral, os trabalhos valorizam as relações, conflituosas ou colaborativas, de aproximações ou atritos, mantidas pelas populações que habitavam os espaços de fronteira. Outra questão levantada pelos trabalhos deste dossiê é a mediação política e econômica entre autoridades locais e poderes centrais, bem como a importância dos sujeitos que atuavam como intermediários entre os diferentes grupos presentes nas fronteiras.
No primeiro artigo, a historiadora francesa Soizic Croguennec aborda a multiplicidade de relações e identidades acionadas por sujeitos que habitavam as fronteiras da Lousiana e da Flórida, durante a fase de incorporação dessas colônias no Império espanhol, do final da Guerra dos Sete Anos até o começo do século XIX. Esse espaço constituía uma zona particularmente importante nas disputas imperiais entre espanhóis, britânicos e franceses na América do Norte e no Golfo do México. A partir da documentação judicial espanhola, principalmente sobre soldados e indígenas, a autora analisa como os sujeitos fronteiriços tinham de lidar não somente com as pressões geopolíticas mais amplas, mas igualmente construir suas próprias estratégias individuais e coletivas de sobrevivência e integração nesse espaço, tomando parte de um jogo fluido de alianças e conflitos, com demarcações imprecisas entre o legal e o ilegal, que também influenciou na conformação dos limites imperiais na América do Norte.
Em seguida, Jonas Moreira Vargas toma o caso do brigadeiro David Canabarro para desenvolver, a partir de uma perspectiva microanalítica, um estudo sobre sua trajetória e a formação de redes econômicas, sociais e políticas por ele articuladas na fronteira da Província do Rio Grande com o Estado Oriental do Uruguai entre as décadas de 1830 e 1860. Canabarro estabeleceu-se como grande liderança político-militar local a partir de suas atuações nas guerras que marcaram o sul do Império e a região platina na primeira metade do XIX, consolidando seu poder por meio de formas de negociação com o poder central e com outros segmentos da sociedade na fronteira. Trata-se, desse modo, de uma liderança que, antes de exercer seu poder de forma absoluta, precisavam manejar alianças com os atores do espaço fronteiriço e com o Estado Nacional em formação, destacando-se como mediador entre a burocracia imperial e as elites nos limites meridionais do país.
Jaime Rosenblitt, por sua vez, trata da atuação de quatro comerciantes britânicos na região Tacna-Arica entre as décadas de 1830 e 1860, abordando os fluxos mercantis que operavam nos limites entre Peru, Bolívia e Chile e que articulavam a costa do Pacífico e o altiplano. Muito embora se tratasse de um espaço politicamente secionado pela formação dos Estados Nacionais citados e de um período marcado por disputas político-militares, Rosenblitt destaca o espaço sul-andino como um mesmo território, o que relativizava as divisões indicadas pelas fronteiras políticas. O estabelecimento desse espaço integrado valeu-se, entre outros pontos, da existência de um mercado articulado principalmente pela entrada de manufaturas importadas e pela saída de produtos minerais. A pesquisa da documentação notarial de Arica e Tacna possibilitou ao autor analisar as estratégias e trajetórias desses comerciantes britânicos, os quais se projetaram regionalmente a partir da diversificação de atividades, da associação com grupos mercantis locais e de alianças familiares e políticas. Tomando como foco os quatro comerciantes, Rosenblitt atenta para o papel desses sujeitos na construção de redes mercantis que coordenavamessas fronteiras.
O quarto artigo deste dossiê, de autoria de Rafael Chambouleyron, Pablo Ibáñez Bonillo e Vanice Siqueira de Melo, trata dos projetos de comunicação para a difusa fronteira entre oestado do Maranhão e o estado do Brasil nas décadas finais do século XVII, almejando fortalecer o comércio interno, a comunicação intracolonial e as cooperações administrativas na América lusitana. Além de abordar as projeções enunciadas pelas autoridades coloniais do Maranhão, os autores analisam as estratégias de controle territorial postas em prática nessa fronteira, e como afetaram diretamente as populações indígenas ao promover descimentos de comunidades nativas ou ao decretar a guerra justa. As conexões projetadas para os limites entre as duas possessões portuguesasna América estavam inseridas em um contexto de expansionismo da sociedade e da economia coloniais, objetivando-se realizar a abertura de novas frentes de penetração, de incorporação de terras e de controle sobre a mão de obra indígena.
O historiador equatoriano Santiago Cabrera Hanna investiga os debates e ajustes que marcaram a montagem espacial da estrutura administrativa republicana colombiana no Distrito do Sul (equivalente aproximadamente ao território do Equador), tomando como marcos a aplicação do regime de intendências e a Lei de Divisão Territorial na primeira metade da década de 1820.As reformas aplicadas versavam sobre questões sensíveis ao exercício local do poder e as relações com a administração central, como fiscalidade, aplicação da justiça e organização das eleições. Esse processo foi caracterizado pelas disputas de poder entre cidades e municípios do Distrito do Sul, principalmente entre Quito, Cuenca e Guayaquil, cidades que irradiavam suas zonas de influência no território correspondente à antiga Audiência de Quito. As relações desses poderes locais com o central foram marcadas por ajustes e negociações com lideranças políticas e militares, o que era importante para garantir a administração e a defesa de uma área fronteiriça no sul da República da Colômbia em um contexto de guerras.
Retornando para o Império do Brasil, o texto de Mariana Thompson Flores investiga questões centrais para o entendimento da formação do Estado imperial a partir dorecorte local da fronteira, mais especificamente o oeste da Província do Rio Grande do Sul na segunda metade do século XIX, ao tratar de duas instâncias importantes para o exercício do poder: a justiça e a fiscalidade. Nesse espaço, a administração da justiça configura um desafio não apenas pelas dificuldades de provimento do cargo de juiz nas cidades de Alegrete e Uruguaiana, mas também pelas formas de criminalidade que grassavam na fronteira, com intensa movimentação de fugitivos entre países limítrofes. O fisco, por sua vez, era constantemente tensionado pela recorrência do contrabando entre o Rio Grande e o espaço platino, com alianças duradouras entre negociantes-contrabandistas e funcionários da alfândega. Tanto as aplicações da justiça quanto dafiscalidade dependeram, em boa medida, de ajustes e mediações entre poder central e grupos hegemônicos locais, o que tornava possível a capilaridadedessas instâncias de poder e o processo de construção do Estado Nacional “para dentro” quanto também na sua relação com outros Estados confinantes.
Adriano Comissoli, por fim, investiga a política de informação e as práticas de espionagem portuguesas a partir da Capitania de São Pedro do Rio Grande e direcionadas à região do Prata, entre as décadas de 1770-1810. Os extremos meridionais da América portuguesa foram marcados pelo estado de guerra ou pela recorrente tensão nas relações luso-espanholas, de modo que a espionagem desempenhava um papel importante para a comunicação política transfronteiriça e para os planejamentos bélicos das duas coroas ibéricas. Tomando como base a documentação produzida por comandantes militares das tropas de 1ª linha dos distritos do Rio Pardo e Rio Grande, Comissoli analisa as redes de comunicação política operadas por esses oficiais e a presença de espiões lusos na região do Prata.
Como em qualquer dossiê, a seleção aqui apresentada de artigos é extremamente parcial, não logrando abarcar o amplo quadro de objetos, fontes, debates e possibilidades dos estudos históricos sobre as fronteiras na América ibérica. A despeito das limitações próprias dessa empreitada, não se pode perder de vista os avanços que os trabalhos aqui reunidos apontam. Os diferentes espaços em foco, dentro do amplo recorte cronológico dos textos selecionados, são analisados com a devida atenção sobre a interrelação de escalas, vinculado espaços locais e dinâmicas globais. A agência dos atores das fronteiras, suas formas cotidianamente construídas de apropriação do espaço e as mediações culturais, sociais e políticas, são igualmente colocadas em destaque. O olhar atento para os espaços fronteiriços pode trazer à tona outros ângulos de análise ou novos questionamentos que elucidem processos mais abrangentes -como sugere Karl Schögel, as fronteiras oportunizam o estudo de “processos de mescla, transferências e amálgamas que trazem algo novo” [9].A partir dos textos que compõem esse dossiê, o leitor tem em mãos uma amostra qualificada desse potencial.
Notas
3. GARAVAGLIA, Juan Carlos, GAUTREAU, Pierre (ed.). Mensurar la tierra, controlar el territorio: América Latina, siglos XVIII-XIX. Rosario: Prohistoria, 2011.
4. MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Introducción. In: FAVARÓ, Valentina; MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Fronteras: procesos y prácticas de integración y conflictos entre Europa y América (siglos XVI-XIX). Madrid: FCE; Murcia: Red Columnaria, 2017, p. 17. ZÁRATE BOTÍA, Carlos Gilberto. Amazonia 1900-1940: el conflicto, la guerra y la invención de la frontera. Letícia: Universidad Nacional de Colombia: Instituto Amazónico de Investigaciones: Grupo de Estudios Transfronterizos, 2019.
5. LANGFUR, Hal. Frontier/Fronteira: A transnationalreframing of Brazil’sInlandColonization. History Compass, Hoboken, v. 12, p. 843-852, 2014.
6. HERZOG, Tamar. Frontiers of Possesion. Spain and Portugal in Europe and the Americas. Cambridge,MA: Harvard University Press, 2015. ERBIG JR., Jeffrey Alan. Where Caciques and Mapmakers Met: Border making in Eighteenth-Century South America. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2020.
7. MORIEUX, Renaud. Diplomacy from Below and Belonging: Fishermen and Cross-Channel Relations in the Eighteenth Century. Past &Present, Oxford, v. 202, n. 1, p.83-125, 2009.
8. LÓPEZ ARANDIA, María Amparo. Territorio frente a Estado. Nuevas fronteras y conflictos en la España del siglo XVIII. In: FAVARÓ, Valentina; MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Fronteras…, Op. Cit.,p. 365-385.
9. SCHÖGEL, Karl. En el espacio leemos el tiempo: sobre historia de la civilización y geopolítica. Madrid: Siruela, 2007. p. 146, tradução nossa.
Referências
ERBIG JR., Jeffrey Alan. Where Caciques and Mapmakers Met: Border making in Eighteenth-Century South America. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2020.
GARAVAGLIA, Juan Carlos, GAUTREAU, Pierre (ed.). Mensurar la tierra, controlar el territorio: America Latina, siglos XVIII-XIX. Rosario: Prohistoria, 2011.
HERZOG, Tamar. Frontiers of Possesion. Spain and Portugal in Europe and the Americas. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2015.
LANGFUR, Hal. Frontier/Fronteira: A transnational reframing of Brazil’s Inland Colonization. HistoryCompass, Hoboken, v. 12, p. 843-852, 2014.
LÓPEZ ARANDIA, María Amparo. Territorio frente a Estado. Nuevas fronteras y conflictos en la España del siglo XVIII. In: FAVARÓ, Valentina; MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Fronteras: procesos y practicas de integración y conflictos entre Europa y America (siglos XVI-XIX). Madrid: FCE; Murcia: Red Columnaria, 2017. p. 365-385.
MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Introduccion. In: FAVARO, Valentina; MERLUZZI, Manfredi; SABATINI, Gaetano. Fronteras: procesos y practicas de integracion y conflictos entre Europa y America (siglos XVI-XIX). Madrid: FCE; Murcia: Red Columnaria, 2017.
MORIEUX, Renaud. Diplomacy from Below and Belonging: Fishermen and Cross-Channel Relations in the Eighteenth Century. Past &Present, Oxford,v. 202, n. 1, p.83-125, 2009.
SCHOGEL, Karl. En el espacio leemos el tiempo: sobre historia de la civilizacion y geopolitica. Madrid: Siruela, 2007.
ZARATE BOTIA, Carlos Gilberto. Amazonia 1900-1940: el conflicto, la guerra y la invención de la frontera. Leticia: Universidad Nacional de Colombia: Instituto Amazonico de Investigaciones: Grupo de Estudios Transfronterizos, 2019.
Carlos Augusto Bastos – Universidade Federal do Pará. Ananindeua- Pará- Brasil. Doutor em História pela USP, Professor da Faculdade de História do Campus Universitário de Ananindeua/UFPA. Professor do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História/Prof Historia. Autor de No Limiar do Impérios. A frontera entre a Capitania do Rio Negro e a Província de Maynas projetos, circulações e experiências (c.1780-c.1820). (Hucitec, 2017), além de artigos e capítulos de livros. E-mail: carlosbastos@ufpa.br.
BASTOS, Carlos Augusto. [Fronteiras e relações transfronteiriças na América Ibérica]. Almanack, Guarulhos, n.27, 2021. Acessar publicação original [DR]
Rio de Janeiro e a Cidade Global: Histórias comparadas de cidades na Era Moderna da Globalização / Almanack / 2020
Em seu livro, descrevendo os seis meses que passara no Brasil em 1846, o americano Thomas Ewbank escreveu que “os gritos em Londres são bagatelas quando comparados aos da capital brasileira. Escravos de ambos os sexos anunciam seus produtos em todas as ruas.” Quer fossem frutas ou vegetais; itens de vidro, porcelana ou prata; ou ainda sedas e jóias “tais coisas, e milhares mais, são vendidas pelas ruas diariamente”[5]. A comparação feita com Londres sugere que ao tentar traduzir a sua experiência com o Rio de Janeiro para os seus leitores, Ewbank achou necessário referenciar a cidade que, no imaginário Americano, estaria mais associada a um comércio urbano vibrante e abundância de mercadorias advindas de regiões mundiais mais diversas. Na mesma época em que Ewbank publicava seu livro, Friedrich Engels compunha sua obra A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra, onde ele descreveu Londres como o centro comercial do mundo [6]. É pouco provável que Ewbank e seus leitores conheciam o texto de Engels, mas certamente saberiam da reputação da capital do império Britânico e do alcance global de suas instituições financeiras e mercantis. Ao comparar as duas cidades, Ewbank associava o Rio de Janeiro oitocentista à cidade global por excelência daquela época.
Para Ewbank, o ponto de comparação com Londres era a disponibilidade de qualquer produto comercial imaginável em qualquer momento que o cidadão urbano o requeresse. O Rio de Janeiro da metade do século XIX estava, de fato, inserido em uma complexa rede de trocas comerciais e financeiras que se estendia pelo interior do território brasileiro, pelo mundo atlântico, e além [7]. Assim como Londres, a cidade portuária brasileira atuava, desde o século XVII, como nódulo importante na rede de centros urbanos e portos que conectava diferentes cantos do mundo e promovia a movimentação global de produtos comerciais, ouro e prata, pessoas, ideias e práticas. Mesmo com as restrições econômicas e políticas de monopólio do antigo regime, diferentes historiadores apontam a participação crucial de comerciantes do Rio de Janeiro, e da cidade portuária em si, na circulação econômica no império português [8]. Mas não é somente a referência a mercadorias diversas que, na passagem do texto de Ewbank, ilustra as conexões transoceânicas que caracterizavam o Rio de Janeiro oitocentista. O breve comentário sobre escravos de ambos os sexos, encarregados de animar tantas trocas comerciais, invoca um outro lado do caráter transnacional ou global daquela cidade: o papel central que o Rio de Janeiro tivera no tráfego de africanos escravizados entre diferentes regiões do Atlântico e do Índico [9].
Essa curta passagem de Life in Brazil aponta, sem necessariamente se dar conta, para a globalidade potencial do Rio de Janeiro, ou seja, a centralidade da cidade em processos de circulação globais que animaram a definiram realidades do século XIX e experiências urbanas de viajantes, consumidores, e comerciantes grandes e pequenos, livres e escravos. A notável cacofonia da cidade, evidência de um setor comercial urbano ativo, representa mais do que conexões mercantis; ela invoca um ambiente urbano familiar, reconhecível. Descrições como essa, disseminadas por viajantes, indicam como o Rio de Janeiro contribuiu para reforçar a imagem do que era típico, esperado, ou desejado em uma cidade[10]. Contribuía assim para noções do urbano no mundo oitocentista.
A relação entre o urbano e o global é a questão histórica que esse dossiê propõe examinar. A fundação da cidade do Rio de Janeiro em 1565 é um dos eventos que marcou um primeiro processo histórico de globalização. A expansão marítima e projeto colonizador de Portugal, Espanha e, eventualmente, de outras comunidades europeias, integraram novas rotas Atlânticas, e mercados nas Américas, a existentes rotas marítimas e redes de trocas econômicas do Mediterrâneo e Oceano Índico. Os séculos XV ao XIX testemunharam, pela primeira vez, a circulação global de mercadorias e o contato entre as populações humanas de todos os continentes[11]. A articulação dessa rede global se deu nas águas e navios, feitorias e mercados, e nos vários centros de poder onde atividades mercantis e alianças políticas foram negociadas. Especificamente, grande parte desse processo se deu em cidades e vilas, tanto portuárias quanto algumas interioranas, onde atores urbanos moldaram espaços e práticas locais para manejarem melhor oportunidades e pressões criadas por forças e conexões globais. O urbano e o global, enquanto fenômenos históricos, interagiram de forma dialógica: dinâmicas urbanas sustentaram a criação de um mundo moderno globalmente conectado enquanto a movimentação global de pessoas, bens, ideias e práticas ajudou a definir realidades e imaginários urbanos. A perspectiva que salienta a interconexão entre a cidade e globalização—a cidade global—é corrente em estudos urbanos do fim do século XX e início de XXI[12].A adoção dessa mesma perspectiva analítica para o princípio do período moderno nos permite entender melhor o papel que cidades como o Rio de Janeiro e populações urbanas tiveram naquela era de globalização, assim como a maneira pela qual aquele momento histórico definiu a cidade.
Interrogar o diálogo entre o urbano e o global a partir de trabalhos somente sobre o Rio de Janeiro não seria suficiente. Estudos individualizados de cidades frequentemente produzem biografias de centros urbanos que tendem a exagerar o distinto ou excepcional de uma localidade e ignorar importantes conexões com outras localidades ou contextos para além do contexto nacional ou imperial [13]. A história global, enquanto disciplina, encoraja comparações e contextualizações amplas que revelam sincronicidades históricas, novas geografias de análise que não a nação ou império, e conexões entre eventos distintos e diacrônicos14. Histórias globais urbanas oferecem também comparações e contextualizações férteis, capazes de produzir narrativas e análises inovadoras, porém ancoradas em localidades e experiências humanas tangíveis15. É em busca dessa perspective urbana global, e seu potencial para elucidar o processo de globalização durante o período moderno e a centralidade da cidade nesse processo, que o dossiê O Rio de Janeiro e a Cidade Global combina textos de pesquisadores de renome internacional sobre o Rio de Janeiro e sobre outras comunidades urbanas do mundo Atlântico. Juntos, os sete artigos aqui reunidos contribuem duas principais intervenções historiográficas: expandir o corpo literário ainda limitado que aborda o Rio de Janeiro como um importante estudo de caso para a discussão sobre a história urbana global e sedimentar a relevância de uma perspectiva comparativa e voltada para o período moderno para estudos de cidades como agentes de globalização.
O leitor encontrará aqui uma análise de processos históricos que marcaram os séculos XVII ao XIX centrada em comunidades urbanas do mundo Atlântico. Luciano Figueiredo e Paul Musselwhite avaliam a relevância histórica de cidades—Rio de Janeiro e James Town, e cidades do mundo Atlântico Britânico, respectivamente—na construção de uma geografia política imperial de proporções globais. Eles ressaltam a importância de populações urbanas para o processo de articulação e negociação de vínculos políticos e econômicos entre o velho e o novo mundos. Em particular, eles demonstram a atuação de espaços urbanos como forjas de identidades políticas e palcos de conflitos e confrontações que reconfiguraram a relação entre colônia e metrópole num contexto imperial influenciado por processos globais.
Jesus Bohorquez e Fabrício Prado examinam comunidades e redes mercantis centradas no Rio de Janeiro, Montevideo, Buenos Aires e além, e sua relevância para a organização de uma economia, assim como alinhamentos políticos, trans-imperiais. Eles exploram os esforços feitos pelas coroas portuguesa e espanhola para regulamentar e controlar uma economia cada vez mais globalizada e assim proteger seus interesses e dominação política. Ao focarem, porém, conexões comerciais entre diferentes cidades, eles demonstram que mais do que projetos imperiais, essas redes de troca se materializaram graças às ações de agentes econômicos e mercados coloniais. Essa análise revela ainda a necessidade de se pensar as conexões econômicas dessa região inseridas numa geografia global muito mais ampla do que o Atlântico Sul e mais influentes na maturação das ambições políticas regionais do que os ideais pro-independência da era das revoluções atlânticas.
Emma Hart, Randy Sparks e Ynaê Lopes dos Santos dedicam seus artigos a uma discussão de populações urbanas comumente marginalizadas em narrativas da formação do mundo Atlântico e de processos globalizadores: trabalhadores manuais, imigrantes voluntários e forçados, africanos e seus descendentes, pessoas escravas e libertas. Os séculos XVIII e XIX testemunharam a intensificação de trocas comerciais e movimento de populações ao longo de rotas Atlânticas organizadas em torno de algumas cidades específicas. Hart, Sparks e Santos examinam a trajetória de Charleston, na Carolina do Sul, de Annamaboe, na Costa do Ouro, e do Rio de Janeiro. Dialogando com a historiografia que explica a centralidade de cada cidade em termos das atividades econômicas e poder político de elites e populações europeias ou euro-descendentes, os autores demonstram que foram as diferentes iniciativas e prioridades de populações marginalizadas, de agentes econômicos africanos e de escravos negros que moldaram Charleston, Annamaboe, e o Rio de Janeiro, respectivamente. Esses grupos urbanos, repetidamente ignorados em histórias dominantes do mundo Atlântico, construíram espaços, mercados, e práticas urbanas que viabilizaram articulações econômicas, sociais, e culturais cruciais à constituição do mundo setecentista e oitocentista.
O presente dossiê, através da comparação implícita entre a cidade do Rio de Janeiro e centros e comunidades urbanas do Atlântico britânico, espanhol, e da Costa do Ouro na África, oferece uma nova perspectiva da relação entre o urbano e o global durante o período moderno. Por um lado, ele ilumina a relação dialógica entre dinâmicas e experiências urbanas e a formação de redes de contato e troca globais que marcaram aquela era histórica. Por outro, ele revela a relevância de cronologias, geografias, e atores históricos ao processo de globalização centrado na cidade—e portanto ao fenômeno da cidade global—que são pouco explorados na literatura corrente, a qual tem se preocupado mais em focar o chamado norte global durante o final do século XX e começo do XXI.
Notas
5. EWBANKS, Thomas. Life in Brazil, or, A journal of a visit to the land of the cocoa and the palm. New York: Harper & brothers, 1856. p. 92-93.
6. ENGELS, Friedrich. The Condition of the Working Class in England in 1844. London: Sonnenschein & Co, 1892. p. 23.
7. COSTA, Sérgio; GONÇALVES, Guilherme Leite. A Port in Global Capitalism: Unveiling Entangled Accumulation in Rio de Janeiro. London: Routledge, 2019.
8. FRAGOSO, João Luís. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil do Rio de Janeiro, 1790-1830. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. PESAVENTO, Fábio. “Para além do império ultramarino português: as redes trans, extraimperiais no século XVIII.” In: GUEDES, Roberto (org.). Dinâmica Imperial no Antigo Regime Português. Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2013. p. 97-111. GUIMARÃES, Carlos Gabriel. Os ingleses no Rio de Janeiro da primeira metade do século XVIII: o caso da família Gulston, c. 1710-1720 – primeiras impressões.” In: MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer; SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de; GUIMARÃES, Carlos Gabriel; RIBEIRO, Alexandre Vieira. Ramificações Ultramarinhas: Sociedade Comerciais no Âmbito do Atlântico Luso. Rio de Janeiro: Mauad Editora, 2018. p. 93-114.
9. FLORENTINO, Manolo. Em Costas Negras: uma história do tráfico atlântico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro, séculos XVIII e XIX. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1995. BORUCKI, Alex. From Shipmates to Soldiers: Emerging Black Identities in the Río de la Plata. Albuquerque: University of New Mexico Press, 2015. p. 25-56.
10. MARTINS, Luciana de Lima. O Rio de Janeiro dos viajantes: o olhar britânico (1800-1850). Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar, 2001.
11. ABU-LUGHOD, Janet. Before European Hegemony: The World System A.D. 1250-1350. New York: Oxford University Press, 1989. CROSBY, Alfred. The Columbian Exchange: Biological and Cultural Consequences of 1492. Westport: Greenwood, 1972. PAGDEN, Anthony. Lords of All the Worlds: Ideologies of Empire in Spain, Britain, and France, c. 1500-c.1800. New Haven: University of Connecticut Press, 1995. RUSSELL-WOOD, A.J.R. The Portuguese Empire, 1415-1808: A World on the Move. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1998, p. 8-26.
12. SASSEN, Saskia. The Global City: New York, London, Tokyo. Princeton: Princeton University Press, 2013. TAYLOR, Peter; DERUDDER, Ben. World City Network: A Global Urban Analysis. London: Routledge, 2015. KING, Anthony. Writing the Global City: Globalization, Postcolonialism, and the Urban. New York: Routledge, 2016.
13. SAUNIER, Pierre-Yves; EWEN, Shane. Another Global City: Historical Explorations into the Transnational Municipal Moment. New York: Palgrave: 2008. NIGHTINGALE, Carl. Segregation: A Global History of Divided Cities. Chicago: University of Chicago Press, 2012.
14. CONRAD, Sebastian. What is Global History? Princeton: Princeton University Press, 2016.
15. ARAÚJO, Erick Assis de; SANTOS, João Júlio Gomes dos, Jr. (orgs.). História Urbana e Global: novas tendências e abordagens. Fortaleza: Editora UECE, 2018.
Referências
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Mariana Dantas – Ohio University. É autora do livro Black Townsmen: Urban Slavery and Freedom in the Eighteenth-Century Americas (2008). Ela foi a co-investigadora do projeto de rede de pesquisa internacional “Global City: Past and Present”, financiado entre 2015 e 2017 pelo Conselho de Pesquisa em Artes e Humanas do Reino Unido. http: / / orcid.org / 0000-0003-2691-5033
Emma Hart – University of St. Andrews. É autora dos livros Building Charleston: Town and Society in the Eighteenth-Century British Atlantic World (2010) e Trading Spaces: The Colonial Marketplace and the Foundations of American Capitalism (2019). Ela foi a investigadora principal do projeto de rede de pesquisa internacional “Global City: Past and Present”, financiado entre 2015 e 2017 pelo Conselho de Pesquisa em Artes e Humanas do Reino Unido. http: / / orcid.org / 0000-0003-0749-3701
DANTAS, Mariana; HART, Emma. O urbano e o global na era moderna em uma perspectiva comparativa. Almanack, Guarulhos, n.24, abr., 2020. Acessar publicação original [DR]
Iglesia Atlântica. Iglesia universal. Iglesia romana. Escenarios de la modernidad Católica en el siglo XIX / Almanack / 2020
La iglesia es un mundo”, tituló Emile Poulat uno de sus libros en 1984 [5]. Con esta expresión el intelectual francés daba cuenta de la multiplicidad de aspectos y facetas que abarca la iglesia: es una institución, una comunidad creyente, una cultura, un complejo de templos, conventos, colegios, una infinidad de prácticas y costumbres… . En la medida en que el catolicismo, en tanto religión universal, procuró su expansión globalmente, también es un mundo a escala geográfica, que amplía todavía más su multiplicidad. Pero también en esa expresión puede leerse una advertencia de época. Porque, si bien la iglesia es todo un mundo, es sólo uno, al lado de otros muchos mundos que pueden convivir, no sólo en una misma nación, sino incluso en un mismo individuo. Charles Taylor ha hecho extensiva esta situación para todas las religiones en en la “era secular”: la característica de la modernidad religiosa no es la desaparición de la creencia, sino la posibilidad de no creer[6]. Analizar el catolicismo y su iglesia en clave transnacional durante el siglo XIX implica reconocer esas dos dimensiones: su diversidad y su coexistencia con nuevos marcos de referencia, nuevas instituciones y prácticas que pretendían, también, matrizar la vida de los pueblos.
En términos metodológicos, el impacto que tuvo y sigue teniendo en los últimos años la ola de las historias globales (transnacional, interconectada..) en los estudios de historia de la Iglesia y del catolicismo dan cuenta de que había mucho para aportar desde esos puntos de vista. El gesto metodológico más valioso de los nuevos estudios que adoptan este enfoque transnacional no es reconocer la condición mundial de la Iglesia y el catolicismo, sino hacer de las formas concretas en que se expresa esa condición parte del objeto de estudio.
Si bien esa advertencia es válida desde los siglos XV y XVI, cuando las sociedades cristianas entraron en contacto fluido con culturas y pueblos ajenos a sus marcos de referencia originales -en un proceso que José Casanova llama globalización sin occidentalización (Casanova, 2020)-, es más importante considerarla a la hora de historiar el mundo atlántico en el siglo XIX. En ese espacio y período cobraron fuerza dos fenómenos que, por su enorme potencia transformadora y, sobre todo, por el éxito que tuvieron hacia el siglo XX, invadieron el panorama que observaba el historiador hasta casi hacer desaparecer todo lo demás. Nos referimos a la construcción de los estados nacionales y a un proceso de cambio religioso que, en el espacio católico, supuso el triunfo de la corriente ultramontana por sobre otras alternativas para pensar el catolicismo en las sociedades modernas. Para plantearlo gráficamente, la historia de la iglesia en el siglo XIX se leyó en la clave que ofrecían la declaración de la infalibilidad papal, el Syllabus y la caída de Roma en manos del naciente Estado italiano.
De tal manera, la historia de la Iglesia en el mundo occidental se presentaba como una réplica a escala nacional de esa lucha matriz: las iglesias locales enfrentando los impulsos laicistas de los estados nacionales, bajo la dirección del papa. En ese esquema, las variables a estudiar eran fundamentalmente nacionales o sub nacionales: jerarquías eclesiásticas, clero, laicado. Podría objetarse que ese enfoque nunca perdía de vista la centralidad de Roma en la dirección de esas luchas de las iglesias locales contra la modernidad. De hecho, es en ese relato que cobra sentido la idea de “romanización”: un proceso por el que las iglesias periféricas (en nuestro caso, las amaericanas) habrían sido subordinadas y homogeneizadas en sus formas a la autoridad papal. Sin embargo, en la medida en que la acción del papa era un dato constante e independiente del caso que se estudiaba, los vínculos entre los actores locales y la Iglesia universal eran incorporados al análisis, pero siempre en forma de contexto. Es que, en última instancia, el papa era la contracara simbólica de otro dato contextual: la modernidad.
Hace unos años, todo este cuadro está sufriendo críticas muy fértiles. Por un lado, el modelo clásico de modernidad, tal como fue impulsado desde los países “occidentales”, es hoy considerado sólo como un proyecto, pero no como la única expresión posible de la modernidad. Por el otro, y de manera solidaria, también está siendo revisada la forma de entender los proyectos y actores que se oponían a ese modelo: puede llamársele reacción o corriente contra revolucionaria. La hipótesis de trabajo hoy es que, en diversos espacios se vivieron procesos de modernización específicos (aunque interconectados) sin que existiera un único sentido posible para ellos, pero también que, incluso en los espacios donde esa modernidad tomó sus formas clásicas, como en la Europa occidental, las expresiones de disidencia, lejos de ser elementos anacrónicos y externos a esos procesos, también deben ser consideradas parte esencial de esas modernidades. Y esto por dos motivos. Primero, porque en la confrontación, los movimientos contrarrevolucionarios y conservadores se vieron obligados a cambiar en sus métodos y contenidos, y ello los llevó a compartir muchas de las características y herramientas de sus contrincantes (la prensa periódica, la movilización popular, la organización de redes transnacionales). Segundo, porque su acción también obligó a las fuerzas herederas de la revolución a reformularse y repensar sus objetivos.[7]
A la luz de estas novedades, la imagen del catolicismo decimonónico se está viendo fuertemente transformada. Ya no se trata de un actor retardatario y anacrónico dirigido autocráticamente por el papa bajo el libreto del Syllabus. El catolicismo es un mundo de intereses, representaciones y actores donde resuena, con tonalidades locales, el cambio político, cultural y económico acelerado a nivel global desde fines del siglo XVIII. Los artículos publicados en este dossier se nutren de diferentes enfoques nucleados en la gran familia de la historia global para analizar ese catolicismo en contexto de modernidad. Hay dos ejes que nos permiten relacionarlos porque uno u otro, en muchos casos ambos, se hallan presentes en todos los trabajos.
Uno es el de la dimensión atlántica del catolicismo en el siglo XIX. Luca Cordignola demuestra la fertilidad de abandonar el marco “nacional o subnacional” para analizar un elemento clásico de la historia eclesiástica: la “mala conducta” de los sacerdotes. Cordignola muestra muy claramente que, en regiones de fuerte inmigración como las del norte de América (y también podríamos decir del sur de ese continente) las normas residían en los territorios, pero también se desplazaban con las personas. ¿con qué criterios juzgar el desempeño de un párroco inmigrante? ¿con los de las autoridades de su destino?¿con las costumbres de su lugar de origen? ¿con las de sus feligresías también inmigrantes? Pero además, ¿cómo fueron modificados esos criterios por la misma experiencia inmigratoria y, fundamentalmente, por las condiciones extremas de los territorios en los que estos sacerdotes oficiaban? En este sentido, es fundamental considerar la convivencia de gentes de múltiples orígenes y religiones, y las enormes distancias que separaban a los sacerdotes de sus autoridades para entender la laxitud o rigidez exigida en términos de conducta personal a los sacerdotes. Sin un enfoque transnacional es imposible comprender estos fenómenos.
El artículo de Ferreira y Guedes, junto con el de Codignola sacan buen partido de una modalidad específica de la historia atlántica: el estudio a escala de imperio. Los autores muestran que, en el marco del imperio portugués, la condición colonial o de misión de Brasil y Angola otorgaba cierto marco legal común: en este caso, las normas para celebrar y registrar bautismos en Luanda eran las que había dispuesto el arzobispo de Bahía. Una disposición lógica si se considera que muchos africanos fueron bautizados en esa ciudad (la principal exportadora de esclavos) para ser luego trasladados y vendidos en Brasil. Sin embargo, ello no significa que la norma era aplicada de manera homogénea en contextos tan diversos: hacia fines de siglo XVIII en Luanda era común el del bautismo masivo sobre lotes de esclavos antes de ser enviados al Brasil, práctica impensada por el arzobispo de Bahía. Por otro lado, el reconocimiento de la escala imperial operando en prácticas y normas sobre el bautismo, permiten a los autores salvar vacíos documentales ensayando comparaciones entre Angola y Brasil bajo la hipótesis de análisis de un compadrazgo atlántico. Por otro lado, los autores señalan que el bautismo en Luanda era parte de la trata atlántica de esclavos. Por medio de ese rito y del compadrazgo los esclavos buscaban evitar la deportación para América. El bautismo y el compadrazgo eran, en definitiva, signos de jerarquía en la sociedad de Luanda.
El trabajo de José Ramón Rodriguez Lago, ubicado temporalmente en el otro extremo del siglo, nos muestra un mundo atlántico totalmente transformado por el vertiginoso desarrollo político y económico de Estados Unidos y el ocaso definitivo del imperio ibérico en América. Rodríguez Lago da cuenta de dos fenómenos fundamentales (y sorprendentemente poco explorados) para entender el catolicismo occidental contemporáneo: el creciente peso del catolicismo y del poder político estadounidenses en la transformación de la Iglesia católica durante el siglo XX, y la profunda transformación que vivió el poder papal en sus formas de entender y ejercer el poder eclesiástico y su rol en el nuevo mapa geopolítico mundial.
Y este punto nos lleva al segundo eje que mencionábamos arriba: el de la transformación de la figura y el poder papales en este largo siglo XIX. El breve pero muy rico trabajo de Carlo Fantappiè [8], (cuya versión portuguesa se publica por primera vez en Brasil en la página de Almanack en la sección “Texto em Destaque”), da algunas claves para la comprensión de esa dinámica en el largo plazo. En resumidas cuentas, el trabajo de Fantappiè nos advierte que es imposible entender la vocación de dominio universal del papado sin considerar su predisposición a adaptar ese dominio a las circunstancias geográficas e históricas precisas. Así, nos habla de estrategias que oscilan entre “adaptación” y “disciplinamiento”, entre “inculturación” y “aculturación”, cuando el ordenamiento católico debe ser aplicado en contextos muy diferentes. Es una lógica en la que la representación del poder como “centro” y “periferia” debe necesariamente revisarse. En ese constante trabajo de negociación y adaptación, Iglesia y Estado modernos se nos presentan como el producto de un proceso de imitación reciproca cuyo producto final, en el espacio eclesiástico, será la codificación del derecho canónico en 1917, no casualmente, al cierre del largo siglo XIX.
Esas lógicas de imitación recíproca de dos esferas que comenzaban a diferenciarse cada vez más, la secular y la espiritual, pueden identificarse en el trabajo de Ivo Silva sobre las resonancias atlánticas del anticlericalismo brasileño del siglo XIX. Por supuesto que la contestación religiosa no es una novedad del mundo moderno, pero los muy fluidos diálogos y referencias internacionales que reconstruye Silva para el anticlericalismo brasileño sólo pueden entenderse en diálogo con la difusión, también internacional, de un discurso clerical que se expandía por los mismos medios y con las mismas herramientas que utilizaban sus adversarios. A tal punto es esto así, que al autor se le hace difícil (podríamos agregar, vano) determinar si fue primero el clericalismo o el anticlericalismo en esta clave moderna.
El discurso clerical que combatían con tanta pasión los anticlericales de Brasil y de todo el mundo, fue parte de un proceso, también global y de amplio alcance, que podríamos describir con dos términos clásicos, que han sido sin embargo sustancialmente modificados en los últimos años: ultramontanismo y romanización. Los trabajos de Benedetta Albani y Anna Clara Lemmans Martins, por un lado, y de Italo Santirocchi y Pryscylla Cordeiro, por el otro, abordan aspectos concretos de esos fenómenos. En el caso del primero, es parte de un vasto proyecto institucional con sede en el Instituto Max Planck de Frankfurt, que desde hace varios años estudia la presencia del poder papal en las iglesias del mundo ibérico. En esta ocasión se concentra en la imagen que poseían los juristas brasileños sobre las características y el funcionamiento de los dicasterios romanos. En este trabajo el carácter transnacional de la autoridad papal se analiza en sus diferentes dimensiones: por un lado, el pensamiento jurídico sobre esa autoridad es parte de una red de producción y circulación transnacional que pone en evidencia, en el peso de la literatura de origen europeo, pero no italiano, el carácter multilateral del impulso romanizador; por otro lado, la consideración en suelo brasileño de la validez de las disposiciones de la congregaciones romanas y el peso de esas disposiciones sobre la autoridad episcopal permite evaluar la dimensión, pero también las formas específicas que fue adquiriendo el poder romano en este período y espacio específicos.
El artículo de Italo y Pryscylla Santirocchi analiza aspectos transnacionales de un instituto religioso católico: la Congregación de la Misión. Éste se presentó como uno de los protagonistas del proceso de reforma ultramontana en varias partes del mundo, debido a su cultura religiosa, que se desarrolló desde su creación en el siglo XVII. En la liña de Carlo Fantappiè, los autores reflexionan sobre los esfuerzos de esa congregación para evitar roces entre el contexto local y su propuesta universalizante. Centrando su atención en las misiones, analizan la organización jerárquica y los procesos de disciplinamiento, los instrumentos formativos, las reglas del instituto y los trazos de su cultura misional, para luego mostrar cómo se daba la flexibilización de las reglas y las directrices centrales, así como las consecuencias de la desobediencia a esas reglas, en un contexto geográfico particular: Ceará, provincia del imperio de Brasil. El artículo permite percibir cómo la reforma ultramontana sólo fue posible en diálogo estrecho con la religiosidad popular brasileña a pesar de ser un proceso global.
Notas
5. POULAT, Emile. L’Eglise, c’est un monde. L’Ecclésiosphère.Paris: Èd du Cerf, 1984.
6. TAYLOR, Charles. A Secular Age. Cambridge (Massachussetts): Belknap Press of Harvard University Press. 2007.
7. RÚJULA, Pedro y RAMÓN SOLANS, Javier, El desafío de la revolución : reaccionarios, antiliberales y contrarrevolucionarios, (Siglos XVIII y XIX). Granada: Comares, 2017. En este sentido, Vincent Viaene afirma que “…in their desire to rewrite the master narrative of modernity, historians of modernization and historians of religion are natural allies.” VIAENE, Vincent. International History, Religious History, Catholic History: Perspectives for Cross-Fertilization (1830-1914). European History Quarterly,Vol. 38(4). 2008, p. 584.
8. O texto de Carlo Fantappiè foi traduzido pela primeira vez e publicado na seção “Texto em Destaque” na página da Almanack no Portal de Periódicos da Unifesp, disponível em: https: / / periodicos.unifesp.br / index.php / alm / article / view / 11453.
Referências
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RUJULA, Pedro y RAMON SOLANS, Javier, El desafio de la revolucion : reaccionarios, antiliberales y contrarrevolucionarios, (Siglos XVIII y XIX). Granada: Comares, 2017. [ Links ]
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Ignacio Martínez – Universidad Nacional de Rosario. Es doctor en Historia por la Universidad de Buenos Aires, investigador adjunto del Conicet y docente regular de Historia Argentina I en la carrera de Historia de la Universidad Nacional de Rosario. Es autor de Una nación para la Iglesia argentina. Construcción del estado y jurisdicciones eclesiásticas en el siglo XIX (2013), coautor con Diego Mauro de Secularización, Iglesia y política en Argentina. Balance teórico y síntesis histórica, y coeditor con Natacha Bacolla de Universidad, élites y política. De las reformas borbónicas al reformismo de 1918 (2018). E-mail: igntinez@gmail.com http: / / orcid.org / 0000-0001-8522-6241
Ítalo Domingos Santirocch – Universidade Federal do Maranhão. Professor adjunto do curso de Licenciatura em Ciências Humanas da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em História da UFMA. E-mail: italosantirocchi@hotmail.com http: / / orcid.org / 0000-0002-3343-1283
MARTÍNEZ, Ignacio; SANTIROCCH, Ítalo Domingos. [Iglesia Atlântica. Iglesia universal. Iglesia romana. Escenarios de la modernidad Católica en el siglo XIX[. Almanack, Guarulhos, n.26, dez, 2020. Acessar publicação original [DR]
História Marítima e Portuária / Almanack / 2019
História Marítima e Portuária, temas propostos para este dossiê de Almanack, são ao mesmo tempo clássicos e pouco explorados. As perspectivas abertas pelos textos aqui reunidos indicam um longo caminho a percorrer a fim de adensar as temáticas e suas muitas abordagens possíveis.
A rigor, portos seriam os lugares modernos de movimentação de gentes e mercadorias, aparelhados com equipamentos mais sofisticados do que os simples atracadouros. Porém, tendo em vista que gentes e mercadorias circulavam desde antes de uma definição contemporânea calcada no desenvolvimento capitalista, acostumamo-nos a chamar de portos os lugares onde navios de diferentes tamanhos e procedências atracavam. Em torno dos portos desenvolveram-se especificidades urbanas, culturais e econômicas, fazendo com que as cidades portuárias tivessem e, ainda hoje, tenham características quase sempre resultantes de sua condição de elo de comunicação com sua hinterland, com lugares mais ou menos próximos, ou então com as rotas de longo curso que as ligavam ao mundo todo.
Ofícios, culturas profissionais, formas de organização, trânsito intenso, paisagens diversificadas, línguas e etnias diversas em convívio: tudo isso aproxima a história dos portos e das cidades portuárias. Fenômeno similar pode ser observado a bordo: também os navios são lugares sociais da diversidade e do movimento, embora o isolamento e as constantes tentativas de impor a disciplina em pleno mar tenham feito com que historiadores observassem a vida dos embarcados como um fenômeno semelhante ao que ocorria nos ambientes da prisão ou da fábrica.
Por isso, o diálogo entre História Portuária e História Marítima[5] é estimulante. Se a História Portuária vincula-se à terra firme, à economia e à sociedade, a História Marítima é seu espelho. Os homens não habitam o mar, ainda que tripulantes passassem boa parte de suas existências a bordo. A chegada em terra, para cumprir seus destinos e obrigações, sempre se dava em portos e impactava a sociedade local: os navios traziam mercadorias, demandavam abastecimento, portavam informações escritas e orais, introduziam epidemias, carregavam passageiros, podiam ser meios de fuga da justiça, de contrabando de bens, de invasão militar e de resistência.
Ao dizermos “homens”, estamos nos referindo à humanidade e também ao gênero masculino. Os trabalhos marítimos e portuários eram masculinos por excelência, muito embora as mulheres não estivessem totalmente afastadas do ambiente dos navios. Todavia, sua incorporação era, quase sempre, na condição de passageiras ou, no caso portuário, de familiares daqueles que embarcam e que viviam à espera. Portanto, a História Portuária e a História Marítima também comportam análises nas quais o gênero é uma categoria relevante, à espera do interesse dos historiadores.
Se a História Portuária dialoga mais fortemente com as histórias nacionais, a História Marítima pode distanciar-se dessa perspectiva. Na verdade, alguns autores têm proposto a superação das histórias imperiais e nacionais nos estudos de História Atlântica – e podemos ampliar suas preocupações para oceanos, mares e cursos d’água diversos. Os oceanos são espaços geográficos e ao mesmo tempo uma categoria. Com os Estados, os oceanos compartilham essas e outras características: ambos têm fronteiras definidas e seus sujeitos constroem lealdades políticas entre si e em relação aos poderes institucionais. Ao mesmo tempo em que sugere isso, David Armitage observa, nos Estados, fronteiras mutantes e “conjunções imperfeitas entre lealdades políticas e limites geográficos”. Os oceanos são obras da natureza, mas o uso desses espaços é histórico e sobre eles podemos nos debruçar como sobre qualquer outro objeto. O autor ainda indica uma cronologia para a História Atlântica, de Colombo à era das revoluções. Com espaço e tempo próprios, a História Marítima pode transcender a abordagem estrita (e eventualmente estreita) dos Estados nacionais para não ser reduzida a uma forma palatável de estudar os impérios marítimos. Em sintonia com Armitage, Bernard Bailyn pontua que uma história das gentes do / no mar não pode se traduzir na somatória das histórias dos povos que habita(va)m suas margens, se quisermos ir além do caráter imperial e nacional. É importante acrescentar que, se não é uma somatória, essa abordagem também não pode simplesmente deixar de lado a história dos povos da Europa, África e América, como eventualmente ocorre.
Muitas abordagens poderiam surgir a partir da conjunção entre História Portuária e História Marítima, inclusive uma visão integrada. Neste dossiê, os textos e seus autores compõe um inventário em andamento, que está a merecer uma ampliação e um fortalecimento do campo.
Os textos do dossiê lidam com o arco temporal situado entre o final do século XVIII e as primeiras décadas do século XX. Todos eles referem-se ao Atlântico Médio e Sul – espaços que, no âmbito de uma historiografia atlântica, têm tido muito menos destaque. Historiadores do Brasil, da Argentina e da Espanha, reunidos na empreitada proposta pelos organizadores, falam, leem e escrevem em português e espanhol. As fontes produzidas nesses idiomas são nossa força para intervir no debate que, visivelmente, tem privilegiado o Atlântico Norte anglófono e francófono, transformado no parâmetro para estudos mais abrangentes.
Todo sumário é um pouco arbitrário, e nesta apresentação isso também pode ocorrer. Observamos, entre outras possibilidades de arranjo, três abordagens exemplificadas pelos textos do dossiê. A primeira, focada em historiografia e fontes da História Portuária e Marítima, está representada nos artigos de Cezar Honorato e Jaime Rodrigues. O primeiro nos brinda com sua ampla experiência ao construir um balanço sobre a historiografia de portos e cidades portuárias, com maior densidade para o caso emblemático do Rio de Janeiro, mas sem descuidar da produção sobre outros lugares do Brasil. Além de apontar as grandes linhas gerais pelas quais a historiografia dos portos vem se desenvolvendo há décadas, Honorato tem um amplo domínio dos estudos e dos núcleos mais ativos e relevantes de produção historiográfica sobre a temática portuária. Seu domínio do tema provém da longa experiência docente e da coordenação, em conjunto com Miguel Suarez Bosa, da Universidade de Las Palmas, do projeto “Puertos y Ciudades del Mundo Atlántico”, do qual participam pesquisadores de diversas partes do mundo. Por sua vez, Jaime Rodrigues explora preliminarmente o potencial dos registros de matrículas como fontes para a História Marítima na perspectiva da História Social e dos homens comuns que foram, eles também, construtores do império. Além de permitir um vislumbre da circulação das gentes livres e pobres entre a segunda metade do século XVIII e as primeiras décadas de século XIX, as fontes viabilizam estudos sobre cargos e funções a bordo; tempo de experiência e faixa etária dos embarcados; as eventuais possibilidades de ascensão profissional; a relação entre os tipos de navios, rotas marítimas e o tamanho das tripulações; e a variedade de lugares de origem, condição social e treinamento profissional dos marinheiros e oficiais.
A segunda abordagem contida nos textos do dossiê remete aos estudos de casos de portos. Alejandro González Morales e Antonio Ramón Ojeda trabalham com um espaço mais amplo – a chamada Macaronésia, composta pelos arquipélagos atlânticos incorporados ao território de suas antigas metrópoles, a saber: Açores, Madeira e Canárias. Sua condição insular é determinante para a existência de tantos portos e de tantas escalas feitas por embarcações de diferentes tipos em seus portos. A natureza como condicionamento é o ponto de partida do estudo que os autores nos apresentam sobre o desenvolvimento portuário desses arquipélagos, considerados em perspectiva comparativa.
Demografia e sociedade na região portuária do Rio de Janeiro são o objeto de Thiago Mantuano. Seu olhar para a cidade no século XIX se constrói desde as freguesias portuárias, sua dinâmica e evolução urbana. Com foco em espaços exíguos e de alta densidade demográfica, o autor os insere na região, no Brasil e no mundo por meio do porto carioca e de seu movimento. A riqueza que por ali circulou nos tempos em que a cidade era a capital do Império não impediu que a região portuária do Rio fosse, no decorrer no tempo, uma área de concentração da pobreza.
Mas não são apenas grandes volumes o sustentáculo dos portos. Flávio Gonçalves dos Santos vem, há anos, dedicando-se ao estudo de Ilhéus, na Bahia, e do impacto de seu porto na vida da cidade. O autor lida com temas como composição social e ocupações profissionais sendo transformadas em razão da atividade portuária. Todos os indícios interessam ao historiador e Santos deixa isso claro ao lidar, com desenvoltura, com fontes seriais e literatura de ficção para compor uma abordagem demográfica que não descuida da sociedade em processo de transformação.
Laila Brichta atravessa o Atlântico para focar um espaço colonial ainda pouco estudado entre nós: Moçâmedes no século XIX. O local vai ganhando importância entre os domínios portugueses na medida em que ali se viabilizam atividades comerciais com outros portos africanos e com a metrópole portuguesa. Diferentemente do que previam os planos de colonização, será na pesca e no comércio dos produtos dela derivados que se construirá a relevância dessa região ao sul de Angola.
Por fim, o dossiê traz uma perspectiva inescapável: a construção de circuitos atlânticos por meio da circulação de pessoas, da vigilância, da repressão e das ideias que, não fossem por esse caminho, não teriam se disseminado tão amplamente entre fins do XIX e início do XX. Três artigos foram dedicados a esse exame. Martín Albornoz e Diego Antonio Galeano dividem a autoria do estudo sobre anarquistas em pleno movimento pelo Atlântico Sul, sobretudo na rota que ligava o Rio de Janeiro a Montevidéu e Buenos Aires. Policiais, diplomatas e outros agentes da repressão ao anarquismo na América do Sul deixam claro que as fronteiras nacionais são, por vezes, limites que os historiadores criam para seu próprio conforto. Diante das estratégias internacionais de controle dos movimentos espaciais, os anarquistas foram capazes de construir suas próprias estratégias de proteção e escape por mar e nos portos do continente.
Álvaro Pereira do Nascimento revisita a história de João Cândido como personagem emblemática da vida marítima em um momento de transformações muito pronunciadas. O esforço não é simplesmente biográfico, mas sim o de entender Cândido como o guia para uma análise do impacto tecnológico na nova realidade, na qual a Armada continuava a recrutar um contingente amplo de homens negros e egressos da escravidão recém-extinta no Brasil. Cor, tecnologia, relações de trabalho e disputas ideológicas no novo regime são questões que Nascimento mobiliza e às quais dá um tratamento que raramente se vê em abordagens que não a da História Social por ele praticada.O dossiê encerra-se com o texto de Rodrigo Faustinoni Bonciani, que analisa um conto do brasileiro Machado de Assis e um romance do estadunidense James Weldon Johnson, expoente da Renascença do Harlem. Ambos os literatos são oriundos de sociedades escravistas e viveram o pós-abolição, expressando na literatura as repercussões da diáspora africana nas relações raciais no Brasil e nos Estados Unidos. Bonciani concentra-se na virada dos séculos XIX e XX para interpretar diferentes abordagens existentes nos estudos sobre o Atlântico negro.
Poderia haver muito mais. O dossiê deixa claro que o campo é amplo e pode ser aumentado. Trouxemos para este número de Almanack abordagens diferentes que poucas vezes dialogam entre si. Evidenciamos possibilidades de estudos considerando fontes conhecidas e outras nem tanto. Analisamos os portos e o mar em diferentes períodos e perspectivas. Trouxemos para o palco a História Econômica, a História Social e os Estudos Culturais. Tudo isso ainda é pouco, o que não nos desanima: portos e mares são objetos sedutores e continuarão a sê-lo para as gerações de estudiosos que virão.
Nota
5. LINEBAUGH, Peter. “Todas as montanhas atlânticas estremeceram”. Revista Brasileira de História,6: 7-46, set. 1983.
Referências
LINEBAUGH, Peter. “Todas as montanhas atlânticas estremeceram”. Revista Brasileira de História, 6: 7-46, set.1983. [ Links ]
Jaime Rodrigues – Professor na Unifesp e doutor em História pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). http: / / orcid.org / 0000-0002-9893-7365
Flávio Gonçalves dos Santos – Professor na Uesc e doutor em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF). http: / / orcid.org / 0000-0003-4241-8870
RODRIGUES, Jaime; SANTOS, Flávio Gonçalves dos. História marítima e portuária em revista. Almanack, Guarulhos, n.21, jan / abr., 2019. Acessar publicação original [DR]
História das Doenças e das práticas de curar no Oitocentos / Almanack / 2019
As últimas décadas têm sido marcadas por uma ampliação significativa no campo de pesquisa da história das doenças e das práticas de curar no Oitocentos. Dentre as características presentes nesses estudos, podemos ressaltar a intercessão e diálogo entre diferentes especialidades científicas, destacadamente os diálogos entre a história e a antropologia e a história e a linguística e a teoria literária; a multiplicidade de opções teórico-metodológicas adotadas – que transitam, mais comumente, entre a história social, a (nova) história política, a história cultura e a história das ciências – e de fontes utilizadas. Aliás, parte desse alargamento de fontes e olhares nos tem permitido, cada vez mais, captar as percepções em torno das doenças e das possibilidades de curas de certos estratos sociais antes desconsiderados em narrativas da história da medicina (em âmbito geral, apenas de uma medicina douta) eivadas de triunfalismos e percepções “presentistas”. [7]Cada vez mais sabemos dos achaques e de suas explicações e terapêuticas engendradas por escravos, libertos e demais elementos oriundos das camadas subalternas, num tipo de olhar que Roy Porter (1985), tão bem nomeou “visão dos pacientes / sofredores”.
Outro aspecto que merece menção é o alargamento dos temas de investigação: representações e caracterizações de doenças; passagem sempre temida de epidemias; diferentes medicinas que coexistiam e, não raro, se confrontavam em diferentes arenas; institucionalização da medicina douta; práticas de curar e doenças dos cativos, entre outros assuntos. Não sendo aqui o lugar para arriscarmos uma revisão dessa extensa bibliografia[8].
No rastro dessas possibilidades de ampliarmos o campo de análise em torno dessa área de pesquisa em franca expansão e fomentar o diálogo entre parte de seus autores e estudos, que apresentamos o presente dossiê temático História das Doenças e das práticas de curar no Oitocentos, na Revista Almanack. Acreditamos que o dossiê possa contribuir para que seus leitores – especialistas ou não especialistas – tenham diante de si textos que uma pertinente amostragem dessas novas leituras, fontes e métodos de estudo em torno dos temas da saúde e da doença no século XIX, com ênfase à realidade do Brasil imperial.
Assim, o artigo de Jean L. N. Abreu, “Discípulos de Asclépio: as teses médicas e a medicina acadêmica no oitocentos (1836-1897)”, analisa, a partir da organização das primeiras faculdades de medicina no Brasil, na década de 1830, até fins do século XIX, de que maneiras a produção de final de curso desses “facultativos” – como se dizia à época – espelha a institucionalização dos saberes médicos no Brasil. Nesse sentido, o autor, usando como corpus documental o banco de teses existente no Arquivo Público Mineiro, percebe as leituras, teorias e controvérsias que formavam os médicos nas faculdades de medicina do Império, ainda em vias de afirmação e legitimação de seus discursos e práticas.
Ainda acerca do processo de institucionalização dos saberes e práticas médicas oficiais no Brasil, mas, nesse caso, com base em um objeto mais específico de interpretação, qual seja as “nevroses” e demais “doenças mentais”, temos o texto de Simone de Almeida Silva, “Impugnação analítica: uma semiologia das doenças nervosas em defesa da medicina douta no período joanino”. A autora analisa os diagnósticos produzidos em torno dos êxtases da beata irmã Germana (1782-1853), na região do Caeté (Minas Gerais). Assim, diferentes saberes médicos oscilaram entre a percepção de que a beata era vítima de fenômenos sobrenaturais, argumento defendido por dois cirurgiões, e sua recusa, tecida em obra publicada pela Imprensa Régia em 1814, pelo médico mineiro diplomado na Europa, Antônio Gonçalves Gomide. Tais diferenças de olhares, teorias e conceitos acionados por esses diferentes discípulos de Hipócrates, revelam a rivalidade entre cirurgiões e médicos, além das influências de autores como Philipe Pinel e outros alienistas nessa publicação que a autora considera uma das primeiras obras sobre o tema do alienismo no Brasil.
O artigo de Tânia Pimenta, intitulado “Médicos e cirurgiões nas primeiras décadas do século XIX no Brasil”, com base na documentação da Fisicatura-mor (1808-1828), nos permite tomar conhecimento das diferentes “artes de curar” e perfis sociais daqueles que recorreram ao Órgão para oficializarem suas terapêuticas a partir da aquisição de licenças para curar. Assim, Pimenta dá conta das amplas e profícuas possibilidades analíticas dessa rica documentação, a exemplo da relação – em geral conflituosa – entre médicos e cirurgiões, os conhecimentos médicos exigidoa para a aquisição das licenças expedidas pelo Fisicatura, seu raio de ação em diferentes espaços geográficos, os custos arcados pelos indivíduos que queriam curar sem caírem nas raias da repressão e da ilegalidade, entre outros aspectos.
Os outros quatro artigos que compõem o presente dossiê revelam uma temática em franca expansão na historiografia das doenças e das artes de curar (como se dizia de modo corrente no oitocentos): a saúde dos escravos[9].
Assim em, “tráfico e escravidão: cuidar da saúde e da doença dos africanos escravizados”, de Jorge Prata, encontramos aproximações metodológicas e conceituais entre a História da Escravidão e a História das Ciências para o entendimento das formas de cuidados dos escravizados e das classificações e percepções dos achaques que sofriam. O autor, usando variada documentação, como testamentos e inventários, fontes da Santa Casa de Misericórdia, assentos de óbitos, defende a existência de um “sistema de saúde do escravo”, com especificidades e formas de identificação das doenças e, sobremaneira, tipos de tratamento que possuíam características próprias.
A fértil documentação da Santa Casa de Misericórdia (desta vez, a da Bahia) reaparece em “Decrépitos, anêmicos, tuberculosos: africanos na Santa Cada de Misericórdia da Bahia (1867-1872)”, de Gabriela Sampaio que, valendo-se de fontes inéditas, analisa as doenças dos escravos que viviam em Salvador na década de 1870. A autora busca, a partir desses registros, “chegar mais perto de quem eram e como viviam” esses indivíduos africanos, muitos deles cativos, uma vez que são revelados pela documentação do Hospital dados como a idade, o estado civil, a profissão, sua “nação”, entre outros dados. Além disso, a partir da produção médica da época, a autora igualmente busca compreender o discurso médico oficial tecido acerca das doenças que acometiam essa população e suas causas.
O corpo e a doença escrava como objetos de análise do saber médico oficial no século XIX também é analisado por Sílvio Lima, com base na obra do renomado médico Cruz Jobim. Assim, o autor sublinha de que maneiras, nas primeiras décadas do século XIX, o entendimento das enfermidades e a produção do conhecimento médico se processavam a partir da observação direta dos pacientes em hospitais que cada vez mais se configuravam com importantes espaços pedagógicos e de produção de textos médicos, a exemplo de teses, manuais e periódicos especializados. Para o autor, nesse processo de produção de saberes médicos, os corpos dos escravizados internados na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, seriam de fundamental valia para a construção das teorias etiológicas que tão fortemente influenciaram a medicina brasileira em recentes vias de institucionalização.
Como há tempos sabemos, os escravizados e seus descendentes não apenas adoeciam, mas também curavam. Nesse sentido, o artigo produzido por Sebastião Pimentel Franco e André Nogueira, interpreta as ações de dois curandeiros ilegais que atuaram na província do Espírito Santo na segunda metade do século XIX, sendo um deles, decerto filho de uma cativa. O processo-crime, tipo fonte já consagrada na produção de abordagens sociais em torno do universo do cativeiro, é aqui usado para percebermos que tipo de indivíduo recorreu aos curandeiros, quais achaques curavam e de que tipo de terapêutica e recursos sobrenaturais se valeram para a realização de suas curas. Assim, o caso de “O Trem” e Olegário dos Santos, nos remete ao pregnante universo da crença no feitiço e de práticas de curar que flertavam com o catolicismo e com matrizes culturais centro-africanas.
Aproveitamos para externar nossos agradecimentos à equipe da Revista Almanack pela eficaz parceria e auxílio em todas as etapas da edificação desse volume. Agradecemos, igualmente, aos colaboradores, cujos estudos aqui publicados nos permite um panorama dos mais atuais em torno da produção acadêmica da história das doenças e das práticas de curar no oitocentos. Enfim, desejamos que as leituras que seguem contribuam para o fomento do diálogo nesta seara de produção e possibilite novas incursões no universo fascinante e vário das doenças e suas curas no século XIX.
Saudações e boa leitura!
Notas
7. Para uma discussão sobre essa temática, ver, entre outros, Edler (1998) e Luiz Antônio Teixeira et. al. (2018, pp. 9-26).
8. Para um apanhado mais geral dessas tendências e texto concernentes à história das doenças e das práticas de curar no oitocentos, conferir Acosta (2005), além dos textos – muitos se propondo a um “estado da arte” publicados na coletânea organizada por Teixeira e Pimenta (2018).
9. Para uma abordagem mais ampla e que sugira ao escopo dessa apresentação sobre a produção historiográfica sobre a saúde dos escravos, ver, entre outros Figueiredo (2006, pp. 252-273) e Barbosa e Gomes (2016, pp. 273-305).
Referências
GOMES, Flávio e BARBOSA, Keith de Olivreira. Doenças, morte e escravidão africana: perspectivas historiográficas. PIMENTA, Tânia Salgado e GOMES, Flávio (org.). Escravidão, doenças e práticas de cura no Brasil. Rio de Janeiro: Outras Letras / CNPQ, 2016. [ Links ]
EDLER, Flávio. A medicina brasileira no século XIX: um balanço historiográfico. In: Asclépio. V. L-2, 1998. [ Links ]
FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves. As doenças dos escravos: um campo de estudo para a história das ciências da saúde. NASCIMENTO, Dilene Raimundo do, Diana Maul de; MARQUES, Rita de Cássia (org.). Uma história brasileira das doenças, v. 2. Rio de Janeiro: Mauad X, 2006. [ Links ]
PORTER, Roy. The patient’s view: doing Medical history from below. Theory and Society, v.14, n.2, Mar1985, pp. 175-198. [ Links ]
TEIXEIRA, Luiz A; PIMENTA, Tânia S. HOCHMANe Gilberto (org.). História da Saúde no Brasil. 1ed.São Paulo: Hucitec, 2018. [ Links ]
WITTER, Nikelen A. Curar como arte e ofício: contribuições para um debate historiográfico sobre saúde, doença e cura. In: Tempo. Revista do departamento de História da UFF. V.10, 2005. Disponível em:http: / / www.scielo.br / pdf / tem / v10n19 / v10n19a02.pdf. [ Links ]
André Luís Lima Nogueira – Doutor em História das Ciências e da Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz (COC / FIOCRUZ). Atualmente está no Programa de Pós-doutorado Nota 10 da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro, na mesma instituição (FAPERJ / FIOCRUZ). Autor de Entre Cirurgiões, Tambores e Ervas: calunduzeiros e curadores ilegais em ação nas Minas Gerais (século XVIII) (Garamond, 2016), além de artigos e capítulos em livros. E-mail: guazo08@gmail.com http: / / orcid.org / 0000-0003-2160-4279
Lorelai Brilhante Kury – Doutora em História pela Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales, EHESS. Atualmente é professora do PPGHCS da Casa de Oswaldo Cruz (onde atua também como pesquisadora titular) e do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Autora de Usos e circulação das plantas no Brasil. 1. ed. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio, 2013; Iluminismo e Império na Brasil: O Patriota (1813-1814). 1. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz / Biblioteca Nacional, 2007. Entre outros livros, artigos e capítulos de livros. E-mail: lolakury@gmail.com http: / / orcid.org / 0000-0002-5231-5720
SEBASTIÃO PIMENTEL FRANCO – Doutor em História pela Universidade de São Paulo. Professor Titular e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Autor, entre outros livros, de O Terribilíssimo Mal do Oriente:o cólera da província do Espírito Santo (1855-1856) (EDUFES, 2015), e da organização, com a colaboração de outros pesquisadores, da coletânea Uma História Brasileira das Doenças, vols. 4, 5, 6 e 7. E-mail: sp.franco61@gmail.com http: / / orcid.org / 0000-0002-3593-1724
NOGUEIRA, André Luís Lima; KURY, Lorelai Brilhante; FRANCO, Sebastião Pimentel. O oitocentos visto a partir de suas doenças e artes de curar. Almanack, Guarulhos, n.22, maio / agosto, 2019. Acessar publicação original [DR]
Jurisdições, Soberanias, Administrações / Almanack / 2018
Se é correto afirmar que as Independências foram uma solução, entre outras, possíveis, para os projetos em curso nas primeiras décadas do século XIX na América Ibérica, é igualmente verdadeiro sustentar que elas geraram um problema central: o da constituição de novas unidades jurídico-políticas de projeção nacional. Como é já sabido, este problema derivou da ausência de uma força política capaz de impor um programa geral nas disputas pela soberania e reconfiguração territorial que se seguiram, tanto na Europa como na América, à crise imperial ibérica desde 1807. Consequentemente, os projetos existentes tinham de afrontar não apenas a definição de seus difusos limites externos, senão também o que Ilmar Mattos chamou de “expandir-se para dentro”(Matos, 2005). O que exigiu tanto dar novo sentido às unidades políticas anteriores, como vice-reinados, províncias e domínios, quanto reorganizar novos territórios, definindo suas relações entre si com novos centros políticos. Tudo isso imerso na tradição de governo colonial que condicionou o desenvolvimento de novas estratégias e seguiu operando como pano de fundo comum de algumas concepções e práticas institucionais emergentes.
Apesar dos significativos avanços historiográficos sobre esta problemática, entendemos que ainda segue sendo um ponto a explorar o do processo histórico de conformação das unidades interiores com suas soluções políticas e institucionais. Para além de qual tenha sido o “sujeito-espaço político” que predominou em uma ou outra experiência, entendemos que são poucos os estudos comparativos que têm abordado o como, quer dizer, discursos, técnicas, dispositivos institucionais, etc., mediante os quais aqueles “sujeitos-espaço políticos” se consolidaram dentro das novas nações. Esta foi a principal motivação para que realizássemos, em junho de 2016, o Colóquio Jurisdições, soberanias, administrações: a configuração dos espaços políticos na construção dos Estados Nacionais na América Ibérica, ocorrido na Faculdade de Direito (USP), com financiamento da FAPESP e da CAPES (PAEP), o qual contou com a participação de pesquisadores do Brasil, Argentina, México, Colômbia, Chile, Cuba, Portugal, Espanha, Itália e França. Seu escopo foi discutir a questão no interior das novas unidades estatais na América ibérica, com foco na criação dos instrumentos de governo e controle sobre o território e a população durante o século XIX, assim como as tensões suscitadas pela sua implementação; e seu resultado foi muito frutífero, resultando em parcerias e publicações.
Uma delas é o dossiê que aqui se apresenta em que concentramos parte dos textos que discutiram um dos eixos de nossa proposta para o Colóquio: os agentes de governo (magistrados, oficiais, funcionários, etc.) e seus órgãos tendo como foco os modos de administração, como se organizaram institucionalmente os espaços provinciais, como se operou o processo de recrutamento de agentes do Estado, como se buscou a ordem pública, entre outros. Os trabalhos aqui reunidos tratam do caso do Brasil, dois deles antes da deflagração do movimento constitucionalista em Portugal, quando já era ali evidente a busca de soluções alternativas à crise da monarquia diante das transformações que se viviam em todo mundo ao redor. Única exceção é um estudo sobre Cuba, o qual se justifica, a despeito da manutenção de seu estatuto colonial, pela semelhança de problemas vividos na ilha diante da herança dos elementos coloniais no regime constitucional espanhol; isso sem contar a existência da escravidão, que muito faz pensar sobre o caso brasileiro.
Obviamente, cabe destacar que, no marco de um mesmo conjunto de problemas, estamos diante de uma rica pluralidade de enfoques oferecida pelas autoras. Além da alta qualidade das reflexões presente em todos os trabalhos, uma questão os une no afrontamento da reflexão proposta desde o início: o da qualificação do processo que, em cada um dos temas específicos tratados nos artigos, está longe de ser redutível a uma simples avaliação acerca de suas rupturas ou continuidades. Suas respostas são convergentes à necessidade de conhecer a complexidade deste momento transicional de estabelecimento de regimes constitucionais, cujas soluções, projetos e disputas políticas ocorreriam em meio a um universo contaminado culturalmente por práticas jurídicas consolidadas.
Neste sentido, alguns textos põem em questão o recurso a dispositivos ou ao modus operandi existentes na organização destes novos espaços nacionais. É o caso do trabalho de Renata Silva Fernandes que analisa as petições apresentadas ao Conselho Geral da Província de Minas Gerais, entre 1828 e 1834, buscando entender suas implicações no processo de criação do poder provincial, mesmo sendo o movimento peticionário prática consolidada no regime anterior. Neste escopo está o caso de Cuba, que Alina Castellanos Rubio afronta por meio da discussão acerca do Tribunal Especial Militar, atuante na primeira metade do XIX como tribunal de intervenção executiva de “excepcionalidade” (para controle da criminalidade, do bandoleirismo, e também crimes políticos), o qual fez parte de um programa consciente de conservação de um equipamento político militar colonial num ambiente de afirmação do regime constitucional espanhol. Numa outra chave, mas tendo em vista a mesma questão, Maria Luiza Oliveira explora os modos de governar dos presidentes das províncias brasileiras por meio das narrativas presentes em suas correspondências, as quais descortinam um quadro de acumulação de saberes e interesses pessoais que buscava lógicas diferentes das que os novos espaços institucionais almejavam construir.
Os revezes desta transição podem ser frequentemente vislumbrados no discurso da necessidade de reformas, cuja enunciação, mesmo quando não efetivadas, costuma ser um dado mais que significativo; sobretudo às vésperas do movimento constitucional no mundo português, em que se fazia necessário estar atento às possibilidades abertas em outras experiências coevas. Este é o caso visível do trabalho de Adriana Barreto de Souza ao analisar a Junta do Código Penal Militar e de Melhoramento das Coudelarias do Reino, instituída pelo príncipe regente D. João em 1802 com o intuito de modernização, em meio a um conjunto de reflexões sobre o foro militar e seu papel na estruturação das suas instituições, em especial do Exército. Tratando especialmente dos impasses que se colocaram no estabelecimento de novas soluções estão os trabalhos de Adriana Pereira Campos e Cláudia Maria das Graças Chaves. O primeiro, tendo como tema os juízes de paz no Brasil, explora os diversos sentidos conferidos àquela magistratura ao longo do período de sua “experimentação”, que vai desde sua criação em 1827 até a acomodação de suas funções em 1841, descortinando as contradições presentes na sua concepção e implantação. O segundo, concentra-se na discussão das Juntas da Real Fazenda que, como formas tradicionais e jurisdicionais de administração fazendária, tornaram-se a base dos novos poderes políticos e econômicos regionais quando da criação das Juntas Provisórias de Governo, organizadas desde as Cortes de Lisboa.
A complexidade das soluções experimentadas neste período talvez possa ser mimetizada pela ordem de problemas levantadas no texto de Roberta Stumpf. Ao analisar as modalidades de recrutamento dos oficiais americanos durante o governo joanino, chega à conclusão que a ocorrência de mudanças, por um lado, indicava o reforço do sistema de remuneração de serviços (a economia das mercês), essencial à consolidação do papel do monarca como promotor da justiça distributiva, mas, por outro, anunciava uma tendência de aceitação dos princípios meritocráticos, mesmo que no âmbito de uma monarquia tradicional. Nem apenas o caminho do patrimonialismo, nem somente o da burocracia, servem para sintetizar algo cuja graça está na sua própria história, ou seja, em descortinar como os protagonistas agiram e inventaram, com os instrumentos disponíveis, uma Era que foi vivida como de transformações. Oxalá este conjunto proporcione a seus leitores semelhantes vôos.
Referências
MATTOS, Ilmar Rohloff de. “Construtores e herdeiros: a trama dos interesses na construção da unidade política”. Almanack Braziliense, 1 (2005), pp. 8-26. [ Links ]
Andréa Slemian – Universidade de São Paulo. Professor Adjunto III no Departamento de História da EFLCH – Universidade Federal de São Paulo. http: / / orcid.org / 0000-0002-2745-7073
José Reinaldo de Lima Lopes – Doutor (1991) em direito pela Universidade de São Paulo. Pós-doutorado pela Universidade da Califórnia, São Diego (1995), e livre-docente pela Universidade de São Paulo (2003).
Alejandro Agüero – Graduado en Derecho por la Universidad Nacional de Córdoba (Argentina), Master Europeo en Historia y Comparación del as Instituciones Jurídicas y Políticas de la Europa Mediterránea por Universidad de Messina (Italia); Doctor en Derecho por Universidad Autónoma de Madrid (España). Cargo: Investigador Independiente CONICET – Prof. Adjunto Historia del DerechoDepartamento: Centro de Investigaciones Jurídicas y Sociales. Facultad: Facultad de Derecho – Universidad Nacional de Córdoba (Arg.). Contacto: aaguero@derecho.unc.edu.ar / / aleguero@hotmail.com.
SLEMIAN, Andréa; LOPES, José Reinaldo de Lima; AGÜERO, Alejandro. Palavras Introdutórias. Jurisdições, Soberanias, Administrações (Primeiras décadas do século XIX). Almanack, Guarulhos, n.18, jan / abr., 2018. Acessar publicação original [DR]
Regência e Imprensa / Almanack / 2018
Imigrações / Almanack / 2017
Fenômeno de longa duração, as migrações destacam-se como marca da modernidade. Rearranjos dos grandes impérios, transformações do capital, conflitos civis e novas demandas da organização do trabalho no interior do sistema capitalista provocaram fome e miséria. Tal quadro justifica o vertiginoso deslocamento ocorrido entre 1815-1914, quando cerca de 50 milhões de mulheres e homens, na maior parte europeus, abandonaram suas terras de origem e dirigiram-se às Américas para iniciar uma nova vida.
Cerca de um século depois, a globalização da economia vem fomentando uma nova onda migratória. Vemos a formação de um extraordinário fenômeno de mobilidade de indivíduos pelo planeta, em uma proporção muito superior àquele período, anteriormente citado, conhecido como da Grande Imigração. De acordo com os dados da Organização das Nações Unidas, em 2013, estimava-se em cerca de 232 milhões o número de imigrantes no mundo.
De um lado, a transnacionalização e a multinacionalização das empresas vem promovendo uma intensa circulação de trabalhadores nos mercados de produção, gerando novas formas de imigração, que devem ser consideradas como componentes da estruturação da sociedade na era da globalização.1 De outro, um número recorde de conflitos civis, étnicos e / ou religiosos, e os terríveis desastres ambientais que tem assolado diferentes regiões do planeta se somam à sociedade globalizada para explicar esse maciço deslocamento humano que caracteriza o tempo presente.
Trata-se de uma imigração diferenciada, porque volátil, uma vez que a nova ordem mundial facilita a continuidade desses deslocamentos, dificultando o enraizamento, adicionando-lhe novas e delicadas questões, como a receptividade da sociedade brasileira a esses novos grupos e o conflito gerado pela disputa no mercado de trabalho e por direitos políticos, civis e sociais. Além disso, antigas questões se reapresentam ante a opinião pública, como o debate sobre o imigrante desejável, produzindo uma incômoda sensação de retorno ao final do século XIX. Xenofobias reaparecem e nos fazem refletir se o Brasil é de fato um país cordial.
Assim, não seria errado afirmar que a e / imigração é um tema fundamental da história, e que talvez seja, na atualidade, um dos campos mais instigantes para os historiadores. Vale dizer que para o estudo desse fenômeno e dos seus desdobramentos convergem questões centrais do tempo presente como o debate sobre as identidades, os desejos e deveres de memória e as comunidades de sentido, problemas diretamente relacionados ao avanço da globalização sobre os estados e economias nacionais e locais.
É sob a luz das questões e inquietações do presente que o dossiê Imigrações, organizado pelas professoras Ismênia de Lima Martins, Gladys Sabina Ribeiro e Érica Sarmiento, aborda o “longo século XIX”- e os seus diferentes fluxos migratórios e grupos de imigrantes que encontraram nas Américas seu pouso e destino.
Na historiografia relacionada aos estudos migratórios, o Oitocentos estende-se até o ano de 1930, compreendendo, assim, também o denominado período da Grande Imigração (1880-1930) e todo o arcabouço deixado pelo numeroso contingente migratório que cruzou o atlântico. O dossiê reúne um conjunto de textos, escritos por especialistas de longa trajetória na temática, que analisam, desde diferentes perspectivas, as políticas migratórias, as experiências, a memória, a opinião pública e a integração nas sociedades de recepção dos diferentes grupos de imigrantes.
O continente americano constituiu-se em um grande receptor de imigração ao longo do século XIX. Muito dos jovens Estados, ainda em formação, fortaleceram e consolidaram as suas políticas em função da chegada de imigrantes, que foram entendidos como elementos de progresso e de civilização para as promissoras sociedades em desenvolvimento.
No caso do Cone Sul, em particular Brasil e Argentina, a imigração representou uma das molas propulsoras das políticas estatais, partícipes das políticas de povoamento, substituição de mão de obra escrava e de branqueamento da população. Já nos primórdios do século XIX, os intelectuais argentinos que fizeram parte da mítica Geração de 37, de Buenos Aires, deixaram em seus escritos a importância do elemento estrangeiro no desenvolvimento de sua sociedade, como foi o caso de Juan Bautista Alberdi, que imortalizou a frase “governar es poblar”. No artigo de Alejandro Férnandez, intitulado “La ley argentina de inmigración de 1876 y su contexto histórico”, o autor analisa a chamada Ley de Inmigración y Colonización, promulgada no ano de 1876, considerada como um dos pilares legislativos da modernização da Argentina. A lei atribui ao imigrante o seu papel modernizador, tanto no plano da economia como na sociedade como um todo.
Diferente das jovens repúblicas da antiga América espanhola e dos Estados Unidos, o Império brasileiro discutiu e estimulou a questão imigratória no âmbito de uma sociedade ainda escravista. Nesse sentido, o artigo de Paulo Gonçalves realiza uma importante análise sobre as tensões estabelecidas no âmbito do fornecimento e controle da mão de obra para a economia agroexportadora oitocentista. No contexto do período conhecido como de transição do trabalho escravo para o livre, em fins do XIX, a mão de obra assalariada imigrante viu-se refém da mentalidade escravista dos fazendeiros brasileiros, do mandonismo local, e de seus instrumentos de coerção econômica e do uso da força.
O texto de Ana Scott apresenta o estudo da experiência migratória ocorrida entre Portugal (Província da Beira / Concelho da Lousã) e a província de São Paulo (região de Espírito Santo do Pinhal). Nesse caso, a história demográfica forneceu informações importantes para a análise e cruzamento de fontes por meio da exploração de registros paroquiais de batismo e de casamento correspondentes às décadas de 1860 e 1880, da Vila da Lousã (próximo à cidade de Coimbra), e do Núcleo Nova Lousã, no interior da província de São Paulo. Vale ressaltar a relevância dos registros paroquiais como importantes fontes nominativas na construção de tipologias de grupos migratórios. Outrossim, o estudo das variações regionais ou provinciais demonstra um amadurecimento dos estudos migratórios, nas últimas décadas, com uma profunda compreensão e conhecimento da realidade de origem e recepção dos migrantes, bem como das relações que se estabelecem entre ambos os universos. A questão da variação da escala aos níveis locais – antes muito limitada- a recortes maiores sem dúvida representou um grande avanço para a análise de fatores microssociais dos processos migratórios.
O patrimônio e o legado cultural construídos por imigrantes na sociedade de acolhimento é uma das contribuições mais significativas relacionadas ao fenômeno migratório. Eloisa Capovilla Ramos, em seu artigo, analisa dois monumentos, um na cidade de Buenos Aires e outro em Caxias dos Sul, erigidos como símbolos da identidade da imigração italiana. Os monumentos, segundo a autora, representam espaços de memória e rememoração que pertencem ao patrimônio cultural de seus países. Na memória dos imigrantes, a história se inicia somente no ponto onde acaba a tradição, momento que, segundo Maurice Halbwachs, se apaga ou se decompõe a memoria social. Quando a memória se dispersa, então o único meio de salvar as lembranças é fixá-las por escrito em uma narrativa, em símbolos, uma vez que as palavras e os pensamentos morrem, mas os escritos permanecem.2 A autora em questão dá uma original contribuição para estender tais pressupostos aos monumentos urbanos construídos para celebrar a imigração no quadro urbano.
O artigo de Martín Pérez Acevedo lança luz sobre a presença imigrante de irlandeses no México. Tal grupo não tinha merecido ainda um esforço de pesquisa sistematizada, talvez por ser quantitativamente inferior no quadro da grande imigração para aquele país. Assim, o autor demonstra, a partir de dados extraídos do Registro de estrangeiros no México do ano de 1925, como esta coletividade formou parte de projetos colonizadores de povoamento do norte do país, ao logo do século XIX, por meio da mineração e do comércio, sendo, muitos deles, agentes de empresas britânicas.
Outra temática que preenche lacunas na historiografia das migrações encontra-se no texto de Oscar Alvarez Gila. Trata-se da análise da opinião pública na imprensa sueca em relação aos primórdios da emigração para os Estados Unidos, um dos destinos preferenciais deste grupo no período da Guerra Civil. O autor realiza um importante levantamento da imprensa da época, ao elencar várias questões afins ao processo migratório publicado na imprensa, como as cartas, as agências de imigração e a posição dos periódicos quanto à emigração.
O conjunto de artigos apresentados nesse dossiê representa uma importante contribuição, do ponto de vista teórico e metodológico, para a nova historiografia das migrações. O leitor poderá acompanhar as discussões realizadas pelos autores e os seus percursos bibliográficos a partir dos quais estabeleceram suas conclusões.
Tais análises contribuem, também, como chaves de leitura para que os historiadores do tempo presente enfrentem os dilemas, as inquietações e as tensões das migrações contemporâneas.
Finalmente, cabe agradecer ao PPGH-UFF por ter custeado a diagramação e a marcação XML deste número. A Almanack é um revista interinstitucional que precisa contar com o apoio dos programas de pós-graduação partícipes da grande aventura que é a manutenção de uma publicação em tempos de escassos recursos.
Notas
1. Canales, Alejandro apud BAENINGER, Rosana. Desafios teórico-metodológicos para a interpretação da migração internacional na sociedade contemporânea. Rev. bras. estud. popul., São Paulo , v. 34, n. 1, p. 181-184, Apr. 2017 . Available from<http: / / www.scielo.br / scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-30982017000100181&lng=en&nrm=iso>. access on 19 Sept. 2017. http: / / dx.doi.org / 10.20947 / s0102-3098a0015.
2. HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro Editora, 2006.
Érica Sarmiento – Professora Adjunta na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Professora titular do Programa de Mestrado em História da Universidade Salgado de Oliveira. Coordenadora do Laboratório de Estudos de Imigração (Labimi / UERJ) e do Laboratório de Imigração e Estudos Ibéricos (UNIVERSO). É pesquisadora Jovem Cientista Nosso Estado da FAPERJ. E-mail: erisarmiento@gmail.com
Ismênia de Lima Martins – Professora Emérita da Universidade Federal Fluminense. Coordenadora de Editoração e Acervo da FAPERJ e Membro do CONARQ. Integra a Comissão de Altos Estudos do Programa Memórias Reveladas, da Casa Civil da Presidência da República. Coordena o projeto Portugueses no Brasil, em cooperação com o CEPESE, da Universidade do Porto; o GT Imigração, Identidade e Cidadania, da ANPUH, e o Projeto Entrada de Imigrantes no Brasil, Listagem de Vapores, Arquivo Nacional, BNDES. É presidente da Associação Cultural do Arquivo Nacional e Sócia Honorária do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro – IHGB. E-mail: ismeniamartins@uol.com.br
Gladys Sabina Ribeiro – É professora titular do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense; bolsista de produtividade do CNPq e Cientista do Nosso Estado / FAPERJ. É coordenadora do NEMIC (Núcleo de Estudos de Migrações, Identidades e Cidadania), vice-coordenadora do CEO (Centro de Estudos do Oitocentos) e uma das fundadoras da SEO (Sociedade Brasileira de Estudos do Oitocentos). E-mail: gladyssabina@gmail.com
SARMIENTO, Érica; MARTINS, Ismênia de Lima; RIBEIRO, Gladys Sabina. Apresentação. Almanack, Guarulhos, n.17, set / dez, 2017. Acessar publicação original [DR]
A escravidão e o tráfico atlântico de escravos no Brasil e em Cuba desde uma perspectiva afro-atlântica / Almanack / 2016
Um número crescente de estudos comparando a escravidão nas Américas foi publicado nas últimas duas décadas. Essa recente bolsa de estudos enfatizou muito a importância de estudar o papel da África no comércio de escravos no Atlântico, a fim de compreender sua dinâmica e compreender as maneiras pelas quais os africanos escravizados contribuíram, econômica, política e culturalmente, para a construção das Américas. [1[ Embora a maioria dos estudos comparativos sobre escravidão nas Américas tenham se concentrado no Brasil e nos Estados Unidos, as duas maiores sociedades escravistas do hemisfério ocidental, novas pesquisas também exploraram as muitas semelhanças entre o Brasil e outras sociedades escravistas, especialmente Cuba. [2]
Essa nova onda de estudos comparando Brasil e Cuba é bem justificada. Colonizadas por portugueses e espanhóis, ambas as sociedades foram marcadas pela presença da Igreja Católica. No Brasil e em Cuba, como em outras partes das Américas espanholas, os escravos eram batizados e podiam se casar. Em centros urbanos como México, Lima, Montevidéu, Rio de Janeiro, Havana, Matanzas e Salvador, escravos ingressavam em irmandades leigas católicas (irmandades ou cofradías). Nas áreas urbanas cubanas, os escravos também se juntaram aos cabildos de nación. [3] Essas associações, que prestavam serviços funerários e serviam como sociedades de ajuda mútua aos seus membros, foram organizadas segundo linhas étnicas. Eles permitiram que os escravos suportassem as adversidades da escravidão e preparassem a transição para a liberdade. [4]
O Brasil importou aproximadamente 5,1 milhões de escravos africanos, enquanto as importações de escravos cubanos são estimadas em 778.000 escravos. No século XVII, o Brasil era um grande produtor de açúcar, enquanto a indústria açucareira cubana ganhava importância após o surgimento da rebelião escravista em São Domingos. No início do século XIX, Brasil e Cuba tornaram-se grandes produtores de café. [5] Havia também outras semelhanças. A maioria dos africanos escravizados transportados para o Brasil e Cuba veio de áreas da África Ocidental e da África Central Ocidental, onde predominavam as línguas bantu e ioruba. Da África trouxeram tradições espirituais semelhantes que aliadas ao catolicismo possibilitaram o surgimento de religiões como o candomblé e a santeria. [6]Da mesma forma, eles também carregaram consigo conhecimentos de guerra, que empregaram para organizar revoltas de escravos, durante os séculos XVIII e XIX. [7]
Os sistemas jurídicos das sociedades coloniais latino-americanas, incluindo Brasil e Cuba, baseavam-se amplamente no Direito Romano, dimensão que impactou as populações escravizadas de maneira semelhante. Nas duas sociedades, os escravos conseguiam obter a alforria e podiam comprar sua liberdade. Escravos recorreram à Justiça para apresentar uma petição a seus senhores para obter sua liberdade e também para denunciar maus tratos e abusos sexuais. Além disso, apesar de seus tamanhos diferentes, tanto no Brasil quanto em Cuba, como no México, Peru e Argentina, a escravidão estava presente não apenas nas zonas de plantio, mas também nas áreas urbanas.
No Brasil e em Cuba, o comércio de escravos gerou grandes lucros para os mercadores de escravos, que continuaram a importar escravos após sua abolição legal. [8] Entre 1820, quando o tráfico de escravos para Cuba foi proibido pela primeira vez, e 1867, quando sua proibição foi efetivamente aplicada, aproximadamente 499.580 escravos africanos desembarcaram na colônia espanhola. [9] Da mesma forma, após sua primeira proibição legal em 1831, o Brasil importou cerca de 480.000 escravos. [10]Em ambas as sociedades, proprietários de escravos e fazendeiros obtiveram ganhos importantes. A escravidão foi uma instituição lucrativa que muito contribuiu para o desenvolvimento do capitalismo na Europa e nas Américas durante o século XIX. Como a escravidão era uma instituição lucrativa, os proprietários e proprietários de escravos brasileiros e cubanos resistiram muito ao fim da escravidão. [11] Tal oposição levou à adoção da emancipação gradual, que, exceto para a República Dominicana, também foi a abordagem escolhida pelas elites locais em todas as outras sociedades latino-americanas.
Como Cuba estava dividida por uma guerra pela independência, em 4 de julho de 1870, o Parlamento espanhol aprovou a Lei Moret emancipando todas as crianças nascidas de mães escravas após sua promulgação. [12] Além disso, a mesma lei libertou os escravos com mais de 60 anos. Ainda assim, a lei estabeleceu uma série de restrições, incluindo que recém-nascidos libertados deveriam permanecer sob a custódia do mestre da mãe. Em 28 de setembro de 1871, o Brasil aprovou uma legislação semelhante. A Lei do Rio Branco (ou Lei do Ventre Livre) libertou os filhos de mães escravas que nasceram após seu falecimento. Semelhante à Lei Moret, o alcance da Lei Rio Branco também era limitado e, na prática, não libertava nenhum escravo vivo no Brasil.
Cuba aprovou a Lei do Patronato em 1880 que determinava o fim da escravidão e a substituiu por um período de aprendizagem de oito anos. Portanto, escravos libertos foram renomeados como patrocinados, enquanto os ex-mestres foram nomeados patronos. [13] Em 1885, o Brasil promulgou a Lei Saraiva-Cotegipe ou Lei Sexagenária, que emancipava todos os escravos com mais de sessenta anos. Eventualmente, o sistema de patronato cubano terminou em 7 de outubro de 1886, antes da data inicialmente estabelecida, com a abolição definitiva da escravidão.
A escravidão brasileira foi abolida apenas em 13 de maio de 1888. Tanto no Brasil quanto em Cuba, a transição da escravidão para a liberdade apresentou vários elementos em comum. Enquanto no Brasil a força de trabalho escrava foi substituída principalmente por trabalhadores de origem europeia, Cuba incentivou a imigração de trabalhadores contratados asiáticos. Além disso, em ambos os países o período pós-abolição foi marcado pela manutenção de relações raciais em que predominava a ideia de mestiçagem e democracia racial. Como em outras sociedades pós-escravistas nas Américas, no Brasil e em Cuba, as populações recém-libertadas e seus descendentes enfrentaram uma longa história de racismo e de exclusão social e econômica.
Ao explorar a história da escravidão e do tráfico atlântico de escravos no mundo do Atlântico Sul, durante os séculos XVIII e XIX, este número especial olha para o exemplo de Cuba como contraponto ao estudo da escravidão no Brasil. Além disso, os vários artigos exploram a história dessas duas sociedades escravistas, dando à África um papel central no estudo do comércio de escravos no Atlântico. Para tanto, quatro artigos deste número exploram os mecanismos do tráfico de escravos para o Brasil e Cuba, enquanto os outros três artigos examinam os mecanismos da escravidão nessas duas sociedades escravistas das Américas, com particular atenção ao papel dos escravos. e mulheres libertas.
Em seu artigo, Carlos da Silva Jr. examina a longa história das trocas entre a Bahia e o Golfo do Benin durante o século XVIII, a fim de compreender a dinâmica do tráfico negreiro atlântico nos portos dessa região. Da Silva explica por que os mercadores de escravos baianos preferiam comprar cativos de determinados grupos linguísticos, como Ardra, Mina e Jeje, em detrimento de outros. Ele também enfatiza como as guerras interestatais no golfo de Benin e seu interior, bem como as interações entre os vários atores sociais envolvidos no comércio de escravos contribuíram para essa escolha. Explorando novas fontes de arquivos e mergulhando profundamente na história da África Ocidental para examinar a escravidão na Bahia, o artigo da Silva contribui para uma longa tradição de estudos que examinou essa região nas últimas seis décadas.
Explorando o comércio de escravos do início do século XIX para Cuba, Michael Zeuske analisa as trajetórias entrelaçadas de um homem escravizado nascido na África e um comerciante de escravos europeu. Roberto (ou Robin ou Robert) Botefeur nasceu no interior da Gâmbia, onde foi escravizado quando ainda era jovem. Trazido para a costa, ele foi vendido como escravo a um médico alemão e comerciante de escravos, chamado Daniel Botefeur, que morava na Ilha de Bunce, Serra Leoa, há vários anos. Em 1815, senhor e escravo mudaram-se para Cuba, onde se juntaram a uma comunidade composta por homens e mulheres de vários status e nacionalidades. Navegando nas interseções da micro-história e macro-história, Zeuske demonstra como, apesar de suas histórias diferentes, esses dois homens podem ser definidos como cosmopolitas do mundo atlântico “escondido”.
O artigo “Do Além do Kwango: Traçando as Origens da Saída dos Escravos de Angola, 1811-1848”, de Daniel B. Domingues da Silva e Badi Bukas-Yakabul, estuda as origens dos africanos libertados de Cuba e Serra Leoa durante o século XIX. O artigo analisa os registos disponibilizados no Portal Origens Africanas (http: / / www.african-origins.org) de forma a estimar o número de africanos escravizados da região de Angola e a sua distribuição etnolinguística. Desafiando estudos anteriores sobre as origens dos escravos naquela área geográfica, os autores mostram que apenas cerca de 21 por cento dos cativos embarcados em Angola durante o século XIX vieram da zona além do rio Kwango. Além de contribuir para identificar as origens dos escravos africanos importados para as Américas,
Da África Ocidental e da África Central Ocidental, os próximos artigos movem o foco para Braizl. A maioria dos trabalhos que examinam a chegada de navios negreiros às costas brasileiras durante a era do comércio de escravos no Atlântico concentra-se nos portos do Rio de Janeiro e Salvador. Os historiadores Marcus JM de Carvalho e Aline Emanuelle De Biase Albuquerque exploram a história do tráfico de escravos para o Brasil antes de sua proibição legal em 1831. Os autores examinam os procedimentos médicos e de higiene aplicados aos navios negreiros que chegavam da África no porto de Recife em Pernambuco . O artigo explica o papel dos diversos atores sociais envolvidos no processo de desembarque, e as péssimas condições de transporte a que os africanos foram submetidos durante a Passagem do Meio,
Mariana Dantas explora a história das mulheres negras e das mulheres de cor na Minas Gerais colonial, no Brasil. Examinando registros notariais como inventários post mortem, testamentos e escrituras executadas em Sabará, município de Rio das Contas, na segunda metade do século XVIII, ela mostra como as mulheres negras conseguiram alguma mobilidade social. O artigo discute os processos pelos quais essas mulheres desafiaram as fronteiras sociais e raciais existentes. Ela mostra como, apesar das condições difíceis, essas mulheres conseguiram assegurar a transmissão de bens, inclusive escravos, para seus filhos homens e mulheres.
O artigo de Mariana Muaze discute as relações entre senhores e escravas que trabalhavam como empregadas domésticas no casarão de uma das maiores e mais antigas fazendas de café da região, a Fazenda Pau Grande, localizada em Paty do Alferes, no Vale do Paraíba. . Embora as mulheres escravizadas esperassem que os laços de afeto recíproco com seus senhores as ajudassem a obter os papéis da alforria, Muaze mostra que ganhar a liberdade sempre foi uma conquista incerta. Cientes de seu poder, os senhores brincavam constantemente com essas expectativas para exercer controle sobre seus escravos. O trabalho de Muaze contribui para esclarecer como o trabalho escravo doméstico era generalizado no Brasil e como seus legados persistem até hoje.
No artigo final deste número, Ynaê Lopes dos Santos compara a escravidão urbana em Havana e no Rio de Janeiro entre 1816 e 1820. Esse período foi marcado pela queda de Napoleão Bonaparte e pelo Congresso de Viena, junto com a ascensão do abolicionista britânico movimento, eventos que pareciam colocar em perigo a continuação da escravidão em um futuro próximo. Baseando-se em diversos relatórios produzidos pelas autoridades administrativas de Havana e do Rio de Janeiro, Santos mostra como esses funcionários utilizavam seu conhecimento detalhado do tecido urbano para controlar as populações escravas que cresciam rapidamente nas duas cidades. Focalizando um período em que o medo da rebelião assombrava os senhores de escravos até mesmo nas cidades, o artigo de Santos contribui para o estudo comparativo da escravidão urbana nas Américas a partir de uma perspectiva afro-atlântica.
Reunindo obras que enfocam a história da escravidão e do tráfico atlântico de escravos no sistema do Atlântico Sul, os diversos artigos deste número concebem a escravidão e o tráfico de escravos como resultantes de relações interconectadas, também devedoras de determinadas dinâmicas sociais, econômicas e culturais. que evoluiu nas sociedades africanas.
Através do estudo das múltiplas dimensões das conexões afro-atlânticas e combinando uma variedade de abordagens que combinam micro-história e macro-história, bem como demografia e história urbana, os vários artigos iluminam como os mecanismos mais amplos do escravo atlântico afetaram o cotidiano de escravos e escravas no Brasil e em Cuba. Esperamos que tais trabalhos incentivem o desenvolvimento de novas pesquisas comparativas sobre outras sociedades escravistas nas Américas.
Notas
1. RODRIGUES, Jaime. De costa a costa: escravos, marinheiros e intermediários do tráfico negreiro de Angola ao Rio de Janeiro, 1780-1860. São Paulo: Companhia das Letras, 2005; HAWTHORNE, Walter. Da África ao Brasil: Cultura, Identidade e um Comércio de Escravos no Atlântico, 1600-1830. Nova York: Cambridge University Press, 2010; SWEET, James H. Domingos Álvares, African Healing, and the Intellectual History of the Atlantic World. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2011; FERREIRA, Roquinaldo Amaral, Intercâmbio intercultural no mundo atlântico: Angola e o Brasil na era do tráfico de escravos. Nova York: Cambridge University Press, 2012.
2. BERGAD, Laird W. As histórias comparativas da escravidão no Brasil, em Cuba e nos Estados Unidos. Nova York: Cambridge University Press, 2007; BERBEL, Márcia Regina, Rafael de Bivar Marquese e Tâmis Parron. Escravidão e política: Brasil e Cuba, c. 1790-1850. São Paulo: Editora Hucitec, 2010; COWLING, Camillia. Concebendo a liberdade: mulheres de cor, gênero e abolição da escravidão em Havana e no Rio de Janeiro. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2013; GRADEN, Dale Torston. Doença, resistência e mentiras: o fim do tráfico transatlântico de escravos para o Brasil e Cuba. Baton Rouge: Louisiana State University Press, 2014 e PARRON, Tâmis Peixoto, A política da escravidão na era da liberdade: Estados Unidos, Brasil e Cuba, 1787-1846, Tese (Doutorado em História Social), Faculdade de Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo,
3. Sobre cabildos afro-cubanos, ver HOWARD, Philip A. Changing History: Afro-cuban Cabildos and Societies of Color in the XIX Century. Baton Rouge: Louisiana State University Press, 1998; CHILDS, Matt D. A rebelião Aponte em Cuba de 1812 e a luta contra a escravidão no Atlântico. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2006.
4. SOARES, Mariza de Carvalho. Pessoas de fé: escravidão e católicos africanos no Rio de Janeiro oitocentista. Durham, NC: Duke University Press, 2011.
5. Sobre a produção de açúcar no Brasil, ver SCHWARTZ, Stuart B. 1985. Plantações de açúcar na formação da sociedade brasileira: Bahia, 1550-1835. Cambridge: Cambridge University Press. Sobre o crescimento da produção de açúcar em Cuba durante o século XIX, ver FERRER, Ada. Espelho da liberdade: Cuba e o Haiti na era da revolução. Nova York: Cambridge University Press, 2014. Sobre a produção de café em Cuba, ver VAN NORMAN, William C. Shade cultivou a escravidão nas vidas de escravos nas plantações de café em Cuba. Nashville, TN: Vanderbilt University Press, 2012; e no Brasil, ver SALLES, Ricardo. E o vale era o escravo: Vassouras, século XIX: senhores e escravos no coração do Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
6. Sobre as religiões iorubá na diáspora, ver OLUPONA, Jacob K. e Terry Rey, Òrìşà Devotion as World Religion: The Globalization of Yorùbá Religious Culture. Madison, WI: University of Wisconsin Press, 2008.
7. Sobre a guerra no golfo do Benin e na Bahia e em Cuba, ver BARCIA, Manuel. Guerra da África Ocidental na Bahia e em Cuba: soldados escravos no mundo atlântico, 1807-1844. Oxford: Oxford University Press, 2014, e REIS, João José, Rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos malês em 1835. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
8. Sobre Cuba, esse ponto é enfatizado por ZEUSKE, Michael. Amistad: A Hidden Network of Slavers and Merchants. Princeton: Markus Wiener Publishers, 2015. Sobre o Brasil, ver CHALHOUB, Sidney. A força da escravidão: ilegalidade e costume no Brasil oitocentista. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
9. Sobre o tráfico de escravos para Cuba, ver BERGAD, Laird W., Fe Iglesias García e María del Carmen Barcia. The Cuban Slave Market, 1790-1880. Nova York: Cambridge University Press, 1995.
10. Para estimativas, consulte o Transatlantic Slave Trade Database: Voyages, www.slavevoyages.org.
11. Veja SCHIMIDT-NOWARA, Christopher. Império e antiescravidão: Espanha, Cuba e Porto Rico, 1833-1874. Pittsburgh: Pittsburgh University Press 1999, capítulo 7 e SCHIMIDT-NOWARA, Christopher. Escravidão, liberdade e abolição na América Latina e no mundo atlântico. Albuquerque: University of New Mexico Press, 2011, p. 90-91.
12. Sobre a rebelião, ver FERRER, Ada. Cuba Insurgente: Raça, Nação e Revolução, 1868-1898. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1999. Sobre a Lei Moret, ver COWLING, Conceiving Freedom, capítulo 3.
13. Sobre as limitações desta lei, ver SCOTT, Rebecca. Slave Emancipation in Cuba: The Transition to Free Labor, 1860-1899. Pittsburgh, PA: University of Pittsburgh Press, 2000, p. 128
Ana Lucia Araújo – Howard University Washington. E-mail: aaraujo@Howard.edu
ARAÚJO, Ana Lucia. [A escravidão e o tráfico atlântico de escravos no Brasil e em Cuba desde uma perspectiva afro-atlântica]. Almanack, Guarulhos, n.12, jan / abr, 2016. Acessar publicação original [DR]
Escalas de História Global / Almanack / 2016
Algumas palavras sobre o dossiê Escalas de História Global [1]
De 3 a 5 de março de 2016, a Faculdade de Filosofia de Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo sediou o Seminário Internacional Escalas de História Global , organizado pelo LabMundi-USP como parte das atividades relacionadas à Rede de História Global 2 . Seu objetivo principal foi reunir duas dezenas de historiadores de oito países diferentes (Brasil, Argentina, Peru, Estados Unidos, Holanda, Senegal, Índia e China), em diferentes estágios de suas carreiras, para discutir as possibilidades e limites da História global. Os trabalhos apresentados no seminário exploraram temas específicos em vários tempos e lugares, mas todos eles engajados em abordagens amplas que poderiam ser identificadas de diferentes maneiras como globais.
Durante o seminário, os participantes exploraram temas que cruzaram oceanos e continentes unidos, como movimentos migratórios, fluxos de capitais e mercadorias, formação de territórios, dinâmicas de trabalho em ambientes urbanos e rurais, ideias religiosas e políticas, entre outros. A maioria dos debates lidava com uma questão central: a necessidade de compreender certas realidades sociais que, por sua própria natureza histórica, exigem dos estudiosos a capacidade de usar ferramentas empíricas e teóricas extensas, empurrando assim para ir além de escalas de observação que são muito restritas.
Muitos dos trabalhos apresentados no seminário – enriquecidos por críticas e sugestões dos participantes – compõem este número especial do Almanack, periódico eminentemente cosmopolita desde o seu início. Nenhum desses artigos apresenta uma defesa acrítica de abordagens globais, nem tenta definir tais abordagens. A riqueza deste número reside precisamente no facto de apresentar uma investigação histórica da mais alta qualidade, que oferece a base mais sólida para avaliar qualquer proposta teórica ou metodológica independentemente do seu grau de real inovação. No caso da História Global, parece sensato considerar que seu potencial de inovação depende da existência de casos específicos – embora espacialmente amplos – em que as abordagens globais se mostrem eficazes e úteis.
Além de suas contribuições historiográficas individuais, os artigos apresentados são exemplos de uma História Global construída sobre realidades concretas. Eles são uma advertência saudável contra a possibilidade de que o potencial inexplorado das abordagens globais possa se tornar outra teoria superficial ou simplesmente uma nova seita historiográfica.
Notas
1. Traduzido por Leonardo Marques.
2. A Rede de História Globalfoi concebida por Sven Beckert e Marcel van der Linden e é formada por seis instituições: East China Normal University, International Institute of Social History (Holanda), LabMundi-USP (Brasil), University of Delhi (Índia) , Université Cheikh Anta Diop (Senegal) e Weatherhead Initiative on Global History-Harvard (EUA).
João Paulo Pimenta – Universidade de São Paulo. E-mail: jgarrido@usp.br
Rafael Marquese – Universidade de São Paulo. E-mail: marquese@usp.br
PIMENTA, João Paulo; MARQUESE, Rafael. Algumas palavras [Algumas palavras sobre o dossiê Escalas de História Global]. Almanack, Guarulhos, n.14, set / dez, 2016. Acessar publicação original [DR].
Experiencias de tiempo en los siglos XVIII y XIX iberoamericanos. Un abordaje desde la historia conceptual / Almanack / 2015
Los estudios sobre las formas de experimentar, representar y conceptualizar el paso del tiempo, así como los cambiantes vínculos entre pasado, presente y futuro y el valor que se les otorga a cada una de estas dimensiones, ocupan un lugar cada vez más importante en la agenda de las ciencias humanas y sociales. Las preguntas que orientan a estas indagaciones obedecen tanto a innovaciones promovidas por disciplinas como la filosofía, la sociología, la antropología, la estética y la teoría de la historia, como a las mutaciones en las formas de experimentar la temporalidad que se están produciendo en los últimos años.1 Esto permite explicar el creciente uso de categorías metahistóricas o antropológicas que procuran examinar con un mismo lente a diversas sociedades del pasado y del presente, como “espacio de experiencia” y “horizonte de expectativas” tal como las concibió Reinhart Koselleck; o herramientas heurísticas como “régimen de historicidad”, que François Hartog forjó para dar cuenta de los momentos en los que se producen “crisis del tiempo” al ponerse en cuestión las relaciones entre pasado, presente y futuro”2.
El dossier presenta los primeros resultados de una indagación colectiva realizada por miembros del equipo sobre Historicidad que integra la red de investigación de historia conceptual Iberconceptos.3 Nuestro propósito es analizar desde una perspectiva conceptual las experiencias de tiempo en el mundo iberoamericano durante los siglos XVIII y XIX. Dado que se trata de una temática novedosa para la historiografía iberoamericana, quisiéramos realizar algunas precisiones sobre nuestro enfoque.4 La primera es que no se trata de una indagación filosófica o teórica sobre el tiempo, la temporalidad o la historicidad, por lo que no se partió de una definición a priori, sino que se procuró examinar empíricamente cómo conceptualizaron las experiencias de tiempo los actores del período. La segunda es que a diferencia de la tradicional historia de las ideas, e incluso de enfoques más atentos a los contextos y a la historicidad como la historia de los lenguajes políticos, no se centra en los grandes nombres del pensamiento político, filosófico y social. Es por ello, y por el carácter polisémico y controversial que tienen los conceptos, que buena parte del corpus está integrado por debates parlamentarios y por la prensa en los que se pusieron en juego y se disputaron sus significados. La tercera es que si bien en ese período se produjeron transformaciones decisivas de orden social, cultural, económico, científico y tecnológico, decidimos privilegiar los cambios políticos como mirador para explorar las experiencias de tiempo y su conceptualización. En ese sentido, los trabajos analizan cómo estas experiencias se entrelazaron con los principales fenómenos y procesos ocurridos en esa centuria: las reformas imperiales, las crisis de las monarquías, los procesos revolucionarios e independentistas y la emergencia de nuevas unidades políticas soberanas.
El dossier se inicia con un trabajo en el que Ana Isabel González Manso traza algunas coordenadas teóricas y metodológicas generales, para luego detenerse en el examen de los cambios producidos en España en las formas de percibir el tiempo desde fines del siglo XVIII, y sus consecuencias en el campo historiográfico y político en la siguiente centuria. A continuación, Victor Samuel Rivera, analiza la recepción que tuvo la Revolución Francesa en la ciudad de Lima entre 1794 y 1812, llamando la atención sobre una de las formas en las que se procesó la aceleración del tiempo a uno y otro lado del Atlántico: la apocalíptica. Fabio Wasserman propone, por su parte, un minucioso recorrido en el que indaga cómo las elites rioplatenses conceptualizaron esa nueva experiencia de tiempo inaugurada por la revolución y cómo se entrelazó con su vida política hasta la década de 1830. Esa misma década es analizada por Luisa Rauter Pereira en un trabajo sobre los debates parlamentarios en Brasil que muestra algunos cambios fundamentales en la forma en la que el tiempo fue vivido e interpretado en el marco de disputas por la organización política de la monarquía independiente. El trabajo de Christian Lynch continúa de cierto modo el análisis de Rauter, pues toma como objeto el discurso parlamentario de Bernardo Pereira de Vasconcelos, quien a finales de la década de 1830 planteaba la necesidad de regular el ritmo de los cambios, llegando a la conclusión de que el “Regresso” es el verdadero progreso. De ese modo distinguía al conservadurismo de la reacción ya que en modo alguno se trataba de un retorno al Antiguo Régimen tal como se proponía en Europa. El trabajo de Francisco Ortega, por su parte, desarrolla una indagación sobre el “tiempo precario de la república” en Nueva Granada-Colombia durante las primeras décadas del siglo XIX, haciendo foco en las propuestas realizadas por el político y escritor conservador José Eusebio Caro que reivindicaba al movimiento constante como un componente esencial de las sociedades modernas. El dossier se cierra con un estudio de Miguel Hernández sobre la prensa conservadora mexicana en dos coyunturas, la de las revoluciones europeas de 1848 y la del Imperio de Maximiliano. Su trabajo le permite concluir que los conservadores compartían una misma concepción del tiempo con los liberales, pero procuraban atenuar el ritmo y ofrecían otra mirada sobre el pasado.
Como ya advertimos, las formas de experimentar y de conceptualizar la temporalidad en los siglos XVIII y XIX iberoamericanos es una temática que recién está comenzando a explorarse, por lo que aún no estamos en condiciones de ofrecer un panorama general a modo de síntesis. Confiamos sin embargo en que la riqueza de los estudios presentados en este dossier lo constituye en un punto de partida valioso para poder profundizar en el análisis sobre las experiencias de tiempo en ese convulsionado período, así como también para interrogarnos por los cambios que se están operando en nuestro presente.
Notas
1. CHARLE, Christophe. Discordance des temps. Brève histoire de la modernité. París: Armand Colin, 2011; GUMBRECHT, Hans Ulrich. Lento presente. Sintomatología del Nuevo tiempo histórico. Madrid: escolar y mayo, 2010; KOSELLECK, Reinhart. Estratos do Tempo.Estudos sobre História. Rio de Janeiro: Contraponto : Editora PUC Rio, 2014; LORENZ, Chris; BEVERNAGE, Berber (eds.). Breaking up Time.Negotiating the Borders between Present, Past and Future. Gotinga: Vandenhoeck & Ruprecht, 2013; ROSA, Hartmut. Social Acceleration:A New Theory of Modernity (New Directions in Critical Theory). New York: Columbia University Press, 2013.
2.KOSELLECK, Reinhart. Futuro pasado.Para una semántica de los tiempos históricos. Barcelona: Paidós, 1993; HARTOG, François. Régimes d´historicité.Présentisme et expériences du temps. Paris: Éditions du Seuil, 2003.
3. El proyecto en http: / / www.iberconceptos.net / grupos / grupo-historicidad. Éstos y otros trabajos del grupo fueron presentados y discutidos en el Colóquio Internacional Experiencias de Tempo nos Século XVIII y XIXrealizado en la Universidade de São Paulo en abril de 2014.
4. Esta afirmación no implica desconocer la existencia de aportes significativos sobre los cambios en las concepciones de la temporalidad producidos en Iberoamérica durante ese período, comenzando por los realizados en el marco del proyecto Iberconceptos como el análisis del concepto Historiacoordinado por Guillermo Zermeño para el primer tomo del DiccionarioIberconceptos(http: / / www.iberconceptos.net / wp-content / uploads / 2012 / 10 / DPSMI-I-bloque-HISTORIA.pdf) o una publicación reciente del director general del proyecto, FERNÁNDEZ SEBASTIÁN, Javier. Cabalgando el corcel del diablo. Conceptos políticos y aceleración histórica en las revoluciones hispánicas. In:_______; CAPELLÁN DE MIGUEL, Gonzalo (eds.). Conceptos políticos, tiempo e historia. Santander: Universidad de Cantabria McGraw-Hill Interamericana de España, 2013. También resultan de gran valor algunos trabajos que utilizan otros enfoques, como los estudios sobre lenguajes políticos realizados por E. Palti, o los estudios sobre historia cultural como el trabajo de V. Goldgel sobre prensa, literatura y moda: PALTI, Elías. El tiempo de la política. El siglo XIX reconsiderado.Buenos Aires: Siglo XXI, 2007; GOLDGEL, Victor. Cuando lo nuevo conquistó América. Prensa, moda y literatura en el siglo XIX. Buenos Aires: Siglo XXI, 2013. Cabe señalar por último la destacada producción sobre Teoría e Historia de la Historiografía realizada en Brasil, como el trabajo de ARAUJO, Valdei Lopes de. A experiência do tempo: conceitos e narrativas na formação nacional brasileira (1813-1845). São Paulo: Hucitec, 2008.
Fabio Wasserman – Instituto Ravignani – Conicet. E-mail: fwasserm@gmail.com
João Paulo Pimenta – Universidade de São Paulo. E-mail: jgarrido@usp.br
PIMENTA, João Paulo; WASSERMAN, Fabio. Apresentação. Almanack, Guarulhos, n.10, maio / agosto, 2015. Acessar publicação original [DR]
Almanack | UNIFESP | 2011
Almanack (Guarulhos, 2011-) é uma revista acadêmica e interinstitucional especializada na história da formação dos Estados nacionais no Brasil e em todo mundo, entre os séculos XVIII e XIX.
Editada por especialistas nesta temática, ela possui pesquisadores de universidades brasileiras e estrangeiras (Argentina, EUA, Espanha, França) entre seus editores e conselheiros executivos, e opera com um amplo espectro de avaliadores de dentro e de fora do Brasil.
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ISSN 2236-4633 (Online)
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