Independências: 200 anos de história e historiografia/Acervo/2022

Em 2022 completaram-se 200 anos da(s) Independência(s) do Brasil. Datas marcantes costumam ser oportunidades instigantes para comemoração e reflexão. Afinal, transformam-se em uma oportunidade para revisitar temas e renovar olhares, interpretações e abordagens sobre eles. No caso dessa efeméride, foi o que aconteceu, dentro e fora da academia. Teses e dissertações, exposições, livros, sítios eletrônicos, seminários e simpósios, textos e um sem-número de artigos científicos foram produzidos ao longo deste ano (e ainda deverão continuar a ser publicados nos próximos), trazendo à tona antigas questões, mas fornecendo novos encaminhamentos e novas roupagens.

Comemorar o bicentenário da Independência não é somente voltar-se para o passado, mas é também refletir sobre os problemas apresentados pelo presente e sobre as expectativas com o futuro do país. Ao fim de 200 anos de emancipação, cabe perguntarmos que país é esse que foi construído e qual país desejamos daqui para frente. Leia Mais

Independência ou Morte! Tradições e modernidades | Modos – Revista de História da Arte | 2022

O presente dossiê parte das diferentes narrativas sobre a efeméride do bicentenário da Independência do Brasil – 1822-2022, em conexão com outros marcos históricos relacionados ao longo do tempo. O conjunto de artigos apresentados manejam diferentes histórias conectadas e cruzadas, em distintas escalas de leitura temporal e espacial, acerca da tradição e da modernidade no Brasil. Assunto prolixo, porém inesgotável, o evento histórico é tratado aqui como uma janela para a compreensão das relações entre passado e presente no campo da arte. Para isso, este número incorpora questionamentos sobre a produção artística, crítica e historiográfica dedicada às artes visuais e suas correlações com a polissemia da noção de independência, os inúmeros modos de ver e diversas práticas de olhar, assimetrias, centros e periferias da arte. Desde a pintura histórica e a escultura comemorativa à criação moderna e às intervenções contemporâneas, passando pelos tópicos de produção e circulação de imagens, lugares de exibição de obras, acervos e coleções. Está claro o interesse sobre a reflexão das múltiplas narrativas que moldam como percebemos, interpretamos e divulgamos o campo artístico e a obra de arte em torno dessa efeméride patriótica, entre imagens, memórias e ocultamentos.

Em O monumento do “guerreiro guarani”: o chafariz de Conceição de Mato Dentro e a memória da independência em Minas Gerais, Francislei Lima da Silva (2022), trata da inauguração, em 1825, durante as comemorações do quarto ano da independência e do império, no povoado de Conceição do Serro, Minas Gerais, de um chafariz coroado pela escultura de um indígena – “gênio do Brasil”. Para o autor, este monumento serviu para reforçar e inserir, no imaginário local, a ideia de adesão ao jovem Império que se conformava a partir da independência política em 1822. A presença do indígena alegorizado em gestos triunfantes e que enaltecia determinadas virtudes cívicas coexistia com as tensões e a violência imposta aos nativos que habitavam os campos de cerrado que davam nome ao lugar. Leia Mais

Portugueses no Rio de Janeiro: negócios, trajetórias e cenografias urbanas (séc. XIX-XXI) | Lená Menezes de Medeiros

Lena Menezes de Medeiros Imagem
Lená Menezes de Medeiros | Imagem: Extra

Portugueses no Rio de Janeiro. Negócios, trajetórias e cenografias urbanas, livro de autoria da historiadora Lená Medeiros de Menezes, publicado pela editora Ayran no segundo semestre de 2021, constitui, a um só tempo, um trabalho afetivo e acadêmico. Talvez isso desperte a curiosidade do leitor em geral, talvez, ainda, suscite a desconfiança do acadêmico, uma vez que afetividade e a abordagem objetiva próprias do ofício do historiador não costumam a se entrelaçar. Não costumam, mas podem sim conviver sem nenhum prejuízo à qualidade da obra. E é isso o que vemos aqui nesse livro, e sem nenhum desdoiro nem a sua dimensão acadêmica, nem à expressão dos seus afetos.

É bem verdade que a equação que une a cientificidade e a afeição manifesta para com o objeto de análise não é algo fácil de ser alcançado, podendo facilmente resvalar em incoerências, mascaramentos, excessos, ou mesmo em imprecisões. Mas aviso desde já aos leitores que nada disso se verifica nessa obra. E isso não se dá sem motivo. A razão principal para essa harmoniosa conjugação de fatores que tradicionalmente são tão distintos e excludentes é a maturidade da autora do livro. Lená Menezes é uma historiadora talhada pelo cinzel de uma longa caminhada acadêmica. É professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro desde o final da década de 60, passando por vários cargos e funções nessa instituição, entre eles a Pró-reitoria de graduação, além de ter fundado um dos mais importantes laboratórios de pesquisa sobre a imigração do Brasil, o LABIMI, que se destaca pela sua internacionalização, justamente, com o meio acadêmico português. É exatamente essa maturidade como pesquisadora que sustenta a delicada equação que aludimos e, mais ainda, a nosso ver, a torna fator de engrandecimento do livro. Tanto os leitores médios afeitos às coisas de Portugal podem lê-lo sem o temor da maçada que uma obra acadêmica pode inspirar, como aqueles que se debruçam academicamente no tema da imigração portuguesa podem o fazer sem o temor de qualquer desalinho com os bons padrões da pesquisa universitária. Leia Mais

Os militares e a crise brasileira | João Roberto Martins

Joao Roberto Martins Filho Foto Gabriela Di BellaThe Intercept
João Roberto Martins Filho Foto: Gabriela Di Bella/The Intercept

Em 2020, João Roberto Martins Filho publicou a segunda edição de O palácio e a caserna: a dinâmica militar das crises políticas na Ditadura (1964-1969), adaptação da sua tese de Doutorado em Ciência Política, orientada por Décio Saes e defendida em 1989. Nesse livro, manteve a proposição de que as forças armadas brasileiras configuram um partido político fortalecido na emergência uma “ideologia militar fortemente calcada na repulsa à política civil”, cujas pautas correlatas e consequentes seriam a estabilidade social e a garantia da ordem. (p.55). A tese contrapunha-se à interpretação da experiência militar como um conflito entre dois ideais capitalistas: o internacionalismo da Escola Superior de Guerra (ESG) e o nacionalismo de grupos minoritários. Um ano depois da republicação, Martins Filho nos brinda com outro estudos sobre “militares” e “crise” dos anos recentes, reunindo dezessete autores vinculados a instituições de ensino e pesquisa nas áreas de Estudos de Defesa, Segurança Internacional, Relações Internacionais, Estudos Estratégicos, Ciência Política e História Contemporânea, Antropologia e, ainda, profissionais do jornalismo e da área militar.

Os militares e a crise brasileiraSe o organizador registra que a proposição de 1989 ficou no limbo até 2005, agora restam poucas dúvidas de que os militares representam funções e estratégias de um partido político para si mesmos e que são corresponsáveis pelos ataques à democracia liberal brasileira, perpetrados, por exemplo, desde 2013. O leitor, contudo, encontrará alguma dificuldade para chegar às provas dessa responsabilização. A coletânea é qualitativamente desequilibrada e variada em termos de gênero textual. Verá divergências compreensíveis e saudáveis, em termos de fontes e interpretações. A credibilidade das Forças Armadas (FA), na última década, por exemplo, é tida como em declínio e em ascensão; as políticas dos governos progressistas em termos de defesa são vistas positivamente e negativamente; e a profissionalização dos militares é fundamental e nula para a sua submissão ao controle político civil. Leia Mais

Historia de los conservadores y las derechas en Uruguay. De la contrarrevolución a la Segunda Guerra Mundial | Magdalena Broquetas, Gerardo Caetano

El libro coordinado por Magdalena Broquetas y Gerardo Caetano, en el que participaron diecinueve investigadores ―en su mayoría uruguayos, pero también extranjeros― representa un gran aporte para la consolidación de un campo académico de estudios sobre las derechas latinoamericanas en el país. La obra forma parte de un proyecto mayor que consta de tres volúmenes ―siendo este el primero―, concebidos «como un caleidoscopio de imaginarios, tradiciones, corpus de ideas y prácticas de sujetos muy diversos» que abarca un amplio período comprendido entre los siglos XIX y XXI, «apuntan a reponer la heterogeneidad y la perdurabilidad de estilos de pensamiento y acción de las derechas uruguayas a lo largo de su historia» Leia Mais

José Antonio Anzoátegui. Accionar y forja de un héroe binacional (1810-2019) | Hancer González Sierralta

José Antonio Anzoátegui. Accionar y forja de un héroe binacional (1810-2019) es una obra robusta en lo heurístico y ambiciosa en lo hermenéutico, que refl eja bien tanto las inquietudes cuanto los logros de la historiografía reciente sobre la fi gura del héroe en Europa y América. Tributario del resurgimiento de la biografía en el marco de la investigación histórica, el estudio de González Sierralta ofrece, además, un detallado recuento de la otra trayectoria del caudillo de la Independencia: su biografía póstuma. Al explicitar sus deudas teóricas e historiográfi cas, el autor nos facilita la tarea de ubicar su propia obra en el contexto de un nutrido revisionismo historiográfi co que, desde fi nales del siglo XX y a lo largo de estas últimas dos décadas, trajo consigo nuevas y sugerentes visiones sobre las guerras de Independencia en América y sus connotados caudillos. La obra de González Sierralta aprovecha, en el mejor de los sentidos posibles, toda aquella historiografía que nos ha ayudado a entender mejor los derroteros de las luchas independentistas, ampliando el ángulo de visión hacia nuevos problemas como la historia social de la guerra; los procesos de articulación de las élites en el contexto de declive de la monarquía hispánica; y los intricados procesos de negociación política que hicieron posible la emergencia y consolidación de los estados nacionales en América, a lo largo del siglo XIX. Al cobijo de las más recientes interpretaciones sobre estos fenómenos, y con el respaldo de una sólida crítica documental, la primera parte de la obra nos explica con todo detalle y rigor la labor militar y política de José Antonio Anzoátegui (entre 1810 y 1819) a la luz de la compleja red de intereses y cambios sociales de esa época convulsa. En la segunda parte de libro, por su parte, se analiza la transmutación heroica del personaje como un factor relevante en la construcción del Estado venezolano y de su propia memoria histórica.

Un aspecto significativo de la obra reseñada, en el contexto más amplio de los estudios recientes sobre el héroe, es la comparación entre las dos grandes matrices de su imagen: la vital y la póstuma. Una y otra son construcciones que el historiador recupera de testimonios contemporáneos (en el primer caso) y de relatos históricos y gestos conmemorativos de diversa índole (en el segundo). La imagen esencialmente marcial de Anzoátegui se revela como el resultado de su aguerrida (a veces incluso despiadada) y disciplinada labor militar, pero también como una consecuencia de su lealtad a la autoridad máxima en que terminó convirtiéndose Simón Bolívar. Sin omitir las opiniones y juicios negativos sobre Anzoátegui, González Sierralta explica su éxito político militar pero también el triunfo de su imagen pública en razón de su férrea lealtad a la autoridad de Simón Bolívar. Dado que la imagen del Libertador se volvió, a la postre, constitutiva de la ideología dominante del Estado venezolano, la memoria en torno a ese personaje y a sus leales representantes, sufrió similar destino. Leia Mais

Catolicismos locales y globales en la Argentina. Desde el siglo XIX a la actualidad | Diego Mauro

Es toda una invitación a la incertidumbre, resolver de manera prematura, la tarea de reseñar una compilación de textos académicos sobre devociones marianas en Argentina, siguiendo algún método prestablecido. Quince capítulos coordinados por el historiador Diego Mauro, que reflejan igual número de cultos católicos marianos desarrollados por diversas autorías, en algunos casos, que se repiten. Creo no errar, al decir que se trata de una de las primeras compilaciones académicas sobre la temática en el país. Incluye autorías con diferentes trayectorias de investigación hermanadas en una red académica sólida, solventada en variadas disciplinas de las ciencias sociales (antropología, sociología, historiografía, comunicación social y geografía). Sin embargo, allende su disciplinariedad múltiple, se trata de un libro de historiografía religiosa plena. Leia Mais

Abolición y post-abolición de la esclavitud en la América Hispana: cambios legales y trayectorias personales/Anuario del Instituto de Historia Argentina/2022

Lasaboliciones de la esclavitud en la América Hispana fueron procesos graduales cuyo desenvolvimiento se desplegó en dos ciclos. En primer lugar, un ciclo de políticas graduales que —con dos excepciones— se desplegó en las dos primeras décadas del siglo XIX. Ese ciclo involucró la sanción de leyes de prohibición del tráfico transatlántico de africanos esclavizados y las llamadas de “vientre libre” que terminaron con la transmisión hereditaria de la condición esclava. Ambas leyes fueron adoptadas en Chile en 1811, en Argentina en 1812 y 1813 respectivamente; en Colombia, Ecuador, Perú y Venezuela ambas medidas se adoptaron en 1821; en República Dominicana se prohibió el tráfico en 1822; en Centroamérica y México se lo hizo en 1824; en Uruguay ambas leyes se votaron en 1825. Más tardíamente fueron adoptadas en Bolivia (1840) y en Paraguay (1842). En Cuba y Puerto Rico si bien se prohibió formalmente el tráfico en 1820, debió ratificarse en 1835 y se hizo efectivo en 1866 y 1842. Allí las leyes de vientre libre recién se sancionaron en 1870.

En segundo lugar, se abrió un ciclo de aboliciones definitivas que se concentró en los años cincuenta, con excepciones tempranas como Chile (1823), Centroamérica (1824) y México (1829) o más tardías como Bolivia (1861), Paraguay (1869), Puerto Rico (1872) y Cuba (1886). Algunas de esas aboliciones totales se ligaron a procesos militares que buscaban reclutar masivamente antiguos esclavos como soldados (Uruguay, Perú) y la mayoría de ellas previeron indemnizaciones para los propietarios de esclavos (Borucki, 2009aAguirre, 19932005Blanchard, 2008). Volveremos sobre estas aboliciones definitivas luego. Leia Mais

Devociones marianas. Catolicismos locales y globales en la Argentina. Desde el siglo XIX a la actualidad | Diego Mauro

Este libro, coordinado por Diego Mauro, compila las historias de algunas de las devociones marianas más importantes de nuestro país y explora su promoción en los siglos XIX y XX. Leia Mais

Os mundos do trabalho no Brasil independente e as experiências de trabalhadoras e trabalhadores em suas diversas perspectivas: gênero, raça, classe, etnia e cultura/Ofícios de Clio/2022

Em 2022 o Brasil completou 200 anos como país independente tendo como base de sua formação social e da configuração do seu mercado de trabalho o modelo escravista. Buscando refletir sobre os rumos dos mundos do trabalho e das trabalhadoras e trabalhadores no Brasil independente, esse Dossiê buscou pesquisadoras e pesquisadores que quisessem contribuir com artigos que analisassem as pluralidades que atravessam os mundos do trabalho no Brasil, como a classe, a raça, o gênero e a cultura. Leia Mais

Historia política de Chile/ 1810-2010/ tomo IV: Intelectuales y pensamiento político | Iván Jaksic e Susana Gazmuri

Los volúmenes colectivos se debaten siempre entre ser compendios de textos individuales y, por así decirlo, obras unitarias. Nunca son por entero una u otra, sino algo en el medio y, por supuesto, no hay soluciones óptimas. Este libro, que corresponde al último volumen de Historia política de Chile, 1810-2010, reúne ensayos de temáticas y perspectivas muy diversas, también de calidad desigual. Lo mismo hay textos de carácter general, que perfilan los principales debates intelectuales y políticos en el Chile decimonónico, que los que se abocan, más específicamente, al pensamiento católico y de derechas, o a las ideologías de izquierda y de masas. Hay ensayos que se dedican a los siglos XIX o XX, e incluso al periodo de la transición, y otros que abarcan casi todo el arco temporal del libro. Los hay también de tema más acotado, como las ideas sobre la educación, las revistas culturales, la academia y las ciencias sociales, el pensamiento político mapuche.

A lo largo de once capítulos, en esta obra se hace una revisión de las principales ideas, polémicas e intelectuales que, a juicio de sus respectivos autores, han configurado durante los dos siglos pasados el campo de lo político en Chile: sus instituciones y actores, sus conflictos, debates y estrategias, sus proyectos y las condiciones de su éxito o fracaso. Se trata, pues, más de una historia intelectual que de las ideas. Leia Mais

200 años después. Los escolares preguntan/los historiadores responden | Proyecto ESpecial Bicentenario de la Independencia del Perú

En las últimas décadas en el Perú, la relación entre la enseñanza de la historia a nivel escolar y la investigación académica de temas históricos ha funcionado como si de compartimientos estancos se trataran. La poca interacción entre historiadores y docentes ha hecho que interpretaciones tradicionales y caducas sobre procesos y eventos históricos se mantengan y reproduzcan, sin que haya un cambio en el discurso histórico nacional, más allá de algunos usos políticos (y demagógicos) de determinados sucesos, como el reciente Conflicto Armado Interno (1980-2000), el gobierno militar de Juan Velasco Alvarado (1968-1975), o la Guerra del Pacífico (1879-1883). En ese mismo sentido, el proceso de independencia peruano ha logrado, en los últimos años, encontrar un consenso en la población, superando polémicas sobre, por ejemplo, la naturaleza misma del proceso independentista; a la vez que ampliando la narrativa histórica para incluir a actores sociales que, tanto en el discurso académico como en el educativo, estuvieron silenciados: indígenas, afroperuanos, mujeres, etc. Además, gracias al contexto de la conmemoración del bicentenario de la independencia peruana, se creó un ambiente propicio para fomentar encuentros entre el mundo académico y los escolares.

Así, el Proyecto Especial Bicentenario de la Independencia del Perú propició la creación de un espacio en el cual los escolares pudieran realizar cuestionamientos sobre el proceso de independencia a un grupo de historiadores especialistas en el tema. Así, el texto[1] recoge las preguntas de un total de 100 estudiantes entre los 10 y los 16 años (pp. 160-163), provenientes de 90 centros educativos públicos, de los cuales 25 correspondieron a los Colegios de Alto Rendimiento (COAR), ubicados en cada departamento del país; mientras que únicamente 5 colegios pertenecen al área metropolitana de la capital del país (pp. 156-159). No ocurre lo mismo respecto a los historiadores que fueron consultados: de un total de 37 profesionales, únicamente 2 trabajan fuera de la capital; y del resto, 12 laboran en instituciones extranjeras. Del grupo restante, resalta que la mayoría pertenezca a dos universidades: la Universidad Nacional Mayor de San Marcos (9) y la Pontificia Universidad Católica del Perú (6), ambas con una larga tradición de investigación histórica. El hecho que la mayoría de preguntas provenga de escolares de las provincias del país puede servir como base para futuras reflexiones sobre las dinámicas de intercambio y de construcción de saberes, especialmente los relacionados a las narrativas históricas nacionales y los mecanismos por los cuales estas se reproducen a distintos niveles. Asimismo, que la abrumadora mayoría de académicos provenga de la capital muestra las desigualdades de incorporación de los intelectuales de provincia en los debates académicos y políticos a nivel nacional. Leia Mais

El Perú y su Independencia. Reflexiones ante el Bicentenario | José Agustín de la Puente Candamo

Jose Agustin de la Puente Candamo Foto Hugo PerezArchivo El Comercio
José Agustín de la Puente Candamo | Foto: Hugo Pérez/Archivo El Comercio

El Perú y su Independencia. Reflexiones ante el Bicentenario, el reciente libro póstumo de José Agustín de la Puente Candamo y editado por José de la Puente Brunke, nos presenta la reedición de una selección de textos sobre la independencia del Perú escritos a lo largo de setenta años. En estos, se aprecia claramente su visión del proceso independentista peruano e hispanoamericano. El primero influenciado por la idea de peruanidad y la vinculación con el mestizaje propuestas por José de la Riva-Agüero y Víctor Andrés Belaunde, así como la idea del Perú «como sujeto histórico que se va formando a lo largo de siglos» (XV), y el segundo como la «maduración» del sentimiento americano frente a la metrópoli desde —para él— mediados del siglo XVIII hasta las guerras napoleónicas de inicios del siglo XIX.

El libro cuenta con doce capítulos agrupados en dos partes, una introducción, un colofón y bibliografía general. En la introducción, se reproduce el discurso de agradecimiento al Doctorado Honoris Causa otorgado por la Universidad Ricardo Palma (2007), donde se da cuenta su acercamiento a la Historia, los motivos que lo llevaron a seguir la docencia y el estudio de la independencia, así como la importancia de los cursos de historia del Perú en el ámbito escolar y universitario, muchas veces dejados de lado. Leia Mais

Historiography of Science in South America: Reception/ Reflection and Production (Argentina/ Brazil and Uruguay) | Mauro Condé

Mauro Conde Imagem IEAUSP
Mauro Condé | Imagem: IEA/USP

No Brasil, circulam, aproximadamente, 190 revistas autodesignadas (em seu foco e escopo) “de História” (Resenha Crítica, 2021). Um quinto desses periódicos explora questões e objetos escanteados pelos historiadores por formação inicial (graduados em História), como Direito, Educação, Ensino, Enfermagem, Esporte, Matemática e Medicina. Não é tanto por má vontade ou pré-conceito, como eu julgava há uma década, e sim pelo fato de a demanda por narrar a historicidade das coisas estar em todos os cantos da vida prática. É isso que explica, provavelmente, a criação recente de uma revista especializada em crítica e narrativa da escrita histórica sobre a ciência – Transversal: International Journal for the Historiography of Science (UFMG, 2016). Foi esse periódico quem publicou, no dia de Natal, o dossiê “Historiografia da Ciência na América do Sul, reunindo oito pesquisadores que tratam de experiências argentinas, brasileiras e uruguaias.

Transversal 2Com esse dossiê, o periódico visa ao fortalecimento das interações entre pesquisadores da Argentina, Brasil e do Uruguai, no que diz respeito à pesquisa sobre História e Filosofia da ciência. Esse é o objetivo principal anunciado pelo organizador Mauro Condé. Não sei se por questões de ética prática ou mesmo por crença, o apresentador reitera uma tendência recentíssima nos trabalhos do gênero: é necessário descolonizar as narrativas sobre a ciência por meio da percepção e da reflexão de ideias estrangeiras acerca do assunto em seu contexto de recepção. Na sequência, entretanto, Condé toma para si a conhecida tese de que determinadas ideias estavam fora do lugar, exemplificando com o caso de Pedro Américo a partir do qual ressuscita a hipótese de que o Brasil não estava preparado para compreendê-las: “ainda não havia uma cultura científica […] demoraria 100 anos até que Pedro Américo tivesse leitores adequados à sua tese” (p.2-3). Leia Mais

O médico e o monstro: uma leitura do progressismo latino-americano e seus opostos | Fabio Luis Barbosa dos Santos e Daniel Feldmann

O livro do historiador Fabio Santos e do economista Daniel Feldmann, ambos professores da Universidade Federal de São Paulo, trata da América Latina contemporânea, apontando para atores individuais e coletivos e seus projetos de sustentação da lógica de dominação. A obra é uma daquelas publicações necessárias pelas polêmicas que traz, pelo desconforto que provoca, pelo deslocamento do lugar comum das interpretações hegemônicas, daí inclusive a publicação sair por uma editora alternativa que surgiu com a proposta de publicar pensamentos contra-hegemônicos sobre a América Latina. Os autores são provocadores no melhor dos estilos, artístico e interpretativo, desde o título, que tomam emprestado da novela “O médico e o monstro” – escrita pelo escocês Robert Stevenson no final do século XIX – aos traços artísticos que desenham as figuras de capa e contracapa representando a dualidade do “progressismo” no Brasil e na América Latina, no século XXI. A escrita fluente, a forma ensaística da narrativa que sustenta as interpretações (e aqui entende-se ensaio não como algo menor) permitem uma liberdade necessária aos autores para fazer perceber a dualidade, distanciamentos e aproximações entre projetos e políticas de governos que se apresentam como contrapostos. Leia Mais

Uma Casa de Educação Literária: 150 anos do Atheneu Sergipense | Eva Maria Siqueira Alves, João Paulo Gama Oliveira e Rosemeire Marcedo Costa

As efemérides constituem relevantes espaços de celebração e de construção de análises que tendem a avaliar as experiências tecidas na malha do tempo. Nos idos de 2020, em pleno contexto dilacerado pelos dilemas da pandemia, ocorreram as celebrações alusivas ao bicentenário da emancipação política de Sergipe e do sesquicentenário da mais longeva instituição educacional do estado, o portentoso Atheneu Sergipense. Infelizmente, em decorrência das necessárias ações de isolamento social, as ruas e os auditórios estiveram vazios, desprovidos de festejos, de eventos e da presença de sujeitos que enfaixam sentidos, vivem e narram as histórias. Entretanto, nem tudo foi silêncio. No dia 19 de outubro, uma live reuniu um considerável número de historiadores da Educação no efusivo lançamento da coleção “Uma Casa de Educação Literária: 150 anos do Atheneu Sergipense”. Trata-se de uma coleção que reúne dez livros que têm como escopo a trajetória da velha instituição de ensino secundário de Sergipe.

Certamente, o evento de lançamento pode ser entendido como o principal episódio das aludidas celebrações. Além disso, a coleção se tornou o marco, o registro historiográfico que investiga o passado do Atheneu Sergipense em seus variados aspectos. Assim, os discípulos de Clio cumpriram seu compromisso com a memória, ao reunir esforços para demarcar o tempo com uma produção que amplifica a visibilidade do ensino secundário sergipano. Leia Mais

A coleção Adandozan do Museu Nacional Brasil Daomé/ 1818-2018 | Mariza de Carvalho Soares

Os primeiros anos de graduação são tempos de intensas paixões. A cada semestre, elegemos alguns autores com os quais passamos anos a fio, sempre citando e revisitando, como se sua obra se tornasse uma régua de qualidade que será usada para tudo que vier depois. Então, por força de currículos eurocêntricos, que ainda predominam em muitas universidades, os primeiros a terem este amor são os europeus, muitos destes medievalistas; e assim, com suas abordagens, eles se tornam, também, o paradigma de sucesso a ser alcançado. Leia Mais

A Political Biography of Arkadij Maslow/1891-1941: Dissident Against His Will | Mario Kessler

Esta biografía erudita y bien escrita puede ser leída como un libro independiente o bien como un volumen complementario de la biografía que Mario Kessler escribió sobre la compañera de toda la vida de Maslow, Ruth Fischer: Ein Leben mit und gegen Kommunisten (1895-1961), Köln, Bohlau Verlag , 2013, 759 pp. Ambos libros son el resultado de muchos años de investigación sobre la historia temprana del Partido Comunista de Alemania (KPD), particularmente del ala ultraizquierdista liderada por Fischer y Maslow, que también incluía a destacadas figuras intelectuales y políticas como Arthur Rosenberg, Werner Scholem, Karl Korsch, Hugo Urbahns y Josef Winternitz. Tanto Arkadij Maslow como Ruth Fischer pertenecieron a una generación que despertó a la vida política en medio de la carnicería de la Primera Guerra Mundial, del colapso de la Segunda Internacional y sus secciones nacionales (en primer lugar, del Partido Socialdemócrata de Alemania, SPD) y de la salida a la recaída en la barbarie que ofrecía la revolución bolchevique de 1917. Es decir, ninguno de ellos tenía raíces en las tradiciones de la Segunda Internacional como Rosa Luxemburg, Paul Levi, o Lenin y Trotsky, y por lo tanto fueron incapaces de comprender lo que Lenin quiso decir cuando escribió que Karl Kautsky (su principal teórico) era un renegado: a saber, que él, y la burocracia del partido y de los sindicatos de la que se había convertido en portavoz, habían traicionado el legado de la Segunda Internacional y del SPD. El proyecto político de Maslow y Fischer, junto con el resto de la ultraizquierda, fue, pues, tirar al bebé con el agua de la bañadera: incapaces de separar el trigo marxista de la paja parlamentaria, se embarcaron en una cruzada unilateral contra la socialdemocracia que ayudó a allanar el camino para el surgimiento del estalinismo, así como para su propia eliminación por parte de Stalin y de su secuaz Ernst Thälmann. Arkadij Maslow fue el nombre de partido de Isaak Yefimovich Chemerinsky. Nacido en 1891 en Yelisavetgrad, Ucrania (entonces parte del imperio ruso), en 1889 se mudó con su familia a Alemania, donde el talentoso Isaak estudió música. De joven fue concertista de piano en Europa, Japón y América Latina. A los veintitrés años, sin embargo, abandonó su carrera como músico y se matriculó en matemáticas y física en la Universidad de Berlín en 1914, donde estudió con figuras excepcionales como Max Planck y Albert Einstein. Pero la guerra y la revolución radicalizaron a Chemerinsky, desviando su interés del arte y la ciencia a la política. Comenzó a trabajar ilegalmente para el SPD en 1916 y estableció contactos con la Liga Espartaco, especialmente con August Thalheimer, a principios de 1918. Se unió al Spartakusbund el 5 de diciembre de 1918, con el fin de agitar entre los prisioneros de guerra rusos, y también trabajó como traductor para el recién creado KPD, del cual fue miembro fundador y donde adoptó el nombre de partido Arkadij Maslow. Colaboró estrechamente con Max Levien, uno de los líderes de la República Soviética de Baviera que surgió a raíz de la revolución alemana de noviembre de 1918, y siguió siendo un amigo cercano hasta que Levien fue ejecutado en la Unión Soviética por orden de Stalin en 1937, en el marco de la Gran Purga. En 1919, Maslow conoció a su compañera de vida, la joven austriaca Elfriede Friedländer, quien se volvió famosa bajo el nombre de partido Ruth Fischer. La pareja nunca se casó, pero su relación duró hasta el asesinato de Maslow en 1941. Si Fischer fue la figura pública más conocida, Maslow fue el intelectual políglota de la pareja. Durante los años críticos de su actividad política, la atención pública se centró en Fischer, sobre todo porque, desde mayo de 1924 hasta julio de 1926, Maslow fue encarcelado por el estado alemán por cargos falsos. El libro de Kessler relata muchas anécdotas fascinantes, algunas no directamente relacionadas con la vida de Maslow. Por ejemplo, nos enteramos de “que el diario del SPD Vorwärts publicó un ‘poema’ de odio de Arthur Zickler el 13 de enero de 1919 que pedía el asesinato de Rosa Luxemburg, Karl Liebknecht y Karl Radek”, y que “En 1933 Zickler se unió al Partido Nazi” (p. 16, nota 27). Dado que la Bibliothek der Friedrich-Ebert-Stiftung ha digitalizado todos los ejemplares del Vorwärts desde 1891 hasta 1933, el “poema” en cuestión se puede leer en línea; se titula Das Leichenhaus: “La Morgue” (https://fes.imageware.de/fes/web). Leia Mais

A Coleção Adandozan do Museu Nacional. Brasil-Daomé/ 1818-2018 | Mariza de Carvalho Soares

O livro aqui resenhado, vale ressaltar de início, toma outra dimensão ao relembrar o devastador incêndio sofrido pelo Museu Nacional em 2 de setembro de 2018, transformando em cinzas objetos ali guardados ou expostos, entre eles os da coleção estudada pela historiadora Mariza Soares. Acontecimento que confirma o aspecto trágico e a impermanência que rondam museus e coleções no Brasil.1 Isso torna este livro um material de prova, documento e memória daquilo que foi irremediavelmente destruído. Ele foi escrito, declara a autora, para “dar vida a algo que já não existe”, e feito, muito apropriadamente, juntando o argumento historiográfico às práticas de museus (p. 35). Leia Mais

El exilio en el contexto latinoamericano: problemas y perspectivas desde el discurso (siglos XIX-XXI)/Secuencia/2022

El exilio ha sido objeto de constante interés en las últimas décadas tanto en el seno de las ciencias sociales como de las humanas,1 y no sólo a modo de fenómeno que ha merecido consideración por sí mismo, sino también como punto de partida de investigaciones fruto de diferentes corrientes de estudio.2 El tema, de hecho, ha suscitado numerosas aproximaciones al pasado, lejano y cercano –incluso a cuestiones de estricta actualidad–, a la vez que a infinidad de espacios en que este se ha manifestado de una u otra forma. De esta manera, se puede acceder a los discursos de sus protagonistas y, por consiguiente, incidir mediante nuevos acercamientos en expresiones ya conocidas o mostrar otras ignoradas hasta la fecha, en las que cabe profundizar. Los discursos, asimismo, pueden proceder de quienes han retratado el exilio sin haberlo tenido que vivir en primera persona. Todo ello queda cifrado, entre otros cauces, en textos de muy distinta condición (correspondencia epistolar, novelas, poemas, autobiografías, documentos administrativos, etc.),3 que permiten recuperar itinerarios más interesantes en un sentido personal o colectivo, pero elocuentes de la realidad histórica.4 Leia Mais

Regimes autoritários e totalitários em perspectiva histórica (séc. XIX, XX e XXI) | Ars Historica | 2021

1984
Detalhe de capa de 1984, de George Orwell | Cia das Letras, 2009

… porque o país se calava, não podia fazer outra coisa,

senão calar, e enquanto isso as pessoas morriam e a polícia

mandava e desmandava. Pereira começou a suar, porque

pensou novamente na morte. E pensou: esta cidade fede a

morte, a Europa toda fede a morte.

Antonio Tabucchi em Afirma Pereira

Regimes autoritários e totalitários. Parece que não conseguimos nos esquivar desses temas – alguns poderiam dizer que temos mesmo uma certa obsessão por eles. Mas não é de se espantar que esses temas, em suas variações nacionais ou transnacionais, tenham uma presença constante na historiografia.2 Afinal, se há algo que as pesquisas e os estudos sobre o tema demonstram é que a democracia só está segura enquanto o autoritarismo não se torna uma opção aceita por parte considerável da população. No momento em que posicionamentos autoritários são reconhecidos como soluções possíveis, ou que a nostalgia por tempos de repressão se torna um sentimento comum, é o momento em que os fantasmas do autoritarismo não estão mais nos rondando, mas já se encontram sentados à mesa, na sala de decisões, bebendo de nosso café. Daí a perene urgência de desenvolvermos esses estudos. Leia Mais

Calçadas de Porto Alegre e Beijing | Airton Cattani, César Bastos de Mattos Vieira e Lu Ying

Cesar Vieira
César Bastos de Mattos Vieira | Foto: PROPUR/UFRGS

Calcadas de Porto Alegre e de BeijingUM OLHAR ATENTO

O livro foi editado para documentar a exposição fotográfica Projeto Calçadas: Porto Alegre-Beijing, que ocorreu nos últimos meses de 2019, no Campus Central da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre e, quase simultaneamente (com uma diferença de dias), no Advertising Museum da Communication University of China (CUC), em Beijing. A exposição (e o livro) é o resultado de uma missão acadêmica, intermediada pelo Instituto Confúcio, que professores brasileiros da UFRGS realizaram junto à CUC, na China, em outubro de 2018. Embora a edição impressa esteja esgotada, a versão digital pode ser acedida no sítio web da editora.

Airton Cattani, um dos organizadores do livro e da exposição, arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura da UFRGS, vem trabalhando com a temática das calçadas em Porto Alegre desde 2007, quando da exposição fotográfica Olhe por onde você anda: calçadas de Porto Alegre, que também foi documentada em livro. Essa obra ganhou versão em língua espanhola especialmente para a exposição Mira por donde andas: aceras de Porto Alegre, realizada no Centro de Estudos Brasileiros da Embaixada do Brasil no México, em 2008. Em sua trajetória, Cattani desenvolveu um olhar atento ao registrar a beleza e poesia das texturas, brilhos, formas, padrões e cores das calçadas urbanas, indo além de imagens com características turísticas. Este foi o motting passado aos estudantes dos cursos da Faculdade de Arquitetura da UFRGS e de Design da CUC e que vemos no livro: um registro fotográfico sensível das calçadas de Porto Alegre e Beijing que alimentam e formam um background estético e diferenciado para futuras aplicações tanto na arquitetura quanto no design. Leia Mais

Imprensa no Maranhão: Trajetória Bicentenária | Outros Tempos | 2021

Tipos moveis de chumbo
Tipos móveis de chumbo | Imagem: Medium.com

Não obstante casos inexpressivos e de curta duração, foi apenas com a chegada da família real à sua colônia na América que se deu a instalação e o efetivo funcionamento de atividade tipográfica no Brasil, em 1808. No rol das transformações advindas da transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, ocorreu a instalação da Imprensa Régia, sob as ordens de D. João. Ainda que não restrita à publicação de documentos oficiais, a Gazeta do Rio de Janeiro, primeiro jornal impresso na colônia, passou a circular, em 10 de setembro de 1808, com finalidade de servir aos interesses da Coroa, publicizando atos do governo. Leia Mais

Negacionismos e usos da história | Revista Brasileira de História | 2021

Bolsonaro Negacionismos
Negacionismos | Fotomontagem: Jornal da USP

Como certos passados, sistematicamente escrutinados pelos historiadores, amplamente debatidos e largamente documentados, podem ser simplesmente negados ou apresentados como invenções motivadas por interesses escusos? O que leva grupos e indivíduos a duvidarem da existência do Holocausto, da ditadura militar brasileira, dos incontáveis genocídios ao redor do mundo ou da escravidão que, ao longo de mais de três séculos, moldou as formas sociais do capitalismo moderno? Quais são as operações intelectuais, afetivas, políticas e ideológicas que envolvem e inscrevem os desafios e interrogações lançados pelos negacionismos à história, como conhecimento organizado do passado, aos seus usos políticos, apropriações e condições de produção da verdade?

Estas questões estiveram nas origens deste dossiê e agora são aprofundadas pelos artigos que o compõem. Eles apresentam um arco diversificado de reflexões acerca das variadas formas de visibilidade do negacionismo e do revisionismo ideológico no espaço público, bem como se propõem a pensar o papel da escrita da história e dos historiadores em seu enfrentamento. Evidentemente, explorar todas as respostas possíveis para as perguntas anteriores nos levaria a perscrutar um domínio inalcançável de análises produzidas por áreas que, ao longo das últimas décadas, procuraram decifrar a complexidade do fenômeno negacionista. Nossos objetivos são outros. Leia Mais

Mastodontes: a história da fábrica e a construção do mundo moderno | Joshua Freeman

Em 2010, dezoito trabalhadores da empresa de tecnologia chinesa Foxconn tentaram cometer suicídio ao pularem do telhado de uma das instalações da empresa. Quatorze deles infelizmente conseguiram. Este trágico evento foi uma das razões que levaram o historiador norte-americano Joshua Freeman a refletir a escrever Mastodontes: a história da Fábrica e a construção do mundo moderno, publicado originalmente em 2018 pela W.W. Norton, e traduzido imediatamente para o português em 2019 pela editora Todavia. O livro faz parte do esforço da editora brasileira em trazer para uma audiência nacional produções estrangeiras que versam sobre temas proeminentes do mundo contemporâneo. Neste caso, a obra traduzida busca contribuir para o debate sobre a relevância do mundo industrial nos dias de hoje e frisar o quanto este universo impactou e continua a impactar o presente.

No livro, Freeman nos traz uma história das fábricas. Mas não qualquer fábrica __ como ele mesmo salienta no começo do livro __ mas aquelas mastodônticas, que se destacaram à época de sua construção por terem suscitado na sociedade industrial uma miríade de questões políticas, culturais e econômicas, incorporando, a um só tempo, um imaginário de horror ancorado na exploração do trabalho, degradação ambiental e miséria social com a esperança de um futuro glorioso pautado na abundância material. Como o próprio autor ressalta, estas fábricas “não eram típicas” e se diferenciaram da maior parte das unidades produtivas fabris do século XIX e XX, que eram menores tanto em tamanho quanto em sofisticação (FREEMAN,2019, posição 134). Além disso, sua experiência como professor do Queen’s College (um dos principais centros de história operária dos EUA) e um representante da Nova História Social do Trabalho1 , com vasta produção em história do operariado estadunidense e publicações a respeito do capitalismo norte-americano em perspectiva global, pode ser percebida no enfoque fornecido pelo autor, que se difere dos trabalhos acadêmicos que analisam as fábricas sob o viés arquitetônico (DARLEY, 2003), e das pesquisas que as compreendem como uma componente secundária dentro do mundo do trabalho (LE ROUX, 1980). Freeman, por sua vez, busca apresentá-las como uma “instituição em si mesma”, dotada de historicidade própria, com seus aspectos políticos, culturais, econômicos e estéticos sendo compreendidos como elementos que variaram no tempo e no espaço (FREEMAN, 2019, posição 142). Leia Mais

RESISTÊNCIA: A construção de saberes históricos em tempo de pandemia | Das Amazônias | 2021

Casarao da Rua 20 Goiania

Iniciamos esta edição com sinceras condolências em respeito a todos os brasileiros e brasileiras que partiram devido à crise sanitária ocasionada pelo novo coronavírus, mas sobretudo pesarosos do contexto ideológico em que o Brasil está inserido. A Revista Discente das Amazônias se irmana no sentimento de tristeza de cada ente querido que sente a dor da saudade, palavra encontrada apenas no português do Brasil (e que faz muito sentido face a falta do avô, da mãe, do irmão, do pai, da tia, do primo, do próximo ou do distante), na ausência da vida. Externamos nossa solidariedade aos que permanecem e lastimamos por aquelas pessoas que se tornaram montante numérico superior a 470.000 mil mortos, vítimas de um genocídio resultante da ignorância, do negacionismo e da pseudociência.

Mas, nos apeguemos aos respingos de esperanças. Paulo Freire, fugindo da norma, já nos convidava a conjugar o substantivo “esperança” – esperançar é preciso. É nesses embalos de incerteza de um viver marcado por lutas, que devemos acreditar na ciência, na educação pública e gratuita e sua fundamental importância e contribuição para à sociedade. Assim, caros(as) leitores e leitoras, lhes convidamos a lerem os trabalhos submetidos à Das Amazônias, Revista Discente de História da Ufac (em seu volume 4, número 1), que compõe o conjunto de periódicos da área de História do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), da Universidade Federal do Acre (Ufac). Leia Mais

Iglesia y derechos humanos. Ley natural y modernidad política, de la Revolución francesa hasta nuestros días | Daniele Menozzi

En la segunda Audiencia General de agosto de 2020, el papa Francisco sostuvo que el coronavirus no era la única enfermedad que debía ser combatida. Para el Obispo de Roma, la pandemia visibilizó otras patologías de base, como “la visión distorsionada de la persona”, “que ignora su dignidad y su carácter relacional”. En este sentido, recordó que “la dignidad humana es inalienable, porque ha sido creada a imagen de Dios”, y apeló a la Declaración Universal de los Derechos Humanos como la referencia más cercana a ese principio. 1 Tal conceptualización había sido expuesta dos años atrás en la Conferencia Internacional “Los derechos humanos en el mundo contemporáneo: conquistas, omisiones, negaciones”, organizada por la Pontificia Universidad Gregoriana de Roma (Italia). En ocasión del septuagésimo aniversario de la Carta de 1948, el Sumo Pontífice sostuvo que la Declaración de la Asamblea de las Naciones Unidas reconoció “la igual dignidad de toda persona humana”, de las cuales derivan derechos fundamentales, “enraizados en su naturaleza” (es decir, en la “unidad inseparable de cuerpo y alma”), y deberes para con la comunidad.2

Ahora bien, ¿cuál es la interpretación que la Iglesia de Roma ha realizado sobre los derechos humanos? ¿Qué alcance ha tenido el documento adoptado por las Naciones Unidas en 1948 dentro del mundo católico? ¿Cuán restrictivo o novedoso es el pronunciamiento de Jorge Bergoglio? En Iglesia y derechos humanos. Ley natural y modernidad política, de la Revolución francesa hasta nuestros días, Daniele Menozzi nos brinda herramientas para ensayar algunas respuestas y formular otros interrogantes sobre estas cuestiones. Leia Mais

Gordos, magros e obesos: uma história do peso no Brasil | Denize Bernuzzi de Sant’Anna (R)

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Denise Bernuzzi de Sant’Anna | Foto: Editora Contexto |

SANTANA D Gordos magros e obesos1Sobre o corpo delineamos nossas identidades e, com ele, perfazemos as nossas vivências. Experimentamos nossas relações socioculturais com a pele e com todas as nossas marcas sensoriais: cheiramos, ouvimos, degustamos, tocamos e percebemos o mundo em suas multiplicidades com a história de nosso corpo, pelo o qual transparecemo-nos, também, por meio da arte, desde tatuagens e piercings a performances e marcas discursivas. Com o corpo, apresentamo-nos à vida. Porém, se aquilo que transmitimos com nossa imagem destoa do que é vigente, do que é a ‘voga’ de um tempo, vemos nossas identidades em xeque.

Nos aeroportos, nos parques, nas estações de trem e ônibus, pessoas que não se enquadram nos moldes – tracejados pelos cartazes, outdoors, variadas propagandas contemporâneas, embalagens e invólucros dos atuais espaços públicos – sentem-se fora de seu lugar: do obeso que, para se sentar em uma fileira num cinema ou num assento de ônibus coletivo, ouve as agressões e piadas sobre o seu tamanho, às magérrimas meninas, que são impulsionadas a seguir sempre magérrimas para serem aceitas em seus grupos sociais. As cidades do século XXI criam seus espaços de exclusão rotineiramente por meio de símbolos: semideuses personificados em roupas de marcas, ícones da perfeição estética que ditam os padrões de beleza e alimentos que são in [1] criam os cenários de estigmas sociais.

Como o gordo se sente nesse meio? Qual é a história da obesidade neste país? Que instrumentos a indústria alimentícia (com a força da indústria cultural da propaganda de massa) lança mão a seu favor? Não seriam antagônicas e incoerentes as imagens midiáticas que se proliferam no cotidiano das cidades, em relação aos corpos das pessoas? Do outro lado dos problemas relativos à obesidade, como a anorexia e a bulimia estão transformando mulheres, em especial jovens, em face ao estado de temor de serem percebidas como gordas?

Perguntas como essas são levantadas no livro de Denise Bernuzzi de Sant’Anna, Gordos, Magros e Obesos: uma história do peso no Brasil, publicado pela Estação Liberdade (2016, 184 p.). Professora e emérita pesquisadora livre-docente de História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Denise B. de Sant’Anna, há alguns anos, dedica-se às pesquisas sobre a história do corpo, da higiene e das relações entre o corpo e subjetividade, destacando-se por seus artigos publicados nos mais acessados periódicos, além de suas organizações de livros históricos e sociológicos que trazem tais temáticas à vista da comunidade acadêmica.

Já na apresentação, a autora joga-nos em um acontecimento, no mínimo, ambíguo da vida na Corte: numa quermesse que se deu no Cassino Fluminense em 1886, a família imperial promovera uma festa que duraria dias, com toda a fartura de alimentos e com o intuito de arrecadar fundos para os mais desamparados e famintos da sociedade carioca. Regada de ceias gordurosas, vinhos e todas as formas de quitutes, os nobres e a realeza se fartaram no banquete, num desfile de seus corpos opulentos e vantajosos: “Os Orleans, Bourbons e Braganças ainda podiam sentir orgulho por serem pesados” (SANT’ANNA, 2016, p. 12). Era uma cultura alimentar do peso que se refletia como poder: no século XIX e no começo do século XX, a correlação entre o excesso ou baixo peso e a distinção de classe social era nítida.

No primeiro capítulo, intitulado Triunfo da gordura e medo da penúria, vale destacar a notável pesquisa história da autora, buscando em fontes de jornais e revistas da época, como O Paiz, Fon-Fon, Careta, etc., material relevante para o entendimento das representações que o corpo de magros e obesos adquiriram com o decorrer do século XX (valendo-se das propagandas, charges, poemas, paródias e notícias). De um lado, o corpo gordo, algumas vezes, era representado pela imagem do animal para abate (o gordo era o ‘boi’, ‘o porco’, ‘o leitão’), por outras vezes, como elementos geométricos de circunferência ampla (eram os ‘homens-balões’ e as mademoiselles Zeppelin, ou senhoritas Zepellin); por outro lado, até meados do século XX, a imagem do homem gordo ainda resistia como símbolo da riqueza e ostentação. Entre as imagens circenses, cômicas e inusitadas do corpo de homens gordos e mulheres obesas, Sant’Anna (ibid., p. 24-25) aponta o fardo social que se representava nesse período histórico: o tamanho corporal como uma ranhura nas identidades de pessoas, que culminaria no crescimento da epidemia da obesidade no final do século XX e começo do século XXI.

Dos campeonatos de comida às mudanças do uso das palavras como ‘guloseima’, ‘gulodice’ e o aparecimento da palavra ‘gastronomia’ no vocabulário das cidades, o peso corporal, durante anos, demarcou as identidades sociais e de classe no país. De um lado, o gordo corpulento que possuía as economias para se abastecer, enchendo as prateleiras de seu “corpo-armazém” (ibid., p. 39); de outro, a figura do magricela, muito bem representada pela personagem Jeca Tatu de Monteiro Lobato, era percebida como a imagem do insalubre e sem prosperidade, alvo das propagandas inescrupulosas de elixires e xaropes messiânicos: como o remédio Sargol que “era possível encher o corpo e ganhar entre cinco e sete quilos de ‘carne sólida e permanente'” (ibid., p. 35). Válido ainda notar o trabalho investigativo de Sant’Anna sobre as ofensas direcionadas às pessoas magras deste período, além da crítica ao modo como se subjugavam as mulheres à função de reprodutora da família (ibid., p. 50), que eram válidas pelas suas ‘ancas’ bem torneadas.

Ao final desse capítulo, a autora retrata a imagem da ‘criança robusta’, divisora de águas da relação entre o gordo e o magro no imaginário cultural que havia se consolidado inclusive no cinema (o famoso filme O gordo e o magro, em inglês, The Lucky Dog, de 1921). Denise B. de Sant’Anna analisa também as imagens de bebês que deixaram “à margem da história e à sombra do sucesso os bebês e crianças julgados magricelas, assim como as mães que ignoravam as leis básicas da boa nutrição” (ibid. p. 59-60). De fato, os magros eram enxotados da representação de uma nação cuja imagem corporal era um desejado espelho da ‘robustez’.

Porém, com o avanço da industrialização no país, a percepção da imagem sobre o gordo será reinterpretada e redesenhada [2]. No segundo capítulo, Vergonha de ser gordo, a imagem do homem obeso é dada como descartável, inapta ao momento histórico em que o corpo (agora o ‘corpo-termodinâmico’, ‘corpo-máquina'[3]) se tornaria sinônimo de energia a ser bem empregada no progresso e na produtividade, especialmente, no dispêndio de forças e energias nas fábricas.

Após 1930, o corpo agora tinha à sua frente a figura do sportman, i.e., o homem esportista, saudável, aquele que seria esculturalmente preparado para os desafios da sociedade. O ‘corpo-armazém’ começava a ser questionado face aos perigos dos excessos do peso: o obeso se tornava um fardo estético e social. Surgem nos jornais os regimes e cardápios para emagrecer e a balança se tornaria o fantasma de muitos que destoavam da imagem sugerida pelas propagandas da época (ibid., p. 77).

A representatividade da ‘barriga’ dos brasileiros que a professora traz é considerável. Até a metade do século XX, ter uma barriga avantajada condicionava valores sociais, políticos e afetivos: relacionava-se com o status quo na figura de políticos; como a imagem do bem-sucedido; como o símbolo de um casamento feliz, em que o lar era bem abastado e abastecido; e como chamariz da economia local, representada pelos restaurantes que indicavam que ali se comia até “ter que abrir o cinto” (ibid. pp. 87-89).

Se de um lado, o grande peso corporal masculino foi mais resistente no século XX, a imagem corporal feminina tendeu a se transformar: é a passagem da imagem da ‘matrona’ do começo do século XX à delgada senhora do lar, aquela que não perde a graça da formosura do corpo esbelto, mesmo sendo relegada ao espaço privado e à reprodução da família. Tem-se, portanto, uma nova relação entre o corpo e a estética: é a explosão, nesse cenário, das cirurgias plásticas nas barrigas de mulheres que tiveram filhos, o aparecimento da lipoaspiração e a crescente exploração da imagem feminina para a criação de um padrão de beleza que só se consolidaria por meio das inúmeras dietas ofertas semanal ou diariamente em magazines, as revistas voltadas para as donas de casa da época.

É sobre isso que, no terceiro capítulo do livro, Do sonho da fartura à realidade das dietas, Denise B. Sant’Anna discorre. A primeira problemática se dá com relação às propagandas vinculadas à alimentação na metade do século XX: o american way of life (estilo de vida americano, estadunidense) cresce, consideravelmente, na sociedade brasileira, com a promoção de alimentos industrializados e uma variedade cada vez mais inovadora de aparelhos técnicos e eletrodomésticos voltados para o ambiente da cozinha de uma casa. Se se mudava, dia após dia, a estética da casa, principalmente, da arquitetura das cozinhas, a nova dona do lar também deveria se transformar, conservando a beleza estética e a elegância de uma mulher magra, como as propagandas em revistas dos anos 50 e 60.

O Brasil assistiu à ascensão das lanchonetes, nos anos de 1970 e 1980, e, com ela, a adaptação da alimentação de sua população, em especial, nos grandes centros urbanos. Um novo nicho mercadológico surge, o da alimentação das crianças: as pequenas bolsas de couro, que eram as lancheiras e merendeiras das crianças, darão lugar às de plástico e adesivadas com personagens do imaginário infantil, com garrafas térmicas e divisórias internas. Público-alvo de um mercado em expansão, as crianças tiveram sua alimentação redirecionada e recondicionada.

Ao lado dessa indústria de propaganda, o corpo feminino também era repensado: a moda excluirá os que não tinham o peso ideal, as farmácias passam a vender inúmeros produtos para o extermínio das celulites e remédios para emagrecimento, a comida diet e light (livre de açúcares e de baixa gordura) entrarão no jogo da luta contra o corpo obeso temido, e as revistas masculinas (como uma das mais conhecidas, a Playboy) celebravam, semanalmente, a estética da beleza corporal feminina a ser seguida. É a ambivalência da passagem histórica do corpo magro, antes execrado, agora o modelo idealizado de perfeição: “‘A magra de ruim’ aproximou-se da imagem dos bons hábitos alimentares. Também no universo erótico, a mulher emagreceu” (ibid. p. 120).

No quarto capítulo, Entre liberdades e patologias, as questões serão direcionadas à saúde do corpo: da obesidade, que é um fator crescente, verificado por dados e estatísticas na população brasileira, desde o final do século XX e começo do XXI, à presença dos corpos anoréxicos e do aumento da bulimia entre jovens.

Um número sem fim de dietas e remédios, a psicose da ‘lipofobia’ (o medo da gordura, de ser ou estar gordo), a preocupação com o meio ambiente e a alimentação, o mercado de inibidores de apetite, os adoçantes, as mudanças conceituais da nutrição (‘sobrepeso’, ‘obesidade mórbida’, ‘obesidade em graus’, etc.), a cirurgia bariátrica e os programas televisivos atuais[4] formam um cenário de temor ao peso, que estigmatiza aqueles que sofrem com a obesidade e cria um espetáculo do terror em jovens (em sua maioria, as mulheres), que se veem levadas a mudanças drásticas em sua alimentação, tornando-se anoréxicas ou sob o distúrbio da bulimia[5].

Emblemático, dualista, ambíguo: o corpo contemporâneo está no limiar de uma guerra simbólica. De um lado, o cortejo por uma sociedade mais ativa na saúde surge como uma saída para a luta contra o mal-estar com o corpo, por meio das inúmeras campanhas que apontam a necessidade de se exercitar continuamente, fazer caminhadas, corridas pelas cidades, passeios ciclísticos, além da ascensão das academias de ginástica e dos seus personal trainers (símbolos de profissionais que encenam uma perfeição estética a ser atingida). Do outro lado, encontram-se as explosões de lanchonetes, praças de alimentação [6] repletas de fast-foods [7], alinhadas ao encarecimento da alimentação saudável e ao tempo escasso para a massa populacional poder se cuidar. Com isso, vemos que a obesidade atinge proporções epidêmicas, principalmente, hoje, entre as famílias mais carentes, cujo acesso à alimentação fitness (saudável, natural, livre de gorduras e açúcares) é uma miragem.

Alimentar é, também, um espetáculo midiático. Sant’Anna apresenta, ao final, uma discussão sobre o aumento de programas televisivos de culinário, varandas gourmet e Food Trucks (carros que oferecem comidas rápidas, como hambúrgueres, lanches, bebidas alcóolicas, etc.), que oferecem mais do que o alimento: privilegiam a “experiência da alimentação” (ibid. p. 122), obviamente, a um preço mais ‘calórico’ do que em ambientes e restaurantes mais populares. Surge o ‘coaching alimentar’, que, mais do que o nutricionista, é símbolo do fetiche e da incapacidade de bem-estar autônomo com o corpo.

Do século XIX ao XXI, a passagem histórica sobre o corpo dos brasileiros é o sinal das transformações comportamentais e da cultura alimentar de um povo. Em O peso da história, último capítulo do livro, encontramos uma síntese da pesquisa histórico-discursiva da autora: as representações sobre o gordo e o magro, a mudança nos hábitos e na cultura alimentar brasileira, além da problemática da crescente obesidade nacional e os distúrbios da bulimia e anorexia.

De fato, os corpos de obesos, assim como o corpo marcado pela anorexia e bulimia, são representativos de um cenário de estigmatização. Diferentes, fora do padrão, alienados, espaçosos, desproporcionais e estranhos, tais pessoas convivem, cotidianamente, com os olhares maliciosos e preconceituosos.

A obesidade é uma distinção corporal que traz cenas repetidas de exclusão nas relações sociais, tanto na família, na escola, nas relações trabalhistas, na vida afetiva e sexual. O corpo obeso é percebido como corpo em negação, corpo estranho, sujeito à segregação e estigmas sociais: corpo transgressor, pois viola as regras de uma, dita, correta, boa e certa alimentação; que vive em eterno descontrole dos desejos, numa ansiedade constante, já que “o obeso (seu corpo o trai) passa por alguém que come mais do que os outros, mais do que o normal, numa palavra: mais do que sua parte” (FISCHLER, 1995, p. 74).

Assim, com Denise B. de Sant’Anna, aprendemos que o corpo é terreno de lutas simbólicas, com discursivas batalhas que encenam as representações em torno do que é o poder, o sucesso e a felicidade na sociedade. De fato, o livro Gordos, magros e obesos: uma história do peso no Brasil é uma obra referencial e que traz um estudo de significante valor e pauta para as discussões nas cadeiras das ciências humanas e sociais que voltam-se para as pesquisas das relações entre ‘corpo’, ‘história’ e ‘gênero’.

1. Em outras palavras, alimentos, roupas e acessórios que são aceitos socialmente; vale apontar que aqueles não os conhecem estarão out, fora dos padrões da, dita, normalidade.

2. Georges Vigarello (2012, p.10) assim sintetiza sobre a passagem da imagem do corpo gordo como símbolo de riqueza e poder para o de problemático: “(…) Prestígio e modelo mudaram: as antigas tabelas de alimentos empilhados desaparecem, o acúmulo alimentar já não é sinal de força, mas sim de descuido ou grosseria. A história do gordo está ligada a essas reviravoltas. O desenvolvimento das sociedades ocidentais promove o afinamento do corpo, a vigilância cerrada da silhueta, a rejeição do peso de maneira mais alarmada. O que transforma o registro da gordura, denegrindo-a, aumentando o seu descrédito e privilegiando insensivelmente a leveza. A amplitude do volume afasta-se cada vez mais do refinamento, enquanto a beleza se aproxima mais e mais do que é magro, esguio”.

3. O estudo de Denise Bernuzzi sobre essa passagem histórica da representação do corpo está inserido em “Corpo e História” (In: SANT’ANNA, 1995).

4. Por exemplo, ‘The Biggest Loser‘ (‘O Grande Perdedor’) e ‘Quilos Mortais, ambos transmitidos no Brasil pelo canal Discovery Home & Health.

5. Os casos apresentados por Sant’Anna (ibid.p. 147-148) retratam as mortes de duas modelos, Isabelle Caro, francesa, 28 anos, e Ana Carolina Reston, brasileira, 21 anos, ambas vítimas da anorexia.

6. Nos espaços de alimentação como praças, em shopping centers, perdemos nossa capacidade de se relacionar cultural, geográfica e sazonalmente com a comida.

7. Sobre a indústria do fast-food, o filme “A dieta do palhaço” (2004) apresenta uma experiência que retrata a precarização nutricional dos alimentos ricos em gordura, sódio e carboidratos. Fast-food é alimentação rápida, com alto teor calórico e de açúcares. Também é denominada de junkie-food, i.e., uma ‘comida lixo’.

FISCHLER C. Obeso Benigno, Obeso Maligno. In: SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de (org.). Políticas do Corpo. São Paulo: Liberdade, 1995. p. 69-82.

SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. Corpo e história. Cadernos de subjetividade. Núcleo de estudo e pesquisa da subetividade – Programa de estudo de Pós-graduação em Psicologia Clínica – PUC/SP, 1995 (2), p. 243-266.

SUPER size me – A dieta do Palhaço. Direção de Morgan Spurlock. EUA: The Con, 2004. 1 DVD (98 min.)

VIGARELLO, G. As metamorfoses do gordo: história da obesidade. Petrópolis: Vozes, 2012

Renato Marcelo Resgala Júnior – Graduado em Letras pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Santa Marcelina em Muriaé-MG; Mestre em Letras pelo PROMEL: Teoria Literária e Crítica da Cultura, na Universidade Federal de São João Del Rei-MG; Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Estadual do Norte Fluminense – Darcy Ribeiro (UENF), em Campos dos Goytacazes -Rio de Janeiro. Membro do ATEGEN – Ateliê de Gênero do Centro de Ciências do Homem (CCH- UENF). Bolsista CAPES-Cnpq. E-mail: renatoresgalajr@gmail.com


SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. Gordos, magros e obesos: uma história do peso no Brasil. 1. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2016. 184p. Resenha de: RESGALA JR Renato Marcelo. À mesa fata, a fome e a gula: corpos brasileiros e sua história, por Denise B. de Sant’Anna. Projeto História. São Paulo, v.70, p.346-354, jan. / abr. 2021. Acessar publicação original [IF].

Uma história das leishmanioses no novo mundo: fins do século XIX aos anos 1960 | Jaime Larry Benchimol e Denis Guedes Jogas Junior

O livro Uma história das leishmanioses no novo mundo: fins do século XIX aos anos 1960, de Jayme Larry Benchimol e Denis Guedes Jogas Júnior, publicado em 2020 pelas editoras Fino Traço, de Minas Gerais, e Fiocruz, do Rio de Janeiro, não é bem um livro, mas uma enciclopédia especializada. Desde a apresentação, Jayme Benchimol nos informa que haverá um próximo volume sobre a história de uma doença que tem características desafiadoras, seja por sua amplitude e singularidades geográficas, seja pela sua epidemiologia ou pela epistemologia dos fatores que interferiram nas explicações sobre sua classificação nosológica.

A dimensão épica do presente livro não é surpresa, dada a tradição de grandes empreitadas a que Jayme Benchimol se dedica, sempre na seara da história da saúde pública e da biomedicina no Brasil, especialmente a partir do Rio de Janeiro. Em publicações anteriores já vimos pesquisas de grande fôlego, tais como a divulgação da obra de Adolpho Lutz – este em parceria com Magali Romero Sá, em vários volumes, publicados entre 2004 e 2006 – ou a coordenação de publicação sobre a história da febre amarela, de 2001. Leia Mais

Tribunal do Santo Ofício Português, 200 anos após extinção: história e historiografia | Politeia: História e Sociedade | 2021

SOBRE A TRAJETÓRIA DO SANTO OFÍCIO PORTUGUÊS

Por meio da bula Cum ad nihil magis, assinada em 23 de maio de 1536, o papa Paulo III atendeu à solicitação do rei de Portugal, Dom João III, que realizava investidas no sentido de conseguir a autorização para implantação do Santo Ofício português. 1 Tentativas ocorriam desde o reinado de Dom Manuel I, mais precisamente desde o ano de 1515, quando este monarca escreveu ao embaixador de Roma, Dom Miguel da Silva, pedindo que fosse enviada uma solicitação ao Papa Leão X, para que o pontífice criasse para Portugal um Tribunal da Inquisição, nos moldes de seu congênere espanhol. Diante das tensões entre os cristãos novos portugueses e espanhóis e, também, dos conflitos entre a população cristã e os conversos, Dom Manuel pretendia “tutelar a autonomia jurisdicional dos seus territórios, recusando as invasivas pretensões dos inquisidores castelhanos” (MARCOCCI, 2011, p. 23). Durante duas décadas, muitas foram as iniciativas, tanto da coroa portuguesa quanto de setores eclesiásticos no sentido de alcançar esse objetivo.2

Embora a bula papal tenha sido assinada em maio de 1536, apenas cinco meses depois, mais precisamente em 22 de outubro, ocorreu a cerimonia de publicação, na Catedral de Évora, cidade de habitação, na época, da corte portuguesa, na presença do inquisidor-geral, do rei, do cardeal, do cabido e todo o restante do clero e da população da cidade e arredores. A leitura da bula tornava públicos, aos ouvintes, o ato de criação da instituição, esclarecimentos sobre o caráter da Inquisição, bem como sobre os delitos de sua alçada. Conforme Marcocci e Paiva (2013), o Santo Ofício português começou a funcionar no dia 22 de novembro de 1536, na pousada do Inquisidor-geral, Dom Diogo da Silva, espaço no qual foram ouvidas “testemunhas contra a cortesã cristã-nova Madalena de Oliveira. Em janeiro do ano seguinte, desencadearam-se os primeiros processos” (MARCOCCI; PAIVA, 2013, p. 35).

Ainda no ritual do estabelecimento, foi feita a leitura do Édito da Graça, que estabeleceu o prazo de 30 dias para que as pessoas que tivessem cometido crimes de heresia pudessem se apresentar diante do Santo Ofício, demostrando arrependimento. Ao término do tempo da Graça, “em 19 de novembro o inquisidor-geral publicou um monitório com descrição pormenorizada dos crimes sob jurisdição inquisitorial que deveriam ser denunciados ao tribunal” (BETHENCOURT, 2000, p. 25).

Desde o início, a alegação utilizada para o estabelecimento da Inquisição portuguesa era o crescimento das heresias junto aos cristãos novos portugueses. Embora a alçada da Inquisição diga respeito a uma variedade de crimes contra a fé (judaísmo, maometismo, protestantismo, molinismo, deísmo, críticas aos dogmas etc), e estivessem contemplados, também, entre os delitos previstos, práticas que atentassem contra a moral cristã e os bons costumes (bigamia, sodomia, feitiçaria, solicitação etc), o objetivo principal da Inquisição portuguesa era, mesmo, perseguir e punir práticas de judaísmo em meio aos neófitos do cristianismo. Até a primeira década do seiscentos, o Santo Ofício português também se preocupou com desviantes identificados com os erasmianos, com luteranos e calvinistas e com o avanço das ideias reformadas, como esclarece Elisete da Silva (2020, p. 38). A tentativa de controle por meio de leituras proibidas está em destaque nesse período, como nos séculos seguintes.

O crescimento do judaísmo em Portugal esteve associado à conversão forçada dos judeus, banidos da Espanha pelos reis católicos. Em dezembro de 1496, Dom Manuel publicou um decreto de expulsão, estabelecendo um prazo de dez meses para que judeus e mouros deixassem Portugal, como esclarecem Marcocci e Paiva (2013, p. 25):

4 de dezembro de 1496, em Muge, onde se encontrava a corte de D. Manuel I, fora anunciada a expulsão dos judeus e muçulmanos residentes em Portugal, sem que a sua coexistência com a maioria cristã tivesse provocado, no século XV, tensões semelhantes às ocorridas em Castela e Aragão. Ali, em 1492, os Reis católicos, Fernando e Isabel os judeus (mas não os muçulmanos).

A medida adotada por D. Manoel, atendia ao disposto no contrato de casamento entre o rei português e Isabel de Aragão, filha dos reis espanhóis. Contudo, ao término do prazo previsto, em fins de outubro do ano seguinte, os judeus que ainda estavam em Portugal foram proibidos de sair do país:

Em fins de outubro de 1497 expirou o prazo para que os judeus deixassem Portugal. Milhares deles, que se dirigiram para o porto, receberam o comunicado de que, uma vez que já havia se findado o prazo, eles seriam considerados, a partir de então, escravos do rei. A ordem foi revogada logo em seguida, mas o rei ordenou que todos fossem batizados à força. Esse episódio justifica, em parte, o grau elevado de criptojudeus em Portugal e seus domínios (SOUZA, 2008, p. 90).

O presente texto, de caráter introdutório, panorâmico e de apresentação não tem por objetivo trazer minúcias da história de quase trezentos anos de existência do Santo Ofício português, não só pela longevidade da instituição, mas também pela extensão geográfica de sua atuação: a Inquisição lusa foi atuante não apenas em Portugal, mas em todo o território ultramarino do reino, nos continentes americano, africano e asiático. Durante o período de existência do Santo Ofício português, existiram três tribunais, com sedes em Lisboa (1536-1821), Évora (1536-1821) e Coimbra (1541-1821). 3 O primeiro tinha por jurisdição, além de regiões do reino, também o Brasil, ilhas do Atlântico e posições portuguesas na costa ocidental da África. O único tribunal fora de Portugal foi o de Goa, na Índia, instituído em 1560, que tinha também sob sua jurisdição a costa oriental africana.

Restrições impostas pelo papa, na primeira década de existência da Inquisição portuguesa, não agradavam D. João III, pois feria a sua autonomia. Como destaca Antônio José Saraiva (1994), dos quatro inquisidores, três eram nomeados diretamente pelo papa e ao monarca era autorizado escolher apenas um. Outros indicativos de cerceamento de autonomia da monarquia portuguesa pelo papado são elencados pelo autor:

Além disso, determinava que durante três anos os nomes das testemunhas de acusação não fossem secretos, e que durante dez anos os bens dos condenados não fossem confiscados. Os bispos teriam os mesmos poderes que os inquisidores no conhecimento das heresias. Por intermédio do seu núncio em Lisboa, o Papa reservava-se o direito de fiscalizar o cumprimento da bula, de conhecer os processos quando o entendesse e de decidir em última instância (SARAIVA, 1994, p. 50).

O controle do sumo-pontífice sobre a Inquisição portuguesa, sobretudo no que se refere à condução dos processos contra cristãos novos, foi superado apenas com a bula Meditatio Cordis, publicada em julho de 1547, que dotou o Santo Ofício português “das faculdades ambicionadas, sobretudo maior autonomia face a Roma e possibilidade de realizar processos secretos anulando ainda os poderes da bula de 1536 que tinha dado a vários bispos inquisidores, agora todos exclusivamente concentrados em D. Henrique” (MARCOCCI; PAIVA, 2013, p. 38). 4

Na década de 1540, marcada por conflitos, várias bulas e breves foram publicados e revogados: “Chegou-se mesmo a levantar a possibilidade de um rompimento […] com Roma. A última cartada de Paulo III foi a promulgação de um breve datado de 8 de janeiro de 1549, em que abolia o segredo das testemunhas, porém nunca entrou em vigor em terras lusitanas” (SOUZA, 2014, p. 56).5

O tribunal do Santo ofício português foi, ao mesmo tempo, régio e eclesiástico e, desde o momento de seu nascimento, foi de fundamental importância para a política de centralização do poder monárquico. Mas, apesar de ter conseguido consolidar a tão sonhada autonomia, a Inquisição portuguesa e as suas ações contra os cristãos novos permaneceram, até princípio do século XVII, sob o controle de Roma. Exemplo disso é Perdão Geral de 1605, concedido pelo papa Clemente VIII, o quarto perdão emitido por esse mesmo papa, segundo Elias Lipiner (1977). Por meio desse breve, foram beneficiados 70 homens e 85 mulheres que se encontravam presos nos cárceres do Santo Ofício.6 Dentre as mulheres que alcançaram a liberdade por força desse ato, estavam três moradoras da Bahia todas da família Antunes, sendo duas filhas – Beatriz e Leonor – e uma neta – Ana Alcoforada – do casal Ana Rodrigues e Heitor Antunes. 7

Ainda referente ao Perdão de 1605, em um livro de correspondência da Inquisição de Lisboa encontramos anotações de uma carta enviada para a Bahia, datada de 16 de março de 1605, informando que foi remetido um maço com documentação destinada ao bispo do Brasil, Dom Constantino Barradas, com uma missiva do “Senhor Inquisidor Geral” – na época, D. Pedro de Castilho – e da Mesa inquisitorial avisando “que as pessoas que estivessem lá presas por ordem do Santo Ofício, as mandasse soltar” e tornar seus bens, pagando somente o que tinham custado com suas pessoas. 8

No reinado de Dom João IV, tiveram lugar vários conflitos entre a coroa e poder inquisitorial, relacionados à guerra com a Espanha, ao reconhecimento da restauração da monarquia portuguesa e, ainda, por conta das ações frente aos cristãos novos envolvendo o padre Antônio Vieira. Esclarece Novinsky (1978, p. 13):

Durante o reinado de D. João IV, quando atrás do monarca soprava a voz do padre Antonio Vieira, a Inquisição se viu seriamente ameaçada e privada de seus lucros. Os desentendimentos entre Coroa e Inquisição alcançaram então seus extremos. Apesar da indignação dos Inquisidores com a formação da Companhia de Comércio para o Brasil (1649) e o Alvará que isentou do confisco os mercadores cristãos novos acionistas da Companhia, D. João IV teve a coragem de desafiar a Inquisição e mandou retirar desta a autoridade administrativa do Fisco, ordenando que passasse para o Conselho da Fazenda, alegando ainda que não era conveniente que os Inquisidores se “distraíssem” com negócios alheios a sua função principal, visto haver pessoas que atrevidamente punham em dúvida o escrúpulo usado no manejo dos seqüestros (1655).

No bojo da relação entre monarquia portuguesa e o tribunal do Santo Ofício, foi revelado, em 1641, um complô articulado pelo então inquisidor geral, D. Francisco de Castro, com o intuito de assassinar o rei. Para Saraiva, essa conspiração tinha por objetivo reestabelecer a união ibérica. O episódio insere-se na luta por poderes entre o rei e papa, do qual o Inquisidor geral era o representante:

O Inquisidor-Geral tinha a qualidade e os poderes de delegado do Papa, podendo inclusive lançar excomunhões reservadas à Santa Sé. Era, no entanto, designado pelo Rei, limitando-se o Papa a confirmar essa designação. Uma vez nomeado e confirmado, o Rei não tinha mais qualquer poder ou controlo sobre este seu súbdito que assumia dentro do Reino os poderes e a autoridade do mesmo Papa em matéria de Fé. Embora nomeasse o Inquisidor-Geral, o Rei não podia destituí-lo, fossem quais fossem as circunstâncias (SARAIVA, 1994, p. 159).

Outro episódio decisivo relativo às ações inquisitoriais diz respeito à suspensão dos processos da Inquisição portuguesa, em 1674, por meio do breve Cum dilecti, do Papa Clemente X. O poder só foi restituído ao Santo Ofício português em 1681, já no pontificado de Inocência XI. Segundo Marcocci e Paiva (2013, p. 204), depois “do perdão geral de 1604-1605, a suspensão dos processos e cessação dos autos de fé foi a maior derrota da inquisição”.

Para uma melhor compreensão sobre os afazeres inquisitoriais, sobretudo no que se refere às atividades repressivas, trazemos um quadro geral baseado na análise de documentos e em informações presentes na historiografia referente aos tribunais de Lisboa, Coimbra, Évora e Goa. No período que se estende de 1536 a 1605, desde a instalação do tribunal em Portugal até a concessão do Perdão Geral, foram processados mais de 10 mil indivíduos, sendo que aproximadamente 7,4% foram condenados à morte. 9 De 1606 a 1674, período que começa no ano seguinte à concessão do Perdão Geral e termina com a suspensão da Inquisição pelo papa, foram sentenciados pelo Santo Ofício português mais que o dobro do período anterior: 22.481 pessoas, das quais 863 foram relaxadas. 10 Após o retorno das atividades inquisitoriais, em 1681, até 1750 – início do reinado de D. José I e da ascensão do Marquês de Pombal à condição de secretário de Estado – foram computadas 10.551 pessoas processadas, com 3,7% condenadas à morte. Embora, nesse último período o número de processados tenha ficado próximo ao da primeira etapa de funcionamento da Inquisição, o percentual de relaxação foi bem menor, cerca da metade. A partir da década de sessenta dos setecentos, ocorreu uma queda acentuada no número de condenados pela Inquisição. Tomando como base os dados fornecidos por Bethencourt (2000), entre os anos de 1751 a 1767, o Santo Oficio português sentenciou pouco mais de 1590 pessoas, das quais foram relaxadas 3,6 %.

A média anual de processos correspondente aos quatro tribunais, em cada um desses quatro períodos, foi consolidada por Bethencourt (200, p. 312): “37 entre 1536 e 1605, 81 entre 1606 e 1674, 35 entre 1675 e 1750, e 23 entre 1751 e 1767”. Comparando esses números com os de sentenciados das inquisições Espanhola e Italiana, o autor conclui que “as médias anuais dos processos portugueses são sempre superiores, em todos os períodos, à medias espanholas e italianas, embora se deva atentar às enormes lacunas de fontes verificadas nesses últimos casos” (BETHENCOURT, 2000, p. 321).

A maior parte dos delitos apontados nos processos do Santo Ofício português dizia respeito às práticas judaizantes, contudo cada localidade do império deve ser examinada em suas particularidades, como pode ser observado nos artigos que compõem o dossiê que ora apresentamos.

A partir da década de setenta do século XVIII, as atividades repressivas do Santo Ofício português reduziram significativamente e várias são as razões. Em 25 de maio de 1773, foi publicado um decreto régio pondo fim à distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos. No ano seguinte, entrou em vigor o último regimento da Inquisição, que incorporou os anseios de reforma administrativa do Estado português e das suas relações com a Igreja. 11

O novo regimento trouxe elementos que julgamos importante destacar aqui. Ele contribuiu para a redução das atividades inquisitoriais e, consequentemente, para o arrefecimento do medo em relação ao que se entendia como marca do horrendum tribunale: o uso de tortura. Outras modificações importantes foram: o fim do segredo processual e a modificação no tratamento de alguns crimes, a exemplo das “chamadas práticas mágicas, feitiçarias, superstição, adivinhadores, proporcionadores ‘racionais’ de malefícios e astrologia judiciária de feitiçaria” (SOUZA, 2014, p. 242).

A prática de tortura era já tratada, naquele momento, como “estranha dos pios e misericordiosos sentimento da Igreja Mãe”, e era condenada por alguns por levar a falsas confissões. Porém, ela continuou a ser admitida “nos casos de heresiarcas ou dogmatista negativos e que ocultavam os nomes das pessoas que com eles prevaricaram, mantendo o que estava prescrito no Regimento anterior quanto ao modo de sua aplicação” (MARCOCCI; PAIVA, 2013, p. 354-355). 12

Em relação ao fim do segredo processual, é importante ressaltar que, desde o início das atividades inquisitoriais, o segredo, juntamente com o confisco de bens que impedia o acesso à herança por parte dos filhos menores dos condenados, foi alvo de severas críticas e pesados argumentos daqueles que se opuseram às práticas da instituição. Segundo Bethencourt (2000, p. 340), o segredo do processo “é o que distingue mais claramente o processo inquisitorial das práticas processuais da época: os acusados não podiam conhecer os nomes de seus denunciantes ou testemunhas de acusação, nem sequer as circunstâncias de tempo e lugar dos crimes imputados”. O indivíduo, quando era preso, não sabia o motivo da denúncia, quais pessoas o denunciaram e nem mesmo o delito que havia cometido. A falta completa de informações levava o réu ao desespero e, instado a dizer o que os inquisidores queriam ouvir, em muitos momentos entregavam amigos e familiares. Uma parte considerável das denúncias por práticas de judaísmo tiveram origem dentro dos cárceres do Santo Ofício. Analisando o processo de Alexandre Henriques – bem como a história de vida de sua mãe e irmãos –, enviado preso de Salvador para Lisboa em 1734, verificamos que as denúncias contra sua família foram todas feitas de dentro dos Estaus. 13 Ele próprio, quando tinha 16 anos de idade, em 1706, procurou a Mesa Inquisitorial, juntamente com sua irmã, Maria Nunes, para confessar que judaizavam e que havia sido iniciado na religião judaica por sua mãe, Clara Rodrigues, e por sua madrinha, Leonor Rodrigues, ambas sentenciadas pelo Tribunal. 14 Além dele e da mãe, foram presos, também, duas irmãs e um tia.

O último regimento do Santo Ofício português, que entrou em vigência em 14 de agosto de 1774, era, também, resultado do reformismo ilustrado pombalino e pretendia “dar uma roupagem diferenciada à Instituição, torná-la instrumento em defesa do Estado, coerente com o momento histórico e tipo de governo que Portugal vivenciava, embora a manutenção de tal Instituição no ‘século das luzes’ não deixava de ser contraditória” (SOUZA, 2014, p. 242). 15 No novo regimento, a crença em práticas de feitiçaria passou a ser atribuída à ignorância, ao fanatismo, estimulada por textos e autores que estimulavam o obscurantismo, dentre os quais o Malleus Maleficarum, manual escrito pelos dominicanos Heinrich Kraemer e James Sprenger, no século XV; uma obra atribuída ao Fr. Jeronimo Savanarola; além de escritos de padre Antônio Vieira e do frei Thomas Campanela. O regimento de 1774 traz um arrazoado sobre a impossibilidade do pacto demoníaco, por não ser verossímil e não condizente com a razão:

Porquanto pela dedução e combinação de tudo o referido, se concluiu teológica, jurídica e geometricamente, que os feitiços, sortilégios, adivinhações, encantamentos e malefícios, depois da redenção do mundo foram manifestamente imposturas maquinadas: ou por pessoas poderosas que para santificarem, ou fazerem formidáveis as suas cobiçosas tiranias, e lisonjearem as suas depravadas paixões se serviram dos magos ou mágicos, e dos sacerdotes gentis, como de instrumentos próprios para estabelecerem, sobre a ignorância e fanatismo dos povos, a cega sujeição as suas cureis atrocidades.16

A incredulidade na existência das práticas mágicas conduz à admissão de que os réus que insistissem na veracidade dos efeitos dessas ações deveriam ser tratados com insanos, alienados:

Só pode ser miseráveis efeitos de uma crassa ignorância, e de uma furiosa loucura, agitadas por um daqueles ardentes fanatismos, que intemperado as cabeças dos homens, ou deixam cegos à luz da verdade, e indisposto para ouvirem as vozes da razão: Ordenamos: que os réus que se acharem nos referidos casos, sejam definitivamente julgados por loucos, sem necessidade de outra prova ou exame: Que sejam como tais remetidos ao Hospital Real de todos os santos; Que nele fiquem reclusos nos Cárceres dos doidos enquanto o Conselho Geral não mandar o Contrário. 17

O estudo da legislação inquisitorial é de grande valia para compreender a dinâmica legal de funcionamento da instituição.18 Os regimentos da Inquisição portuguesa, em particular, são também fundamentais ao estudo do Santo Ofício em sua trajetória de quase três séculos de existência, período de grandes mudanças nas mentalidades. São fartos os registros sobre processos inquisitoriais, processos de habilitação, instruções a ministros e outros, o que nos leva a identificar como essa legislação foi colocada em prática. Também, por meio dessa mesma documentação, percebemos as diversas maneiras como as suas determinações eram burladas, seja pela população em geral ou pelos próprios agentes habilitados. Enfim, o conjunto documental que compõe o fundo do Santo Ofício, incluindo os regimentos, nos revela muito da trajetória dessa instituição, desde o princípio até a sua extinção.

UMA REDE DE AGENTES INQUISITORIAIS

Fora dos tribunais de distrito, as ações inquisitoriais estiveram ao encargo de uma rede de agentes, constituída principalmente por Comissários e Familiares. Essa rede começou a se formar nos últimos anos do século XVI e a sua presença se intensificou a partir do XVII. Em algumas localidades do império só veio a se consolidar no final dos seiscentos e princípio dos setecentos. Sendo assim, no primeiro meio século de funcionamento do Santo Ofício português, suas ações fora do reino ocorreram por meio de agentes delegados e, de maneira mais efetiva, quando da realização das visitações autorizadas pelo Conselho Geral (CG). Órgão máximo da hierarquia inquisitorial, o Conselho Geral era presidido pelo Inquisidor-mor e composto por deputados. Foi instituído em meados de 1569 pelo Cardeal Dom Henrique e pelo Regimento elaborado em 1570. A criação do CG objetivava manter um controle maior dos tribunais de Lisboa, Évora e Coimbra sobre o funcionamento do corpo de agentes. 19 Com a finalidade de fiscalizar e controlar o mundo luso, dentro e fora de Portugal, o Conselho organizou as diversas visitações do final do século XVI, intenção já registrada em 1588, quando foi externado o interesse na realização de visitas nas ilhas da Madeira, Açores, Brasil, Cabo Verde e São Tomé. Foi como parte desse projeto que ocorreu a primeira visitação da inquisição às terras da América portuguesa, no ano de 1591, com a chegada do primeiro visitador Heitor Furtado de Mendonça. 20 Sobre o momento do desembarque do Heitor Furtado de Mendonça em Salvador, expõe Luiz Mott (2010, p. 19):

Salvador, 50 anos depois de fundada, possuía por volta de 800 vizinhos brancos e três vezes mais negros e índios, quando no ano do Senhor de 1591 desembarca em seu porto inesperado visitante: o Licenciado Heitor Furtado de Mendonça, Deputado do Santo Ofício da Inquisição. A notícia de tão temível visita deve ter-se alastrado a trote de cavalo pelos mais de 40 engenhos espalhados pelo Recôncavo, deixando a população em palpos de aranha.

No mesmo ano de 1591, parte para as ilhas dos Açores e da Madeira o visitador Jerônimo Teixeira; em 1596, foi a vez do padre Jorge Pereira visitar Angola. No Brasil, ocorreram mais três visitas: a segunda, restrita à Bahia (Salvador e Recôncavo), ocorreu entre 1618 e 1620; outra, nas capitanias do sul, aconteceu entre 1627 e 1628. Já no século XVIII, entre 1763 e 1769, foi realizada a visitação do Grão-Pará. 21

Contudo a presença mais efetiva da Inquisição nas terras de ultramar se deu, mesmo, por meio da formação de uma rede de agentes. A historiografia portuguesa e brasileira sobre Inquisição é rica em detalhes sobre a ação desses agentes, tanto a partir de uma perspectiva mais geral, no que refere ao processo de estabelecimento, estrutura e procedimentos da rede, quanto em uma perspectiva mais específica, em escala de regiões, cidades ou pequenas localidades. 22 No universo mais restrito, os agentes locais fizeram a ponte, foram os “pontas de lança” dos tribunais aos quais estavam subordinados.

ACESSO À DOCUMENTAÇÃO INQUISITORIAL E NOVAS PESQUISAS

A documentação resultante das ações inquisitoriais é de grande valia para os estudos da história colonial, sobretudo com relação às primeiras décadas de colonização efetiva, cujas fontes são mais escassas. Essa documentação nos permite analisar não apenas as questões de ordem religiosa, mas também as relacionadas ao poder e à dominação econômica, à sociabilidade e à vida cotidiana. Com base nessas fontes, já no início da década de setenta do século XX, temos os primeiros trabalhos publicados, com destaque para a produção de Sonia Siqueira e Eduardo d’Oliveira França. Foram eles, conforme Ângelo Adriano, que lançaram as bases da historiografia brasileira sobre a Inquisição.

Siqueira e França foram os responsáveis pela publicação – precedida de um vasto e importante texto introdutório acerca do papel e presença dos cristãos-novos nos domínios portugueses e além, em especial o luso trópico, durante a Modernidade – das confissões referentes à segunda visitação do Santo Ofício ao Brasil, iniciada em 1618 e que duraria cerca de dois anos, com raio de ação sobre a cidade do Salvador da Bahia de Todos os Santos e o seu Recôncavo, sob a responsabilidade do visitador Marcos Teixeira (ASSIS, 2015, p. 12). 23

Nas décadas seguintes as pesquisas de Anita Novinsky, Luiz Mott, Laura de Melo e Souza e Ronaldo Vainfas produziram excelentes obras “impulsionadas pela riqueza das fontes e pelas correntes historiográficas ligada à história cultural e à história das ideias” (FEITLER, 2007, p. 11), influenciando toda uma geração posterior, não só na perspectiva de funcionamento da máquina inquisitorial, mas principalmente nos estudos dos crimes da alçada do Santo Ofício: judaísmo, feitiçaria, sodomia, solicitação, bigamia, “protestantismo”, dentre outros. Pelas características da vasta produção historiográfica e para não cometermos injustiças é impossível elencarmos todas as valiosas contribuições dos investigadores brasileiros para os estudos inquisitoriais.

A atual geração de investigadores tem se beneficiado das novas tecnologias que, por meio do Projeto Inquisição on-line do Arquivo Nacional da Torre do Tombo que, em 2007, deu início ao processo de digitalização e posterior disponibilização da documentação produzida pelo tribunal lisboeta, segundo Calainho (2019, p. 182), “o maior dos tribunais regionais, e que tinha, sob sua jurisdição, no ultramar, o Brasil, as ilhas dos Açores e Madeira, Angola e regiões do Oriente, e portanto o mais procurado pelos pesquisadores dado o volume de territórios que abarcava”.

Da Inquisição de Lisboa (IL) se encontram disponíveis em meio digital mais de 19 mil documentos, sendo 90% de processos inquisitoriais. A partir de 2011, a digitalização foi ampliada para o subfundo do Conselho Geral do Santo Ofício, com as diligências de habilitandos a diversos cargos do Tribunal do Santo Ofício (Comissário, Qualificador, Notário, Visitador de nau e, predominantemente, Familiar). Esta série documental, compostas por mais de 30 mil processos, inclui também as habilitações incompletas, que calculamos um pouco mais de 5 mil documentos.

A documentação online do Tribunal do Santo Ofício português hoje permite ampliar as pesquisas, mediante a democratização do acesso as fontes inquisitoriais, e a dinamização da produção historiográfica, visto que os investigadores têm a possibilidade de principiar suas investigações ainda no início da vida acadêmica, em trabalhos de iniciação cientifica, trabalhos de conclusão de cursos e pós-graduação. Hoje já temos uma geração de pesquisadores que começam, dessa maneira, a labutar no site do Arquivo Nacional da Torre do tombo online.

SOBRE O DOSSIÊ “TRIBUNAL DO SANTO OFÍCIO PORTUGUÊS, 200 ANOS APÓS EXTINÇÃO: HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA”

O dossiê “Tribunal do Santo Ofício português, 200 anos após extinção: História e Historiografia” foi projetado com o objetivo de contribuir com os estudos inquisitoriais, sobretudo nesse momento em que investigadores de diversas partes do mundo têm discutido a história do tribunal e colaborado para enriquecer, ainda mais, a historiografia relativa à instituição. Os artigos aqui apresentados – dispostos na ordem cronológicas e da temática mais ampla para os estudos de caso – mostram a presença da inquisição portuguesa nos continentes americano, africano e asiático.

Começamos, então, pelo texto de Eduardo Borges de Carvalho Nogueira, “Homens profanos: fluidez identitária entre renegados ‘portugueses’ na Índia”. O autor trabalha com estudo da trajetória de três homens, naturais do reino, que foram condenados por apostasia. O primeiro estudo diz respeito a Antônio Camacho, natural de Lisboa, mestre-escola de profissão, que foi para Goa no início da segunda metade do século XVI. O crime cometido foi o de bigamia, pois, já casado em Lisboa, o homem contraiu segundo matrimônio com uma mestiça nas terras luso-indianas. Os outros dois indivíduos estudados por Borges são Jorge Cardoso de Mendonça e Gonçalo Toscano, ambos também apostatas aos olhos da Igreja. O primeiro “tornou-se mouro, inclusive sofrendo a circuncisão”, vestindo-se à mourisco, realizando cerimonias islâmicas e, mesmo depois de ter se apresentado ao tribunal em 1590, abjurado em auto-de-fé na Sé de Goa e absolvido pelo Santo Ofício, novamente se tornou um mouro. Gonçalo Toscano não conseguiu sucesso nem mesmo nos seus intentos de apóstata, pois não conseguiu ser visto como pessoa de confiança entre os islâmicos, tendo sido preso como suspeito de ser cristão. Destacamos algumas semelhanças entre os casos estudados: primeiro, o fato de os três homens terem indicado como motivo para a apostasia a necessidade de sobreviver no mundo islâmico, já que, como católicos, estavam fadados a morrer de fome; em segundo lugar, o fato de que os três homens tiveram seus nomes “alterados aquando de sua passagem ao Islã”, além de andarem com indumentária “à mourisca”. Tanto Mendonça como Toscano serviram à força islâmica. Enfim, o texto traz elementos importantes não só para pensar questões relativas à ortodoxia como é rico em informações acerca das tensões entre cristãos e muçulmanos na índia e, também, no mediterrâneo.

“Sodomia faeminarum: a Inquisição e a alforria do lesbianismo no mundo” é o segundo artigo, mais uma importante colaboração de Luiz Mott para os estudos inquisitoriais, contribuição que foi iniciada nos primeiros anos da década de oitenta do século XX, com a publicações de artigos e livros resultantes das consultas da documentação do Santo Ofício português. O texto aqui publicado, que tem como objetivo central levantar questões sobre a perseguição e penalização à homossexualidade feminina, parte da análise de um documento escrito pelo Tribunal de Goa, em 1646 e dos debates, entre os inquisidores, sobre o caráter da sodomia feminina. Como suporte para a discussão do tema, o autor visita uma vasta produção de textos dos séculos XVI e XVII, nomeadamente a literatura galega e os cancioneiros populares, com destaque para um poema de Gregório de Matos intitulado “Nise: A uma dama que macheava outras mulheres’’. Rica também é a incursão que Mott faz pela legislação que entra em vigência no império português até meados dos seiscentos, tanto as Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas) como os regimentos inquisitoriais (até o penúltimo, que entrou em vigor em 1640), destacando a importância de cada um desses documentos para a qualificação dos inquisidores no que se refere às relações sexuais entre mulheres. O autor conclui que relações entre as “filhas de Eva” não pertenciam à condição de “sodomia perfeita”, estando, portanto, excluídas do delito da pena capital, ou seja, da morte na fogueira. Além do aporte jurídico, o autor – que também é organizador do dossiê – relaciona um conjunto de obras de teólogos que alimentam a discussão sobre o “homoerotismo lésbico”.

Ainda sobre o século XVII, apresentamos o texto “Mulheres africanas nas redes dos agentes da Inquisição de Lisboa: o caso de Crispina Peres, em Cacheu”, de Vanicléia Silva Santos. Por meio de processos inquisitoriais e relatos de viajantes, autora aborda a trajetória de vida e o papel de uma mulher comerciante em Cacheu, cidade considerada a mais portuguesa da Guiné, com intensas relações comerciais com África, Europa e Brasil. Crispina Peres e seu marido possuíam “estalagem de estrangeiros”, casas de aluguel, navio mercante e “muitos homens e mulheres feitos cativos para serem exportados”. Além disso, ela era uma pessoa muito influente na região. Essa influência ficou bem demostrada quando as pessoas da nação Papel ameaçaram invadir Cacheu na noite de sua prisão. Conforme Vanicleia Santos, o processo contra Crispina foi um subterfugio, com objetivo de eliminá-la como concorrente comercial, tendo em vista que foram 21 pessoas denunciadas, mas apenas ela foi presa, enviada para Lisboa e condenada pelos crimes de feitiçaria, uso de ritos de gentilidade e de bolsas de mandingas. A história dessa mulher é um elemento importante para a compreensão das relações comerciais estabelecidas no período de expansão do tráfico transatlântico de escravizados, bem como para os estudos de gênero, raça e religião.

O quarto artigo que compõe o dossiê, “A família cristã-nova Bernal Nunes de Miranda: entre fronteiras, religiosidades e a Inquisição na Bahia” foi escrito por Ademir Schetini Júnior e trata da perseguição da Inquisição portuguesa a uma família cristã-nova que chega na Bahia na passagem do século XVII para o XVIII. Por meio dos processos dos Bernal Nunes de Miranda, o autor levanta questões relacionadas ao criptojudaísmo na Bahia, mesmo tendo passado mais de dois séculos desde a conversão forçada, bem como sobre o discurso da Inquisição contra as práticas judaizantes. A abordagem acerca do estatuto de pureza de sangue, que vigorou nas sociedades ibéricas como pré-requisito para o acesso as instituições do Antigo Regime, também tem lugar de destaque no artigo, assim como os estudos do médico Francisco Bernal, em Salamanca, e a sua aproximação com Sebastião Monteiro da Vide, Arcebispo do Brasil de 1702 a 1722. Enfim, mediante o cotejamento de informações coletadas em fontes inquisitoriais, o autor demonstra como o ensinamento das cerimonias judaicas eram passadas, discute o papel da mulher na orientação religiosa e na organização cerimonial e ritualística, além de apresentar informações sobre as experiências dos acusados no interior do cárcere, onde eram submetidos a tormentos. O texto é rico em discussões e informações sobre relações familiares e fenômeno migratório, atividades econômicas, sociabilidade e poder na América portuguesa.

Voltada para o universo mineiro setecentista, por meio da documentação inquisitorial, a autora do artigo seguinte, Leticia Maia Dias, apresenta a história de um português que chegou ao Brasil em 1719 e, alguns anos depois, ocupou o cargo de escrivão da Casa de Moeda de Vila Rica. O texto, intitulado “Um bígamo nas Minas Gerais: a trajetória de Antônio José Cogominho”, conta a trajetória desse reinol processado por crime de bigamia no final da primeira metade do século XVIII, uma vez que, já sendo casado no reino, casou-se novamente na capitania de Minas Gerais. Ao analisar o processo de Cogominho, a autora coloca em evidência características importantes da colônia e de sua relação com as instituições do Império Ultramarino. Além disso, a autora trabalha muito bem com a legislação referente ao crime de bigamia, transitando pelas Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, pelas Ordenações do Reino e pelos Regimentos da Inquisição Portuguesa. A autora conclui que o delito de bigamia deve ser visto por dentro “da própria estrutura dos casamentos coloniais, uma vez que o ato de casar de novo evidenciava brechas inerentes aos processos matrimoniais que podem ter sido estrategicamente usadas pelos bígamos”.

O artigo intitulado “Contestação e memória do Tribunal do Santo Ofício: uma perspectiva protestante”, escrito por Elizete da Silva, é muito oportuno para a conclusão da seção de artigos do dossiê. Ao analisar fontes escritas contra as práticas inquisitoriais do século XVIII, a autora traz à discussão, na perspectiva das ideias iluministas, a noção de liberdade de consciência e põe em evidência a trajetória do escritor Francisco Xavier de Oliveyra – de alcunha Cavaleiro de Oliveira –, feito réu e sentenciado em 1761 pelo Tribunal de Lisboa. Com esse estudo, a autora dá uma excelente contribuição para o estudo do protestantismo europeu, desde a sua origem, com o surgimento do luteranismo, perpassa a discussão sobre a extinção do Santo Ofício português e conclui com o nascimento de igrejas protestantes no Brasil, na segunda metade dos oitocentos. Para falar do protestantismo europeu e do discurso referente ao terror e à tirania da Inquisição, Elizete chama a atenção sobre a estratégia discursiva de disputa entre protestantismo e catolicismo, afirmando que a intolerância ocorreu dos dois lados.

O dossiê se encerra com a entrevista, realizada pela equipe do Laboratório de Estudos, Documentação Inquisitorial e Sociedade de Antigo Regime (LEDISAR), com sede na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, com a historiadora Patrícia Souza de Faria. Na entrevista, são abordados temas relativos às possiblidades e potencializados de desenvolvimento de pesquisas e projetos de ensino com base na documentação inquisitorial. Com ampla experiência na identificação e exploração de fontes relativas à presença da Inquisição no Oriente português, Patrícia Faria expõe sua trajetória acadêmica e fornece orientações para aqueles que queiram se aventurar nos estudos inquisitoriais.

A título de conclusão, submeto à reflexão dos leitores da Politeia dois documentos produzidos no apagar das luzes da Inquisição portuguesa, os quais são importantes para pensar a atuação desta instituição no mundo liberal. O primeiro é o processo de Hipólito José da Costa – redator do jornal Correio Braziliense, impresso entre 1808 e 1822 em Londres. O personagem foi preso nos cárceres da inquisição de Lisboa, em janeiro de 1803, por acusação de ser pedreiro-livre (maçom), mas fugiu em 1805. 24 Conforme consta em seu processo, o crime tornou-se mais grave pelo fato de o indivíduo ter “graus superiores na Ordem Maçónica” e ter sido enviado como plenipotenciário pelo supremo Conselho Maçônico de Portugal ao Grande Oriente de Londres. Após a fuga dos Estaus, Hipólito foi para a Inglaterra, onde viveu até a sua morte, ocorrida em 1823. O segundo documento trata de uma anotação no último livro de Correspondências Expedida do tribunal de Lisboa. Os registros começaram a ser feitos em 7 de janeiro de 1802, enumerados e rubricados pelo inquisidor Manuel Estanislau Fragoso. A última anotação foi feita em 28 de fevereiro de 1821, portanto, a um mês da extinção do Santo Ofício Português.25 O teor de uma carta enviada para Évora fornece informação sobre a soltura do réu Francisco de Almeida Nogueira, no dia 28 daquele mesmo mês. O primeiro individuo era o que se poderia chamar à época de “famoso”; o segundo nem tanto. Os processos aos quais eles foram submetidos revelam muito sobre os últimos lampejos do Santo Ofício.

Notas

1 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Bulas, Maço 9, número 15, Bula Cum ad nihil magis do papa Paulo III dirigida aos bispos de Coimbra, Lamego e Ceuta pela qual os constitui seus comissários e inquisidores no reino de Portugal como também outra pessoa eclesiástica que o rei d. João III nomeasse para procederem contra os cristãos novos e mais pessoas que incorressem em crimes de heresia, com as penas declaradas. Para acesso online ao documento: https://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=3908041

2 A historiografia portuguesa é rica em autores que se debruçaram sobre a trajetória de ações de setores do clero e da coroa portuguesa no sentido do estabelecimento do Santo Ofício português, bem como da resistência papal a essas iniciativas. O tema está presente em publicações do século XIX e princípio do século XX, de autoria de Antônio Joaquim Moreira, Alexandre Herculano e António Baião; nos estudos de Francisco Bethencourt (2000) sobre a História das inquisições em Portugal, Espanha e Itália; e na História da Inquisição Portuguesa (1536-18210, de Giuseppe Marcocci e José Pedro Paiva (2013). Sobre a trajetória da historiografia do Santo Ofício português, cf. Souza (2014, p. 25-35).

3 Foram também estabelecidos mais três tribunais, porém todos eles tiveram vida curta: o do Porto, criado em 1536 e extinto em 1545; o de Lamego (1541-1546) e o de Tomar (1541-1544).

4 Em 1539, D. Diogo da Silva renunciou à carga de inquisidor geral e em seu lugar foi nomeado o Cardeal Dom Henrique – irmão do rei D. João II, arcebispo de Braga e eleito cardeal de 1545, que tomou posse em 3 de julho de 1539. D. Henrique sucedeu a D. Sebastião e foi coroado como Rei Henrique I, permanecendo no trono até a sua morte, ocorrida em janeiro de 1580. Esse ano marca o início do período de União das Coroas Ibérica, sob o comando do rei Felipe II da Espanha e I de Portugal.

5 “[Os] conflitos, internos e externos, relacionados ao Tribunal continuam por longo tempo, e somente na segunda metade do século XVIII, no período pombalino, a Inquisição Portuguesa parece ter sido completamente dominada pelo Estado” (SOUZA, 2014, p. 56).

6 Coleccão de Listas impressas e manuscritas dos Autos de Fé públicos e particulares da Inquisição de Lisboa, Évora, Coimbra e Goa. Corrigida e anotada por Joaquim Antonio Moreira, 1863. 4 v. (613 f.; 428 f.; 365 f.; 308 f.). Disponível em: https://purl.pt/15393

7 A história dessa família é conhecida pelos registros da primeira visitação do Santo Ofício em terras brasileiras, ocorrida entre 1591 a 1595, tendo como visitador foi Heitor Furtado de Mendonça. Muitos membros da família foram denunciados e quatro mulheres foram enviadas presas para Lisboa, sendo que a matriarca, já octogenária, não resistiu aos suplicio e morreu nos cárceres dos Estaus, em Lisboa. Além dos filhos, sete netos também foram à mesa inquisitorial para testemunhar: Ana Alcanforada, Valentim de Faria, Felipa de Faria, Custódia de Faria, Isabel Antunes, Lucas de Escobar e Beatriz Teles. O historiador Angelo Adriano de Farias Assis, em seu livro Macabéias da Colônia (2012) apresenta, com riqueza de detalhes, a trajetória dessa família nas malhas da Inquisição.

8 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Tribunal do Santo Ofício (TSO), Inquisição de Lisboa (IL0, Livro 18, fl. 254.

9 Segundo Bethencourt (2000), nesse período 755 indivíduos foram relaxados à justiça secular.

10 Dados fornecidos por Francisco Bethencourt (2000). O autor informa que, no momento da realização da pesquisa, não foi possível computar o número de relaxados da Inquisição de Goa referentes ao período de 1606 a 1684.

11 O regimento anterior esteve em vigência por 134 anos, desde 1640. Foi elaborado no final do período da união das coroas ibéricas. Antes dele, a Inquisição portuguesa teve dois outros: o de 1552 e o de 1603.

12 A referência feita acima pode ser observado no Livro II (Da ordem do judicial do Santo Ofício), e Capítulo XIV, pelo qual ficou determinado de “como há de proceder com os réus, que houveram de ser postos a tormento, e na execução dele. Marcocci e Paiva (2013, p. 255) acrescentam outras mudanças importantes, como a “suspensão da inabilitação dos condenados e dos seus descendentes; condenação da impossibilidade de recursos para o Tribunal Superior da Coroa, agora admitido”.

13 O palácio dos Estaus (ou Estaos) foi a sede do Conselho Geral do Santo Ofício e da Inquisição de Lisboa até a extinção do Santo Ofício. Localizado na praça do Rossio (atual praça Dom Pedro IV), foi construído em meados do século XV para servir como albergue para pessoas da corte portuguesa sem residência e estrangeiros representes de outros reinos.

14 ANTT, TSO, IL, Processo 3432.

15 Sobre o contexto político no qual se insere a publicação do Regimento de 1774, cf. Falcon (1992).

16 REGIMENTO do Santo Ofício da Inquisição do Reino de Portugal, 1774, Livro III, Título XI.

17 REGIMENTO do Santo Ofício da Inquisição do Reino de Portugal, 1774, Livro III, Título XI, Capítulo II.

18 Para mais informações, cf. Siqueira (1996) e Mott (1990).

19 O controle do Conselho Geral em relação ao corpo de funcionários é perceptível quando analisamos a troca de correspondência entre esse órgão e os tribunais de distrito. Essas correspondências fazem parte de dois conjuntos documentais identificados como correspondências expedidas (1575-1819) e correspondências recebidas (1562-1770), além de documentos avulsos que fazem parte dos acervos dos tribunais.

20 Já na primeira década do século XX, Capistrano de Abreu (1922) dedicou-se a organizar uma importante publicação sobre a primeira visitação. Sobre o tema cf, também, Vainfas (1997).

21 Muitos são os estudos sobre as visitações do Santo Ofício em terras brasileiras. Deixamos aqui algumas leituras indispensáveis para um melhor conhecimento do tema: Pereira (2011); França e Siqueira (1963), além de Lapa (1978).

22 Cf. Mott (2010); Wadsworth (2007); Calainho (2006); Feittler (2007); Souza (2014); Vaquinhas (2010); Rodrigues (2011).

23 Sobre a historiografia referente ao Santo Ofício português, cf., também, Souza (2014, p. 25-35) e Assis (2015).

24 ANTT, TSO, IL, Processo 17981.

25 IANTT, IL, Livro 69.

Referências

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WADSWORTH, J. E. Agents of Orthodoxy: Honor, Status, and the Inquisition in Colonial Pernambuco, Brazil. Lanham, MD: Rowman & Littlefield. 2007.


Organizadores

Grayce Mayre Bonfim Souza – Professora de História Moderna da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb) Doutora em História pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pós-doutora pela Universidade de Évora. Coordenadora do Laboratório de Estudos, Documentação Inquisitorial e Sociedade de Antigo Regime (LEDISAR).

Luiz Mott – Professor Titular aposentado da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Doutorado em Antropologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Pós-doutorado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Portugal. E-mail: luizmott@yahoo.com.br


Referências desta apresentação

SOUZA, Grayce Mayre Bonfim; MOTT, Luiz. Apresentação. Notas sobre A Inquisição portuguesa: história e historiografia. Politeia: História e Sociedade. Vitória da Conquista, v. 20, n. 1, p. 8-22, jan.-jun. 2021. Acessar publicação original [DR]

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Red Banners/Books and Beer Mugs: The Mental World of German Social Democrats/ 1863-1914 | Andrew G. Bonnell

Esta colección de ensayos de un historiador marxista que se especializa en la historia del Partido Socialdemócrata de Alemania (SPD) está compuesta por ocho artículos. El primero trata del culto a Lassalle en la Asociación General de Trabajadores Alemanes (ADAV), que se transmitió en parte al SPD. Este ensayo recordará a muchos militantes trotskistas de sus propias experiencias con ciertos “cultos a la personalidad” en sus propias organizaciones; lamentablemente, las organizaciones trotskistas posteriores a Trotsky han tenido una tendencia a heredar todas las malas cualidades de la socialdemocracia y ninguno de sus aspectos positivos, comenzando por su capacidad de convertirse en una organización política de masas de la clase trabajadora. En 1912, el SPD recibía el 34 % de los votos. A pesar del sistema de representación antidemocrático, esto equivalía a 110 escaños del parlamento, de un total de 397, lo que convertía a los socialdemócratas en el grupo más grande en el Reichstag, el parlamento alemán. En 1914, el partido contaba con más de un millón de miembros, de los cuales 175.000 eran mujeres, en un país en el que a las mujeres solo se les había permitido organizarse políticamente en Prusia, entonces la mayor parte de Alemania, desde 1908 (p. 199). También controlaba los movimientos cooperativos y sindicales: la membresía de los sindicatos cristianos católicos llegaba a 350.000 en 1912, en comparación con los 2.500.000 miembros de los sindicatos libres alineados con los socialdemócratas (p. 197). El segundo ensayo proporciona un resumen útil de la actitud de las entonces dos organizaciones socialistas en Alemania hacia las tres guerras de unificación alemana, y particularmente hacia la Guerra Franco-Prusiana de 1870-71, que resultó en sentencias de prisión para August Bebel y Wilhelm Liebknecht por su intransigente postura internacionalista. Es importante resaltar esta ideología militante internacionalista del SPD para evitar interpretaciones anacrónicas basadas en su capitulación al nacionalismo en agosto de 1914, cuando votó por los créditos de guerra en el Reichstag. En un diálogo registrado por la policía en febrero de 1905, en el contexto de la revolución en Rusia, un trabajador polaco aparentemente residente durante mucho tiempo en Hamburgo lamentó que la nobleza polaca mostrara muy poca solidaridad con el pueblo polaco oprimido. Un camarada alemán lo reprendió airadamente por alimentar la ilusión nacionalista de que la nobleza podía ser cualquier cosa menos una explotadora del pueblo, ya fuera en Alemania o Polonia. El socialdemócrata alemán concluyó enfáticamente: “Me cago en todas las nacionalidades y estoy con la socialdemocracia, que es internacional” (p. 52). El tercer ensayo, que trata de las actitudes hacia el trabajo dentro del SPD, ofrece un buen ejemplo de la forma en que el Partido conectaba la teoría marxista con la experiencia cotidiana de sus miembros de clase trabajadora y de los lectores de sus publicaciones periódicas. En El Capital, Marx habló de los resúmenes estadísticos de accidentes laborales, y de las muertes y lesiones resultantes, como “despachos del frente de batalla, que cuentan los heridos y los muertos del ejército industrial”. Los periódicos socialdemócratas publicaban regularmente secciones con títulos como “Del campo de batalla del trabajo”, para enfatizar el desperdicio sin sentido de vidas humanas que resultaba de la regulación inadecuada de la seguridad laboral. Bonnell cita como ejemplo el artículo “Vom Schlachtfelde der Arbeit”, del diario socialdemócrata de Frankfurt Volksstimme del 30 de noviembre de 1906, que ofrecía una descripción de la escena tras una explosión en una fábrica de productos químicos en Dortmund (p. 70). El cuarto ensayo describe cómo el SPD lograba mostrar a los trabajadores en su agitación la conexión entre temas que los afectaban directamente, como el precio del pan y los alimentos, y temas políticos más “abstractos”, como las políticas arancelarias y agrarias del Kaiserreich, donde el estado monárquico tenía una conexión especial con la clase terrateniente Junker de Prusia. El capítulo cinco trata sobre el destino de los socialdemócratas en el ejército imperial, donde abundaba el abuso de los reclutas, así como las precauciones especiales que el SPD tuvo que tomar en su agitación antimilitarista, tanto para evitar la persecución como para evitar el abuso de los jóvenes reclutas. El sexto ensayo, titulado “leyendo a Marx”, muestra cómo las enseñanzas del marxismo se filtraban entre las filas del partido a través de una variedad de conductos, desde órganos teóricos como la revista Die neue Zeit editada por Karl Kautsky hasta grupos de estudio, bibliotecas del partido y de los sindicatos, series de libros como la Internationale Bibliothek, y en particular la edición masiva de folletos que sintetizaban los principales puntos en discusión. A modo de ejemplo, las actas del congreso del SPD celebrado en Erfurt en 1891, en el que el partido adoptó su programa marxista (el año anterior, recién salido de la ilegalidad de las Leyes Antisocialistas, el SPD había adoptado estatutos democráticos en el Congreso de Halle), se distribuyó en 30.000 ejemplares. El programa en sí se imprimió en medio millón de copias y se distribuyeron 120.000 copias del folleto explicativo del programa (p. 132). El libro más vendido de Bebel, La mujer y el socialismo (reeditado por Akal en 2018), que incorporó en sus sucesivas ediciones material de El origen de la familia, la propiedad privada y el Estado de Engels, alcanzó su edición número 50 en 1909, fecha en la que se habían impreso 197.000 ejemplares (p. 130). El capítulo siete, sobre “Trabajadores y actividades culturales”, resume algunas de las principales formas en que el partido combinaba actividades culturales, políticas y sociales en posadas, conferencias, festivales y por otros medios, bajo la atenta mirada del censor y de la policía. El ensayo final sobre “Socialismo y republicanismo en la Alemania imperial” explica por qué el SPD tuvo que bajar el tono de la agitación en torno a la república, debido a la censura y la persecución política, aunque se sabía ampliamente que los socialdemócratas eran republicanos y que la república se escondía tras consignas confusas como el “estado del pueblo libre” (freier Volksataat), una formulación comprensiblemente condenada por Marx como vacía en su Crítica del Programa de Gotha. A pesar de que los marxistas no atribuían mayor importancia a la diferencia entre la república y una monarquía constitucional, Rosa Luxemburg consideró oportuno, después de 1910, realizar una agitación sobre la huelga de masas en torno a la consigna de la república, no como un fin en sí mismo, sino como un medio para la movilización de las masas, convirtiendo así una demanda puramente democrática en una demanda de transición, al igual que la organización de mujeres del SPD centró su agitación en torno a la cuestión del sufragio universal femenino como medio para la movilización y organización de un movimiento de mujeres proletarias dirigido por un partido socialista. Dado que la calidad de los ensayos es uniformemente buena, en vez de analizar uno en particular señalaremos algunos de los hechos que menciona el autor, para enfatizar por qué es importante para los marxistas de hoy estudiar de cerca la experiencia del SPD. Por ejemplo, Bonnell señala que, a pesar de la famosa crítica de Robert Michels a las tendencias supuestamente oligárquicas del SPD, la estructura democrática del partido se revelaba en el hecho de que las organizaciones partidarias locales celebraban asambleas para enviar delegados a los congresos anuales del partido y debatían las resoluciones que serían discutidas en esos congresos, y que la prensa partidaria informaba sobre estas asambleas y sobre los debates que en ellas se desarrollaran. Es difícil imaginar hoy, dado el estado miserable de la izquierda marxista en todo el mundo, el alcance de la prensa obrera en Alemania antes de la Primera Guerra Mundial. En 1914, había más de 90 diarios socialdemócratas en Alemania, con una circulación total cercana al medio millón, incluyendo periódicos de ciudad importantes como el Hamburger Echo (con una circulación de 76.000 en 1913) y el Leipziger Volkszeitung (53.000 en 1913). Desde 1911, el órgano central del partido, Vorwärts, que también funcionaba como el periódico del partido en Berlín, fluctuó entre 150 y 160.000 suscriptores. No muy lejos del Vorwärts estaba el periódico de las mujeres socialistas, Die Gleichheit, que tenía 125.000 suscriptores en 1914. Vorwärts fue superado por el semanario ilustrado humorístico-satírico Der Wahre Jakob, que disfrutaba de una circulación masiva de unos 371.000 ejemplares (p. 140-141, 152). Ser editor de un periódico socialdemócrata era un trabajo peligroso. Bonnell señala que, a lo largo de la década de 1890, Vorwärts llevó un registro mensual de las condenas, sentencias de prisión y multas que sufrían los miembros del partido, el cual mostraba que los editores de periódicos socialdemócratas estaban en una situación de riesgo especial, y que en la década de 1890 apenas había un editor de los periódicos de los sindicatos o del partido que no hubiera pasado varios meses en la cárcel por difamación y calumnia (Beleidigung) contra el Kaiser, el soberano de algún estado alemán en particular, funcionarios estatales o empleadores. Teniendo en cuenta estos hechos, no es de extrañar que en la década de 1890 se sugiriera a veces que el puesto de editor legalmente responsable de un periódico socialdemócrata se rotara entre camaradas más jóvenes, solteros, sin familias que mantener, que pudieran permitirse pasar unos meses en la cárcel (p. 179-180). Leia Mais

La tortura en la España contemporânea | Pedro Oliver Olmo

¿Tortura el gobierno español en nuestros días? Es la pregunta que podría asaltar al lector desprevenido al toparse con La tortura en la España contemporánea en el estante de una librería. Para quienes crean que la tortura gubernamental era algo “del pasado”, este libro demuestra su inquietante presente en estados democráticos de derecho y garantistas, su arraigo histórico y sus diferentes modalidades a través del tiempo. Ejercicio político, ético e intelectual, a la vez que investigación documentada, esta obra coordinada por Pedro Oliver Olmo, se pregunta por quiénes, cómo y a quiénes se ha torturado –y se tortura– en la España contemporánea (siglos XIX a XXI). La apuesta es analizar la producción social de la tortura en la transición de la tortura judicial de Antiguo Régimen –partiendo del título de la obra de Tomás y Valiente censurada por el franquismo– a la tortura gubernativa del estado liberal, particularmente la ejercida en ámbitos policial-carcelarios. El libro se divide en cinco partes: un capítulo introductorio, a cargo de Oliver Olmo, en el que reflexiona acerca de la historicidad de la tortura y presenta el libro, y cuatro capítulos que recorren la historia de la tortura a través de más de doscientos años, escritos por Oliver Olmo, Luis Gargallo Vaamonde, Daniel Oviedo Silva, César Lorenzo Rubio y Eduardo Parra Iñesta. Leia Mais

Sobre o autoritarismo brasileiro | Lilia Moritz Schwarcz (R)

É preciso coragem de verdade para enfrentar as histórias associadas às construções mitológicas, sobretudo aquelas calcadas no senso comum. A importância de uma resenha do livro de Lilia Schwarcz, “Sobre o autoritarismo brasileiro”, não reside exclusivamente na qualidade de seu conteúdo, mas sobretudo na atualidade de seu tema. A vontade da autora em dar uma rápida resposta à crise política da qual atravessamos, reveste o livro de importância, independentemente da relativa superficialidade com que aborda o tema. Tal superficialidade, no entanto, não deve ser encarada apenas como uma fragilidade argumentativa. Se boa parte da sociedade brasileira está estupefata com a escalada do autoritarismo bolsonarista, era urgente que algum historiador propusesse algumas respostas que dessem conta de explicar o recrudescimento do autoritarismo e a violência institucional que ele implica. Temos sempre de ter em vista que a história não deve ser direcionada para usufruto exclusivo de seu público especializado, mas que momentos políticos conturbados exigem que reflexões deste tipo se tornem públicas, sem, é claro, perder as especificidades da disciplina.

Uma importante reflexão do livro, quase chave explicativa para entendermos o principal público a que se destina a obra, trata-se de uma reflexão onde a autora encaminha uma diferenciação entre história e memória. Neste caso, a história seria um procedimento inconcluso, plural, composto em diversos debates, “incompreensões e lacunas”. Já a memória, um procedimento individual de atualização do passado no presente, uma produção. Se recupera “o presente do passado”, fazendo com que o passado também vire presente. Nesse sentido, o que pretende a autora é lembrar, ou seja, repensar o presente sob os auspícios do passado, ou seja, sem esquecê-lo, projetando ao mesmo tempo o futuro. Dessa maneira ela entende que não há como dominar totalmente o passado e que sua contribuição jamais se propõe a fazê-lo, se distanciando, agora, da história pois essa seria composta de uma diversidade de debates sem os quais ela pretende realizar. Com isso, podemos entrever que a obra busca uma maior amplitude de público que não somente o especializado, pois não se dedica a fazer história, mas, como bem quer a autora, a produzir memória, sendo esta produção, por fim, uma atitude individual, capaz de ser realizada por todos

Segundo nos conta sua introdução, um dos objetivos da obra é justamente tentar acalmar os ânimos daqueles que não encontram respostas para o crescimento acelerado da violência e da intolerância, questões que acompanham o Brasil da atualidade. Para tanto, a autora convida esse leitor a uma viagem pela História do Brasil, entendendo as bases de nossa desigualdade e conflito, o terreno fértil aos arranjos autoritários que acompanham a nossa política. Por completude, entende-se que esses regimes forjam sua legitimidade na construção narrativa da harmonia e paz social, mas funcionam de maneira a conservar suas práticas centralizadoras e segregacionistas.

É consenso que a ascensão de Jair Bolsonaro à presidência é um momento inaugural na terceira república, rompendo o quadro democrático proposto na constituição de 1988. Para tanto, diz Schwarcz que essa ruptura foi orientada através de batalhas retóricas em torno de novas narrativas históricas, construindo uma verdadeira batalha entre modelos autênticos e falsos, causa e consequência da divisão política do Brasil atual.

Nessa batalha retórica, um dos argumentos encontrados na tradição autoritária brasileira é a constante reafirmação de um mito nacional, no qual lê-se o Brasil como um território onde os problemas nacionais são encarados de maneira harmoniosa e positiva. Esse argumento se estabelece numa leitura continuada da história do Brasil. Segundo a autora, o ponto original dessa elaboração é o naturalista Von Martius, um dos fundadores do IHGB, segundo ela o primeiro responsável por estabelecer a “metáfora das três raças”.

Na concepção da autora, a batalha retórica se materializa na prática governamental da seguinte maneira. O Estado, grande articulador da convivência social, busca sua própria versão da História, promovendo determinados acontecimentos político-militares e “suavizando” problemas que tem raízes históricas e que estão fincados no presente. Essa “história única” postulada pela retórica governamental de caráter autoritário, busca sobretudo naturalizar “estruturas de mando e obediência”, sem poupar esforços para exercer seu controle e violência institucional, abandonando, na prática e de certo modo, a leitura harmoniosa que embala a sua construção mítica.

Em sua viagem pela história do Brasil, na tentativa de estabelecer as bases onde se assentam a tradição autoritária brasileira, a autora começa pelo tópico “Escravidão e Racismo”. O argumento histórico é que a escravidão é uma instituição colonial aprofundada no Império e persistente na República, sendo “o racismo filho da liberdade”, pois perdura na organização social da contemporaneidade brasileira, uma vez que a população negra é a mais vitimizada do país. Outro ponto importante no trato do capítulo é a discussão que aponta para o vínculo dos projetos autoritários com a prática que remete ao legado colonial, onde tenta-se sistematicamente “recriar e obscurecer” o papel e a história das populações não europeias.

Dando sequência às temáticas, a autora propõe a investigação do “Mandonismo”, uma estrutura herdada da tradição colonial “assenhoriada” e aprofundada na sua forma coronelista. Para mim, esse é o principal ponto no qual gravita a tradição autoritária brasileira. Primeiro para entendermosas bases do mandonismo, é importante percebermos que segundo a autora, nossa aristocracia colonial foi meritória e não hereditária, onde o reconhecimento do privilégio era individual e tido como um favor do Estado. Nesse sentido, recorre a um importante argumento de Sérgio Buarque em Raízes do Brasil, qual seja, o uso de diminutivos e apelidos utilizadospelos subordinados para se direcionar a seu senhor, sendo uma maneira de confundir o público e o privado, ou melhor, uma prática que, ao aproximar as hierarquias distintas, confunde a dominação.

O terceiro tópico é o “Patrimonialismo” e este é mais uma vez apresentado segundo sua base colonialista. Desde o início da ocupação, os colonos centralizavam uma série de funções administrativas e de autoridade pública – marca administrativa da colônia brasileira. Nesse meio, cabe uma crítica na maneira com que a autora discute o conceito de patrimonialismo. Ela afirma que a prática atravessa diversos grupos ou estratos sociais e que está ligada ao sentido geral da propriedade. Porém, cabe discutir se no uso do conceito não seria melhor trabalha-lo a partir da perspectiva que entende o Estado como instrumento de uma classe, sendo mais eficiente para entendermos a tradição autoritária do Estado brasileiro.

Ao desembocar no tópico da Corrupção, me permitam uma pergunta com a qual indaguei a autora durante a leitura de seu livro. A corrupção é cultural ou estrutural? Nas suas análises Lilia Schwarcz aposta na tese da continuidade histórica e afirma ser a corrupção uma herança dos tempos coloniais, ao meu ver, portanto, estrutural. Num esforço de origem, ela retoma um relato fundante de nossa história, a carta de Pero Vaz de Caminha, onde o escrivão chega a apelar ao então rei português que facilite a vida de seu genro. Contudo, ao final, é apresentada a ideia, como encerramento da reflexão, de que a corrupção, nas palavras da autora, constitui um problema endêmico do Brasil, parte do caráter brasileiro e, portanto, fincada na cultura nacional. Ao menos assume não ser impossível de ser erradicada, sendo o grande desafio da atual República.

Ao se referir às práticas de corrupção no Império, é citado um dito popular utilizado para exemplifica-la naquele regime político: “Quem furta pouco é ladrão, quem furta muito é Barão, quem mais furta e esconde, passa de Barão a Visconde”. Tal abordagem não sinaliza apenas uma “questão de preço”, como indicado no livro, mas uma questão de classe, argumento que ela evita enfrentar diretamente ao longo da publicação aqui resenhada.

A Desigualdade – novo tópico – por sua vezé conclamada a partir da escravidão. Na sequência de sua argumentação, o passado colonial é sempre posto como ponto originário do desequilíbrio social, através justamente da concentração de terras e renda e suas respectivas práticas culturais patrimonialistas. No entanto, entre continuidades e rupturas, a autora infere que aquele tempo não deu conta de esclarecer porque o processo de industrialização do século XX não foi capaz de romper esse ciclo vicioso do passado, dando uma certa independência histórica ao fenômeno de nossa modernidade e contradizendo a perspectiva de que ela é na verdade carente, fruto de nossa dependência colonial.

Já encaminhando o desfecho do livro, Lilia Schwarcz propõe a discussão da violência, onde aqui destaco os argumentos que pretendem circunscrever sua forma autoritária e institucional. Parte fundamental é a discussão de que, no momento presente, sendo a violência uma marca estrutural de nossa história, estaríamos diante de um perigo eminente, tendo em vista os incentivos governamentais à brutalidade, à redução da maioridade penal e ao armamento. Contudo, o recrudescimento autoritário entendido nessas medidas não é capaz de entender e enfrentar a violência como um grande problema nacional.

A violência no campo é pouco ou quase nada trabalhada pela autora, tratando exclusivamente da questão indígena. Um ponto importante da argumentação sobre o tema é o fato de que a partir do Império se criou a imagem de que os indígenas a serem valorizados seriam aqueles capturados pela cultura nacional única e indivisível, os que tendiam a valorizar e defender sua existência sem passarem pelo processo de aculturação, seriam, enfim, tidos como bárbaros. Nesse sentido, argumenta a autora que essa visão romântica se transforma num processo violento que se eterniza na história nacional.

Em Raça e Gênero, sem muito me alongar no debate, apesar de considerar uma discussão importante para o equilíbrio social na contemporaneidade, apresento o apelo da autora para a criação de política públicas afirmativas, uma constante do livro. Mais caro ao esforço intelectual para o entendimento do autoritarismo, é a constatação de que o país se constitui na base de desigualdades socioeconômicas atreladas a questão de raça e gênero, mas também de geração e região.

Um ponto ao mesmo tempo já desgastado, mas importante de ser apresentado é quando a autora comenta que existe um racismo dissimulado no país, reservando à polícia a principal performer da discriminação. A partir desse ponto ela começa a citar casos de corpos negros vulneráveis como exemplos da violência policial, dentre os quais se destaca o recente assassinato de Marielle Franco.

Outro ponto que remete a questão de raça e gênero é a cultura do estupro. Ela é, ou ao menos deveria ser, um dos grandes problemas a serem enfrentados pelos governos em suas diversas esferas. Para exemplificar a construção patriarcal que ao longo do tempo tem autorizado, naturalizado e legitimado o estupro, a autora recorre às imagens da colonização, empresa de caráter masculino, onde o território colonial americano foi insistentemente representado como um corpo feminino a ser dominado e explorado. Ao final, em Intolerância, parte fundamental da imposição em torno das políticas afirmativas das minorias reside no argumento de que o Brasil é “uma nação de passado violento, cujo lema nunca foi a inclusão de diferentes povos, mas sobretudo a sua submissão, mesmo que ao preço do apagamento de várias culturas”.

Em dado momento em que discute a intolerância, a autora propõe que a crise política que engendrou o recente autoritarismo deu-se por um desgaste democrático ao longo dos últimos trinta anos, o que dá brecha para uma interpretação naturalizada da emergência conservadora. É uma interpretação confusa, pois em certo nível justifica a escalada autoritária, seus discursos e suas práticas, estas incompatíveis com uma organização política democrática, como bem defende a autora.

É evidente que a história do país e todos os argumentos dela derivados para definir as raízes de nosso recente autoritarismo, ilumina a cena atual. Contudo, a particularidade da política dos últimos anos, ou seja, o acirramento pós manifestações de 2013, escanteou os mitos fundantes da nacionalidade, e a proposta de sociedade harmônica do novo discurso autoritário nasceu envolta em meio daqueles que a buscam negar.

Filipe Menezes Soares – Doutor em História pela Universidade Federal do Pará. Atualmente pesquisa sobre os seguintes temas: teoria e metodologia da história, ditadura militar no Brasil, conflitos agrários, Nordeste e Amazônia. E-mail: menezes.fs@gmail.com  ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2535-8538


SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. Resenha de: SOARES, Filipe Menezes. Muitas vezes é mais cômodo conviver com uma falsa verdade do que modificar a realidade. CLIO – Revista de pesquisa histórica. Recife, v.39, n.1, p.519-524, jan./jun. 2021. Acessar publicação original [DR]

Historia económica, política y social de la Argentina (1880-2003) | Mario Raport

La edición aumentada y corregida de este libro que apareció por primera vez en 2005, encuentra en la actualidad un momento más que oportuno para volver sobre su amplio análisis de la realidad argentina. Desde el apogeo del modelo agroexportador (1880- 1914) hasta los avatares que en el siglo XX sacudieron la economía argentina, constituyen procesos ineludibles para pensar el futuro inmediato que nos depara ante los severos problemas socioeconómicos que está dejando la pandemia por COVID19. En este sentido, la historia, especialmente económica, tiene mucho que aportar al debate. Si bien el libro abarca un amplio conjunto de variables que involucran la coyuntura política y social en todos sus capítulos – las relaciones internacionales, el Estado, la población y las migraciones y el movimiento obrero –, en esta reseña nos centramos en comentar diferentes ejes que involucraron a la política económica argentina que, en definitiva, es el espíritu del libro y de la trayectoria del autor.

El primer capítulo se encuentra dedicado a analizar la etapa del modelo agroexportador argentino. En el presente, el apartado referido a la economía mundial se torna imprescindible para entender cómo y bajo qué condiciones la economía argentina se incorporaba a él. En aquellos años – bajo los difundidos principios del librecambio, en verdad algo agotados – la Segunda Revolución Industrial inglesa dio una respuesta a la primera crisis del capitalismo (1873) acelerando la incorporación al mercado mundial de nuevos proveedores de materias primas como la Argentina, que incorporaba los beneficios de la inversión directa británica. Como dice Rapoport: aunque el Reino Unido en estos años veía declinar su productividad ante la competencia de Alemania y Francia, aquel seguía siendo tanto un gran exportador de capitales a través de empresas ferroviarias y préstamos gubernamentales como un actor político de relevancia dada la hegemonía del patrón oro, que le permitió a la Argentina – una vez lograda la paz social – integrarse al mercado mundial con intensas políticas de inmigración. Leia Mais

A elite do atraso | Jessé Souza

Como tem sido escrita a História brasileira? Qual é o paradigma hegemônico que preside os nossos intelectuais na construção de nosso passado? Quais são as raízes do nosso atraso social? Quais seriam as interações entre os intelectuais e os membros da elite política e econômica? São em torno destes questionamentos que se debruça Jessé Souza em seu livro A elite do atraso: Da escravidão a Bolsonaro.

Jessé José Freire de Souza é um jurista, sociólogo, escritor, professor universitário e pesquisador brasileiro da área de Teoria Social. Nascido em Natal, em 1960, desde a década de 1980, quando concluiu sua formação em Direito pela Universidade de Brasília, tem se dedicado a estudar a construção do pensamento intelectual brasileiro. Possui Mestrado em Sociologia pela UnB (1986), Doutorado na mesma área pela Universidade de Heidelberg (1991), Pós-Doutorado em Filosofia e Psicanálise pela New School for Social Research (1994/95) e Livre Docência pela Universidade de Flensburg (2006). Assumiu em 2015 a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) tendo sido exonerado no ano seguinte após o golpe de Estado. Leia Mais

¿Cómo pensaron el campo los argentinos? Y cómo pensarlo hoy, cuando ese campo ya no existe | Roy Hora

Este último libro de Roy Hora analiza la percepción del latifundio como problema social o económico a lo largo de casi dos siglos de reflexión intelectual y los efectos de esa persistente prédica, largamente compartida por las élites letradas urbanas argentinas de todos los signos ideológicos. La importancia y actividad de las mismas es también una marca distintiva del país: sólo para mencionar algunos de sus miembros: Pedro Andrés García, Domingo F. Sarmiento, Nicolás Avellaneda, Miguel A. Cárcano, Juan B. Justo, Emilio Coni, Eduardo Laurencena, Horacio Giberti. Aun a fines del siglo XX, esa tradición era sorprendentemente vital, en un énfasis de inspiración romántica. Es de destacar que ese diagnóstico fue durante mucho tiempo hegemónico, al punto que las tímidas voces disidentes nunca lograron hacerse oír. Un ejemplo es Saturnino Zemborain, cuyo La verdad sobre la propiedad de la tierra en la Argentina (Buenos Aires: Sociedad Rural, 1973), apenas trascendió. Con la ayuda de hemerografía relevante y fuentes gubernamentales y privadas, el libro de Roy Hora sitúa esas visiones en línea con la evolución de la estructura agraria y del mundo social y económico rural, así como con la política nacional. Es, por tanto, muy bienvenido, no sólo por la maestría con que trata una temática compleja, sino por la falta de suficientes análisis informados y las muchas ignorancias y estereotipos que persisten al respecto. Así, debe notarse que la anterior iniciativa comparable data de hace casi treinta años: el libro de Osvaldo Barsky, Marcelo Posada y Andrés Barsky, El pensamiento agrario argentino (Buenos Aires, Centro Editor de América Latina, 1992). Leia Mais

Forças Armadas e Política no Brasil | José Murilo de Carvalho

Em 2015, o historiador José Murilo de Carvalho chamou a atenção para um episódio cuja gravidade havia passado despercebida no âmbito da opinião pública. O General Hamilton Mourão celebrou o golpe de 1964 sem despertar reação dos seus superiores ou da presidência da República. Uma luz amarela acendeu-se. Um sinal de alerta a desfazer a crença na reclusão dos militares às suas atividades profissionais. Significava a retomada do envolvimento das Forças Armadas na política brasileira?

Com a redemocratização do Brasil e a aprovação da Constituição de 1988, a agenda política foi tomada por outros assuntos mais urgentes, passando os militares a um papel secundário no quadro das preocupações dos analistas, da imprensa e das forças partidárias. Entretanto, a atuação dos militares nos recentes acontecimentos do País modificou tal percepção, restaurando a questão do protagonismo político dos militares. O livro de José Murilo é mais do que oportuno. Recoloca uma vez mais não só a necessidade, mas a urgência do estudo dos militares no passado e no presente da vida nacional. Trata-se de uma reedição ampliada, disponível em versão impressa e em formato digital, que oferece aos leitores, novos capítulos tanto sobre a história dos militares quanto da sua atuação recente. Leia Mais

La Historia Indígena y sus abordajes contemporáneos a los procesosindígenas de la Patagonia (siglos XIX a XXI)/Revista de Historia/2020

En los ámbitos universitarios argentinos, durante la última década del siglo XX, quienes decidían como profesores/as de historia o historiadores/as estudiar a las poblaciones indígenas de Latinoamérica y, en particular, de la región patagónica, debían abocarse al estudio  del  período colonial. Esto,bajo  el  supuesto de que las sociedades  indígenas habitaban previamente los territorios luego definidos como nacionales, fueron constituidos como el “pasado” del estado argentino, no sólo temporal sino en términos de un efectivo discurso de civilización y barbarie. Leia Mais

Leer El Capital/teorizar la política: contrapunteo de la obra de Enrique Dussel y Bolívar Echeverría en tres momentos | Jaime Ortega Reyna

La publicación de Leer El Capital, teorizar la política constituye un acontecimiento significativo en el campo de la historia del marxismo y de las izquierdas en América Latina. Se trata de una investigación acerca de los problemas fundamentales del marxismo latinoamericano a partir de un análisis de las obras de Enrique Dussel y Bolívar Echeverría. Su autor, Jaime Ortega Reyna, forma parte de un grupo de jóvenes intelectuales mexicanos interesados en la historia del pensamiento crítico latinoamericano y en la necesidad de un despliegue de una política de izquierdas en México y el resto de los países de la región. El presente libro permite aproximarnos al trabajo de esta nueva camada de intelectuales de izquierda mexicanos e interiorizarnos en la singularidad de la obra de uno de sus miembros más destacados. El volumen, una versión de una tesis doctoral defendida en el Programa de Posgrado en Estudios Latinoamericanos de la Universidad Nacional Autónoma de México, constituye un insumo privilegiado a los fines de acrecentar nuestro conocimiento de la historia del marxismo latinoamericano y seguir enfrentando los problemas nodales que atraviesan desde hace décadas a los países de la región. La investigación articula de manera productiva las dos variables necesarias en cualquier estudio de historia del marxismo en América Latina. Por un lado, el autor inscribe las obras de los autores estudiados en la historia global del marxismo del siglo XX. De este modo, tanto la reactivación de la lectura de El Capital en la década de 1960 como la llamada “crisis del marxismo” en las de 1970 y 1980 se presentan como elementos condicionantes del desarrollo de las obras de dos marxistas latinoamericanos. Por el otro, el libro sitúa dichas producciones en el marco de la historia política e intelectual del subcontinente. Así, se evidencia que la particularidad latinoamericana actúa como mediadora de los problemas contemporáneos del marxismo y propiciadora de aproximaciones singulares a los debates teóricos y políticos del siglo XX. Cabe destacar, finalmente, que las figuras seleccionadas permiten a su vez analizar las producciones significativas del marxismo latinoamericano a partir de la circulación internacional de las ideas y los intelectuales. Así es comprendido Dussel, un argentino que desarrolla su obra teórica en México, y Echeverría, un ecuatoriano formado en Alemania que termina igualmente recalando en la academia mexicana. Es en el cruce de ambas variables donde se vuelven inteligibles las hipótesis que guían la investigación. Según Ortega Reyna, en los trabajos de Echeverría y Dussel se cifra tanto una respuesta a la coyuntura crítica atravesada por el marxismo a partir de sus déficits teóricos y sus naufragios políticos como una formulación discursiva original que pretendía encontrar respuesta a los elementos que habían conducido a dicha crisis. Estas características permiten hablar de las obras de ambos intelectuales como producciones inscriptas en un espacio teórico configurado por la lectura pormenorizada de El Capital y por la problematización de la experiencia de la modernidad. Volviendo a las variables analíticas anteriormente mencionadas, hay una dimensión de la particularidad de las obras de Dussel y Echeverría que se encuentra en cierta medida naturalizada en el libro y que por ello sólo puede ser advertida a partir de una mirada extranjera. Se trata de la importancia de México como espacio de formulación y enunciación de los problemas fundamentales que subyacen a la obra de ambos pensadores. Cabe preguntarse, en este sentido, si no es la particularidad mexicana la que habilita ese cruce tan productivo como potente entre la lectura teórica del marxismo, la pregunta por el carácter de la modernidad y el planteo acerca de los requerimientos de una práctica política transformadora. El seguimiento de las obras de Dussel y Echeverría orbita alrededor de tres grandes problemas. Según Ortega Reyna, el trabajo de ambos autores puede ser pensado en conjunto en tanto persiguen el objetivo de 1) leer El Capital; 2) en la modernidad; 3) para teorizar la política. A partir de dicho supuesto, el estudio consiste en el establecimiento de un contrapunto entre los modos en los cuales cada uno de los autores se vincula con cada uno de estos grandes problemas. Lejos de una lectura meramente exegética, la investigación aborda la producción de Dussel y Echeverría a partir de preguntas que se derivan de los textos analizados y de problemas teóricos y políticos contemporáneos que se encuentran fuera de ellos pero que resultan insoslayables a los fines de lograr una aproximación integral al objeto. Mencionemos algunos de estos ejercicios que contribuyen a entregarnos una imagen compleja del marxismo de Dussel y Echeverría. En relación al primero de los problemas, Ortega Reyna lleva a cabo un completo repaso de las tradiciones de lectura de El Capital existentes tanto en el marxismo europeo como en el latinoamericano. Este movimiento permite comprender el modo en el que las obras de ambos se inscriben en tradiciones de lectura más amplias, pero también advertir su carácter original. Sobre el segundo de los tópicos, Ortega Reyna se esfuerza por constatar la diferencia entre los abordajes de Dussel y Echeverría del problema de la modernidad con otros que han marcado el pulso del debate mundial en las últimas décadas, por ejemplo, el de modernidad/posmodernidad de las décadas de 1980 y 1990. Finalmente, los debates políticos en los cuales se involucraron ambos autores son considerados a la luz de un conjunto de autores y tradiciones del marxismo contemporáneo que abordaron problemas similares, fundamentalmente el del Estado. El libro tiene una estructura que se corresponde con los tres problemas señalados. En este sentido, la primera sección está dedicada a las lecturas de El Capital desarrolladas por Dussel y Echeverría. El tratamiento específico de sus lecturas está precedido de una sugerente hipótesis acerca de las recepciones de la obra marxiana. Según Ortega Reyna, las de Dussel y Echeverría forman parte, junto a otras aproximaciones contemporáneas, de un conjunto de lecturas que pudieron desmarcarse de las operaciones de clausura sufridas por El Capital durante el siglo XX. En el caso de Dussel, este tipo de vínculo con la obra de Marx se evidencia en el tratamiento de la categoría de trabajo vivo, la cual refiere al momento primordial de existencia humana con respecto al capital. Cabe señalar, al respecto, el denso trabajo de reposición de los debates acerca de dicha categoría y otras (fuerza de trabajo, trabajo vivo, trabajo muerto) que contribuye a comprender el tipo de lectura la que Dussel somete a la obra de Marx. En el caso de Echeverría, su lectura es recortada principalmente al problema del valor de uso, el cual remite a la reproducción social-natural del conjunto de la vida humana frente a la reproducción del valor. El recorrido por la obra de ambos autores se corona con una lectura de la obra Franz Hinkelammert. La obra del pensador alemán permite establecer un diálogo con Dussel y Echeverría a partir del complemento que ofrecen las categorías por él formuladas de valor de uso social y coordinación del trabajo social. En términos de Ortega Reyna, las lecturas desarrolladas por Dussel, Echeverría y Hinkelammert pueden ser entendidas como diferenciadas de cierto “marxismo fordista” concentrado exclusivamente en las relaciones de producción y la propiedad de los medios de producción. La segunda sección del libro está dedicada al problema de la modernidad. Siguiendo la secuencia que organiza toda la investigación, Ortega Reyna ubica el tratamiento de la modernidad en Dussel y Echeverría luego del análisis de las lecturas por ellos realizadas de El Capital. Con esta concatenación, el trabajo busca demostrar que para estos autores los problemas de la forma de lo social se ubican en un horizonte más amplio de organización social y cultural. Es decir, que los desarrollos acerca del trabajo vivo o el valor de uso forman parte de una lectura crítica de la experiencia del mundo en su conjunto. Al igual que ocurre con las lecturas de la obra de Marx, en este caso las aproximaciones de Dussel y Echeverría son abordadas en conjunto, pero también a partir de sus particularidades. En el caso del argentino, se trata de una crítica de tipo histórica, en la cual se intenta demostrar el carácter eurocéntrico de la modernidad. En el caso del ecuatoriano, se trata de una crítica histórico-genética, la cual está articulada alrededor del problema de la determinación de la técnica en la época moderna. Concebidas en bloque, más allá de sus especificidades, estas aproximaciones se presentan como una crítica a la narrativa ilustrada de la modernidad y como un ejercicio de ampliación del campo de operación del concepto con respecto a la forma capitalista de producción. Debe mencionarse que luego del análisis pormenorizado de la lectura del problema de la modernidad en ambos autores, la investigación da cuenta de otras formas de abordar la cuestión en el marco del pensamiento crítico latinoamericano, especialmente en vertiente descolonial, así como de los modos en los cuales podría pensarse algún tipo de articulación entre todas estas aproximaciones. El libro concluye con la sección dedicada al problema político. Con ella se cierra el plan diagramado al comienzo del libro. Dussel y Echeverría llevan a cabo una lectura de El Capital, la cual está enmarcada en una crítica amplia al mundo moderno y que a su vez entraña un conjunto de cuestiones relativas a la política. En relación a este tópico, vuelve a cobrar sentido la idea del contrapunto. Mientras que, en la obra de Echeverría, la politicidad puede derivarse de su énfasis en el problema de la cultura, en la de Dussel se desprende de las bases de su programa liberacionista. La atención diferenciada a ambos autores lleva a Ortega Reyna a analizar el lugar de la cultura política en la obra del ecuatoriano y lo que ello implica para una lectura de los problemas de la revolución, la nación y la democracia. En este sentido resulta de interés el señalamiento de que en su trabajo se propone una forma distinta de encarar la modernidad capitalista sin que aparezca un sujeto o fuerza política que pueda asumir plenamente el impulso transformador. La dificultad de pensar la práctica política a partir de la obra de Echeverría se derivaría del peso que tiene en su obra la pérdida completa por parte del sujeto de la capacidad de darle forma a la socialidad. De allí que Ortega Reyna proponga situar las implicaciones políticas de su obra en el marco del autonomismo y de la política anti-estatal en general. Posicionamiento que difiere de la obra de Dussel, cuya propuesta liberacionista incluye una atención privilegiada al problema del Estado. De este modo, el recorrido por el trabajo del argentino propuesto por el autor del libro da cuenta de la idea de “volver útil” al Estado, la cual habilita tanto un distanciamiento de la obra de Echeverría como un acercamiento con otros marxistas latinoamericanos interesados en la cuestión estatal, tales como Álvaro García Linera y el ya mencionado Hinkelammert. Para finalizar, puede afirmarse que Leer El Capital, teorizar la política constituye un aporte relevante a los estudios sobre marxismo e izquierdas en la historia latinoamericana reciente. Centrado en la producción intelectual de Dussel y Echeverría, el libro de Ortega se detiene en un conjunto de cuestiones que resultan centrales en el pensamiento crítico latinoamericano y que hoy son los principales objetos de desafío político para las izquierdas del subcontinente. ¿Cómo fue comprendido el problema de la acumulación en las sociedades latinoamericanas? ¿Cuál es el vínculo entre la acumulación y la constitución del orden político y cultural de nuestra región? ¿Cuáles son las estrategias políticas más adecuadas para la transformación del orden social? Se trata de un conjunto de preguntas que el libro analiza a partir de una serie de perspectivas analíticas. A modo de círculos concéntricos, Ortega Reyna parte del despliegue global del discurso marxista en el siglo XX, luego constata las formas en las cuales dicho discurso es mediado por la realidad latinoamericana y finalmente analiza estos problemas en toda su complejidad en la obra de dos marxistas asentados en México. En suma, puede encontrarse en el libro tanto una contribución relevante a la historia del marxismo latinoamericano como un insumo para repensar la práctica de las izquierdas del subcontinente en este mundo tan cambiante y convulsionado. Leia Mais

Desarrollo y Desigualdad en Chile (1850-2009). Historia de su economía política | Javier Rodríguez

El libro Desarrollo y Desigualdad en Chile (1850-2009). Historia de su economía política, de Javier Rodríguez, podría considerarse uno de los mayores aportes que se han hecho en el marco de la historia económica chilena en general, y sobre la desigualdad en particular. En realidad, lo es desde su título, pues su análisis versa sobre economía política, disciplina que no cuenta con muchos seguidores a nivel mundial, y mucho menos en Chile, donde predominan los estudios monetaristas que tienden a presentar los problemas económicos simplemente como ajustes o desajustes de mercado. El libro se divide en siete capítulos, más una introducción, conclusión y un apéndice metodológico. Los dos primeros capítulos son de tipo explicativos, en el sentido que otorgan un marco conceptual y contextual sobre qué debemos entender por desigualdad, su relación con el desarrollo y por qué Chile se constituye en el caso de estudio. En los siguientes, que el autor enmarca según cinco ciclos económicos (1850-1873; 1873-1903; 1903-1938; 1938-1970; 1973-2009), se entregan las claves de mercado e institucionales que incidieron en la desigualdad distributiva que alcanzaron los distintos agentes participantes en el mercado, pero también cómo éstos ejercieron y consolidaron su poder. Dos períodos son de particular importancia para la obra: los períodos que transcurren entre los años 1903-1938 y 1973- 2009. Ahora bien, el estudio plantea la revalorización de análisis que no solo tengan en cuenta el análisis neoclásico de los problemas económicos, sino que también consideren una causalidad institucional, con el objeto de estudiar los altos niveles de desigualdad presentes y cómo éstos afectarían directamente a la democracia, precisamente, en tiempos en que las demandas ciudadanas se dirigirían a que el Estado satisfaga educación, salud y seguridad. Pero no solo eso, porque el caso de Chile permitiría explicar que el desarrollo no va ligado exclusivamente al crecimiento económico y que la desigualdad no solo obedece a condicionantes objetivos del mercado. Apunta el autor es que la desigualdad en Chile sería un problema estructural, de largo aliento. Dicho lo anterior, ello no habría significado que ésta se presentara de la misma forma o con idéntica profundidad durante los casi 160 años de estudio. También se puede destacar en la obra de Rodríguez, que no sería suficiente una explicación, si se quiere neoclásica, para entender la desigualdad, sino que habría que combinar en el análisis la teoría económica y social, con el conocimiento de las circunstancias históricas. Como bien lo resume el autor en el prólogo de su obra: “Se presenta aquí un estudio histórico, sustentado en evidencia cuantitativa, de la economía política de la desigualdad del ingreso en Chile entre 1850 y 2009” (21). Vale decir, que este no es un estudio en el que se entregan y analizan datos económicos, sino que éstos se presentan y vuelven dependientes del devenir político y social del país. De ahí que se requiera un análisis desde la economía política. Un primer problema al entrar a estudiar estas materias, es que se ha preconizado desde el discurso hegemónico imperante, que la desigualdad no es un problema del mercado, ya que éste no sería más que la perfecta retribución de los distintos factores productivos, en función de la oferta y la demanda existente. La desigualdad, entonces, sería justa al representar de manera fehaciente y eficiente las diferencias de talento y de esfuerzo de cada uno de sus miembros. Por el contrario, Rodríguez –sin caer en una propuesta marxista, aunque no será extraño que más de alguno la caricaturice como tal- propone que los mercados actúan bajo la égida institucional, por lo que éstos se encuentran siempre determinados por las relaciones de poder existentes entre sus agentes. Se propone así demostrar que “aquellas instituciones más antiguas y resilientes –como el régimen oligárquico o la hacienda- no solo han incidido en la distribución del ingreso sino que se han visto afectadas por el conflicto social que las alimentaba (…) Indagaremos también sobre la forma en que el crecimiento económico –con sus ciclos de expansión y recesión-, la urbanización o el cambio estructural, han afectado la distribución de los ingresos; pero también cuál ha sido el papel del Estado, y más en general, de las políticas públicas, en el reparto de los costos y beneficios inherentes a dichas transformaciones. Ello nos permitirá demostrar que fenómenos como el crecimiento, la globalización o el cambio estructural, no solo no tienen resultados obvios sobre la distribución del ingreso, sino que su incidencia depende de las características históricas que asumen y, en particular, de cómo interactúan con las políticas públicas y las relaciones entre los actores sociales, las que adoptan muchas veces una forma conflictiva e, incluso, violenta” (29). Un segundo problema que se observa al intentar estudiar la desigualdad en el largo plazo, es que son escasos los estudios y, sobre todo, la falta de fuentes confiables anteriores a 1950. Así de las tres estrategias más utilizadas que se observan en la literatura para la reconstrucción estadística, entre ella, el análisis de los top incomes, índices de ratios de dos magnitudes y el uso de la antropometría, Rodríguez no se queda con ninguna. Por lo mismo, realiza una reconstrucción estadística del material existente, aunque elaborando al mismo tiempo una base empírica que le permita establecer tendencias en el mediano plazo, así como alcanzar un análisis de la distribución del ingreso en el largo plazo. En particular, el autor elabora series de desigualdad entre 1860 y 1970, las cuales vinculadas con los datos de las encuestas de hogares, le permitió obtener una imagen de las tendencias asumidas por la desigualdad en un siglo y medio de historia. Entonces, construyendo tablas sociales dinámicas que tienen en cuenta cantidades de personas como ingresos, entre diversos sectores sociales y económicos, le permite argumentar respecto a la desigualdad entre distintas categorías sociales, aunque no tanto al interior de las mismas, pues es difícil su desagregación. En este sentido, una tabla dinámica podría no ser del todo correcta para determinar la desigualdad en un año concreto, pero sí podría perfectamente presentar una imagen fidedigna de lo que ocurrió en el mediano y largo plazo. Con todo, no habría que ignorar que, en Chile, la desigualdad se explica, principalmente, por la diferencia en la propiedad de los factores de producción, y no sería extraño pensar que incluso la no desagregación por categorías incidiría mucho más en subestimar la riqueza de las élites que, por ejemplo, de campesinos o asalariados. Ciertamente, porque la élite económica chilena, durante gran parte de la historia, ha poseído activos en forma transversal: mineros, bancarios, industriales y agrícolas. En rigor, el planteamiento de Rodríguez tiene dos ideas matrices. Primero, que, pese a la desigualdad estructural existente, según el momento que se analice, “Chile combinó más o menos crecimiento económico con deterioro o mejora en la distribución con salarios más o menos crecientes o con un sector externo muy o poco dinámico” (88). Segundo, el rol que ha cumplido el Estado chileno en tanto organismo que ha logrado delinear la desigualdad, pues éste se constituyó en modelador de la distribución primaria de mercado1. Por una parte, las menos de las veces, como reductor de la desigualdad (durante el I.S.I.), en tanto dispensador de beneficios sociales y árbitro de las relaciones de poder; de otra, como potenciador de las desigualdad, en la medida que permitió que los agentes económicos empresariales impusieran su propia institucionalidad o que influyeran directamente en ella, cuestión que se habría acentuado ostensiblemente en dos períodos: primero, en lo que va entre los años 1903-1938; y segundo, entre 1973 y 1986. Ambos períodos en los que la democracia no habría tenido lugar, esto es, a principios de siglo XX, bajo un sistema oligárquico, y luego durante la Dictadura Militar. Habrían sido, entonces, esos los momentos en los que la élite volcó a su favor el peso normativo y coercitivo del Estado2. Ahora bien, sería un error plantear que en los otros ciclos económicos la desigualdad no existió. Todo lo contrario, pues como se planteó anteriormente, la desigualdad sería un elemento de largo plazo en Chile. Así, entonces, lo que Rodríguez quiere hacer notar es que, pese a ello, ambos períodos supusieron una reversión a las tendencias de mejora de distribución que se habían producido en décadas anteriores, principalmente mediante dos vías: negando o imponiendo mediante la fuerza un nuevo régimen laboral, como ocurrió durante el período oligárquico y la dictadura militar respectivamente. O bien, la privatización de los recursos públicos en contextos de corrupción u opacidad manifiesta. Da cuenta así Rodríguez, de cómo, por una parte, las reivindicaciones obreras fueron acalladas con masacres durante los primeros años de siglo XX, logrando disminuir el número de huelgas para el período; o cómo durante la dictadura se modificó el Código del Trabajo, prohibiendo así el derecho a huelga o la huelga inter-empresa. Por otra, el autor explica de qué manera las tierras de la región de la Araucanía fueron usurpadas por la élite, pero recubiertas por la corrupción como la opacidad, tal como aconteció durante las privatizaciones de la dictadura durante la década de 1970 y a fines de 1980. En efecto, la tesis que se sostiene es que el vínculo élites-Estado habría contribuido fundamentalmente a una distribución regresiva del ingreso, afirmación que vendría a cuestionar lo propugnado, sobre todo en Chile, de que ha sido el Estado el principal responsable –histórico- de no haber alcanzado el desarrollo y de haber puesto un freno al libre mercado. De hecho, se ha afirmado recurrentemente que las elites empresariales chilenas, una vez rotas las cadenas con el “Estado Socialista”, pudieron desplegar su capacidad empresarial. La Revolución Capitalista que habría operado desde 1973 en adelante, y que habría significado un crecimiento económico nunca antes visto durante los gobiernos democráticos, sería una demostración manifiesta de este hecho. Pero no, el estudio de Rodríguez no hace más que demostrar que los períodos de mayor desigualdad en Chile ocurrieron cuando, primero, parafraseando a Moulian, el Estado fue una continuación de la hacienda, o segundo, cuando éste fue despojado de sus bienes y/o aplicando el miedo y la fuerza a los trabajadores. La idea central planteada por Rodríguez, entonces, y más allá del caso chileno, es que son las fuerzas de mercado, el proceso social y político, pero, ante todo, las relaciones de poder entre los agentes, los que producen los ganadores y los perdedores del proceso productivo. Situación de desigualdad que aumentaría proporcionalmente, al menos en el caso chileno, en la medida que la élite logró controlar el Estado institucionalmente. Sea por control directo o porque logró incidir de manera manifiesta en la legislación. De esta manera, prueba que incluso en momentos en el que las fuerzas del mercado actuaron con mayor independencia de la institucionalidad, fue la “institucionalidad elitista” la que en el ciclo siguiente reconfiguró el mercado, por cierto, para su mayor beneficio. “Y en el caso concreto de la desigualdad en Chile, la importancia de la larga duración no debe subestimarse (…) El deterioro de la distribución del ingreso ocurrido durante la dictadura constituye en realidad el último episodio de una serie en que el Estado ha asumido un papel activo en la promoción de la desigualdad. Ello es consecuencia del control que la élite ha tenido sobre el aparato fiscal desde la Independencia –capacidad que se origina, a su vez, en la Colonia. Este le ha permitido incidir en su beneficio en la conformación de las instituciones políticas y económicas que, junto a las fuerzas del mercado, determinan la distribución del ingreso” (264). Con todo, a mi juicio, lo más valioso del texto de Rodríguez, no solo es que su excelente análisis permite comprender las causas históricas de la desigualdad en Chile, sino que también éstas explican el presente. Esto permitiría comprender que, en Chile, ha sido la élite la que, junto a un mercado concentrado, donde predominan los oligopolios, ha contribuido a delinear la desigualdad, sin importar mayormente el período que se haga mención, pese a que en algunos ciclos su presencia ha sido mayor y más decisiva, logrando con ello que la distribución sea aún más regresiva. Eso explicaría que, en la actualidad, bajo gobiernos que nadie podría catalogar de oligárquicos, se han consolidado las brechas de desigualdad por más que muchas de éstas se encuentren afincadas en amarres económicos constitucionales de la dictadura (Gárate, 2012). A decir verdad, lo que Rodríguez hace es invitar a los lectores, y a los chilenos en particular, a entender que no solo trata de crecimiento, mercado o institucionalidad, por separado. Se trata, en términos mucho más profundos, de entender que el modelo de desarrollo económico está directamente interrelacionado con la democracia. “Por ello, quiénes desde las calles, la academia, la sociedad civil o los partidos políticos, denuncian hoy la elevada desigualdad que caracteriza a la sociedad chilena, reclaman mucho más que una reforma tributaria, mayor gasto educativo, mejores pensiones o una nueva ley sobre la financiación de las campañas electorales; están pugnando, en realidad, por un cambio en el modelo de desarrollo que dé lugar a una sociedad más justa y a una mejor democracia. Si habrán, o no de conseguirlo, el tiempo lo dirá” (268). Leia Mais

Classics in Britain: Scholarship/ Education/ and Publishing 1800-2000 | Christopher Stray

Este libro reúne una serie de artículos de Christopher Stray sobre varios aspectos de la enseñanza de los estudios clásicos y la erudición en los siglos XIX y XX en Gran Bretaña. A excepción de los capítulos 3 y 8, que son publicados aquí por primera vez, los restantes artículos vieron la luz previamente en otros libros y revistas. Sin embargo, en palabras del autor, este libro busca ser más que la suma de las partes. Incluye una bibliografía completa y un útil index nominum, que facilita mucho la tarea de consultar un libro voluminoso con información importante. Leia Mais

Sobre o autoritarismo brasileiro | Lilia Moritz Schwarcz

O imaginário sobre o passado brasileiro está permeado de interpretações que, sendo oriundas de um antigo projeto excludente de nação, ignoram uma série de aspectos e problemáticas que marcaram diferentes temporalidades da história do país, da colônia à república. Ideias como o “mito das três raças”, a democracia racial e o entendimento de que a escravidão brasileira teria sido mais “branda” não raro surgem quando se discute a história do Brasil. Esta visão relaciona-se diretamente com a historiografia brasileira do século XIX, quando o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) tinha como objetivo criar uma imagem de um Brasil cujo passado era harmônico, e o futuro, glorioso.

É desse ponto que parte a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz, na introdução de seu livro Sobre o autoritarismo brasileiro. A obra é resultado da junção de conteúdos de outro livro da autora, Brasil: uma biografia (2014), com algumas colunas escritas por Schwarcz ao jornal Nexo. Feito a pedido da editora Companhia das Letras, Sobre o autoritarismo brasileiro tem a intenção de fornecer ao leitor um panorama geral de algumas questões que atravessam a história do Brasil e ainda se fazem presentes na atualidade. Tendo em vista as recentes disputas de ideias, a turbulência política e econômica e a crise social que o país tem vivenciado na última década, Schwarcz busca não atribuir acriticamente as raízes dos problemas atuais ao passado, mas sim propor um olhar à nossa história para lembrar que, diferentemente do que comumente se acredita, a intolerância e a violência sempre marcaram a figura do brasileiro.

Cada capítulo do livro aborda uma temática específica, evidenciando as variadas facetas do autoritarismo no Brasil. O primeiro, “Escravidão e racismo”, busca reforçar que o sistema escravista, muito mais do que uma estrutura econômica e social, “moldou condutas, definiu desigualdades sociais, fez de raça e cor marcadores de diferença fundamentais, ordenou etiquetas de mando e obediência, e criou uma sociedade condicionada pelo paternalismo e por uma hierarquia muito estrita” (SCHWARCZ, 2019: 27-28). Questionando a ideia de que o escravismo no país teria sido mais brando ou “menos pior”, a autora destaca os altos índices de pessoas negras traficadas dos portos africanos para o Brasil, bem como os sofrimentos pelos quais os escravizados passavam diariamente. Por outro lado, um sistema severo significou uma série de resistências: as fugas, formações de quilombos, insurreições e revoltas com diversos meios e motivações não devem ser deixadas de lado.

A abolição foi adiada até onde pôde, e foi empreendida de forma gradual e conservadora, culminando na Lei Áurea de 1888. Contudo, isso não significou uma preocupação em ressarcir ou integrar a população recém-liberta à sociedade. Ainda, a adoção de teorias científicas deterministas representaram uma tentativa de substituir uma desigualdade por outra: antes estabelecida entre escravos e senhores, agora a desigualdade era legitimada pela biologia. Em seguida, a autora realiza uma análise da questão racial na contemporaneidade. Embora hoje não sigamos mais a ideia de raças biológicas nem a falácia de que cor determina conduta moral, nossa sociedade é estruturada pela “raça social”, que opera na cultura e nas mentalidades. No Brasil, a desigualdade social tem cor, e a população negra sofre uma dupla morte: o apagamento de sua memória e o genocídio que marca os indicadores sociais.

O segundo e terceiro capítulos são dedicados, respectivamente, ao mandonismo e ao patrimonialismo. Ambos os aspectos são centrais para entender a hierarquia social do Brasil colonial, fundamentada na concentração de grandes latifúndios monocultores nas mãos de poucos homens, que consistiam na “nobreza da terra”. Era esta aristocracia que detinha os privilégios sociais, políticos e econômicos, num sistema patriarcal onde o homem era o chefe de família e a mulher possuía um papel secundário. Esta forma de organização social acabou por contribuir para a criação da imagem do senhor de terras como a pessoa que distribuía benefícios aos mais próximos e poderia, eventualmente, cobrar por seus favores, aumentando sua influência política.

Tal estrutura perdurou no período republicano. O coronelismo é sua expressão mais relevante na República Velha, e marcou as relações entre os senhores de terras, governadores e a presidência da República. Esta personalização do poder acabou, ainda, por perpetuar o sistema desigual e excludente no meio rural da atualidade: as famílias tradicionais de ruralistas são as maiores beneficiadas pelo Estado, detém a maior parte das terras e ainda possuem considerável relevância nos cenários políticos regional e nacional. Tais clãs perderam algum espaço desde as eleições de 2018, contudo, a estrutura autoritária que os beneficia é a mesma, apesar das reformas políticas empreendidas desde a redemocratização. Ademais, a figura do pater familias, “autoritário e severo diante daqueles que se rebelam; justo e ‘próximo’ para quem o segue e compartilha das suas ideias” (SCHWARCZ, 2019, p. 65) ainda exerce grande apelo no imaginário popular.

Por sua vez, o patrimonialismo é conceituado pela autora como um extrapolamento da divisão entre as esferas pública e privada, quando o Estado é usado como ferramenta para fins particulares. Consequentemente, uma série de práticas, ideias e comportamentos de clientelismo, de conchavo, e de arranjos pessoais que atropelam os limites da regra pública, torna-se cotidiana nas movimentações e negociações políticas. A ideia do Estado como uma extensão do ambiente doméstico permite, então, que o poder político seja exercido pelos detentores do poder (homens, brancos, aristocratas) para fins pessoais. E, apesar das ações levadas a cabo para combater tais práticas existirem desde a Constituição de 1934 (e principalmente com a Constituição de 1988), as práticas patrimonialistas persistem. De acordo com Schwarcz, um dos maiores exemplos disso é a chamada “bancada dos parentes” no Congresso: em 2018, dos 567 parlamentares, 138 eram oriundos de clãs políticos, um aumento de 22% em relação a 2014 (SCHWARCZ, 2019, p. 83). O próprio presidente Jair Bolsonaro bem representa esta questão, já que três de seus filhos possuem cargos políticos. Estreita relação tem o patrimonialismo com a corrupção, tema do quarto capítulo. A autora reforça que, embora possa-se dizer que a corrupção existe no Brasil desde o período colonial, erramos ao simplificar este raciocínio afirmando que as práticas corruptas da contemporaneidade são as mesmas do passado. De fato, o termo “corrupção” tem sido ressignificado múltiplas vezes, assumindo diferentes concepções conforme a alteração dos contextos políticos.

Uma questão relacionada a isso é a recorrência ao combate à corrupção no discurso político para legitimar quebras da normalidade constitucional, como foi o caso do golpe de 1964 e da ditadura militar, que, apesar de assumir a bandeira da anticorrupção, utilizou de práticas ilegais em seus projetos e negociações. De todo modo, a autora conta que, com a redemocratização, o melhor funcionamento das instituições políticas permitiu que os escândalos ganhassem mais espaço nos jornais e no debate público, como foi o caso de Fernando Collor. Essa melhora na percepção da corrupção também se vê no caso do Mensalão. Apesar de afetar diretamente o Partido dos Trabalhadores (PT), então partido que ocupava a presidência, o Mensalão foi o primeiro caso em que as políticas de fortalecimento da Polícia Federal e do Ministério Público Federal levadas a cabo nos últimos anos surtiram um efeito visível. A autora finaliza o capítulo fazendo uma reflexão sobre a corrupção hoje, em que a Operação Lava Jato tem investigado um complexo esquema que envolvia partidos e empresas. Schwarcz pontua que, apesar da relevância do tema no debate público, o combate à corrupção não pode tornar-se uma cruzada moralista focada em indivíduos, com um discurso raso e populista de “luta contra a roubalheira” (SCHWARCZ, 2019: 121). O que é necessário é investir em planos duradouros que combatam práticas cotidianas enraizadas no comportamento da sociedade e que não joguem fora os ganhos que tivemos desde a Constituição de 1988.

Na sequência, Schwarcz se volta às especificidades do cenário das extensas desigualdades sociais brasileiras. Partindo de um panorama estatístico dos níveis de concentração de riqueza no país, a autora estabelece uma série de ramificações, que envolvem desde um não acesso a serviços básicos até a impossibilidade de se consumir bens culturais e de ser uma pessoa plenamente inserida nas participações e nos diálogos políticos previstos pelo ideal de “república democrática”. Entre os elementos da ordem social brasileira que permitem a reprodução constante de tal assimetria, figuraria, em posição proeminente, a precariedade dos serviços educacionais públicos, não estendidos à totalidade da população infanto-juvenil em condições equânimes. Embora a obrigatoriedade de oferta de ensino público tenha sido instituída já em 1824, era irrisório o número de estabelecimentos constituídos. Assim, até meados do século XIX, o letramento consistiu em uma quase exclusividade das elites brancas, responsáveis por instituir proibições à formação educacional de pessoas negras escravizadas.

Na segunda metade dos anos 1800, o ensino seguia uma prática marginalizada, ainda que convenientemente exaltado como critério de seleção da parte do povo apta para votar. Conforme explica Schwarcz, o século XX trouxe transformações conservadoras a essa problemática — se o regime de Vargas pode ser reconhecido pela ampliação e concretização de um sistema de ensino efetivamente nacional, deve ser igualmente encarado como perpetuador de uma lacuna de possibilidades de formação individual entre alunos de famílias abastadas e descendentes da classe trabalhadora. A instituição de dois programas curriculares para o ensino secundário, um voltado à transmissão de saberes técnicos e outro à preparação teórica para ingresso em universidades, favoreceu a continuidade do exclusivismo do ensino superior aos estudantes que não precisavam iniciar suas trajetórias de trabalho ainda na adolescência. Na atualidade, a baixa democratização do direito à educação apareceria expressa em altos índices de evasão escolar e represamento, ocasionando, por consequência, a continuidade do ensino universitário e dos postos de maior remuneração enquanto privilégios de elite.

Relacionada às desigualdades sociais do país, a temática das múltiplas violências é pautada em seguida, com o estabelecimento de panoramas referentes à criminalidade urbana e aos conflitos agrários empreendidos contra comunidades historicamente resistentes à ordem colonial ou nacional. Envolvido naquela estão os altos índices de assassinato (30 homicídios/100 mil hab.), de armas de fogo em circulação e de receio da população em sofrer agressões por agentes policiais (SCHWARCZ, 2019: 156, 161-162). Schwarcz salienta que, apesar da vigência do Estatuto do Desarmamento desde 2003, observa-se, a partir do ano de 2014, aumentos expressivos no número de licenças para porte de armas por civis, bem como uma intensificação de lobbies políticos favoráveis à flexibilização de restrições colocadas pelo Estatuto (SCHWARCZ, 2019: 157-159). Assim, embora as armas de fogo sejam as principais ferramentas por trás da execução de mortes violentas (79,8% delas, aproximadamente), atendem a discursos de populismo autoritário que, diante dos reclamos populares contra a insegurança nas cidades, sugerem o fortalecimento de órgãos repressivos e letais — caso das polícias militares — e a simultânea individualização das políticas de segurança (SCHWARCZ, 2019: 161-164). Em decorrência do desvio de armas obtidas legalmente, seriam as milícias — grupos paramilitares compostos por agentes de segurança do Estado e políticos locais — as formações em mais próspera expansão na conjuntura de tráfico pela guerra às drogas.

Já a segunda esfera estaria dirigida a populações indígenas e quilombolas, usurpadas de seu direito à terra previsto pela Constituição de 1988, na medida em que órgãos como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) corroboram a morosidade dos processos de reconhecimento de suas terras enquanto áreas de válida demarcação. Aos indígenas, atribui-se um longo histórico de representações e de políticas delimitadas pelos ensejos dos grupos governistas brancos. Massivamente alvejados na colonização, foram, no século XIX, tornados matéria de inspiração à produção de obras artísticas financiadas por D. Pedro II, as quais objetivavam a materialização de uma identidade nacional apaziguadora, que via no grupo uma oportunidade de valorizar as raízes brasileiras diversas sempre mantendo a máxima de exaltação das contribuições europeias. No século XX, a adição de dispositivos legais prevendo garantias de preservação de seus territórios não mostrou efeitos práticos, legando os povos à vulnerabilidade frente a interesses capitalistas de ocupação territorial e de exploração de recursos. Os quilombolas, em contraponto, não chegaram a receber propostas de proteção pelo Estado antes de 1988, enfrentando dificuldades para a legalização da posse de suas terras.

A seguir, a historiadora aprofunda suas abordagens fazendo uso de uma perspectiva analítica delimitada, a interseccionalidade, traduzida, por sua vez, no uso dos chamados “marcadores sociais da diferença” como lentes de interpretação de estatísticas e de formas específicas de violência sucedidas no país. Aqui, nota-se a adesão da autora a um horizonte plural e complexificado de investigação das realidades nacionais, que vai ao encontro das perspectivas teóricas propostas por feministas negras estadunidenses desde o final dos anos 1980. Nas obras da jurista Kimberle Crenshaw, observa-se a defesa de uma ramificação das identidades de sujeitos sociopolíticos rumo a uma superação de modelos fixos e superficiais regidos apenas por reivindicações de gênero, de sexualidade e de raça em separado. A teórica argumenta que a densidade de problemáticas coletivas e de formas de existência exige que se leve em conta todos os eixos anteriores em conjunto (CRENSHAW, 1990: 1241-1245). Schwarcz converge com tal intuito, adicionando aos panoramas numéricos de raça e gênero fornecidos fatores regionais, etários e geracionais.

Entre as questões de raça e gênero pautadas, são destacadas algumas ocorrências: em primeiro lugar, a desigual propensão à morte por parte de pessoas negras. Se jovens pretos e pardos são desproporcionalmente atingidos pela violência policial e pelo encarceramento e massa, também seus familiares sofrem dificuldades pessoais — os homens mais velhos tendem a morrer cedo, sem acessar tratamentos de saúde e diagnósticos médicos. As mulheres adultas passam pelo mesmo, estando sujeitas (em percentual superior ao das mulheres brancas) à ameaça constante dos feminicídios. Esses constituem, junto às taxas de estupro, o segundo norte descritivo da autora no capítulo em questão. Para enfocar as violências de gênero, Schwarcz recupera algumas das explicações já delineadas acerca das origens patriarcais da sociedade colonial brasileira. Dialogando com os ideais de Judith Butler, acrescenta ao pano de fundo da tradição patriarcal escravista a heteronormatividade, padrão cultural de conduta que seria responsável pela imposição de hierarquias de poder hierárquicas às relações entre indivíduos dos gêneros feminino e masculino.

Denunciam-se, então, os altos números de feminicídios (50 mil entre 2001 e 2011, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada [IPEA]) e de violações sexuais (cerca de meio milhão por ano) cometidos, sendo estas últimas uma forma de violência direcionada fortemente a crianças, violadas majoritariamente por pessoas próximas, no interior de suas casas (SCHWARCZ, 2019: 198). Motivados pela misoginia arraigada ao sistema de valores heteropatriarcais, ambos os crimes aparecem em registros de violência contra mulheres lésbicas, travestis e transexuais, agredidas em situações de não aceitação de manifestações de gênero e de sexualidade dissidentes. Passando a um olhar mais global das violações contra pessoas LGBTQIA+, Schwarcz atenta para as expressivas taxas de assassinato de integrantes dessa comunidade (aproximadamente 500 ao ano), com ataques mais direcionados a sujeitos trans e travestis, e para a precariedade das condições de coleta de dados voltados a essa população, destituída do foco de políticas públicas desde janeiro de 2019 (SCHWARCZ, 2019: 207-215). Segundo atestam pesquisadores da causa trans no Brasil (BONFIM, SALLES, BAHIA, 2019: 155-164), a ausência de estatísticas consistentes acerca das violências experienciadas particularmente por LGBT+s classifica-se como uma das faces da necropolítica de Estado contra tais corpos, uma vez que inviabiliza a execução de medidas protetivas e a oferta de serviços específicos, aspectos também pautados por Lilia.

Adentrando os dois últimos capítulos da obra, a autora desenvolve um balanço acerca da crise democrática sentida a partir do golpe parlamentar de 2016. Em sua avaliação, recorre às conjunturas de nações que, tal como o Brasil, transmitiam internacionalmente a imagem de “democráticos”, mas que, em decorrência da intensificação de polarizações, adentraram uma zona cinzenta classificada sob o epíteto de “democraduras”. Sem romper completamente a ordem institucional, países como Hungria, Polônia, Estados Unidos e Brasil experienciaram a consolidação de governos sustentados pela intensificação de ódios binários e por sentimentos de aversão a identidades de grupos que, até então, vinham adquirindo direitos básicos e relativo espaço político. A partir da reivindicação de que os setores populares tradicionais (famílias brancas, pessoas de classe média, homens trabalhadores) seriam aqueles autenticamente éticos e, ao mesmo tempo, os sujeitos deixados de lado por Estados que falharam em prover empregos, segurança e infraestrutura, teria se desenrolado um recrudescimento das práticas de intolerância.

A fim de sustentar a narrativa de validação exclusiva dos setores tradicionais (e reacionários), saberes científicos, discussões acadêmicas e jornalísticas passaram a sofrer frequentes ataques visando a seu descrédito. Junto a isso, pessoas negras, LGBTQIA+, mulheres, indígenas e adeptos de religiões de matriz africana foram convertidos em alvos de campanhas que colocam como norma os pilares da doutrina cristã, dando prosseguimento, na verdade, a um histórico de aniquilação de diversidades instaurado ainda no período colonial, seja pelas violências da escravização de africanos, seja pela conversão e genocídio dos povos originários de terras brasileiras. Em face da adesão de significativos percentuais demográficos às propostas de retorno a um suposto passado idílico aos setores abastados e não minoritários, Schwartz conclui: não nos devemos contentar com garantias democráticas oficiais, mas sim apostar na construção de uma cultura de defesa de princípios de diversidade e de participação cidadã, possível de se estruturar por meio da inserção de tais valores em projetos dos ciclos básicos do sistema público de educação.

Para além do amplo espectro de discussões e de explicações históricas apresentado pela obra e sintetizado nas linhas anteriores, merecem destaque ainda alguns outros fatores que concernem ao contexto de produção e de circulação do livro. Publicado em maio de 2019, Sobre o autoritarismo… logra denunciar retrocessos e impactos desencadeados tanto pelo processo eleitoral de 2018, quanto pelos primeiros meses da gestão de Jair Bolsonaro. Mesmo sem mencionar explicitamente sua figura — em uma escolha intencional da autora, que buscou se evadir de uma escrita centrada no Presidente de modo a não recair em uma narrativa personalista (MOTA, 2019) — Schwarcz alerta para os brutais aumentos das taxas de registro de crimes de intolerância em setembro e outubro de 2018, bem como para as consequências da reorganização da agenda de promoção de direitos de minorias sob o esdrúxulo, patriarcal e heteronormativo Ministério “da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”. Influenciada por sua formação, tece diálogos com trabalhos de nomes importantes da Antropologia, a exemplo de Manuela Carneiro da Cunha e Viveiros de Castro, sem deixar de lado os referenciais historiográficos por vezes ausentes em livros que se pretendem contadores do passado brasileiro hoje. Utilizando-se de uma linguagem clara, distancia-se do ideal de livro acadêmico rebuscado em sua redação. Com isso, fornece uma opção de leitura comercialmente acessível, concisa, historicamente embasada e dotada de viés crítico ao público leigo interessado em compreender mais sobre as desventuras sociopolíticas que afligem o Brasil. Essas, conforme evidenciado por Lilia Schwarcz em diversos momento, devem ser percebidas pelos leitores como uma sombra constante, vinculada à longa duração histórica e às particularidades dos arranjos conservadores das elites de cada período.

Referências

BOMFIM, Rainer; SALLES, Victória; BAHIA, Alexandre. Necropolítica Trans: o gênero, cor e raça das LGBTI que morrem no Brasil são definidos pelo racismo de Estado. Argumenta Journal Law, Jacarezinho, Brasil, n. 31, p. 153-170, jul./dez. 2019.

CRENSHAW, Kimberlé. Mapping the margins: Intersectionality, identity politics, and violence against women of color. Stanford Law Review, n. 6, v. 43, p. 1241-1299, jul. 1990.

LILIA Schwarcz: “A todo momento, revelamos nossa raiz autoritária”. Fronteiras do Pensamento, Salvador, 29 jun. 2019. Acesso em: 18 out. 2020.

MOTA, Camila Veras. Brasileiro abandonou “máscara” de cordial e assumiu sua intolerância, diz Lilia Schwarcz. BBC, São Paulo, 01 jun. 2019. Acesso em: 18 out. 2020.

ROVANI, Andressa. Sempre fomos autoritários: Lilia Schwarcz diz que crise fez aflorar ressentimentos e que PT-PSDB falhou em não atender conservadores. UOL, São Paulo, 05 jun. 2019. Acesso em: 18 out. 2020.

Bruno Stori – Estudante do 5º período do curso de História (Licenciatura e Bacharelado) na Universidade Federal do Paraná. É bolsista do grupo PET História UFPR e faz Iniciação Científica sob a orientação da Profª Drª Andréa Carla Doré.

Rafaela Zimkovicz – Estudante do 3º período do curso de História (Licenciatura e Bacharelado) na Universidade Federal do Paraná. É bolsista do grupo PET História UFPR e faz Iniciação Científica sob a orientação da Profª Drª Priscila Piazentini Vieira.


SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. Resenha de: STORI, Bruno; ZIMKOVICZ, Rafaela. Cadernos de Clio. Curitiba, v.10, n.1, p.154-167, 2019. Acessar publicação original [DR]

Relaciones entre autoritarismo y educación en el Paraguay (1869-2012) | David Velázquez e Sandra D’Alessandro

Em 2014, a equipe de Educação em Direitos Humanos e Cultura da Paz, do Serviço Paz e Justiça do Paraguai (SERPAJ-PY), dava a conhecer o primeiro de quatro volumes de uma coleção que busca estabelecer as Relações entre autoritarismo e educação no Paraguai (1869- 2012). Cada tomo é dedicado a um período da história paraguaia, sendo que o primeiro compreende de 1869 a 1930 (publicado em 2014), o segundo, de 1931 a 1954 (2016), e o terceiro, de 1954 a 1989 (2018), que coincide com o stronismo. Faltando ainda o último volume, a coleção conta com uma equipe de pesquisa integrada por Ana Barreto, David Velázquez Seiferheld e Sandra D’Alessandro, coordenada por Ignacio Telesca. A autoria do terceiro volume, apresentado aqui, corresponde a Velázquez Seiferheld e a D’Alessandro.

Ao apresentarem um balanço sobre os nexos entre autoritarismo e educação durante o stronismo, os autores se depararam com a necessidade de expor as principais interpretações que tentam explicar as causas da longevidade da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989), para assim poder apresentar as fases e os principais elementos do desenvolvimento do ensino durante esse período no Paraguai. A tarefa, a princípio, hercúlea, é narrada a partir de uma linguagem que, sem abandonar o rigor científico, é acessível ao público em geral. O objetivo dos autores é mostrar à população paraguaia alguns dos mecanismos utilizados pelo stronismo para garantir sua sobrevivência ao longo de 35 anos, sendo a educação um fator chave para entender a permanência de um modelo autoritário bem-sucedido. Leia Mais

Como era fabuloso o meu francês! Imagens e imaginários da França no Brasil (séculos XIX-XXI) | Anaïs Fléchet, Olivier Compagnon, Silvia Capanema P. Almeida

O Ano da França no Brasil, comemorado em 2009, para além de extensa programação no campo cultural, também inspirou a realização de uma série de eventos acadêmicos, que continuam a dar frutos. Sob a chancela da Editora 7 Letras e da Fundação Casa de Rui Barbosa veio a público em 2017 obra coletiva resultante de colóquio organizado naquele profícuo ano, que reuniu um rol diversificado de especialistas em torno das relações franco-brasileiras.

Abre o volume alentada introdução dos organizadores, que coloca em questão as visões eurocêntricas que fazem do Brasil um receptor, a um tempo passivo e fascinado, de valores e hábitos franceses, tomados como modelo de civilização. Os autores evidenciam que, pelo menos desde meados do século passado, não faltam exemplos de trabalhos a matizar essa leitura, a exemplo dos escritos de Roger Bastide, que já insistia nas trocas bilaterais. Em sintonia com a historiografia contemporânea, que tem evidenciado a força heurística das noções de transferências culturais, histórias conectadas, mestiçagem e história global, o que se propõe é ir além do comparatismo tradicional, que elege um padrão ideal para avaliar o outro, e das noções de centro e periferia, tarefa desafiadora e que se coloca na contra mão de visões cristalizadas e arraigadas no imaginário social e também na produção acadêmica, razão pela qual ainda continuam a se insinuar mesmo entre especialistas.

Seguem-se quinze capítulos, divididos em quatro partes. A primeira delas, “Civilização e barbárie”, traz contribuições de Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves, Ingrid Hötte Ambrogi, Silvia Capanema P. de Almeida e Olivier Compagnon, que problematizam o dualismo enunciado no título a partir de diferentes situações históricas. Assim contemplam-se, respectivamente, as representações – bastante negativas, é bom sublinhar, – difundidas no início do oitocentos no Império português a respeito de Napoleão Bonaparte, quando a Família Real estava instalada no Rio de Janeiro; o ideal perseguido pelos estabelecimentos escolares da Primeira República, claramente calcados em modelos vigentes na França; as caricaturas publicadas a respeito da 1ª Guerra Mundial na Careta, com particular destaque para as que tematizavam a França e, ainda, o posicionamento, nem sempre uníssono, das nossas elites em relação aos contendores, bem como o impacto do conflito e seus desdobramentos nas relações entre os dois países. Trata-se, portanto, de diferentes momentos e contextos a atestar a diversidade de percepções em relação à imagem da França no Brasil, cuja centralidade, tão marcada no decorrer do século XIX, sofreu abalos significativos com a Grande Guerra, aspecto evidenciado por Almeida e Compagnon.

Questões de ordem estética e artística são contempladas nos quatro textos que compõem a segunda parte, “França, mãe das artes”. A produção de Nicolas-Antoine Taunay e Jean Baptiste Debret, que integraram a chamada “missão” francesa de 1816, denominação já relativizada pela rigorosa contextualização das circunstancias que trouxeram ao Rio de Janeiro um grupo de artistas comprometidos com a recém deposta ordem napoleônica, foram abordadas por Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Pires Lima. As contingências políticas, que fizeram da corte lusitana um refúgio seguro que oferecia, pelo menos em tese, várias oportunidades de trabalho, não significou o abandono das relações com a pátria distante, sobretudo em vista das dificuldades enfrentadas no Rio de Janeiro. Se a conjuntura no Hexágono era cuidadosamente acompanhada, tendo em vista o retorno ao solo europeu, a passagem pelos trópicos deixou marcas profundas na produção pictórica, como bem exemplifica a análise dos quadros de Taunay e sua recepção pela crítica francesa, pouco sensível às cores e aos tons da natureza brasileira, o que acaba por colocá-lo num entre lugar – francês no Brasil, estrangeiro em sua terra natal. Já a análise do pano de boca confeccionado por Debret para a coroação de D. Pedro I, que expressava uma certa concepção da jovem nação, sua composição social e futuro projetado, em sintonia com as necessidades e expectativas do poder, adquire outros sentidos quando remetido à posição que ocupou no interior da Viagem pitoresca e histórica no Brasil, às circunstâncias que possibilitaram a publicação da obra entre 1834 e 1839 e às condições reinantes no cenário político francês. Em ambos os casos, trata-se de vias de mão dupla, que problematizam a apreensão ancorada nas ideias de influência e recepção passiva.

Os dilemas em torno das relações nacional e estrangeiro estão presentes nas contribuições de Marize Malta e Maria Luiza Luz Távora. A primeira diz respeito à decoração das residências nos anos 1920, discutida a partir da publicidade estampada na Revista da Semana e A Casa. Em debate os estilos de mobiliário: art-déco, neocolonial e modernismo, com suas linhas simples. Mais do que a opção por um modelo, o que Malta evidencia é o processo de hibridismo, a mistura entre estilos e a apropriação criativa, com a utilização de motivos nacionais, entre eles os marajoaras. Já a discussão suscitada pela presença do artista franco-alemão Johnny Friedlaender no curso inaugural do ateliê de gravura do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em 1959 torna patente as resistências frente às experimentações e propostas estéticas diversas das imperantes no cenário artístico nacional, o que atesta, ainda uma vez, a tensa e complexa relação com as inovações que aqui aportavam, sobretudo numa conjuntura marcada por exacerbado nacionalismo.

A terceira parte, “Grandeza e decadência da mulher francesa”, é composta por três textos que tratam da imagem e do imaginário sobre o feminino, num arco temporal que vai de meados do século XIX às décadas iniciais do século XX, quando a presença da mulher no espaço público começava a alterar e mesmo suberventer a ordem estabelecida e papéis sociais consagrados. As pesquisas de Monica Pimenta Velloso e Lená Medeiros de Menzes privilegiam a figura da cocotte que, a exemplo da modista do início do Império, desfrutava de reputação duvidosa, o que não impedia que fosse objeto de irresistível curiosidade e atração, como bem demonstram as autoras. Velloso explora as ambiguidades do olhar francês sobre o Brasil, a partir de refinada análise do humor “debochado, caricato e anarquiante”, para retomar os seus termos, da revista Ba-ta-clan, que afrontava a sensibilidade e o orgulho locais. Contudo, esse material também permite desvelar valores, desejos e expectativas dos franceses radicados no Rio de Janeiro, num entrecruzamento ambiguo e nem sempre fácil de ser apreendido. Lená Medeiros, por seu turno, exemplifica o périplo transatlântico cumprido por algumas francesas que, contrariamente às suas expectativas e esperanças, enfrentaram uma realidade bem pouco glamourosa. A natureza calidoscópica da questão, diligentemente pontuada no texto, evidencia-se pelo recurso às colunas da Ba-ta-clan, que permitem avaliar o impacto do comportamento transgressor dessas mulheres, que alimentavam a percepção acerca dessas francesas atrevidas, duramente combatidas pelso guardiões da ordem. Fecha o conjunto a contribuição de Cláudia Oliveira, que retoma as representações de Salomé, tematizada na pintura, no teatro, nas revistas ilustradas, com fortes doses de sensualidade. Novamente o que se destaca é a ambivalência diante das mudanças provocadas pela modernidade, num ambiente marcado por significativas transformações na sociabilidade e cotidiano urbanos. Merece particular destaque a análise sensível da Salomé de J. Carlos, publicada em 1927 na revista Para Todos.

Sob a rubrica “O espelho do outro” estão reunidos outros quatro textos que retomam as relações interculturais franco-brasileiras, o primeiro deles a partir da temática da religiosidade e seu surpreendente sincretismo e interconexões, que remetem tanto para a presença de São Luís e outros personagens do ciclo de Carlos Magno nos nossos terreiros quanto à conversão de Pierre Verger, como revela Monique Augras ao explorar as trajetórias e transfigurações desses seres “encantados”. Intercâmbios que também se expressam em periódicos, livros e bibliotecas e na presença de tipógrafos, editores, livreiros, gravadores e litógrafos franceses, que desempenharam papel relevante na difusão da cultura letrada e na ampliação do espaço público, como bem pontua Tania Bessone, que não deixa de assinalar, em sintonia com outras colaborações, o esmaecer dessa presença a partir das primeiras décadas do século XX.

A importância estratégica, para as elites imperiais, de contar com uma percepção positiva a respeito do Brasil na França é discutida por Sébastien Rozeaux. Se, graças à intervenção de Ferdinand Denis e Saint Hilaire, esta expectativa pode ser atendida, a situação alterou-se frente aos relatos bastante ácidos publicados nos anos 1830 na prestigiosa Revue des Deux Mondes. O estudo da reação de indivíduos do calibre de Araújo Porto-Alegre e outras figuras de proa do nosso cenário intelectual permite evidenciar quais eram os anseios da geração romântica, que tomou a si a tarefa de construir uma nação civilizada nos trópicos e de elaborar um discurso autônomo sobre a mesma. O autor explora a sensação de traição e o choque ocasionado pela difusão de percepções pouco confortáveis, fosse a respeito dos vícios sociais, da mestiçagem ou da incomoda questão da escravidão, que maculavam uma imagem pacientemente urdida. Daí o empenho para, se não reparar, pelo menos atenuar as apreensões pouco abonadoras a partir de estratégias discursivas bem diversas: a agressividade e a ironia para o público interno, o tom bem mais conciliador e cauteloso quando o destinatário era o leitor francês. Os estereótipos nacionais figuram em outro registro na colaboração de Anaïs Fléchet, que investiga a maneira como as cidades de Paris e do Rio de Janeiro foram figuradas nas canções populares ao longo do século XX. Mais do que distanciamento, predominam os paralelismo, uma vez que ambas são referidas como lugares distantes, que ativam a imaginação e remetem às aventuras amorosas, compondo uma “geografia musical do imaginário”, na bela definição da autora. Não faltaram referências às mulheres de ambos os lados do Atlântico, descritas em consonância com modelos de há muito em circulação: refinamento/sedução/prostituição, do lado francês, jovem/disponível/ despudorada, no que concerne à brasileira, num quadro de imagens cruzadas – e não raro sobrepostas – que convida a refletir sobre a circularidade das trocas.

A título de conclusão, conta-se com o texto de Robert Frank, que assume o desafio de abordar as relações internacionais em suas dimensões culturais. Para tanto, o autor passa em revista as contribuições de Pierre Renouvin e Jean-Baptiste Duroselle a respeito do significado das mentalidades para a elaboração e difusão de nacionalismos e na relação entre países. À detalhada reconstrução do arsenal analítico proposto, segue-se sua relativização à luz das mudanças introduzidas pelo cultural turn dos anos 1980, que consagrou interpretações ancoradas nas noções de representação, imaginário e identidade.

O rápido deambular por entre os vários capítulos, se não contempla todas as questões abordadas em cada uma das contribuições, é suficiente para evidenciar a importância das mesmas para a temática, que tem recebido atenção significativa nos últimos anos. Cabe ressaltar que as partes acima referidas não devem ser tomadas como conjuntos estanques. De fato, os textos convidam a imaginar outros arranjos e articulações possíveis. Assim, a título de exemplo, Napoleão e os imigrados que deixaram a França após a queda do Imperador são personagens retomados em vários capítulos, tanto quanto o declínio da presença francesa, as referências ao imaginário sobre as mulheres, a oposição (ou a adesão) aos ventos que sopravam da França, os esforços para estabelecer trocas de mão dupla, em lugar das rotas com sentido único. Por certo o leitor será capaz de propor outras possibilidades diante de um rol de contribuições que se revelam tão densas e complexas quanto o objeto a ser desvendado.

Tania Regina de Luca –  Professora Livre Docente em História do Brasil Republicano pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Possui doutorado e mestrado em História Social pela Universidade de São Paulo e graduação em História pela mesma instituição. Responsável, junto ao CNPq, pelo financiamento do projeto “Estudos de jornais em língua estrangeira” (Transfopress Brasil). E-mail: tania.luca@pq.cnpq.br


FLÉCHET, Anaïs; COMPAGNON, Olivier; ALMEIDA, Silvia Capanema P. de. Como era fabuloso o meu francês! Imagens e imaginários da França no Brasil (séculos XIX-XXI). Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa; 7 Letras, 2017. Resenha de: LUCA, Tania Regina de. Sob o signo da complexidade: trocas interculturais entre França e Brasil.  Revista Maracanan. Rio de Janeiro, n. 19, p. 216-220, jul./dez. 2018. Acessar publicação original [DR]

 

130 anos da Abolição: História, luta e resistência escrava no Brasil | Temporalidades | 2017

No começo do século XIX, Brasil e Estados Unidos tinham, cada um, cerca de um milhão de escravos. No icônico ano de 1808, os Estados Unidos se fecharam para o tráfico de africanos, enquanto a chegada da corte portuguesa ao Brasil enrobustecia a aquisição de cativos. Nos anos seguintes, o Brasil absorveu mais dois milhões de escravizados (cerca de 737 mil deles ilegalmente depois de 1831), porém, chegou a fins dos anos 1850 com cerca de 1,7 milhões de escravos. Já os Estados Unidos, ao eclodir a Guerra Civil, tinham uma população que já passava dos quatro milhões de cativos. Fora a diferença de natalidade escrava entre as duas regiões, a disparidade de suas populações escravas conta algo sobre a natureza de cada sociedade. Ao contrário dos Estados Unidos, no Brasil, o sistema escravista produzia continuamente libertos, especialmente mulheres e crianças que contribuíam com a sua fecundidade para o crescimento da população fora do cativeiro.[1] Assim, os livres no Brasil nunca foram homogeneamente brancos e a presença ubíqua de negros alforriados ou nascidos em liberdade acenava uma possibilidade factível para parte dos escravos. Porém, a porta da liberdade era controlada pelos senhores, sendo seu privilégio conceder a alforria ou distribuir benesses entre os cativos – e esse era o lastro moral da sua posição. Efetivamente, os cativos foram capazes de reconhecer essa estrutura de poder e rejeitá-la ou lidar com ela. As cada vez mais comuns histórias de ascensão de ex-escravos à libertos e senhores de outros escravos são um testemunho poderoso da capacidade de aliciamento dos subalternos na sociedade escravista brasileira, na qual os senhores brancos eram a minoria demográfica.[2] Leia Mais

Passado a limpo: o estado capixaba e o seu mito fundador | José Pontes Schayder

Passado a limpo: o estado capixaba e o seu mito fundador é o mais novo livro do historiador capixaba José Pontes Schayder. Lançado em edição própria, o livro chega para os historiadores locais, intelectuais diletantes e demais interessados na história do Espírito Santo no ano de 2017. A densa obra é resultado de longos anos de pesquisa do autor sobre a história capixaba e revela um pesquisador amadurecido em comparação aos seus livros anteriores. Em formato de ensaio, o livro é um esforço de síntese monumental que se estende por 516 páginas apoiadas em vasta bibliografia documental e também numa erudição historiográfica formidável sobre o que se considera atualmente a história do Espírito Santo.

O objeto principal do livro é refletir e propor como problema o mito fundador da história (e também da historiografia) capixaba. Nesse sentido, o leitor é convidado a conhecer o personagem histórico Vasco Fernandes Coutinho para além de sua tradicional roupagem historiográfica e assim fazer a sua devida crítica. Orbitando a figura do capitão donatário, o leitor é apresentado ao que se sabe de concreto sobre o personagem histórico e como foi a historicidade de sua construção no seio da historiografia capixaba. Schayder nos apresenta uma nova forma de interpretar a história capixaba a partir da chave do mito fundador, que para ele é resultante de um constante e secular esforço de criação narrativa de historiadores em aliança com as tradicionais elites que forjaram o estado capixaba. Leia Mais

Ser jornalista no Brasil: identidade e formação acadêmica | Fernanda Lima Lopes

Ler o livro Ser jornalista no Brasil. Identidade profissional e formação acadêmica é, sem dúvida, muito estimulante para quem estuda o jornalismo no país. A busca da autora por respostas sobre esse grupo de agentes sociais com lugar privilegiado no ambiente midiático é a de muitos estudantes e pesquisadores da área. A investigação foi desenvolvida ao longo de seis anos, na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e a publicação abarca parte dos resultados encontrados. Fernanda Lopes tem se dedicado ao eixo do ensino em suas pesquisas empíricas e faz teoria e prática dialogarem em vários tópicos essenciais para responder a essa pergunta tão pouco esclarecida: “Afinal, quem é o jornalista brasileiro?”.

Para justificar sua pesquisa, Lopes lembra que as prerrogativas profissionais do bacharel em jornalismo estão sempre sob tensão e problematizadas. Sua intenção é, entre outras questões, investigar por que a formação acadêmica do jornalista é tão questionada. No caminho para essas respostas, muitos atores sociais dessa polêmica são colocados em diálogo pela autora, como os membros da academia, de entidades de classe, do mercado de trabalho, empresários, enfim, todos esses que ajudam a construir a identidade profissional do jornalista. Segundo a autora, nos momentos em que os sentidos que permeiam a identidade desse profissional, sobretudo devido a tensões entre esses atores, ficam mais evidentes, os valores que ajudam na investigação também sobressaem. Leia Mais

A fotografia amazônica de George Huebner | Andreas Valentin

O livro que temos em mãos, resultado de tese de doutorado defendida na UFRJ, é uma bem-vinda contribuição que interessará especialmente aos estudiosos da história da Amazônia e da fotografia brasileira. Seu autor, Andreas Valentin, persegue, desde uma abordagem da história social, os feitos de George Huebner. Tal era um exímio fotógrafo alemão que, nos últimos anos do século XIX, estabeleceu-se em Manaus, legando importante conjunto de imagens da Amazônia da era da borracha.

Antes de falar mais do fotógrafo, Valentin prepara o terreno, fornecendo elementos que contribuem para uma avaliação minuciosa da atuação de Huebner. O autor demonstra como na cidade natal desse personagem, Dresden, estabeleceu-se uma sólida indústria da fotografia. Tais empresas desenvolveram desde muito cedo atividades de ensino e pesquisa, estimulando assim a formação de profissionais e o aperfeiçoamento dos artefatos. De modo concomitante à popularização da imagem fotossensível, um grande número de fotógrafos partiu para todos os cantos do mundo, propagando assim retratos e vistas de povos e locais os mais longínquos da Europa. Desde a consolidação do Estado alemão os profissionais daquele país se lançaram à captura dessas imagens. As técnicas fotométricas – relacionadas intimamente à mentalidade racista, ao domínio colonial, e à formação de uma ciência nascente, a etnologia – foram a linguagem corrente na constituição dos retratos desses outros. Os de Huebner cujo foco é a população ameríndia que encontrou na Amazônia não escapariam, na maior parte das vezes, desse tipo de enquadramento. Leia Mais

História das Estatísticas Brasileiras (1822-2002) | Nelson Senra

O IBGE, entre 2006 e 2009, editou os quatro volumes da coleção “História das Estatísticas Brasileiras”, cobrindo o período de 1822 a 2002. Seguia, com essa iniciativa, uma tendência internacional, o surgimento, em modo contínuo e sistemático, das pesquisas sócio-históricas das estatísticas. As estatísticas são mostradas em diferentes modos, sendo associadas à formação dos estados, e das sociedades, ora com foco nos estados nacionais, ora em foco com espaços internacionais, quando congressos e seminários são estudados. As relações com as ciências, e com as técnicas, são realçadas, seja delas se valendo, seja ajudando-as a avançarem. E não se está falando apenas da ciência (ou técnica) estatística, mas de um amplo espectro de ciências, como a economia, a sociologia, a antropologia, entre outras, sem olvidar a demografia. E dois pontos merecem destaque, já de pronto.

Primeiro, o fato dessas pesquisas, num novo “campo de pesquisa”, serem, no caso brasileiro, uma iniciativa interna do IBGE, ao passo que em outros países, em geral, ela é feita em ambientes acadêmicos. A razão, ao que nos parece, resulta da localização dos documentos pertinentes, ou seja, na grande maioria dos países, essa documentação configura fundos nos Arquivos Nacionais, de grande domínio dos estudiosos, ao passo que, no Brasil, em sua quase absoluta totalidade integra o acervo do IBGE, que nunca restringiu seu manuseio, mas também nunca o estimulou nas academias, afora que ele, só agora, vem recebendo um tratamento à semelhança dos arquivos públicos, o que irá facilitar o acesso. Assim, afora essa ação sobre os acervos, faltava uma ousada revelação da importância dessa temática, e não apenas no sentido da história da instituição, mas da própria história nacional. Leia Mais

Educação e Psicanálise | Rinaldo Voltolini

São inúmeras as tentativas de conexões e de diálogos entre os campos da psicanálise e da educação. Desde Freud, a psicanálise busca evidenciar uma nova face da educação, propondo uma outra relação entre os dois campos. Sabemos que se a versão profilática da interação já foi, há muito tempo superada, ainda restam interpretações funcionalistas que, em tempos de pedagogias tecnicistas, tornam cada vez mais necessária a discussão sobre as condições e as possibilidades das interfaces deste litoral.

Pois esta é a proposta do livro Educação e Psicanálise, do psicanalista e professor da Faculdade de Educação da USP, Rinaldo Voltolini. Atualizando reflexões de Freud e de Lacan para os dias de hoje, Rinaldo começa propondo uma profícua reflexão acerca dos termos educação e educar, demonstrando na argumentação que é: “[…] como posição discursiva e não mais como um campo outro de conhecimento sobre o qual se deveria aplicar a psicanálise que a educação encontra sua elaboração maior na teoria analítica” (Voltolini, 2011, p. 12-13).

O livro articula uma bela discussão acerca do propalado caráter impossível da arte de educar. Ora, educar, da mesma forma que governar e psicanalisar, é considerado um ofício impossível exatamente pelo paradoxo que se instala na posição daquele que se incumbe dessa tarefa. A discutida relação transferencial com o aluno, com os governados e com os analisantes, exige que o saber apostado na relação seja sempre suposto, pois quando a condição da falta se ausenta na mediação destas relações, ocorrem as fissuras transferenciais. A noção da impossibilidade, portanto, fica evidenciada na paradoxal posição de estar no lugar de suposto saber, porém, sem a apropriação imaginária desta condição, a fim de não impedir a presença da dimensão da falta e da castração.

A impossibilidade também está presente em outro tema caro à educação e à psicanálise, o mal-estar na cultura. A incompletude da satisfação pulsional e os avatares da civilização levam os sujeitos, não raras vezes, a depararem-se com a impossibilidade da civilidade absoluta. Neste sentido, a busca da potência e da não castração são as outras faces desse mal-estar constitutivo do humano.

O autor, imbuído de vasta experiência no trato com educadores e com instituições, filia-se ao pensamento freudiano, deixando decantar, em sua produção, a valiosa química que articula o indissolúvel par: prática e teoria. Ao referir-se ao mal-estar na educação, filho direto do mal-estar na cultura, Voltolini assevera que algo “cai” no percurso da construção da civilidade do sujeito a bem de poder viver em comunidade. Ele pontua aquilo que, tantas vezes, evoca questões nas instituições educacionais, ou seja, “sempre resta um resto” que resiste à dominação e à tipificação. Nos ímpetos selvagens, há alguma coisa que permanece, apesar da moral civilizada à qual somos submetidos, sendo justamente aí que esbarram as tentativas educativas que visam ao sucesso, pois tal resto resulta inalcançável do ponto de vista estrutural.

O interessante dessas articulações de Voltolini é que ele não se furta em explicar que não se trata de repensar a educação, a fim de mudar de estratégia pedagógica, não há em seu pensamento nenhuma ingenuidade posta a serviço de uma certa higienia na direção do mal-estar na educação. Isso porque, em suas ponderações, fica evidente que não há qualquer intenção em propor modos de esgotar o mal-estar na educação. Pelo contrário, o autor compartilha da noção freudiana de que o mal-estar é a condição de criarmos cultura e civilização. Quesito no qual o autor é categórico: caso o projeto pedagógico ambicione algum modo de esgotar a tensão entre o sujeito e cultura fatalmente irá fracassar. Sem a cultura nos restaria somente a barbárie, o gozo absoluto e destruidor, mas é justamente esse resquício que escapa aos movimentos civilizatórios e que norteia as possibilidades de gozo no âmbito da cultura.

Neste mesmo diapasão, reside a noção de que a educação é um campo cheio de paradoxos, cuja insatisfação constante deve ser tomada, como efeito da impossibilidade enquanto condição permanente do ato de educar. Kupfer (2007, p. 14) aponta que,
O sonho de uma educação psicanaliticamente orientada e por isso capaz de contribuir para o progresso da humanidade deixa de fazer sentido. Somos perversos de nascimento; o máximo que a educação pode fazer é esforçar-se para transformar o ‘humus de nossas piores disposições’ em algo que preste, e isso os educadores já fazem há séculos.

Aproveitemos para esta discussão, o fato de que as boas produções da cultura estão sempre a nos brindar com problematizações prenhes de questões caras às nossas inquietações. Exemplo disso é o clássico Laranja Mecânica de Stanley Kubrick (1971) – filme que narra a história de Alex, um jovem líder de uma gangue que comete uma série de atos de violência gratuita. Durante um dos episódios de vandalismo que sua gangue protagoniza, Alex é preso, porém recebe a opção de participar de um programa que pode reduzir o seu tempo na cadeia – um programa experimental para recuperar criminosos. O rapaz vira cobaia de experimentos para refrear os impulsos destrutivos do ser humano, que acabam levando-o à extinção do livre-arbítrio, desumanizando-o.

Kubrick (1971) explorou, na narrativa, a crítica que desenvolveu acerca do uso da terapia comportamental como um modo de acabar com o problema da delinquência, uma forma de reprimir totalmente os impulsos agressivos. Problematizou esse caminho, abrindo uma série de reflexões sobre os paradoxos contidos na tentativa de erradicar a dimensão pulsional do humano. Ao trazer à tona o assunto da delinquência, o diretor acabou por discutir, em diversas cenas, o contraponto civilização/barbárie. Através de inúmeros elementos estéticos que produzem, no espectador, um curto-circuito visual e que fazem alusão à condição estrutural de tensão entre o sujeito e a civilização, Kubrick revisita de diferentes formas o tema do mal-estar. Na exploração fílmica que faz, ecoam questões sobre o que pensar do humano quando as conquistas civilizatórias não garantem nada com relação à felicidade, tampouco com relação às interações com outros.

Podemos dizer que, em direção semelhante, o livro de Rinaldo Voltolini problematiza a tensão entre o sujeito e a cultura, atualizando-a através da discussão sobre o mal estar na educação atual. Conforme Voltolini, “A educação mais bem-sucedida é a que fracassa, permitindo que a nova geração introduza o novo” (Voltolini, 2010, p. 56).

O autor lembra que é em um certo fracasso da tradição, que se forja o novo da geração que chega. Para problematizar essa provocação, trazemos algumas filigranas de Hannah Arendt (2001) no livro Entre o Passado e o Futuro. Lá, a filósofa diz que a crise da educação revela, sobretudo, uma crise na relação do sujeito moderno com o passado e com a história. O problema, segundo ela, é que toda a educação necessita de uma dose de tradição. Isto é, será somente no encontro com o velho que a geração que chega poderá construir o novo, em termos de ação. Ao falarmos do novo, evocamos necessariamente os temas da herança e da transmissão, ou seja, tradição e inovação são invocados para pensar os laços na e da educação (Gurski, 2012).

Ora, uma das principais ideias que, há muito tempo, acompanha o conceito de educação vem ancorada na noção de liame entre os diferentes tempos, ou seja, na noção de continuidade da produção humana. A transmissão é o fino fio que liga, interliga e possibilita que passado, presente e futuro possam estar aninhados, dando-nos, a noção tão cara de que algo de nossos feitos continua na geração que chega. Neste sentido, gostaríamos de associar a fala do autor também a alguns fragmentos do desconstrucionismo [1] de Jacques Derrida.

O filósofo francês estabeleceu um genuíno diálogo com a psicanalista e historiadora francesa Elizabeth Roudinesco (Derrida; Roudinesco, 2004, p. 9), através do qual apresentou o âmago de suas teorizações acerca do tema da herança: “Trata-se de escolher sua herança, segundo seus próprios termos: nem aceitar tudo, nem fazer tábula-rasa”. Ou seja, a melhor maneira de ser fiel a uma herança é ser-lhe infiel, isto é, “[…] não recebê-la à letra, como uma totalidade, mas antes surpreender suas falhas” (Derrida; Roudinesco, 2004, p. 11).

Talvez possamos pensar que é deste modo que a psicanálise pode ser potente quando se encontra com a educação. Ao referir-se à impossibilidade estrutural da educação, a psicanálise aponta para algo maior que a figura do professor, por exemplo. O que implica perceber que a relação aluno-professor, longe de ficar restrita às questões relativas ao conteúdo ministrado e às boas intenções do docente, passa necessariamente por inúmeras questões inconscientes relativas ao sintoma e à posição na relação com o Outro [2] de cada um, no caso do professor e do aluno.

O autor mostra, na delicada trama que estabelece entre sua experiência enquanto psicanalista e educador e a tradição da letra freudiana, a facilidade com que esse impossível é tomado no registro da impotência pelos educadores; em geral mesmo como uma “[…] confirmação das dificuldades de uma educação específica qualquer” (Voltolini, 2011, p. 25). Nesse sentido, é muito recorrente que os professores paralisem-se narcisicamente frente às dificuldades dos alunos. Ao se deixarem levar pela simplificação da noção de educação e, muitas vezes, confundirem o ato de ensinar e o ato de educar, acabam por se sentirem meros instrumentos da absorção de conhecimentos. Tal processo os coloca em posição de não implicação com as dificuldades escolares do aluno.

Lajonquière (2010) sugere que talvez seja possível esperarmos outra coisa da pedagogia com relação à educação se apostarmos “[…] em gente comum disposta a falar com as crianças – ao invés de falar sobre elas de forma pedagógica – e convicta de que a educação está atrelada às mesmíssimas condições de possibilidade para vivermos na polis sem nos comermos uns aos outros” (Lajonquière, 2010, p. 123-124). Posição que infelizmente, sabemos que não é a tônica das instituições educacionais.

Nosso grupo de pesquisa [3] tem experienciado uma atividade de extensão com os adolescentes de uma escola pública no arquipélago da cidade, onde trabalhamos com cinema e psicanálise. Lá, nos deparamos com muitas das questões evocadas pelas letras de Voltolini, uma das mais impactantes foi justamente a facilidade com que o impossível estrutural inerente à tarefa de educar acaba submetido ao registro da impotência pelos professores e funcionários da escola. Era recorrente, no discurso dos professores, a queixa acerca das vicissitudes dos adolescentes. Dentre as questões trazidas, encontrava-se a falta de interesse ou ainda as dificuldades que apresentavam no aprender, sem que em nenhum momento, lhes ocorresse evocar qualquer questão acerca das possíveis implicações com tais fraturas e falências no que avaliam como os processos de ensino-aprendizagem.

Os domesticáveis eram logo tratados como alunos-problema e, uma vez com tal rótulo, toda a aposta do professor com relação a esse aluno, necessária a qualquer educação, desaparecia numa proporção inversa à construção de sua má fama, como se dele já não fosse possível esperar nada. Associava-se à constituição dos ditos alunos-problema a situação social e econômica desfavorecida das famílias da região.
Estes fatos, entre outros, revelam que precisamos constituir outros analisadores a fim de pensar as variáveis da educação, um acento que possa colocar em questão essas relações de modo a repensar condições que estão sendo percebidas como dadas no ambiente educacional. Entendemos que uma outra concepção de educação passa necessariamente pela possibilidade de resignificar condições atuais que estão postas na ordem do dia nas Instituição Educacionais.

Parece que é justamente acerca de um “outro” olhar que Voltolini argumenta, quando convoca a noção da falta e da castração, advindas da psicanálise, como operadores educativos. Ele adverte que, quando se trata de ensinar, existe uma limitação que não é uma limitação do professor, é uma limitação dada pela própria condição da falta.

Ainda que sejam indiscutíveis os caminhos que traçam a conexão entre a educação e a psicanálise, talvez caiba falar que em alguns momentos tal diálogo pode passar por fraturas. A proposta mais comum de debate entre ambas é atravessada por uma noção de ideais educativos que atropela e desvirtua as contribuições da psicanálise.

Kupfer, no livro Educação Para o Futuro: psicanálise e educação reitera a posição do autor de Educação e Psicanálise quando fala que discurso é o que faz laço social: “Desta perspectiva, educar torna-se a prática social discursiva responsável pela imersão da criança na linguagem, tornando-a capaz por sua vez de produzir discurso, ou seja, de dirigir-se ao outro fazendo laço social” (Kupfer, 2007, p. 35).
Parece-nos que Voltolini ressalta a potência das conexões da Educação e Psicanálise especialmente quando propõe que a psicanálise, ao produzir uma ressignificação do campo da educação está propiciando a quem se aventura em tal empreitada, uma circulação pelas diversas possibilidades que o encontro com o outro pode produzir. Dentre tais potências, sublinhamos o quanto a permeabilidade ao outro pode fazer com que da chamada experiência impossível do educar decante efeitos de sujeito.

Notas

1. Segundo nota de Roudinesco (Derrida; Roudinesco, 2004, p. 9), o termo desconstrucionismo foi utilizado pela primeira vez por Jacques Derrida, em 1967, no texto Gramatologia; é um termo retirado da arquitetura que significa a decomposição de uma estrutura. Consiste basicamente em desfazer um sistema de pensamento hegemônico ou dominante sem nunca aniquilá-lo, destruí-lo: “Desconstruir é de certo modo resistir à tirania do UM […]”.

2. Para tratar da constituição psíquica, Lacan diferencia duas instâncias: o chamado “pequeno outro”, que seria o semelhante, o parceiro imaginário, e o “Outro” (grande Outro), que ele conceitua como a instância simbólica e, portanto, da linguagem, que determina o sujeito, sendo de natureza anterior e exterior a ele; lugar da palavra, do tesouro dos significantes (Lacan, 1985 [1954/55], p. 297).

3. Referimo-nos aqui às pesquisas que acontecem no âmbito do NUPPEC/UFRGS – Núcleo de Pesquisa em Psicanálise, Educação e Cultura que congrega professores e pesquisadores vinculados ao Instituto de Psicologia (UFRGS) e PPGEDU/UFRGS.

Referências

ARENDT, Hannah. Entre o Passado e o Futuro. São Paulo: Perspectiva, 2001. [ Links ]

DERRIDA, Jacques; ROUDINESCO, Elizabeth. De que Amanhã: diálogo. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. [ Links ]

GURSKI, Rose. Três Ensaios sobre Juventude e Violência. São Paulo: Escuta, 2012. [ Links ]

GURSKI, Rose. Meio Século de Mal-Estar. Zero Hora, Porto Alegre, 30 nov. 2012. (Caderno de Cultura) [ Links ]

KUPFER, Maria Cristina Machado. Educação Para o Futuro: psicanálise e educação. São Paulo: Escuta, 2007. [ Links ]

LACAN, Jacques [1954/1955]. Seminário 2: O Eu na Teoria de Freud e na Técnica da Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. [ Links ]

LAJONQUIÈRE, Leandro de. Figuras do Infantil: a psicanálise na vida cotidiana com as crianças. Petrópolis: Vozes, 2010. [ Links ]

LARANJA Mecânica. Direção: Stanley Kubrick. Reino Unido, 1971. 1 DVD (138 min. [ Links ]).

VOLTOLINI, Rinaldo. Educação e Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. [ Links ]

Rose Gurski – Psicanalista, membro da APPOA, Professora do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia UFRGS, Porto Alegre/Rio Grande do Sul; coautora dos livros Educação e Função Paterna (Ed. UFRGS, 2008); Debates Sobre Adolescência Contemporânea e o Laço Social (Juruá, 2012); autora do livro Três Ensaios sobre Juventude e Violência (Escuta, 2012).
E-mail: roselenegurski@terra.com.br

Alice Umpierre – Estudante de graduação em Psicologia (UFRGS), Porto Alegre/Rio Grande do Sul; bolsista IC/PROBIC-FAPERGS; pesquisadora do NUPPEC/UFRGS.E-mail: alice.umpierre@gmail.com


VOLTOLINI, Rinaldo. Educação e Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. Resenha de: GURSKI, Rose; UMPIERRE, Alice. Educação & Realidade, Porto Alegre, v.38, n.2 abr./jun., 2013. Acessar publicação original

Eleições no Brasil: do Império aos dias atuais | Jairo Nicolau

A trajetória dos direitos no Brasil, desde a independência até a atualidade, tem sido abordada de diferentes maneiras por historiadores e cientistas políticos e sociais. No entanto, a maioria desses estudos dedica-se a analisar determinadas épocas históricas ou temas específicos, que se relacionam às mais variadas etapas concernentes ao desenvolvimento da cidadania na sociedade brasileira. De modo geral, no tocante ao Império, tem-se estudado a relação entre direito e escravidão, a atuação da imprensa, como espaço de crítica e manifestação da opinião pública, o acesso à justiça por parte dos imigrantes, as diferenças entre cidadania ativa e passiva, o antilusitanismo, os conflitos entre o Estado, grandes proprietários e indígenas, entre outros assuntos que tocam direta ou indiretamente na questão dos direitos individuais e coletivos. Já sobre a República, encontramos trabalhos que tratam do coronelismo, da abstenção e das fraudes eleitorais, da conquista dos direitos sociais, do trabalhismo, da cidadania regulada pelo Estado, da inserção da mulher no mercado de trabalho, da luta pela reforma agrária, da cidadania limitada dos governos militares, e mais recentemente, do movimento das chamadas minorias e dos excluídos da história. Após 1980, com a redemocratização, a luta pelos direitos dos cidadãos passou a ser um dos temas mais visitados pelos intelectuais brasileiros. São os homens do presente, cobrando contas dos homens do passado, visando construir um novo futuro. Leia Mais

O Mundo em 2050: como a Demografia, a Demanda de Recursos Naturais, a Globalização, a Mudança Climática e a Tecnologia Moldarão o Futuro | Laurence Smith

Editado recentemente pela Editora Elsevier, o livro do geocientista americano, especialista em impactos geofísicos da mudança climática e consultor do governo dos Estados Unidos Laurence C. Smith, com o título em português O Mundo em 2050. O Futuro de Nossa Civilização, a partir do próprio título deixa o leitor curioso a respeito do seu conteúdo.

Smith não se concentra somente em um setor, como o crescimento populacional, ou mesmo, o futuro das fontes energéticas. Ele procura mostrar, com a ajuda da Geografia e da História, como as condições atuais de tratamento da Natureza, deixarão marcas duradouras no futuro.

Para isso, se utiliza de modelos computacionais altamente sofisticados, pois, como se sabe, essas forças – demografia, demanda de recursos, globalização e mudança climática – estão intimamente interligadas, tendo o poder de moldar o nosso futuro. Daí, com a ajuda desses modelos, o cientista acredita ter condições de analisar tendências, convergências e possíveis paralelos entre elas. Pretende, através de uma base científica, formalizar uma ideia do que poderá ocorrer nos próximos 40 anos, a partir das tendências atuais, uma vez que estas poderão ser previstas e extrapoladas para o futuro.

Nas suas pesquisas, Smith chegou à conclusão que o aquecimento ampliado do clima começou no Norte, daí, faz as seguintes perguntas: qual o significado disso para os povos e ecossistemas da região? Quais as suas tendências políticas e demográficas? O que isso representaria no que diz respeito aos vastos depósitos de combustíveis fósseis que se acredita haver abaixo do leito dos seus oceanos? De que maneira se transformaria, por pressões ainda maiores que vem se acumulando ao redor do mundo? Que aconteceria se, como sugerem muitos modelos climáticos, nosso planeta for assolado por ondas de calor insuportáveis, secas e a consequente queda da produção agrícola? Será que haveria a possibilidade de surgir novas sociedades humanas em lugares que, hoje, nos parecem inóspitos?

São essas as questões que o autor tenta responder ao longo da discussão que, como vemos pelo próprio título da obra, trata do futuro do planeta. No diagnóstico desse futuro, o autor analisa, por exemplo, os gases do efeito estufa e a oferta de recursos naturais. O autor tem, ainda, a preocupação de projetar quarenta anos no futuro, estudando de perto o que se passa hoje na natureza e o porquê dos fatos.

Para discutir o futuro é preciso entender o passado. Assim, em ordem histórica de importância, o autor analisa as quatro forças globais que há séculos vem, em processo, contribuindo para moldar o nosso mundo em 2050: a demografia, a demanda por recursos naturais, a globalização e a mudança climática.

Ao tratar da primeira força, a demografia, o autor traz uma série de números a respeito do crescimento populacional, desde o advento da agricultura, quando “havia talvez um milhão de pessoas no mundo”, até os dias de hoje, quando a população mundial chegou aos “sete bilhões em 2011” (p.9). A crescente demanda por recursos naturais e serviços, resultante de uma população mundial que não para de crescer também é motivo de sua análise. O fenômeno da globalização é visto pelo autor, como um conjunto de processos econômicos, sociais e tecnológicos, que está tornando o mundo mais interconectado e interdependente – aí ele percebe implícita uma política cultural e ideológica.

No que tange às mudanças climáticas, faz um histórico do desenvolvimento do efeito estufa que, já em 1820, teve sua existência deduzida pelo matemático francês Joseph Fourier (que deduziu que a terra estava muito mais quente que costumava ser, dada a sua distância em relação ao sol). Smith não deixa de citar, neste sentido, o papel da tecnologia, considerada por ele a quinta força, que pode servir de capacitador ou freio para as quatro forças globais, na medida em que tem condições de corrigir problemas.

A partir desta introdução o autor passa a fornecer ao leitor dados e tendências essenciais que ajudam a entender a dinâmica do desenvolvimento que engendrará a imagem do ano 2050. Para isso, recorre ao debate que os cientistas vêm fazendo em nível mundial e que diz respeito à substituição de combustíveis fósseis por tipos de energias renováveis, assim como a possibilidade de reciclagem e poupança dos citados materiais. Abalizando os prós e contras da utilização de diferentes tipos de energia e matérias primas, Smith não descarta o grande potencial de conflito que poderá se desenvolver na exploração de recursos naturais, como água, petróleo e gás natural.

Nesse sentido, de onde viriam essas novas fontes de energia, em 2050? Através do hidrogênio como nos filmes de ficção científica? Dos biocombustíveis (etanol, a partir da cana ou da beterraba)? Da energia nuclear com seus riscos a saúde pública? Da energia hidrelétrica que gera atualmente 16% da eletricidade do mundo? Da energia eólica ou solar, setores em crescimento, sobretudo em países de altitudes médias e altas?

O autor é conclusivo no que diz respeito ao aumento de fenômenos climáticos extremos ou a elevação do nível do mar, mostrando como a mudança climática conduz a tempestades devastadoras.

Nesta perspectiva, cita a catástrofe que se abateu em 2008 sobre o estado de Iowa, que se destacou como a segunda maior em 136 anos. Em maio do mesmo ano, um tornado de categoria f5 atingiu o estado, além de outros 48 menores, todos eles com vítimas fatais. Enquanto isso, em 4 de junho do mesmo ano, o governado Arnold Schwarzneger anunciou uma grande seca no estado da Califórnia, grande produtor de produtos agrícolas dos EUA. Assim, de repente, a Califórnia se viu em meio a uma crise econômica histórica que atingiu o setor da habitação e os mercados de crédito globais, na eminência de perder mais de 80 mil empregos e U$$ 3 bilhões em receitas agrícolas.

Secas excepcionais castigaram países no mundo inteiro, ameaçando a agricultura e provocando incêndios (p.70), como os que alcançaram a Austrália, matando 200 pessoas. Em Chattisgarh, na Índia, 1.500 agricultores cometeram suicídio porque, com a seca, tiveram suas terras confiscadas pelo não pagamento das dívidas.

Para Smith, o problema central no futuro é que uma parcela crescente da população mundial viverá em locais onde a água, sem dúvida, será escassa. Na página 75, o autor comenta que,

enquanto 8 em cada 10 pessoas tem acesso a algum tipo de água melhorada, essa media global mascara intensas discrepâncias geográficas. Alguns países como Canadá, Japão e Estônia fornecem água potável a todos os seus cidadãos. Outros, especialmente na África, oferecem água potável a menos da metade da sua população. (SMITH, 2011, p. 75)

Outro fato aterrorizante, discutido pelo autor, é que já se pode constatar que cada vez mais multinacionais estão privatizando e consolidando os sistemas de abastecimento de água. Cita três exemplos destas: Suez Veolia Enviromental Services (ex- Vivendi) e Thames Water, que, expandindo-se, transformaram-se em empresas de comercialização de água em todo o mundo em desenvolvimento. Em 2009 a Siemens pagou um U$$ bilhão pela U.S Filter, maior fornecedor de produtos e serviços para tratamento da água da América do Norte. A General Eletric e a Dow Chemical também estão entrando no ramo da água (p.77) ao lado da Nalco, ITT e Danaher Corporation.

Contrariando o senso comum, o crescimento populacional e a industrialização representam, para o suprimento de água global, um desafio ainda maior que a mudança climática. O fornecimento de uma quantidade adequada de água para essa produção, a expansão dos parques industriais e, paralelamente, a necessidade de manter a água limpa nesse processo, será, para o autor, o grande desafio do século.

Ao considerar as mudanças climáticas o autor se concentra na análise da elevação das temperaturas no Norte, fato que está ocorrendo mesmo no período do inverno e em altíssimas altitudes. Ele afirma que qualquer processo de mudança climática “é errático ao longo do tempo” (p.104). A mudança climática apresenta ainda um segundo fato: a sua geografia nem sempre é global e nem sempre tende ao aquecimento. A mudança climática não é apenas errática no que diz respeito ao tempo, mas também em termos geográficos. Outro fato é que a mudanças climáticas ocorrerão diferentemente no globo, assim como as situações a elas ligadas: quando existe um aumento de temperatura em um local, não significa que em todos os lugares do globo ela sofra o mesmo aumento. Em alguns locais poderá ocorrer um aumento mais acentuado e em outros poderá ocorrer até mesmo um resfriamento.

O segundo cenário considera igualmente uma população mundial estabilizada e uma pronta adoção de novas técnicas de produção de energia, advindas tanto dos combustíveis fósseis como de combustíveis não fósseis. O terceiro cenário pressupõe um mundo heterogêneo, com forte crescimento populacional, um lento desenvolvimento econômico e uma lenta transição para novas tecnologias que produzam energia.

Smith mostra, ainda, de forma clara, que a mudança climática será bem mais pronunciada na região Norte. Em 2007 foi comprovado que 40% da calota polar derreteu, desaparecendo em questão de meses. Os modelos climáticos existentes não haviam previsto um fenômeno como esse, até pelo menos em 2035. Tais modelos não acompanharam a rapidez que o fenômeno se deu de fato. A fauna e a flora também sofreram o impacto dessa mudança de temperatura.

O autor mostra a mudança de comportamento do urso polar cujo lar é o gelo flutuante, onde caça, dorme e se acasala. O urso polar não hiberna no inverno. No verão, quando o gelo se desintegra e diminui, eles são forçados a migrar para a terra, por conseguinte sendo forçados a jejuar até a volta do gelo. Com isso, em 2004, foram confirmadas pelos biólogos três ocorrências em que ursos polares caçaram e comeram uns aos outros. O que significa dizer que a cadeia alimentar como um todo – do microscópico fitoplâncton ao urso polar –, que está intrinsecamente associada à presença do gelo oceânico está sendo prejudicada.

Não se pode esquecer que seres humanos também dependem do gelo, como os esquimós que vivem no litoral do Oceano Ártico, caçando focas, ursos polares, baleias, e outros peixes, onde já se vê uma mudança de hábitos. Milhares de quilômetros de distancia, nem por isso se entregam ao desespero. Toda essa discussão precedente levará o autor ao ponto principal, ou seja, as consequências dessa situação de aquecimento global e esgotamentos das fontes de energia tradicionais para os oito países que estão na zona do ártico: Rússia, EUA, Canadá, Islândia, Noruega, Finlândia, Dinamarca e Suécia, que terão possibilidades de se beneficiar, haja vista as riquezas do subsolo da região e outros valiosos recursos naturais. A partir dessas novas previsões, esses países estão, pelo menos, avaliando a implementação de novos esquemas na região.

Ampliando suas análises a respeito de 2050 o autor calcula que: a) a população mundial terá aumentado neste ano quase 50%, formando aglomerados urbanos próximos as latitudes mais baixas e quentes do planeta; b) estão surgindo países com grande potencial econômico como China, Índia e Brasil; c) grande parte da população viverá nas cidades e estará mais velha e mais rica; d) a água em muitos locais se tornará escassa; e) cidades sofrerão com a elevação do nível do mar; f) a agricultura irrigada praticamente não existirá.

Comprovadamente, o livro de Laurence C. Smith vale a pena ser lido. Escrito de modo fascinante o livro mostra metodologicamente as consequências socioeconômicas que derivam das mega-tendências do desenvolvimento mundial até o ano 2050, se valendo, para tanto, de dados respaldados em estudos econômicos, sociológicos, ecológicos e geológicos. O livro impressiona ainda pela abundancia de dados apresentados de forma clara e inteligente, numa leitura leve que não cansa o leitor (apesar das interligações feitas entre passado, presente e futuro). É leitura obrigatória para aqueles que se preocupam com a história ambiental e o futuro do planeta.

Ana Maria Barros dos Santos – Doutora pela Universidade Friedrich Alexander Erlangen-Nurnberg (Alemanha). Professora do Departamento de História da Universidade Federal de Pernambuco. AMBS/UFPE.


SMITH, Laurence C. O Mundo em 2050: como a Demografia, a Demanda de Recursos Naturais, a Globalização, a Mudança Climática e a Tecnologia Moldarão o Futuro. Trad. Ana Beatriz Rodrigues. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Resenha de: SANTOS, Ana Maria Barros dos. CLIO – Revista de pesquisa histórica. Recife, v.30, n.1, jan./jun. 2012. Acessar publicação original [DR]

Capoeira – The History of an Afro-Brazilian Martial Art | Matthias Röhrig Assunção

A produção intelectual sobre capoeira tem crescido vertiginosamente, no Brasil e no exterior. Em meio a esse aumento de publicações e pesquisas sobre a temática, o livro do historiador Matthias Assunção, Capoeira – The History of an Afro-Brazilian Martial Art, merece destaque pelas questões levantadas. Assunção, que nos últimos quinze anos é membro do corpo docente da Universidade de Essex, na Inglaterra, se configura hoje como um dos principais expoentes nos estudos sobre capoeira.

No livro em questão, o autor estabelece um grande panorama da situação da capoeira desde o século XIX até os dias de hoje. O fio condutor da análise constitui-se em perfazer os caminhos pelos quais uma brincadeira de escravos marginalizada e temida “arma corporal” se tornou o jogo da moda de ‘descolados’ pelo mundo todo. Leia Mais

Brasil e China na Globalização | Marcos Cordeiro

O texto coloca a diferença de inserção do Brasil e da China no contexto neoliberal principalmente no período de 1980 a 2006, onde o primeiro cresceu cerca de 2,5% (Produto interno) e o segunda 10% (Produto interno). No Brasil, além da crise da dívida externa e crise fiscal foram adotadas as políticas neoliberais, que consistiam na liberalização do mercado, privatização de empresas, resultando em estagnação, nesse contexto o Brasil seguia o “Consenso de Washington”. Na China foi implementado um acelerado e moderno crescimento, mecanismos de mercado, tais como o investimento externo, também uma estratégia de liberalização, esses sob o controle do Estado, o modelo chamado de “Consenso de Pequim”, o mesmo também foi analisado por Joshua C Ramo, ex diretor da revista Times, que antes encontrou estruturas políticos sociais importantes por de trás de uma estratégia de desenvolvimento econômico. Leia Mais

As relações em eixo franco-alemãs e as relações em eixo argentino-brasileiras: génese dos processos de integração | Raquel Cristina de Caria Patrício

O livro ora apresentado é resultado da tese de doutoramento da autora apresentada ao Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília no ano de 2005, cujo reconhecimento a equivalência da tese pela Universidade Técnica de Lisboa já fora realizado. Obra de fôlego, trás em seu bojo a tarefa de reescrever o velho e apresentar um novo olhar, a partir da teoria das relações internacionais, sobre os processos de integração europeu e sul-americano.

O ponto de partida é o biênio 1870-1871, período que corresponde a um rearranjo de forças, tanto para as relações entre França e Alemanha, quanto para Argentina e Brasil. Por um lado, a unificação alemã após a guerra franco-prussiana marca o surgimento de um Estado centralizado e forte economicamente a fazer frente aos interesses hegemônicos da França, por outro, a Guerra do Paraguai consolida o fortalecimento político argentino – antes fragmentado – e a reestruturação da órbita de influências na Bacia do Prata. A partir deste contexto, busca-se reconstruir o longo caminho pelo qual estes países realizaram seus processos de aproximação e dessa forma, avaliar: primeiro a possibilidade de se equiparar o papel das relações bilaterais entre os casos de Argentina- Brasil e Alemanha-França em relação aos respectivos processos de integração; segundo, considerar em ambos os casos as relações bilaterais como relações em eixo; por fim, saber se é possível creditar aos dois eixos, a função de elemento determinante da gênese dos processos de integração. Leia Mais

Esquizohistoria, La Historia que se enseña en la escuela, la que preocupa a los historiadores y una renovación posible de la historia escolar – De AMÉZOLA (AIHE)

El libro de Gonzalo De Amézola es el primero de una colección especializada que dirige el autor sobre la Formación Docente en Historia, inaugurada por la editorial Libros del Zorzal. A través de ella, procura “transformar la enseñanza de la historia en una forma especial de pensar que permita a los jóvenes comprender mejor el presente acudiendo a los saberes, la imaginación y el esfuerzo de los docentes” 1. Como bien señala, de estos temas se ocupa muy poco la inmensa mayoría de los historiadores en Argentina, por esa razón aún escasean en el país, a diferencia de lo que ocurre en España por ejemplo, los estudios de corte empírico acerca de lo que ocurre efectivamente en las aulas con el proceso de enseñanza de la historia. Dada esta situación actual, esta obra resulta original porque reflexiona en un nivel teórico y práctico acerca de cuáles son los problemas que enfrentan concretamente los profesores.

El autor está a cargo de la cátedra “Planeamiento didáctico y prácticas de la enseñanza” de la Universidad Nacional de La Plata y desde allí ha podido realizar observaciones cotidianas que se plasmaron en diversos trabajos. El título, Esquizohistoria, hace referencia a un artículo escrito en 1992 con Ana Barletta que pretendía graficar  una situación de disociación (típica de la esquizofrenia) que se producía entre la historia que preocupaba a los investigadores y la que se enseñaba en la escuela. Allí planteaban la distancia que existía entre la visión del pasado que traían los jóvenes de su educación secundaria y la que se les presentaba en la facultad, a la vez que notaban una dificultad similar cuando los estudiantes estaban por terminar su carrera y debían retornar a la escuela como docentes. Concluían que esto estaba relacionado con la incapacidad de la disciplina histórica para enseñar a pensar a los alumnos secundarios, por un lado, porque la historia se había transformado en un conocimiento especializado, lo que dificultaba la definición de una nueva historia escolar, y por el otro, porque la escuela obturaba toda innovación con los preceptos que se ocupaba de eternizar en las aulas. Leia Mais

Transformação e Crise na Economia Mundial | Celso Furtado

Em fins de 2006, a Editora Paz e Terra lançou, em forma de livro, dez artigos de Celso Furtado, escritos ao longo dos anos sessenta, setenta e oitenta do século passado, sobre economia mundial. Especificamente, os artigos concentram-se nas modificações do cenário externo após o fim da segunda grande guerra mundial. Sobre o fio condutor destes textos, que contém, de modo geral, as mesmas idéias-força desenvolvidas de modo distinto ao longo dos anos em que escrevia, Furtado escreve:

“A idéia central, desenvolvida ao fio de dois decênios, é simples: as modificações políticas causados pelo segundo conflito mundial conduziram à integração dos mercados das economias capitalistas industrializadas, reduzindo a capacidade reguladora dos estados-nacionais, e aumentando a autonomia de ação das grandes empresas. (p.9-10)” Leia Mais

Brasil e Argentina: um ensaio de história comparada (1850-2002) | Boris Fausto e Fernando J. Devoto

Brasil e Argentina padecem de certa insuficiência de desenvolvimento econômico e social, sendo a maior parte dos problemas derivada de erros de gestão macroeconômica e de escolhas infelizes de suas elites políticas ao longo dos anos de formação das nações respectivas e dos momentos de ajuste aos desafios externos, no decorrer do século XX. Durante muito tempo, prevaleceu no Brasil a noção de que a Argentina era bem mais desenvolvida, graças a um maior componente “europeu” na sua formação étnica e aos maiores cuidados com a educação do seu povo. Depois, prevaleceu na Argentina a noção de que o Brasil foi mais bem sucedido na industrialização e no fortalecimento da base econômica, graças ao maior envolvimento de seu Estado na gestão macroeconômica, em lugar do liberalismo praticado naquelas margens da bacia do Prata. Hoje, se pretende avançar no desenvolvimento conjunto, mediante o Mercosul, mas as salvaguardas e os desvios ao livre comércio demonstram os limites da integração econômica.

Essas visões, parcialmente corretas, decorrem de uma complexa realidade, que é examinada, com lentes cuidadosamente focadas nas particularidades nacionais, por um historiador de cada um desses dois países, que colocam em perspectiva comparada, mas não necessariamente em paralelo, duas trajetórias comparáveis, na forma e no conteúdo. Eles se baseiam, neste empreendimento inédito na historiografia regional, em metodologia proposta há muitos anos pelo historiador francês Marc Bloch, que recomendava o estudo de sociedades próximas no espaço e no tempo, buscando não apenas as semelhanças, mas também as diferenças. Este “ensaio de história comparada” começa, justamente, por um excelente capítulo introdutório que discute as vantagens e modalidades do comparatismo em história. Leia Mais

Justiça e Cidadania / Estudos Históricos / 1996

Vários fenômenos deste fim de século contribuíram, e continuam a contribuir, para recolocar o problema da cidadania na ordem do dia, tanto nas novas democracias como nas antigas. A redemocratização de vários países na América Latina e na Europa, sobretudo do Leste, fez com que a preocupação com os direitos políticos e com a maneira de exercê-los voltasse com toda a força. A crise fiscal do Estado, que atinge indiscriminadamente países ricos e pobres, colocou em cheque o Estado de bem-estar e, conseqüentemente, a amplitude e o alcance dos direitos sociais. O processo de globalização econômica, por sua vez, atingiu ao mesmo tempo direitos civis, políticos e sociais. Atingiu negativamente os direitos políticos ao provocar profundas alterações na concepção e na prática do Estado-nação, agora enfraquecido diante do deslocamento de decisões para organismos multinacionais. Atingiu positivamente os direitos civis ao deslocar para a participação social a ênfase antes colocada na participação política. Atingiu um direito social básico, o emprego, ao exacerbar a competividade internacional e o avanço tecnológico, geradores estruturais de desemprego.

Não terminam aí as mudanças. A diversificação da problemática social (etnias, minorias, ecologia), acompanhada (e promovida) por novos movimentos sociais, sobretudo as organizações não governamentais, trouxe à consciência coletiva novos direitos antes não cogitados. Além dos três direitos clássicos sistematizados por Marshall, chamados de primeira e segunda geração, foram propostos, e incorporados a códigos legais, outros como os direitos civis coletivos e os chamados direitos difusos, ligados à preservação do meio ambiente. Pode-se ainda acrescentar o impacto sobre direitos políticos e civis provocado pela sociedade de consumo que transforma cidadãos em consumidores e pela globalização da informação via mídia eletrônica que, se rompe a barreira do controle estatal, também invade a privacidade do indivíduo.

Diante desse quadro, não é de admirar a explosão de estudos, teóricos e empíricos, sobre a problemática da cidadania. Como se viu, não se trata de uma problemática de democracias jovens e imaturas mas de uma questão universal com modulações nacionais. Não deixa de ser um consolo, embora triste consolo, o fato de descobrimos, os latino-americanos, que europeus e americanos do noite estão às voltas com problemas semelhantes, guardadas as especificidades locais. É na verdade uma vantagem o rato de podemos pensar e agir tendo o benefício da informação sobre o que se está passando nos países considerados avançados. Não se trata também de um tema que se possa abranger com o instrumental teórico de uma ou outra disciplina acadêmica apenas. Ele atinge todas as esferas da vida social e exige abordagens diversificadas e inovadoras. Um tratamento compreensivo seria impossível dentro do espaço aqui disponível.

Deu-se ênfase na seleção dos artigos deste número especial de Estudos Históricos ao tema da garantia dos direitos civis, tratando-se secundariamente dos direitos políticos e sociais. A escolha exige justificativa. Como quase todas as análises se referem ao Brasil, país recém-saído de um governo militar e marcado pelas imensas desigualdades sociais, poder-se-ia perguntar se a ênfase não deveria ser posta nos direitos políticos e sociais. Antes de responder, cabe observar que, do ponto de vista da legislação, todos os direitos estão garantidos aos brasileiros. A Constituição de 1988, chamada com razão de cidadã, esmerou-se em incluir todos os avanços atuais na área. Nosso problema se verifica no campo da consciência e da garantia dos direitos. Quanto a isto, não será polêmico dizer que há um conhecimento razoável dos direitos políticos e que seu exercício está razoavelmente garantido pelo sistema eleitoral e partidário. Há, sem dúvida, enormes problemas no gerenciamento do sistema de saúde e previdenciário, mas há igualmente boa noção dos direitos sociais e há uma Justiça do Trabalho a que se tem acesso com celta facilidade. O mesmo não se pode dizer dos direitos civis. O grau de conhecimento desses direitos é mais precário e sua garantia, baseada sobretudo no sistema policial e judiciário, é de longe a mais deficiente.

Além dessa situação desvantajosa dos direitos civis, cabe observar que eles são os direitos fundamentais numa democracia liberal, como é a em que vivemos. Vida, integridade física, propriedade, segurança, liberdade, são direitos básicos que constituem o alicerce de direitos políticos e sociais. São eles que garantem a conquista de outros direitos e sua preservação. Sem segurança pessoal e liberdade de opinião e organização para todos, por exemplo, a participação política será vazia, a política social frágil, a democracia precária.

Dentro do tema da garantia dos direitos civis, salientam-se os estudos sobre o Judiciário. Sinal dos novos tempos, marcados pela perda de influência do Legislativo e até mesmo do Executivo, tendo em vista o enfraquecimento dos Estados nacionais, o Judiciário passa a ver seu papel contestado, redefinido e ampliado. Mais que nunca é colocada em questão a visão rígida da separação dos poderes e se estabelece um processo ainda de contornos indefinidos em que se politiza a Justiça e se judiciariza a política. Ao mesmo tempo, contesta-se a visão positivista do direito e do papel do juiz como mero aplicador da lei, exigindo-se dele a preocupação com a eqüidade social. Esses temas são expostos e discutidos no artigo de Werneck Vianna.

Ainda dentro do tema do Judiciário, Sérgio Adorno demonstra o viés racista da Justiça criminal e o estereótipo que atribui maior tendência à criminalidade entre determinados grupos étnicos. Maria Celina D’Araujo apresenta o que talvez seja a primeira avaliação acadêmica do desempenho dos juizados Especiais. Surgidos como promessa de agilização da Justiça e ampliação de sua acessibilidade, a autora mostra que seu funcionamento está longe de corresponder à promessa inicial. Dois ensaios bibliográficos (Junqueira e Guanabara) avaliam o estado da arte nos estudos sobre o acesso à Justiça e sobre novas visões do direito.

O impacto da globalização sobre o Estado e as identidades nacionais, sobretudo no contexto europeu, é discutido por Guy Hermet. Enquanto na Europa Ocidental o processo de unificação tende a reduzir o peso dos Estados nacionais, a enfraquecer o envolvimento político dos cidadãos e a diluir as identidades nacionais, na Europa Oriental verifica-se o fenômeno oposto. Essas diferenças nacionais no que se refere ao conteúdo da cidadania e às rotas históricas seguidas em sua construção são discutidas por Carvalho, que usa o Brasil do século XIX como exemplo.

Finalmente, o processo social concreto de construção da cidadania é discutido por Sigaud. Usando como exemplo o recurso à justiça do Trabalho por parte de trabalhadores de engenhos de açúcar em Pernambuco, a autora demonstra que a decisão de recorrer ou não às juntas de Conciliação e Julgamento não se explica apenas pelo conhecimento do direito e pela disponibilidade da Justiça. Tem-se que levar em conta também a interveniência de fatores morais.

Papel do judiciário, concepções do direito, acesso à Justiça, estilos históricos e transformações recentes no conteúdo da cidadania, processos sociais de construção do cidadão, são os temas abordados neste número especial. Pequena contribuição à imensa tarefa que se nos apresenta, a um tempo teórica e prática, de construir a comunidade política do século XXI.

José Murilo de Carvalho – Editor convidado.


CARVALHO, José Murilo de. Apresentação. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.9, n.18, jul. / dez. 1996. Acessar publicação original [DR]

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Asclepio | CSIC | 1949

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Asclepio. Revista de Historia de la Medicina y de la Ciencia (Madrid, 1949) una revista científica publicada por eCSIC, editada en el Instituto de Historia del CCHS, consagrada especialmente a la ciencia española, europea e iberoamericana. Publica artículos originales sobre historia de la ciencia, haciéndose eco de las diversas corrientes historiográficas de la disciplina. Está dirigida a un público especializado en historia de la ciencia, pero también a científicos de diversa formación que puedan encontrar en la historia elementos de reflexión epistemológica y social en su quehacer profesional.

Fundada en 1949 con el título Archivo Iberoamericano de Historia de la Medicina y Antropología Médica, comienza a estar disponible online en 2007, en formato PDF, manteniendo su edición impresa hasta 2013, año en el que pasa a ser revista electrónica publicando en formato PDF, HTML y XML-JATS. Los contenidos anteriores están igualmente disponibles en formato PDF.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 0210-4466 (Impresso)

ISSN 1988-3102 (Online) [Coletar 2019-2020]

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Revista do Arquivo Público Mineiro | Belo Horizonte, v.42, n.1, 2006 / v. 51, n.1, 2015. (S)


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v. 51, n.1, jan./jun. 2015.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v. 50, n.2, jul./dez. 2014.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v. 50, n.1, jan./jun. 2014.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.49, n.1, jan./dez. 2013.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.49, n.1, jan./dez. 2012.

 


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.47, n.1, jan./jun. 2011.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.46, v.2, jul./dez. 2010.

 


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.46, n.1, jan./jun. 2010.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.45, n.2, jul./dez. 2009.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.45, n.1, jan./jun. 2009.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.44, n.2, jul./dez. 2008.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.44, n.1, jan./jun. 2008.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.43, n.2, jul./dez. 2007.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.43, n.1, jan./jun. 2007.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.42, n.2, jul./dez. 2006.


Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo Horizonte, v.42, n.1, jan./jun. 2006.

Arquivo Público | APMG | 1895

Arquivo Publico Minas Gerais

A mesma lei estadual que determinou a criação do Arquivo Público Mineiro – APM, em 1895, estabeleceu também a criação de duas publicações para servirem de ferramentas de registro da história mineira: As Efemérides, publicadas em 1897 pela Imprensa Oficial e a Revista do Arquivo Público Mineiro – RAPM (Belo Horizonte, 1895-), que teve o seu primeiro volume em 1896.

A revista circulou até 1913, ficando paralisada por 7 anos, voltou a circular em 1921, 1924, 1927 a 1933 e 1937. Após mais de 30 anos de paralisação, em 1975 voltou a ser editada até 1995.

Já em 1965, o APM deu início a uma série de publicações independentes da RAPM, com o objetivo de divulgar os documentos do seu acervo e contribuir para a elucidação de fatos relativos à história e à cultura mineira. Entre elas estão o caderno Escravidão em Minas Gerais, publicado em 1988, História da Música nas Irmandades de Vila Rica, em 1979 e João Pinheiro – Documentário sobre sua vida, em 1966.

Em 2005, após 10 anos de ausência, a RAPM voltou a ser editada, com novo projeto gráfico e considerável transformação editorial. Tais alterações foram necessárias para o alinhamento da revista aos padrões atuais de publicação acadêmico-científica.

ISSN [?]

[Acesso livre]

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IHGSP | IHGSP | 1895

IHGSP3

A Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (São Paulo 1895-)

Periodicidade anual.

Acesso livre.

ISSN 0100-2953

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IHGACE | IHGACE | 1887

Revista do Instituto do Ceara

A Revista do Instituto do Ceará (Fortaleza, 1887-) é considerada o maior patrimônio gráfico do Ceará, editada desde 1887, ano de fundação do Instituto do Ceará (Histórico, Geográfico e Antropológico), é entregue, anualmente, à sociedade cearense.

Essa Revista, conhecida como a “Revista do Instituto do Ceará”, vem sendo publicada sem qualquer interrupção desde a sua fundação. Consta de trabalhos realizados preferencialmente por seus sócios efetivos no estudo dos assuntos históricos, geográficos e antropológicos voltados particularmente para o Estado do Ceará.

[Periodicidade anual].

Acesso livre.

ISSN 0100-3585

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IHGRS | IHGRS | 1860

Revista do IHGRS1

A Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul – RIHGRGS (Porto Alegre, 1860-) já lançou mais de uma centena de volumes ao longo de mais de 150 anos de publicações.

Sua fundação, pelo Barão de Porto Alegre, foi o título de Revisa Trimensal do Instituto Historico e Geographico da Provincia de S. Pedro.

Desde 1920, ela tem publicações regulares e é um meio relevante para difusão de conhecimentos sobre o Rio Grande do Sul e assuntos ligados à história e desenvolvimento das ciências no estado.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 1678-3484 (Impresso)

ISSN 2595-7031 (Online)

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IHGB | IHGB | 1839

Revista do Instituto Brasileiro

Circulando regularmente desde 1839, a Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Rio de Janeiro, 1839) é uma das mais longevas publicações especializadas do mundo ocidental. Destina-se a divulgar a produção do corpo social do Instituto, bem como contribuições de historiadores, geógrafos, antropólogos, sociólogos, arquitetos, etnólogos, arqueólogos, museólogos e documentalistas de um modo geral.

Periodicidade trimestral.

Acesso livre

ISSN 0101 – 4366 (Impresso)

ISSN 2526-1347 (Online)

Acesse resenhas [Coletar 1960-2000]

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