Revista Brasileira de História. São Paulo, v.44, n.96, 2024.
- Sustentabilidade de Periódicos: Desafios ao Acesso Aberto Editorial
- Meneses, Sônia
- Texto: pt
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- El Tratado de Acobamba (1566) y el Parlamento de Quilacoya (1593): dos capitulaciones interconectadas Artículo
- Gloël, Matthias; Morong, Germán
- Resumo: en es
- Texto: es
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- A monomania de Ahab em Moby Dick (1851), de Herman Melville Artigo
- Felipe, Cleber Vinicius do Amaral
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- “Uma menina baiana, que sabe amar sua pátria”: imprensa e gênero na época da Independência do Brasil Artigo
- Borges, Eduardo
- Resumo: en pt
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- O terror da branquitude: violência e racismo contra os indígenas da Amazônia (século XIX) Artigo
- Henrique, Márcio Couto
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- Texto: pt
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- Saberes sobre cosméticos em vernáculo português do século XVIII Artigo
- Traversa, Eduardo
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Representaciones de la anormalidad a través de la mirada policial: La Revista de los Carabineros de Chile, 1946-1973 Artículo
- León, Marco Antonio
- Resumo: en es
- Texto: es
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- Victoria: “indígena brasileira” ou “parda”? Uma análise da ação de liberdade de uma escravizada e de seus descendentes na vila de Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba, Minas Gerais, 1846 Artigo
- Mori, Robert
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- Texto: pt
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- As escolhas políticas dos afrobrasileiros nas publicações de extrema-direita no Brasil e em Portugal: primeiras décadas do século XX Artigo
- Jacino, Ramatis
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- Texto: pt
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- A democracia na América: perspectivas francesas sobre o governo de Andrew Jackson nos Estados Unidos da década de 1830 Artigo
- Santos Junior, Valdir Donizete dos
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- Texto: pt
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- El Hispano Americano y la propaganda del Perú en Panamá durante la Guerra del Pacífico (1879-1881) Artículo
- Cifuentes, Patricio Ibarra
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- Raça e cultura no pensamento antropológico clássico Artigo
- Petschelies, Erik
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- Texto: pt
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- Ciências sociais e Guerra Fria: As fundações norte-americanas e a agenda racial no Brasil Resenha
- Maia, João
- Texto: pt
- PDF: pt
- Negras formas de atuar artística e politicamente no Pós-Abolição: A trajetória da atriz Léa Garcia pela ótica historiográfica de Julio Claudio da Silva Resenha
- Machado, Ana Carolina
- Texto: pt
- PDF: pt
- A redenção do cativeiro pelos irmãos crioulos Resenha
- Martins, William de Souza
- Texto: pt
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Revista Brasileira de História. Sao Paulo, v.44, n.95, 2024.
- valiação de periódicos para as Ciências Humanas e para a área de História: o que o sistema de avaliação espera dos periódicos e o que a área quer Editorial
- Meneses, Sônia; Sousa, Marcos Eduardo
- Texto: pt
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- Materialidades emergentes: rumo a uma história conectada de objetos nas fronteiras da América colonial Editorial
- Neumann, Eduardo; Wilde, Guillermo
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- Productos importados en las misiones jesuíticas del Paraguay. Economía y circulaciones globales en las periferias del Imperio hispánico (siglos XVII-XVIII) Dossiê
- Svriz-Wucherer, Pedro Omar
- Resumo: en es
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- El libro para la frontera. Producción, circulación y recepción de un texto guaraní entre dos continentes Dossiê
- Vega, Fabián R.
- Resumo: en es
- Texto: es
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- Más allá de los sonidos: intercambios, circulación y valor de los cascabeles en una frontera colonial (Chile, siglos XVI-XVIII) Dossiê
- Cianelli, Laura Fahrenkrog
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- Texto: es
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- Arcos festivos no altiplano andino. Materialidades, arquitetura efêmera e status ontológico Dossiê
- Windus, Astrid; Mardones, Camila
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- Ecos de una imagen itinerante a ambos lados del Atlántico: la Virgen Peregrina de Quito y su recorrido material e inmaterial a lo largo del siglo XVIII Dossiê
- Roca, Facundo
- Resumo: en es
- Texto: es
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- La emergencia del “México Antiguo” o la configuración universal y estética de un pueblo como monumento a fines del siglo XVIII Dossiê
- Sánchez, Alfredo Nava
- Resumo: en es
- Texto: es
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- Por dentro dos cantinhos obscuros: Carmen Dolores, uma feminista em defesa da causa divorcista (1905-1910) Artigo
- Rocha, Ana Vitoria Sampaio Castanheira
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- Texto: pt
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- Um problema historiográfico: a questão dos limites interestaduais no antigo Norte do Brasil Artigo
- Santos, Magno Francisco de Jesus
- Resumo: en pt
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- As fotografias antropológicas do príncipe Roland Bonaparte na era das Exposições humanas: raça, ciência e colonialismo do olhar Artigo
- Barbosa, Cibele
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- Texto: pt
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- Denúncias inconsequentes ao Santo Ofício no Maranhão (1708-1743): as fontes inquisitoriais como práticas etnográficas Artigo
- Abreu, Eloy Barbosa de
- Resumo: en pt
- Texto: pt
- PDF: pt
- Black Rio: música, política e identidade negra Artigo
- Domingues, Petrônio; Medeiros, Carlos Alberto
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Tráfico humano: uma discussão que precisa da História Artigo
- Venson, Anamaria Marcon; Pedro, Joana Maria
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Não é só uma estátua: notas sobre o documentário A arte de derrubar (The Art of Fallism, Aslaug Aarsæther e Gunnbjörg Gunnarsdóttir, Noruega/África do Sul, 2019) Resenha
- Seliprandy, Fernando
- Texto: pt
- PDF: pt
- Violência como jogo: as viradas narrativas no filme Bacurau (2019) Resenha
- Kaminski, Rosane
- Texto: pt
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- Lealdades em disputa: soldados de origem italiana nas forças armadas dos Aliados na Segunda Guerra Mundial Resenha
- Bertonha, João Fábio
- Texto: pt
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Revista Brasileira de História. São Paulo, v.43, n.94, 2023.
- Errata: Revista Brasileira de História – RBH-2023 Errata
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- Apontamentos sobre o uso de AI na produção e na comunicação de pesquisas Editorial
- Meneses, Sônia
- Texto: pt
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- O silenciamento de gênero: a palavra que subverte Debates
- Rovai, Marta Gouveia de Oliveira
- Texto: pt
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- A violência de gênero no (Des)governo Bolsonaro: licença para matar! Debates
- Tavares, Márcia Santana; Alves, Amanda
- Texto: pt
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- Desafiando os cânones nacionais: novas perspectivas e as possibilidades de um futuro antieugênico Dossiê – Confrontando A Eugenia: Novas Perspectivas E Abordagens
- Turda, Marius; Diwan, Pietra
- Texto: en pt
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- A Eugenia entre os séculos XX e XXI: uma discussão necessária Dossiê – Confrontando A Eugenia: Novas Perspectivas E Abordagens
- Góes, Weber Lopes
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- Texto: pt
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- O Mazdaznan, a eugenia e o futuro da “raça branca” Dossier – Confronting Eugenics: New Perspectives And Approaches
- Cleminson, Richard
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- Texto: en
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- O arquivo e a prisão: a premissa de inferioridade dos indivíduos incômodos (Brasil, 1930 – ao tempo presente) Dossiê – Confrontando A Eugenia: Novas Perspectivas E Abordagens
- Borges, Viviane
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- Texto: pt
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- Utopias Eugênicas, Distopias Coloniais-Modernas: uma história transnacional do apartheid de Joanesburgo a Brasília Dossiê – Confrontando A Eugenia: Novas Perspectivas E Abordagens
- Lemos, Guilherme Oliveira
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- Texto: pt
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- Do “Amor duro” à “Briga de rua”: a batalha de Garret Hardin e Cordelia S. May pelo controle populacional e a eugenia na virada do milênio Dossier – Confronting Eugenics: New Perspectives And Approaches
- Chavez-Garcia, Miroslava
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- Eugenia e raça no pós-guerra: o periódico Mankind Quarterly e as teorizações da extrema-direita Dossiê – Confrontando A Eugenia: Novas Perspectivas E Abordagens
- Munareto, Geandra Denardi
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- Texto: pt
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- A substituição nua: o apoio de geneticistas e biotecnólogos à eugenia da Segunda Guerra Mundial ao Projeto Genoma Humano Dossier – Confronting Eugenics: New Perspectives And Approaches
- Donohue, Christopher R.
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- Trauma y Paratraducción: un abordaje histórico del Holocausto en el cómic “El testamento de Magneto” Artículos
- Schurster, Karl; Ferreiro-Vázquez, Óscar
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- Texto: es
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- Assunção de Callado: inserção e modos de engajamento no meio artístico Artigos
- Queler, Jefferson José
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- A guerra da Ucrânia: repercussões historiográficas no contexto da questão nacional Artigos
- Segrillo, Angelo
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- Interesses transatlânticos: acusações, escândalo e negócios (i)lícitos e (i)legítimos – São Paulo, Goiás e Lisboa (1721-1733) Artigos
- Lemes, Fernando Lobo
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- Chamem a polícia? As ruas da cidade e a governamentalidade policial em Lisboa, c.1870-1910 Artigos
- Gonçalves, Gonçalo Rocha
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- Texto: pt
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- Desconstrução da tradição historiográfica sobre as “invasões holandesas”: caminhos para pensar a ocupação neerlandesa seiscentista Artigos
- Costa, Regina de Carvalho Ribeiro da
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- Texto: pt
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- A arquitetura moderna do século 20, tecnologia herdeira da eugenia do século 19 Resenhas
- Gaspar, Natalia Maria
- Texto: pt
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- Por uma história cultural da raça: reflexões urgentes sobre tempos remotos e recentes Resenhas
- Mota, André
- Texto: pt
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- A (des)monumentalização de dom Pedro I no filme A viagem de Pedro (Laís Bodanzky, 2021) Resenhas
- Pinto, Carlos Eduardo Pinto de
- Texto: pt
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- Quando a justiça comove: Argentina, 1985 Resenhas
- Aguiar, Carolina Amaral de
- Texto: pt
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- José Murilo de Carvalho: o sonho frustrado de um país que se realize Memória
- Basile, Marcello
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Revista Brasileira de História. São Paulo, v.43, n.93, 2023.
- Sobre o acesso aberto e as nossas Revistas de História Editorial
- Texto: pt
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- Crítica Anticolonial no Império Português: perspectivas culturais e políticas Dossiê – Artigo Introdutório
- Machado, Adelaide Vieira; Garmes, Hélder; Assunção, Marcello Felisberto Morais de
- Texto: pt
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- Estudos literários africanos e literatura-mundo: reflexão sobre a epistemologia da crítica literária Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Mata, Inocência
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- A literatura e o império lusitano: silêncio e palavra em tempos de exceção Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Chaves, Rita
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- Trânsitos e circulações de mundos: comparar literaturas na África Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Fazzini, Luca
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- Texto: pt
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- Mário Domingues, Ferreira de Castro e a “linha de cor” nas letras portuguesas Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Pereira, Pedro Schacht
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- Querido Pandit Jawaharlal Nehru: Goa e as fundações do movimento indiano de libertação nacional Dossier: Anticolonial Criticism In The Portuguese Empire: Cultural And Political Perspectives
- Lobo, Sandra Ataíde
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- Texto: en
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- Mário Pinto de Andrade: vivências e ressignificações em torno do estudo do kimbundu (Luanda – Lisboa – Luanda, 1940-1950) Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Moreno, Helena Wakim
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- Intelectuais e a censura em Portugal: o caso do livro Luuanda, de José Luandino Vieira Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Macedo, Tania
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- A luta do Regime Fascista Português contra a “subversão” em Moçambique: O jornal Ressurgimento, 1968-1973 Dossiê – Crítica Anticolonial No Império Português: Perspectivas Culturais E Políticas
- Saide, Alda
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- Uma Vila Esclavagista: Proprietários e seus Cativos em Moçâmedes, 1855 Artigo
- Curto, José C.
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- Texto: pt
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- Mitos, categorias e cristais: revisitando os clássicos do movimento homossexual brasileiro Artigo
- Colaço-Rodrigues, Rita de Cassia
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- Texto: en pt
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- Protagonistas de la educación: estudiantes universitarios (as) en Canarias, 1913-1927 Artigos
- González-Pérez, Teresa
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- Texto: es
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- História Ambiental e História Pública: perspectivas para (re)acender o diálogo no Brasil Artigos
- Sevilha, Fabíula
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- Texto: en pt
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- Civilização Cristã ou Laica na Amazônia Oitocentista? O Debate entre Tradição Imperial e Política Científica no Grão-Pará (1870-1880) Artigos
- Moraes, Felipe Tavares de
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- Texto: pt
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- Os malês segundo ‘Abd Al-Raḥmān Al-Baghdādī, um imã otomano no Brasil oitocentista Artigos
- Reis, João José
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- Texto: pt
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- A independência do Brasil por meio de Leopoldina, Maria, Pedro e Thomas Resenhas
- Castro, Rute
- Texto: pt
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- Diante do abismo, observando a história Resenhas
- Nicolazzi, Fernando
- Texto: pt
- PDF: pt
- Derrubando democracias na América do Sul: o projeto hegemônico da ditadura brasileira e o golpe no Chile Resenhas
- Fernandes, Luan Aiuá Vasconcelos
- Texto: pt
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- Hitler na mira das conspirações Resenhas
- Oliveira Neto, Wilson de
- Texto: pt
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Revista Brasileira de História. São Paulo, v.43, n.92, 2023.
- Uma nota sobre os textos e as seções das revistas acadêmicas na área de História Editorial
- Texto: pt
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- Sobre história, sustentabilidade e crise energética Debates
- Miranda, Leila Mourão
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Crise energética, cercamento das águas e resistência: o desafio da construção de comunidades político-epistêmicas Debates
- Ramos Júnior, Dernival Venâncio; Santos, Valéria Pereira
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- Texto: pt
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- Sobrevivendo no inferno: a escrita da história na eco-crise global Debates
- Marques, Leonardo
- Resumo: en pt
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- Na ordem do dia, a representação das minorias: a bancada mineira e o debate sobre eleições em tempos de Conciliação Artigos
- Freitas, Ana Paula Ribeiro
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- “Os torpes Gallicismos, que hoje a feyão muitas traducções”: a influência da língua francesa nas traduções ibéricas da virada do século XVIII para o XIX Artigos
- DeNipoti, Cláudio
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- Texto: en pt
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- “A população precisa conhecer os perigos que corre!”: consumo cinematográfico e retóricas do medo no Rio de Janeiro da Belle Époque Artigos
- Lapera, Pedro Vinicius Asterito
- Resumo: en pt
- Texto: en pt
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- Os camponeses do sertão do Rio de Janeiro: a comunidade camponesa negra e mestiça de Vargem Grande Artigos
- Dória, Júlio Cesar de Souza
- Resumo: en pt
- Texto: pt
- PDF: pt
- Luiza e suas crianças ingênuas: duelo judicial e relações de compadrio em Feira de Santana, Bahia, 1871-1888 Artigos
- Damasceno, Karine Teixeira
- Resumo: en pt
- Texto: pt
- PDF: pt
- Jogos de gênero, maternalismo e política: “uma mulher operária” na Câmara de Vereadores de Porto Alegre (1948-1951) Artigos
- Nunes, Guilherme Machado
- Resumo: en pt
- Texto: pt
- PDF: pt
- Rituais públicos com intervenção de Juan de Albuquerque, primeiro bispo de Goa residente na Ásia. Linguagens de transferência ou de acomodação? Artigos
- Paiva, José Pedro
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- Texto: en pt
- PDF: en pt
- A reforma administrativa portuguesa entre o Estado Novo e a Democracia: continuidades e rupturas (1967-1978) Artigos
- Azevedo, Ana Carina
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- La Mortalidad Infantil durante el Gobierno de la Unidad Popular (Santiago de Chile, 1970-1973) Artigos
- Zúñiga, Pablo Chávez; Peñailillo, Víctor Brangier
- Resumo: en es
- Texto: es
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- A história importa Resenhas
- Cândido, Tyrone Apollo Pontes
- Texto: pt
- PDF: pt
- A Guerra Fria latino-americana revisitada, 1947-1991: continuidade, mudança e ruptura na agenda de pesquisa Resenhas
- Avila, Carlos Federico Domínguez
- Texto: pt
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- As raízes transnacionais da Revolução Cubana Resenhas
- Queiroz, Alexandre
- Texto: pt
- PDF: pt
- Entre direito canônico e tribunal de exceção Resenhas
- Lopes, José Reinaldo de Lima
- Texto: pt
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- Entre antifascismo e antifa: uma conversa com Mark Bray, autor de Antifa Interview
- Schargel, Sergio; Guimarães, Julia de Oliveira Góes
- Resumo: en pt
- Texto: en
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Revista Brasileira de História. São Paulo, vol. 42, n. 91, 2022
- É possível pensar em uma nova política editorial para as Revistas na área de História? Editorial
- Slemian, Andréa; Franco, Renato
- Texto: PT
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- As independências no Brasil e na América Hispânica. História, memória e historiografia 200 anos depois Dossiê – Independência, Independências
- Silva, Ana Rosa Cloclet da; Cid, Gabriel
- Texto: PT
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- El derrumbe de la Monarquía Española en el Nuevo Reino de Granada y en Nueva España, 1819-1821 Dossiê – Independência, Independências
- Ardila, Daniel Gutiérrez; Gutiérrez, Rodrigo Moreno
- Resumo: EN ES
- Texto: ES
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- Cartas Pastorais Constitucionais no contexto da Independência do Brasil: dioceses setentrionais (1822) Dossiê – Independência, Independências
- Santirocchi, Ítalo Domingos
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Las independencias iberoamericanas a debate: reflexiones sobre revoluciones y liberalismos en la década de 1820 Dossiê – Independência, Independências
- Frasquet, Ivana
- Resumo: EN ES
- Texto: ES
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- Liberdade e medo: o impacto das ideias liberais no Rio de Janeiro do Primeiro Reinado Dossiê – Independência, Independências
- Ribeiro, Gladys Sabina
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Pela “Santa Causa do Brasil” e contra a “imprudência, o despotismo e a violência dos ouvidores”: a atuação dos índios no contexto da construção do Brasil independente (Vila Verde – Bahia, 1822-1830) Dossiê – Independência, Independências
- Cancela, Francisco
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Os reflexos das disputas platinas em Santa Catarina durante o processo de Independência do Brasil Dossiê – Independência, Independências
- Schmitt, Ânderson Marcelo
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Soberania, poderes de Estado e autonomia provincial na época da Constituinte de 1823: concepções “liberal-moderadas” em Miguel do Sacramento Lopes e José Bernardino Batista Pereira d’Almeida Dossiê – Independência, Independências
- Leme, Marisa Saenz
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Do centro às províncias: projetos de independências e o debate de ideias pelo periodismo (Rio de Janeiro – Bahia) Dossiê – Independência, Independências
- Meirelles, Juliana Gesuelli; Carvalho, Marieta Pinheiro de
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Homens, mulheres e crianças na ocupação dos vales dos rios Purus e Acre: aspectos sociais na Amazônia sul-ocidental de 1889 a 1904 Artigos
- Klein, Daniel da Silva
- Resumo: EN PT
- Texto: EN PT
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- Nação, infância e seus outros: literatura infantil brasileira do século XIX ao início do XX Artigos
- Hansen, Patricia Santos
- Resumo: EN PT
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- Deslocamentos e construção estatal: o uso de passaportes e a evolução administrativa do Estado joanino no Brasil (1808-1822) Artigos
- Farias, Rogério de Souza
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Um espião na Corte: política, clientelismo e espionagem no Rio de Janeiro da década de 1850 Artigos
- Ferreira Junior, Francisco
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- A independência do Brasil na historiografia escolar portuguesa (1880-1960) Artigos
- Oliveira, Sarah Luna de
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Esportes, lazer e desenvolvimento econômico em Ilhéus (c. 1890-1930) Artigos
- Dias, Cleber; Cotes, Marcial
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Sobre um retrato literário do fascismo Resenhas
- Amado, Thiago
- Texto: PT
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- Atualismo e historicidade do tempo presente Resenhas
- Felipe, Cleber Vinicius do Amaral
- Texto: PT
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- Entre a procura do contato e a manutenção da autonomia: trajetórias indígenas nas fronteiras do Brasil Resenhas
- Carvalho, Francismar Alex Lopes de
- Texto: PT
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- Os sírios… cidadãos franceses? Primeira Guerra Mundial e disputas políticas em torno da conformação da Síria e do Líbano Resenhas
- Almeida, Renata Geraissati Castro de
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Max Weber und die Erste Weltkrieg | Hinnerk Bruhns
Hinnerk Bruhns | Imagem: Hypotheses
Atribuem-se a Heráclito duas fórmulas memoráveis. A primeira, panta rhei, “tudo passa”, faz parte do repertório básico de qualquer aluno de primeiro semestre nas Humanidades. Já a segunda é bem menos citada: “a guerra é o pai de todas as coisas”. De fato, a ideia de que há algo não apenas de estranhamente sedutor, mas também de matricial na guerra, é confirmada à exaustão pela experiência histórica e mesmo por nossa sensibilidade estética. De Homero e do Mahabharata a Euclides da Cunha, da pintura de Otto Dix ao grande romance de Guimarães Rosa, a guerra aparece ora como epicentro narrativo, ora como pano de fundo. Tinha razão Ernst Jünger quando constatou que “a mania da destruição está profundamente enraizada na natureza humana” (Jünger, 2005, p. 48).
Como quer que seja, uma das conquistas fundamentais da modernidade, pelo menos desde a Guerra dos trinta anos, foi a de tendencialmente mitigar o fascínio que, desde sempre, cerca esse fato social total. Daí que, em suas memórias como soldado na Primeira Guerra, o historiador britânico R. H. Tawney não tenha escondido sua repulsa ante a “sensação de desempenhar um papel inútil” no que qualificou de “jogo disputado por macacos e organizado por lunáticos” (apud Stern, 2004, p. 254). Leia Mais
Antigas sociedades da África Negra | José Rivair Macedo
José Rivair Macedo | Imagem: UFRGS
A obra Antigas sociedades da África Negra, de José Rivair Macedo, professor do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, foi publicada no ano de 2021 pela Editora Contexto e já é considerada um clássico e uma leitura recomendada para todos que se interessam pelos estudos africanos, sejam estrangeiros, brasileiros, professores do ensino básico ou superior e público em geral.
Embora Rivair mencione o fato de o texto não possuir uma linguagem didática, mas uma proposta acadêmica com ampla pesquisa bibliográfica e documental, as salas de aula brasileiras, especialmente as localizadas nas periferias, com a maior parte do seu alunado afro-brasileiro, estão prontas para receber esse tipo de trabalho, obviamente quando intermediado pelo docente de educação básica. Os saberes ancestrais, as histórias dos negros na cultura brasileira, como quer o prefácio da obra – que traz inclusive uma canção de Eugênio Alencar, sambista gaúcho e conhecedor das tradições africanas (Rivair, 2021, p. 10) -, estão nesses lugares em que as comunidades afro-brasileiras habitam e aos quais a ciência costuma não olhar. Leia Mais
De metalúrgico a presidente: o Brasil visto a partir da biografia de Lula | John D. French
John D. French | Imagem: Brasil Popular
Em um momento no qual a construção de perspectivas sobre a história e o destino do Brasil voltam-se novamente para Luiz Inácio Lula da Silva, conhecido como Lula1, representações sobre a vida do ex-presidente trazem questionamentos acerca de sua incessante capacidade de mobilizar afetos e disputas interpretativas. Neste contexto, sua trajetória pública e privada remanesce atual e relevante para a compreensão dos impasses do presente e o que se pode esperar do futuro. Esse é o desafio assumido pelo último livro do brasilianista John D. French, que traz uma abordagem surpreendentemente dinâmica para a biografia: Lula and His Politics of Cunning, publicado em outubro de 2020.
O autor é professor de História na Duke University, com atuação também nas áreas de estudos internacionais comparados, africanos e afro-americanos. Com uma vasta e produtiva carreira, French coordena, nos últimos anos, o Duke Brazil Initiative, tendo sido diretor do Latin American Center, também em Duke, e coeditor da Hispanic American Historical Review por cinco anos. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 42, n.90, 2022.
- O Processo de avaliação por pares e a Ciência Aberta: um nó górdio para os periódicos na área de História? Editorial
- Slemian, Andréa; Couto, Katia Cilene do; Vieira, Martha Victor
- Texto: PT
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- Algumas considerações sobre a relação eleições, voto e democracia Debate – Quando As Eleições E O Voto Desafiam A Democracia?
- Pinto, Surama Conde Sá
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- Democracia e autocracia hoje Debate – Quando As Eleições E O Voto Desafiam A Democracia?
- Maciel, David
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- Texto: PT
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- Quando as eleições e o voto nos desafiam? Reflexões a partir da República Romana Tardia Debate – Quando As Eleições E O Voto Desafiam A Democracia?
- Oliveira, Julio Cesar Magalhães de
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- UMA EFEMÉRIDE “BOA PARA PENSAR”? DO CINQUENTENÁRIO AOS CEM ANOS DA SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 Dossiê – Modernismos
- Hollanda, Bernardo Buarque de; Braga-Pinto, César
- Texto: PT
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- Para um 1922 alternativo: cultura popular e modernismo vernacular no Rio de Janeiro Dossiê – Modernismos
- Conde, Maite; Shaw, Lisa
- Resumo: EN PT
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- Os elos do modernismo: raça, música e política no palco do Theatro Municipal Dossiê – Modernismos
- Townsend, Sarah J.
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- Tristes alegrias? A “alegria de 22” e a “alegria de 70” como experiências históricas modernistas Dossiê – Modernismos
- Vieira, Beatriz de Moraes
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Modernismos | Revista Brasileira de História | 2022
O Theatro São Pedro no início do século XX | Imagem: Fabiana Crepaldi
Em memória de Nicolau Sevcenko, historiador do modernismo e dos “seus frementes anos 1920”.
Em um texto de intenções um tanto polêmicas, o crítico estadunidense Harris Feinsod, estudioso de literatura e cultura modernistas, evoca o poeta russo-revolucionário Maiakovski: “Parem de uma vez por todas essas reverências contidas em efemérides de centenários, a veneração por meio e publicações póstumas. Tenhamos artigos para os vivos! Pão para os vivos! Papel para os vivos!” (Feinsod, 2016, tradução nossa). Nessa mesma linha, Feinsod declara: “Há muitas razões para se apavorar com a chegada do ano de 2022”.
De fato, por inevitável que seja, toda comemoração, e todas as efemérides de centenários em especial, correm o risco de promover mais esquecimentos do que memória, mais ocultamento e exclusão do que aprofundamento e análise. Em todo caso, espera-se que, em alguma medida, o centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, com suas celebrações laudatórias, mas também com suas contestações e seus deslocamentos críticos, ofereçam menos uma falsa aparência de coerência, como sugere Feinsod, do que uma oportunidade de expansão de um arquivo vívido e palpitante, sempre em transformação e em movimento. Eis, pois, a “beleza do vivo”, para pôr o mote de Michel de Certeau às avessas, aqui em questão. Leia Mais
Na transversal do tempo: natureza e cultura à prova da história | Ana Carolina Barbosa Pereira
Na transversal do tempo: natureza e cultura à prova da história encara “o desafio de propor um diálogo entre a teoria da história e a etnologia” (Pereira, 2019, p. 24). Ana Carolina Barbosa Pereira, professora na Universidade Federal da Bahia, aponta de saída que “se a etnologia fala exclusivamente aos(às), etnólogos(as), a teoria da história tampouco apresenta disposição para ouvi-los(as)” (Pereira, 2019, p. 24). E se o diálogo entre esses campos já é inusual, as vozes que a autora convoca para travar a conversação não parecem menos estranhas umas às outras: de um lado, o perspectivismo ameríndio; do outro, o historicismo alemão.
A rigor, o que a obra enseja não é bem uma conversa, mas um jogo (de cartas); ou ainda, como sugere a autora, “uma séria e desafiadora brincadeira” (Pereira, 2019, p. 24). Não há melhor modo de compreender um jogo do que jogando-o; de experimentar a seriedade de uma brincadeira do que brincando-a. Pois bem: valendo!
Como colocar-se na transversal do tempo? Em relação a que tempo uma determinada história se poria na transversal? Ou, ao revés, em relação a que história um tempo determinado estaria na transversal? Como dar conta desses atravessamentos recíprocos? E o que se diz através dessa operação?
Antes de abordar essas questões – e como em qualquer jogo -, é preciso aceitar o conjunto de regras proposto. Elas são poucas, relativamente simples e têm o fito de seguir lance a lance o argumento do livro, que é dividido em três grandes partes. Na primeira, as cartas serão dispostas segundo seus naipes e viradas para cima, de modo a explicitarem quais delas conferem vantagem desleal (porque não relacional) a quem as mobiliza(r). A despeito dessa propriedade distintiva, do ponto de vista formal, não se distinguem das demais. Daí o título do capítulo: “Um jogo de cartas conceituais (não) marcadas”.
Isso feito, na segunda parte acompanhamos a autora “Embaralhando as cartas conceituais”. O propósito aqui é deixar manifesta que vantagem posicional permanente não é contingente, mas arbitrária e, do ponto de vista conceitual, uma impostura. Na língua dos jogos – e no jogo das línguas – dir-se-ia que se trata de mera convenção. Como tal, em tese e sem nenhum prejuízo à natureza da atividade, poderia ser repactuada pelos participantes.
A terceira e última parte é, por assim dizer, um pseudoamistoso: uma tentativa de demonstrar como poderia se dar a dinâmica do jogo – entre as categorias “cultura”, “tempo”, “natureza” e “história” – se a interação entre elas fosse conduzida segundo o design conceitual esboçado a partir de uma redistribuição das cartas conceituais, orientado pelo conjunto de reflexões elaboradas ao longo do livro.
CARTAS CONCEITUAIS (NÃO) MARCADAS: TELEOLOGIA FORMALISTA
A História como discurso acadêmico profissional repousa sobre um consenso disciplinar acerca da obsolescência conceitual de abordagens teórico-metodológicas à moda teleológica das chamadas “velhas filosofias da história”. No lugar delas, a historiografia desenvolveu um campo próprio de reflexões e o batizou com o substantivo mais afeito ao propósito de constituir a História como ciência social dotada de critérios específicos de positividade: teoria.
Nesse sentido, uma das tarefas fundantes da teoria da história é, efetivamente e como argumenta a autora, “esvaziar o conteúdo das filosofias da história” (Pereira, 2019, p. 21). O primeiro giro de pensamento exigido para pôr-se na transversal do tempo é depreender em que medida, apesar de ter seu conteúdo esvaziado na e pela teoria da história, o cerne conceitual das filosofias da história – a saber, seu caráter teleológico – segue formalmente ativo, ou seja, atua na forma da forma.
Repare: não se trata de dizer, como de hábito, que há discrepância ou desconformidade entre conteúdo e forma. Muito menos se trata de delinear aspectos que comprovariam quanto a forma escamoteia o conteúdo que traz a efeito. Ou, pior do que isso, de construir esse escamoteamento como condição sine qua non da própria relação entre forma e conteúdo da história. Não se trata, em suma, de supor que a teoria da história não pareça, não tenha a forma, não se apresente como teleológica, mas, na verdade, o seja. Na transversal do tempo, a teoria da história parece, tem a forma, se apresenta como teleológica… e o é.
Uma empreitada conceitual empenhada em demonstrar que algo não é outra coisa senão precisamente o que parece ser pode ver-se obrigada, ao menos provisoriamente, a conceder que alguma noção deve estar sendo empregada de maneira “controversa”. No caso de Na transversal do tempo, a “controvérsia” se dá com a noção de teleologia. Pereira (2019, p. 21) explica que “por teleologia se entende aqui o descompasso entre o desenvolvimento e a consciência deste mesmo desenvolvimento”.
O exercício desse descompasso é, sem tirar nem pôr, a marca patente do que – o mais tardar desde a célebre formulação de Jürgen Habermas (1988) – veio a ser batizado como “discurso filosófico da modernidade”. O inaugurador deste discurso? Hegel. “Controverso” é, pois, o inverso do adjetivo mais apropriado para insinuar a homologia entre os modos de pensar filosoficamente a modernidade e a inclinação às teleologias à la Hegel, isto é, indelevelmente finalistas, mas, dado seu assentamento no contingente, à prova da acusação de determinismos tacanhos.
Na transversal do tempo traça um dos percursos possíveis para entender essa trama no campo da teoria da história. Aqui, assinala dois pontos de inflexão. O primeiro, em Newton e sua mecânica clássica, responsável pela noção de espaço e tempo absolutos e verdadeiros em si mesmos (Pereira, 2019, p. 30). O segundo, na “revolução copernicana” de Kant, que atribuiu uma dupla natureza a esses pressupostos, de sorte a transmutá-los em “grandezas ontológicas e transcendentais” também do espírito: espaço e tempo transmutados em “formas puras da intuição sensível”, que se constituem como condição de possibilidade do conhecer e, nesse sentido, “conteriam, anteriormente a toda experiência, os princípios de suas relações” (Pereira, 2019, p. 31-32).
O caráter absoluto, contínuo e homogêneo do “tempo em si”, herdado das acepções newtoniana e kantiana, operará por dentro do discurso filosófico da modernidade até ganhar a forma do que Na transversal do tempo (se) apresenta como “continuum temporal.”
Aceitando a tese de que o germe filosófico que inaugura a modernidade é o pensar teleológico que deriva do investimento incessante em suprimir o descompasso entre o que já é (ou seria) e o que se é capaz de pensar que ainda é (ou venha a ser), pode-se dizer, acompanhando o argumento de Pereira, que, a partir dessa matriz, tudo quanto viermos a chamar de interpretação histórica “moderna” (a despeito de assumir a forma de teoria da história ou de historiografia) consistirá na diferenciação desse continuum através de um processo que ela denomina “dinâmica da insciência/consciência do tempo” (Pereira, 2019, p. 65).
A teoria da história de extração alemã será o campo de prova desta hipótese. Aqui, pensando com Manuela Carneiro da Cunha, a autora efetua uma “recuperação das cosmologias ocidentais como objeto de estudo antropológico” (Pereira, 2019, p. 208) e empreende uma densa análise cujo fito é delinear afinidades conceituais. Tais afinidades, para usar uma metáfora antropológica afim, funcionam como um verdadeiro deslinde das estruturas elementares de parentesco de dois dos mais importantes expoentes contemporâneos da teoria da história, Reinhart Koselleck e Jörn Rüsen – entre si e com seus conterrâneos e antecessores, a saber, Wilhelm Dilthey e Gustav Droysen -, num primeiro galho genealógico; e, em passado ainda mais recuado, os vínculos de todos com a filosofia de Kant, de Herder e de Hegel.
Visto nessa perspectiva, e parafraseando Lévi-Strauss ([1958] 2008, pp. 32 e 39), o “continuum temporal” faz as vezes da natureza enquanto a “consciência histórica”, tal qual a proibição do incesto, se apresenta como o ponto de passagem (ou mecanismo de articulação) entre natureza e cultura. Ou ainda, na mesma chave, o “continuum temporal”, do qual a etnóloga tentar se aproximar através da consideração de suas expressões mais ou menos conscientes, equivale a uma “condição inconsciente” (da teoria da história).
A partir de uma engenhosa reconstrução do arcabouço analítico de Reinhart Koselleck, cuja formulação mais célebre é a díade espaço de experiência/horizonte de expectativa, “arriscando uma síntese”, Pereira (2019, p. 78) conclui que “o conceito de ‘tempo histórico’ participa da Historik de Koselleck, ora como condição transcendental das histórias, ora como indicador do processo de tomada de consciência do tempo em si mesmo”. Submetendo o pensamento de Jörn Rüsen a escrutínio semelhante, a autora diagnostica, em sua “razão histórica”, outra variante deste movimento que vai da insciência à consciência do tempo.
Em suma, tanto um como o outro “concordam em relação ao essencial”, isto é, mantêm a prerrogativa de um continuum temporal “natural” que, diferenciado pela ação da consciência, faz emergir o tempo propriamente histórico. É esse o arranjo que Na transversal do tempo (se) apresenta correta e peremptoriamente como uma “teleologia formalista” (Pereira, 2019, p. 86): um tempo que faz as vezes de natureza (o continuum temporal), espécie de unidade originária ainda indiferenciada, é submetido à ação reflexiva do pensamento humano e, nesse processo, que pode ser também descrito como “desenvolvimento da consciência do tempo em si mesmo”, se transmuta em algo intencionalmente diferenciado e, nesse sentido, histórico. E é nessa forma que “consciência histórica” e “tempo histórico” passaram a ocupar um lugar irremovível não apenas na teoria, mas na ciência da história.
Por essa razão, como sugere Pedro Caldas (2004, p. 11), ao se considerar que “pensar historicamente é pensar teleologicamente”, não se está “ressuscitando um cadáver” conceitual. Muito pelo contrário. Vista Na transversal do tempo, esse tipo de “teleologia formalista” – constituída pela relação mimética entre tempo natural e tempo histórico ou consciência histórica – oferece régua e compasso para “esclarecer qual a finalidade do saber histórico, ou seja, […] explicitar seu método, seus limites, funções, normas” e, nesse sentido, representa “o esforço para o estabelecimento de uma autonomia do conhecimento histórico” (Caldas, 2004, p. 11).
“Teleologizar” pressuporia, portanto, manter a excepcionalidade relacional de categorias desenvolvidas a partir de uma experiência particular da consciência do tempo que, em sua própria consecução como cânone de um campo de saber, se projetou como imprescindível à “interpretação humana do tempo e consequente construção histórica de sentido” (Pereira, 2019, p. 21).
EMBARALHANDO AS CARTAS: FUTURO SEM DEVIR HISTÓRICO
O embaralhar de cartas tem como objetivo expandir a superfície de contato da contingência e, assim, aumentar o nível de dificuldade de controle de um jogo. Parte fundamental da arte de jogar cartas, aliás, consiste em dominar as formas de embaralhamento e, não menos, torná-las objeto de admiração e fascínio. Quem nunca terá visto algo do tipo nas apologias hollywoodianas dos cassinos e da jogatina? A propósito e não por acaso, a prática é também uma modalidade distintiva no mundo da mágica.
Vão longe as analogias possíveis entre o que a magia faz com os sentidos, sobretudo o da visão, e o que a teoria faz com o sentido das palavras e das coisas. Com isso em mente, consideremos que o embaralhamento conceitual que Na transversal realizará pretende nos fazer compreender que, “alheia e indiferente ao princípio da insciência/consciência do tempo, a consciência histórica ameríndia não é um devir histórico” (Pereira, 2019, p. 156). Para chegar à tese, a autora nos conduz por um longo percurso conceitual. Sintetizo-o em duas manobras.
Primeiro, ela mobiliza o perspectivismo ameríndio para replicar, dentro da teoria da história, a “inversão multinaturalista” que produz um tipo específico de deslocamento da disposição relacional entre natureza e cultura, a saber, “a cultura ou o sujeito seriam aqui a forma do universal; a natureza ou o objeto, a forma do particular” (Viveiros de Castro, [2002] 2017, p. 303). Assim, fica neutralizada de saída aquela “carta marcada” da ontologia da modernidade, isto é, a persistente oposição entre natureza e cultura, e produz-se algum desarranjo na correspondência entre seus correlatos simétricos universal/dado/objetivo/fato versus particular/construído/subjetivo/valor (Viveiros de Castro, 2017, p. 303).
O segundo movimento consiste em produzir um tipo análogo de deslocamento relacional no que diz respeito à noção de indivíduo em sua relação com a sociedade. Aqui, Pereira (2019, p. 98) lança mão da noção do conceito de “personitude fractal”, termo desenvolvido por José Luciani para estabelecer o “fio da relacionalidade, isto é, a constituição relacional de pessoas e contextos” através da descrição do processo pelo qual se dá “tanto o encerramento de pessoas inteiras em partes de pessoas quanto a replicação de relações entre Eus [selves] e Outros [alters] em diferentes escalas (intrapessoal, interpessoal e intergrupal)” nas sociedades indígenas (Luciani, 2001, p. 97).
O primeiro deslocamento, entre natureza e cultura, é fundamental para que se entenda que qualquer ente pode participar da configuração de um campo relacional: um animal, um objeto, um espírito e, claro, pessoas, mesmo as completamente estranhas a um dado grupo. Aqui, a natureza do vínculo não decorre nem depende da identificação com o semelhante (na forma de corpo humano) e sim do estabelecimento de uma relação de afinidade na qual o corpo não é, em primeira linha, compleição material, traço físico, mas, antes, “feixe de afecções” – um conjunto de capacidades e comportamentos típicos de um ser (Viveiros de Castro, 2017, p. 128). Instituída nesses termos, a afinidade assume, portanto, “a função de matriz relacional cósmica” e “constitui-se, virtualmente, como o modo genérico da relação social” ou, usando o conceito de Viveiros de Castro (2017, p. 108) Na transversal, constitui-se como “afinidade potencial”.
Um exemplo de caráter intergrupal pode ser bem elucidativo para entender o modo como a categoria tempo entra – via personitude fractal – nesse arranjo conceitual e fecha o nó do ser e do tempo que nós chamamos de história. Falando dos tupinambás, Viveiros de Castro (1992, p. 291 apud Luciani, 2001, p. 105) analisa o modo como se estabelece um “momento crucial de mútua identificação” entre cativo e captor/matador, de sorte que “o cativo representa o futuro do matador (ser executado pelo inimigo) e o matador representa o passado do cativo (que foi um matador)”.
Em trabalho de campo etnográfico conduzido junto aos Yamináwa, Pereira reconhece traços desses mesmos princípios – afinidade potencial e personitude fractal – na relação entre tempo e pessoa. As estratégias de reprodução de nomes e dos termos entre os Yamináwa, ela explica, na medida em que tendem à replicação entre eus e outros em escala temporal, criam uma estrutura dinâmica e propriamente fractal do tempo (Pereira, 2019, p. 151). A partir dessa conclusão, ela convida: “especulemos por conta própria”.
Se é possível instalar-se no passado e/ou futuro conforme o princípio da reversibilidade, isso se deve, ao que parece, à existência de um fundo virtual de temporalidade não-marcada. A própria dinâmica da fractalidade é indicativa dessa relação de dependência. Aqui, é a simultaneidade (potencial) que impõe a não simultaneidade de “antes” e “depois”. Passado, presente e futuro correspondem justamente àquela dimensão não marcada da história que, por isso, deve ser atualizada (Pereira, 2019, p. 151).
A história assim atualizada é, portanto, ela também potencial, e seu traço fundamental, por conseguinte, é a relacionalidade: “Se o tempo histórico ameríndio é o tempo do parentesco e este é fabricado a partir da afinidade potencial, o mesmo se dá com o tempo como atualização de uma história potencial (Pereira, 2019, p. 153).
E assim, para fechar esta seção retomando o fio do raciocínio, compreende-se o que significa dizer que a “história potencial ameríndia” não pressupõe nenhum vínculo apriorístico “entre passado, presente e futuro que deva ser diferenciado por meio da consciência histórica”; ou seja, que “não é um devir histórico”.
REDISTRIBUIR AS CARTAS: HISTÓRIA MULTIVERSAL DA DIFERENÇA
Tendo, primeiro, deslocado as noções de “tempo histórico” e “consciência histórica” de sua posição não marcada e, em seguida, aguçado nossa compreensão da história rumo a uma relacionalidade radical via perspectivismo ameríndio, Pereira volta aos alemães na terceira (e última) parte do livro, mais precisamente ao projeto de história intercultural – ou humanismo moderno – de Jörn Rüsen.
Para que cheguemos a esse ponto bem equipados, um importante contorno epistemológico é feito: estabelecer a posição relacional da própria história Yamináwa, isto é, da história dos povos indígenas, em um quadro que tem o Acre como pano de fundo, mas que é bastante ampliado. Se usarmos aqui a própria noção de fractal – no que ela serve como recurso visual para imaginar o padrão de repetição de um fenômeno em diferentes escalas -, veremos a história do Acre como uma iteração ampliada da narrativa mestra que estrutura também, a um só tempo, o “paradigma da formação” da nação (no Brasil) e a evolução da modernidade (no Ocidente). Em síntese, produz-se uma epopeia acreana como capítulo particular da marcha universal e inexorável do progresso e da civilização, na qual os povos indígenas ou não figuram ou apenas aparecem para confirmar uma suposta incapacidade inata de oferecer qualquer resistência à ação colonizadora (Pereira, 2019, p. 175).
Isto é feito para que entendamos o excurso político que Na Transversal nos propõe quando traz a ideia de “florestania”. Fusão de “floresta” e “cidadania”, o termo pretendia, historicamente, enfatizar o protagonismo dos povos indígenas e, politicamente, sintetizar um caminho para a superação do antropocentrismo, preconizando um regime de igualdade de direitos entre todos os elementos da natureza, inclusive, naturalmente, os seres humanos. No fim, degenerou em “mero slogan”, de todo desvinculado da ambição originária, calcada numa mudança radical de paradigma (Pereira, 2019, p. 182).
Nessa altura, somos reconduzidos ao que Jörn Rüsen preconiza ao falar de um conceito de história intercultural que “deve vencer o próprio etnocentrismo e contribuir para uma nova cultura do reconhecimento mútuo das diferenças” (Pereira, 2019, p. 185).
Como Na Transversal apresenta essa aspiração em seus pressupostos, entendemos também em que medida a “cultura do reconhecimento mútuo das diferenças”, como critério normativo de validade universal na teoria da história de Rüsen, acaba desempenhando um papel análogo ao da “florestania” como princípio orientador da política, ou seja, o de “mero slogan”. Ambas, cada qual em sua seara, não apenas não operam o giro paradigmático que anunciam, mas, ao revés, atuam como vetor da primazia do moderno.
À luz do que essa modernidade tem sido até aqui para os povos indígenas, a saber, um processo contínuo de reprodução do genocídio como cerne da dinâmica de interação, Pereira (2019, p. 203) conclui que o argumento da “razão inclusiva” subjacente ao humanismo moderno de Rüsen “soa no mínimo ofensivo”. Mas, se não a nobre e bem-intencionada “inclusão”, então o quê? Hora de, finalmente, redistribuir as cartas conceituais.
As narrativas de contato dos Yamináwa – a exemplo da de outros povos indígenas, como os Arara e Manchineri – são dispostas de maneira tal que, embora os brancos sejam acomodados em lugares pré-marcados, isso não impede o surgimento de reordenações cosmológicas que derivam de uma “constante reelaboração do contingente como experiência inédita de algo conhecido de antemão”. Orientada pela “afinidade potencial”, a incorporação do outro se dá, via de regra, “em sua e pela sua diferença”. A história que assim se conta, portanto, “não é uma narrativa post festum, ela é o fundo virtual que prefigura toda a experiência, um veículo para a realização e simbolização de relações efetivas” (Pereira, 2019, pp. 143-144).
Em termos mais abstratos, dir-se-ia que o princípio de reconhecimento mútuo da diferença do qual Rüsen lança mão opera com base em uma lógica de diferenciação ancorada nas categorias tipológicas da semelhança, da oposição, da analogia e da identidade. Daí seus critérios de inclusão acabarem desandando sempre no taxonômico e classificatório, em um movimento que não cessa de repor as regulações hierárquicas que tenciona deslocar (Pereira, 2019, p. 203).
As matrizes de pensamento ameríndias, por sua vez, operam através de uma “síntese disjuntiva” cujo princípio de diferenciação é precisamente o não taxonômico e não substancial. Sua dinâmica relacional de individuação conduz, por isso, à constante “atualização do virtual”. Para retomar a metáfora geométrica, em vez de uma “ontologia plana”, corolária de uma lógica inclusiva da diferença, na qual existir pressupõe a identidade como causa ou como finalidade, poderíamos arriscar uma “‘ontologia fractal’ em que existir significa diferir: diferença intensiva, diferença das diferenças”. Assim, trocando em miúdos historiográficos, em vez de uma “história universal da identidade” construiríamos uma “história multiversal da diferença” (Pereira, 2019, pp. 204 e 207).
AFINIDADE (TEÓRICA) POTENCIAL
“Conhecemos a história de um autômato construído de tal modo que podia responder a cada lance de um jogador de xadrez com um contralance, que lhe assegurava a vitória.” (Benjamin, 1996, p. 222). É assim, imaginando um jogo, que Walter Benjamin principia seu célebre “Sobre o conceito de história”.
O alvo declarado da crítica de Benjamin é um historicismo composto por dois traços fundantes: 1) a aspiração de representar o passado como “ele de fato foi” e que, como tal, 2) “culmina legitimamente na história universal” (Benjamin, 1996, pp. 224 e 231). No limite, Benjamin (1996, p. 231) provoca, o historicismo possibilita o paradoxo de apresentar uma “imagem ‘eterna’ do passado”, o que só é possível porque ele “faz da história objeto de uma construção cujo lugar é um tempo homogêneo e vazio” que se manifesta como “o continuum da história” (Benjamin, 1996, p. 229).
O materialismo histórico benjaminiano desejava explodir esse continuum (Benjamin, 1996, p. 230). Se seguirmos Na transversal do tempo, podemos fazer algo afim. Há (parece) uma afinidade potencial entre o jogo do tempo e da história de Ana Carolina B. Pereira e de Walter Benjamin.
Não obstante, é a diferença que os vincula: o tempo de Benjamin é monológico, intrassubjetivo e messiânico; está impregnado de um salvacionismo cuja virtuosidade parece imanente e, mormente, dado a “revolucionário”. O de Pereira é dialógico, intersubjetivo e contingente; de saída, desconfiado da própria virtude e avesso às epifanias da salvação.
Entre Pereira e Benjamim, a metáfora do jogo interpõe um elo dissonante. Na imagem que Benjamin (2020, p. 66) constrói há um elemento fundamental: “através de um sistema de espelhos criava-se a ilusão de que a mesa era transparente por todos os lados” e, assim, ocultava o espírito que animava o jogo (o anão corcunda da teologia). O truque, portanto, não consiste unicamente em ser guiado pela mente do mestre (de xadrez), mas garantir que – por intermédio da transparência – sua onipresente efetividade na condução dos eventos transcorra na forma da ausência e iluda quem entrar na contenda. Pereira, por sua vez, não quer parecer transparente, não aposta no logro do outro; seu jogo não demanda repor a consciência alheia a partir de uma posição declaradamente misteriosa.
O caso é que, e eis o nó, ao acenar com o estratagema da consciência escondida como guia – a transparência como opacidade -, Benjamin parece adotar prumo mais afeito à assimetria de poder, pois pretende equipar melhor quem joga em franca desvantagem. No que concerne à Pereira, ao revés, quem joga limitado por injustiças dadas de saída segue algo exposto, precisando contar, antes, com a abertura (ou transparência) de um outro que agora – não mais a despeito, mas dada a sua opacidade finalmente declarada – encerraria uma virtuosidade intrínseca e, mormente, capaz de engendrar uma dinâmica de supressão gradual de assimetrias que poderia ser tomada como o início de um tímido processo de reparação.
Que jogo teríamos se o corcunda de Benjamin aprendesse a jogar com as cartas ora embaralhadas e redistribuídas por Ana Carolina B. Pereira?
Referências
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Resenhista
Fernando Baldraia – Freie Universität Berlin, Berlim, Alemanha. E-mail: fbaldraia@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-0140-757X
Referências desta Resenha
PEREIRA, Ana Carolina Barbosa. Na transversal do tempo: natureza e cultura à prova da história. Salvador: EDUFBA, 2019. Resenha de: BALDRAIA, Fernando. O jogo da afinidade. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 42, n. 89, 2022. Acessar publicação original [DR]
Mestiça cientificidade: três leitores franceses de Gilberto Freyre e a sua máxima consagração no exterior | Giselle Martins Venancio e André Furtado
A Editora da Universidade Federal Fluminense acaba de lançar Mestiça cientificidade: três leitores franceses de Gilberto Freyre e a sua máxima consagração no exterior (2020). O livro de Giselle Martins Venancio e André Furtado é uma importante contribuição para interpretar a recepção da obra de Gilberto Freyre no exterior, em especial na França do pós-guerra. Compreender as condições de leitura de autores canônicos como Fernand Braudel, Roger Bastide e Lucien Febvre – os leitores franceses estudados no livro – não é trivial, pois a consagração de Casa-grande & Senzala (1933), de Gilberto Freyre (1900-1987), não dependeu apenas do próprio texto, nem da argumentação e da pesquisa contidas nele, mas de uma série de questões que povoam o mundo dos leitores.
Mestiça cientificidade aprofunda o entendimento acerca da recepção francesa de Casa-grande nas décadas de 1940 e 1950. Funciona também como iniciação à obra de Gilberto Freyre para estudantes, jovens pesquisadores e interessados em um dos autores brasileiros mais importantes do século XX, o de maior repercussão internacional, objeto ainda hoje de acalorado debate público. Sem perder a potência da pesquisa e dos debates acadêmicos contemporâneos, o livro em questão não deixa de praticar história pública. Leia Mais
Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos: “os brancos eram uns pelos outros, por isso os negros também deviam fazer o mesmo” | Wagner de Azevedo Pedroso
Nas Américas, em particular, a escravidão na grande lavoura foi ao mesmo tempo um sistema de trabalho, um modo de dominação racial e a base para o surgimento de uma classe dominante bem caracterizada (Foner, 1988, p. 17).
A assertiva de Eric Foner presente na introdução da ainda pertinente obra Nada além da liberdade parece ser das mais adequadas para iniciarmos a presente discussão acerca do livro Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos. Wagner de Azevedo Pedroso está inscrito em um grupo maior de pesquisadores e pesquisadoras que há pelo menos vinte anos vem produzindo, nos diferentes espaços de pesquisa do Rio Grande do Sul, um substancial trabalho acerca da região à época do escravismo e logo após o seu término. A reflexão proposta por Pedroso está inserida no contexto de produção de obras como, por exemplo, a de Thiago Leitão de Araújo, Escravidão, fronteira e liberdade: políticas de domínio, trabalho e luta em um contexto produtivo agropecuário (Vila da Cruz Alta, Província do Rio Grande de São Pedro, 1834-1884) (2008), a de Vinicius Pereira de Oliveira, A presença negra no porto de Rio Grande (2009), a de Gabriel Santos Berute, Dos escravos que partem para os portos do sul: características do tráfico negreiro do Rio Grande de São Pedro do Sul, c. 1790-c.1825 (2006), a de Melina Kleinert Perussatto, Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós-abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (c.1892-c.1911) (2013), a de Rodrigo de Azevedo Weimer, Os nomes da liberdade: experiências de autonomia e práticas de nomeação em um município da serra rio-grandense nas duas últimas décadas do século XIX (2007) e a de Fernanda Oliveira Silva, Os negros, a constituição de espaços para os seus e o entrelaçamento desses espaços: associações e identidades negras em Pelotas (1820-1943) (2011). Trabalhos estes, em grande medida, aglutinados em torno do GT Emancipações e Pós-Abolição da Associação Nacional de História (GTEP/ANPUH), do GT Emancipação e Pós-Abolição da ANPUH-RS e dos encontros “Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional”, vinculado ao Grupo de Pesquisa do CNPq, e “A experiência dos africanos e seus descendentes no Brasil”.
A perspectiva que aproxima estes diferentes trabalhos e vários outros produzidos neste ambiente, segundo se entende aqui, é a compreensão da agência das pessoas escravizadas, considerando-se as formas ativas como elas atuavam sobre seus destinos em um contexto muito pouco favorável. Um último e pertinente exemplo deste cenário intelectual é a obra Pessoas comuns, Histórias incríveis (2017), texto coletivo produzido por Fernanda Oliveira da Silva, Jardélia Rodrigues de Sá, Luciano Costa Gomes, Marcus Vinicius de Freitas Rosa, Melina Kleinert Perussato, Sarah Calvi Amaral Silva e Sherol dos Santos, voltado ao grande público, notadamente o escolar, que traz a lume outra história do Rio Grande do Sul a partir da perspectiva de pessoas negras, evidenciando a já mencionada busca pela compreensão da atuação, em um cenário quase sempre adverso, tanto das pessoas escravizadas quando da população negra após o término do escravismo.
O trabalho de Pedroso dialoga com a obra de Hebe Mattos Das cores do silêncio (1998) e com as produções de Paulo Roberto Staudt Moreira Sobre fronteira e liberdade (1998), Os cativos e os homens de bem (2003), Entre o deboche e a rapina (2009). As obras de Helen Osório, Fronteira, escravidão e pecuária (2005), e de Regina Célia Lima Xavier, A conquista da liberdade (1996) e Religiosidade e escravidão, século XIX (2008), também são mobilizadas com destaque pelo autor. Um dos pontos centrais de sua discussão é a problematização da agência das pessoas escravizadas. O seu esforço de compreender como as pessoas escravizadas “jogavam” um “jogo” cujas regras lhes eram consideravelmente desfavoráveis se estabelece a partir de um uso profícuo, sobretudo, das considerações de Eduardo Silva e João José Reis expressas em Negociação e conflito (1989), como se verá adiante.
Pedroso traz a lume, em Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos, discussões resultantes de sua dissertação de mestrado, defendida em 2013 no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob o título de Escravos, senhores, posses, partilhas e um plano insurrecional da Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos, RS (1863).
Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos conta com um prefácio assinado por Regina Célia Lima Xavier. Das considerações de Xavier destaca-se aqui a sua observação acerca de como a pesquisa de Pedroso traz algo relativamente inovador nas pesquisas sobre as insurreições do período: a predominância de pessoas escravizadas nascidas no Brasil envolvidas com uma revolta ou tentativa de revolta. A revolta e/ou a tentativa de revolta de pessoas escravizadas na primeira metade do século XIX, com a predominância de pessoas nascidas no Brasil, é um elemento de certa novidade, pois as investigações sobre o período revelam alta taxa de africanidade nas insurreições então ocorridas. O livro está organizado em três capítulos. O primeiro, denominado “Entre conversas e caminhadas: os escravizados e a Aldeia dos Anjos”, é dedicado a investigar a divulgação do plano de insurgência, denotando a articulação e a mobilidade da comunidade de pessoas escravizadas no contexto da Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos, uma localidade que produzia para o mercado interno, detentora de escravarias relativamente pequenas (em comparação, por exemplo, com a produção cafeeira do Sudeste), empregadas em um rol bastante vasto de atividades.
Já o segundo capítulo, “Entre senhores e escravizados: os senhores moços e a força do sistema escravista”, concentra-se nos objetivos da rebelião. Neste capítulo, o rico entrecruzamento de fontes permite visualizar as alterações na forma de dominação e a entrada dos padrões de controle dos senhores moços. As páginas do segundo capítulo trazem a possibilidade de melhor compreendermos a imbricada teia de relações sociais da camada senhorial da região, bem como de percebermos como essas relações, apesar, evidentemente, das particularidades regionais, estavam articuladas à realidade maior do Império. Assim, as alterações na dinâmica imperial a partir, sobretudo, da década de 1850, tiveram implicações sobre a camada senhorial, e as modificações na camada senhorial trouxeram mudanças para a vida das pessoas escravizadas. O terceiro capítulo, “Entre a escravidão e a liberdade: da delação ao retorno ao cotidiano”, tem como foco acompanhar o destino das pessoas envolvidas com a elaboração da tentativa de revolta após o seu malogro. Da repressão senhorial ao retorno às rotinas de um determinado cotidiano, o capítulo revela o tênue equilíbrio construído sobre a base da negociação e do conflito.
Pedroso menciona, no início da sua obra, o quanto o livro de Carlo Ginzburg O queijo e os vermes (1987) foi importante para motivá-lo a ir ao arquivo pesquisar e encontrar o seu Menocchio. Em suas buscas no Arquivo Público do Rio Grande do Sul, o autor não encontrou um Menocchio, todavia, ele encontrou o processo-crime de uma tentativa de insurreição de pessoas escravizadas na Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos, a qual se localizava entre os atuais territórios dos municípios de Viamão e Gravataí. Charles Sidarta Machado Domingos, na contracapa, localiza tal freguesia no atual território de Gravataí. De fato, até onde se sabe, houve alterações no limite territorial da Aldeia dos Anjos ao longo do tempo, de modo a ser viável pensar que ambas as informações sobre a localização da freguesia são plausíveis.
Se Pedroso teve sua inspiração inicial em Ginzburg, aqui ela vem de Foner, uma vez que, ao se ler Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos, é possível localizarmos muito mais que uma tentativa “de uma revolta” da mão de obra escravizada. Encontra-se no texto um relato fundamental sobre as transições econômicas e sociais do Brasil imperial na década de 1860. Destaca-se a alteração na forma de dominação escravocrata dos denominados “senhores moços” em relação aos antigos senhores. Os primeiros, devido às alterações no fluxo de pessoas escravizadas -oferta de mão de obra que diminui -, passaram a ter que extrair muito mais de suas escravarias, em comparação com os senhores antigos. Desta forma, “direitos costumeiros” das pessoas escravizadas passam a ser revogados. Em regiões como a da Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos, essas mudanças sócio-econômicas resultam em uma grande quantidade de pessoas escravizadas em uma área espacial relativamente reduzida.
Esta grande concentração de pessoas escravizadas resultou, segundo a análise de Pedroso, em um contingente de pessoas aparentadas. Somando-se a isso a mobilidade desses indivíduos, característica importante das escravarias da região – aspecto também destacado pelo autor -, tem-se uma comunidade muito bem articulada. A constatação concernente à articulação das pessoas escravizadas já não causa espanto na comunidade de pesquisadoras e pesquisadores desde muito tempo. Todavia, fora dela isso ainda é algo “novo”. O fato de a comunidade ser bastante aparentada revela também traços de uma reprodução endógena; ou seja, toda essa gente é, em sua maioria, nascida no Brasil.
Pedroso indica com perspicácia em seu texto que, se há uma articulação forte entre as pessoas escravizadas, o mesmo se dá nas camadas senhoriais. Os senhores moços sabem que, devido ao fim do tráfico internacional, a oferta de mão de obra escravizada diminuíra, reduzindo-se ao mercado interno; e neste, os proprietários e as proprietárias de pessoas escravizadas do Rio Grande do Sul não tinham recursos para competir com as demandas do Sudeste. Assim, restava à camada senhorial rio-grandense, de modo geral, manter as suas escravarias e, se possível, fazê-las se reproduzirem endogenamente. Estas situações levam os senhores moços a praticarem outras formas de dominação em comparação, por exemplo, com seus pais.
Esta “nova” dominação, ou esse outro tipo de dominação, cria tensões enormes no equilíbrio tênue da sociedade escravocrata brasileira e rio-grandense. Neste ponto da argumentação proposta por Pedroso fica nítida a utilização profícua e aguçada das sugestões e considerações de Eduardo Silva e João José Reis, presentes no clássico moderno Negociação e conflito. Existe uma máxima segundo a qual só possível burlarem-se as regras quando se tem domínio das mesmas. É difícil passar pelas páginas de Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos sem que essa máxima emerja. Tomada em conjunto com as considerações de Silva e Reis, esta máxima convida-nos a pensar que a comunidade de pessoas escravizadas possuía o domínio das regras de negociação e conflito dentro do padrão de dominação dos senhores velhos. Tais pessoas, mesmo em condições de jogo muito desiguais, sabiam como jogar, como se posicionar. Entretanto, a transição para um novo tipo de dominação traz novas regras, retira destas pessoas o “domínio” que possuíam dos mecanismos que regiam suas existências. Uma resposta a isso seria a revolta.
Se o ambiente é de negociação e conflito, a revolta das pessoas escravizadas, ao contrário de uma primeira impressão, podia visar não a conquista a liberdade, mas sim a manutenção de determinado padrão nas relações de dominação. Não parece ser exagero, muito menos descabido, lembrarmos que, para se fugir – sobretudo no período escravocrata -, era preciso saber para onde, caso contrário, fugir não seria uma alternativa. Os insurgentes da Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos não tinham na fuga uma ideia mote: a ideia mote parecia ser mesmo a de alcançar a liberdade. Mas, a liberdade onde? Na própria região? Como o plano de insurgência malogrou, a fuga surgiu como uma opção para os revoltosos. No entanto, fuga para onde? Para a fronteira. A fronteira representava um ideário relevante de liberdade neste contexto, pois, à época, tanto as Províncias Unidas (atual Argentina) quanto a Banda Oriental (atual Uruguai) tinham abolido a escravidão. Contudo, essa fuga era de fato impossível, pois se tratava de viajar cerca de 500 quilômetros no mundo escravocrata na condição de escravo fugido. Desta forma, outra maneira de os insurgentes reagirem ao malogro da revolta foi a tentativa de recorrerem ao apadrinhamento.
Pedroso, ao discutir o apadrinhamento como uma alternativa, traz muitos elementos de como se efetivava a sociabilidade neste ambiente. Visando a diminuição das punições pela tentativa de insurgência, buscava-se o apadrinhamento; recorria-se a um senhor ou a uma senhora para que esta pessoa da camada senhorial interviesse em favor da pessoa escravizada. As perguntas imediatas ao nos depararmos com tal situação são: porque um senhor ou uma senhora fariam isso? E por que uma pessoa escravizada procuraria a ajuda das pessoas que seriam os alvos da sua revolta?
O equilíbrio tênue de regiões como a Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos permite pensarmos que as pessoas escravizadas possuíam bastante nitidez de seu valor e importância para o funcionamento da região. Com escravarias compostas em média por quatro a cinco pessoas, como Pedroso indica no que diz respeito à região em questão, pode-se pensar que as duas pontas chegavam, por caminhos diferentes, a conclusões semelhantes: executar, aprisionar ou inutilizar para o trabalho uma pessoa escravizada era um prejuízo insuperável. É válido focarmos em outra informação muito relevante trazida por Pedroso: ao analisar os inventários post-mortem, ele percebe que, para muitos senhores e senhoras da região, seu “bem” de maior valor eram as pessoas escravizadas. Se a hipótese aqui esposada estiver minimamente correta, as regras do jogo eram conhecidas por todas as pessoas. Desta forma, buscar apadrinhamento era uma opção das mais válidas. Como as regras deste jogo de tênue equilíbrio eram de conhecimento comum, torna-se válido mencionarmos que era de conhecimento das pessoas escravizadas que, após uma tentativa de insurreição, viriam punições. Assim, estava em jogo não a ausência de punição, mas sim o seu tipo. Pedroso enfatiza que a punição pela tentativa de insurreição recaiu sobre toda a comunidade de pessoas escravizadas, muito provavelmente até sobre quem delatou os planos de revolta.
O resultado da tentativa de insurreição é conhecido desde o começo do texto: as lideranças foram presas e julgadas, com exceção daquelas que morreram no confronto com as “autoridades”; caso de Nazário, tomado como o grande elaborador e articulador da ação, como se pode verificar no processo-crime contra os insurretos. No que concerne ao processo-crime, podemos destacar outro aspecto essencial da obra Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos: o cruzamento de diferentes tipos de fontes – além dos processos-crimes, inventários, listas nominais de nascimento, casamento, batismo, morte. Manuscritos que não foram de forma alguma produzidos para a historiadora, para o historiador. A pessoa que se encanta com o ofício de historiar tem que conversar com essa documentação – uma conversa crítica, dura, rígida.
A elaboração de Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos, além de contar com um trabalho bastante relevante de cruzamento de fontes, também apresenta um uso muito criativo da bibliografia recente produzida sobre o tema. O diálogo do autor com a produção recente indica o quão profícuo vem sendo o já citado grupo de pesquisadores e pesquisadoras que, como também já mencionado, vem, há pelo menos vinte anos, produzindo trabalhos fundamentais para um melhor entendimento do Brasil sob o regime escravista, bem como sobre a forma como o país se organizou nos primeiros momentos pós-escravismo. No que diz respeito à colaboração desta obra para um melhor entendimento do Brasil escravista, é importante mencionarmos que ainda é comum, de modo mais amplo, as pessoas associarem a escravidão à grande lavoura, à monocultura voltada à exportação; de certo modo, uma leitura menos atenta da epígrafe selecionada para este texto poderia, inclusive, colaborar para essa impressão. Contudo, a obra Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos demonstra justamente a importância das pessoas escravizadas na dinâmica de um mercado interno, na produção de itens voltados ao consumo na própria região – atividade esta que produzia certa riqueza, evidentemente não a mesma riqueza dos cafeicultores do Sudeste, mas que não era, de forma alguma, irrelevante. Assim, o texto de Pedroso está alinhado à produção historiográfica disposta a rever algumas “verdades” intocáveis sobre os padrões de riqueza no Brasil imperial, bem como sobre as dinâmicas do mercado interno.
Este texto se encerra com argumentos acerca da edição de Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos. Almejando, segundo compreendemos, atingir um público tanto de especialistas quanto de não especialistas, a obra conta com uma diagramação bastante oportuna, trazendo, em suas páginas, caixas explicativas de determinados termos, conceitos e eventos, bem como referenciando autoras e autores estudiosos do tema. Uma opção das mais felizes. Outra opção acertada foi a mencionada logo no início desta argumentação: de narrar fluidamente como funciona o ofício de historiar. A casa editorial que abriga a obra tem por nome Editora Coragem, fundada no ano 2020. Não poderia haver nome mais pertinente. Muito possivelmente foi a coragem, em várias de suas vertentes, que manteve todas as pessoas escravizadas na Freguesia de Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos – como em todos os quase 400 anos de escravidão no Brasil – firmes e perseverantes, mesmo vivendo em um tênue equilíbrio.
Referências
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BERUTE, Gabriel Santos. Dos escravos que partem para os portos do sul: características do tráfico negreiro do Rio Grande de São Pedro do Sul, c. 1790-c. 1825. Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2006.
FONER, Eric. Nada além da liberdade: a emancipação e seu legado. Rio de Janeiro: Paz e Terra; Brasília: CNPq, 1988. 186 p.
GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição. Tradução de Maria Betânia Amoroso. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. 274 p.
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MOREIRA, Paulo Roberto Staudt. Sobre fronteira e liberdade – representações e práticas dos escravos gaúchos na Guerra do Paraguai (1864-1870). Anos 90, Porto Alegre, v. 6, n. 9, pp. 119-149, jul. 1998.
MOREIRA, Paulo Roberto Staudt. Os cativos e os homens de bem: experiências negras no espaço urbano. Porto Alegre 1858-1888. Porto Alegre: EST Edições, 2003.
MOREIRA, Paulo Roberto Staudt. Entre o deboche e a rapina: os cenários sociais da criminalidade popular em Porto Alegre. Porto Alegre: Armazém Digital, 2009.
OLIVEIRA, Vinicius Pereira de. A presença negra no porto de Rio Grande. Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2009.
OSÓRIO, Helen. Fronteira, escravidão e pecuária: Rio Grande do Sul no período colonial. JORNADAS DE HISTÓRIA REGIONAL COMPARADA, II. In: TARGA, Luiz Roberto; HERRLEIN JÚNIOR, Ronaldo; MERTZ, Marli Marlene (Orgs.). Anais: II Jornadas de História Regional Comparada; I Jornadas de Economia Regional Comparada. Porto Alegre: PUC-RS, 2005. pp. 1-16.
PEDROSO, Wagner de Azevedo. Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos: “os brancos eram uns pelos outros, por isso os negros também deviam fazer o mesmo”. Porto Alegre: Coragem, 2020. 168 p.
PERUSSATTO, Melina Kleinert. Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós-abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (c.1892-c.1911) Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2013.
REIS, João José; SILVA, Eduardo. Negociação e conflito: a resistência negra no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras , 1989. 154 p.
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XAVIER, Regina Célia Lima. Religiosidade e escravidão, século XIX: mestre Tito. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008.
WEIMER, Rodrigo de Azevedo. Os nomes da liberdade: experiências de autonomia e práticas de nomeação em um município da serra rio-grandense nas duas últimas décadas do século XIX. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós Graduação em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo, 2007.
Resenhista
Hilton Costa – Universidade Estadual de Maringá (UEM). E-mail: hcosta@uem.br
Referências desta Resenha
PEDROSO, Wagner de Azevedo. Nazário e um plano de rebelião escrava na Aldeia dos Anjos: “os brancos eram uns pelos outros, por isso os negros também deviam fazer o mesmo”. Porto Alegre: Coragem, 2020. Resenha de: COSTA, Hilton. Tênue equilíbrio: a vida de pessoas escravizadas no Brasil oitocentista. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 42, n. 89, 2022. Acessar publicação original [DR]
Brasil em projetos: história dos sucessos políticos e planos de melhoramentos do reino. Da Ilustração portuguesa à Independência do Brasil | Jurandir Malerba
Toda administração e todo governo de negócios e de Estados carece de projetos. De planos elaborados com vistas a atingir determinados objetivos; definindo problemas, metas, estratégias e ações com níveis desejados de controle, autonomia e negociação capazes de garantir sua condução com êxito. Além de conhecê-los, é fundamental saber dos homens que os propõem e os executam. Em Brasil em projetos, Jurandir Malerba, professor titular de Teoria e Metodologia da História na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, procura inventariar os projetos para o Brasil desde a Ilustração até a Independência, realizando uma síntese minuciosa que não trata apenas daqueles projetos, mas também da própria historiografia em torno deles, com uma escrita clara e acessível para os públicos leigo e universitário.
Em um momento histórico dramático, marcado por uma pandemia global, há uma pergunta que é constantemente feita na imprensa e nos círculos intelectuais brasileiros: o governo Bolsonaro tem um projeto para o Brasil? Não poucos analistas apontam a existência de um plano autoritário em curso, de esgarçamento social, de favorecimento a políticas armamentistas, de privatização de ativos e empresas estatais, de retirada de direitos sociais e trabalhistas em consonância com uma agenda neoliberal que valoriza a exportação de commodities e o capital financeiro. E uma palavra que surge em muitos diagnósticos é retrocesso. Seria este o projeto de Bolsonaro, um governo à serviço do atraso e do conservadorismo? Para responder a estas perguntas, conhecer projetos políticos do passado pode ser um bom caminho. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.42, n.89, 2022.
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Construir soberanía. Una interpretación económica de y para América Latina | Theotonio dos Santos
La presente antología presenta un conjunto de textos sobre el científico social brasilero Theotonio Dos Santos (1963-2018), especialmente sus aportes sobre la formación económica y social de Brasil como latinoamericana a partir del marxismo nacionalizado que adoptó en sus análisis. Como destaca Mónica Bruckman en una introducción a la obra, los escritos del brasilero pueden datarse en cuatro momentos cronológicos: la apropiación del marxismo, la dinámica de la dependencia, el papel de la revolución científico-técnica y las preocupaciones sobre la economía mundial. Estos ejes que atraviesan la obra de Dos Santos, se tornan de especial importancia en nuestros días teniendo en cuenta los problemas de desarrollo, integración política y lucha contra la desigualdad que enfrentará la región luego de la pandemia por COVID-19.
A partir de los años 1960 Dos Santos comenzó a formarse en el marxismo y a vincularse con importantes intelectuales como Aníbal Quijano, Fernando Enrique Cardoso, Francisco Weffort, Pedro Paz, entre otros. Aquí se sitúan sus primeros análisis y publicaciones en torno a las clases sociales en Brasil y el desarrollo desde un punto de vista político. Luego vinieron los años en la Universidad de Brasilia donde Dos Santos se apropiará de la teoría marxista de la dependencia y su posterior exilio a Chile tras el golpe de 1964 donde seguiría trabajando con reconocidas figuras como Ruy Mauro Marini y André Gunder Frank. En una tercera etapa iniciada con el golpe de Estado en Chile en 1973 vino la desarticulación de los estudiosos de la dependencia y el exilio a México para desempeñar labores en la Universidad Nacional Autónoma de México donde se dedicó a estudiar la revolución científica tecnológica y su impacto en el desarrollo de las fuerzas productivas a nivel global. Fueron los años en que Dos Santos aportó al conocimiento del capitalismo global y al papel de la ciencia en el desarrollo de industrias y la intervención el Estado en ese proceso. Por último, viene el núcleo de estudios en torno al desarrollo y el proceso civilizatorio desde perspectivas históricas donde profundizó el enfoque de Kondrátiev y cuestionó a teóricos de renombre como a Immanuel Wallerstein y a Giovanni Arrighi en torno a la formación capitalista mundial. Leia Mais
Between the Ottomans and the Entente: The First War in the Syrian and Lebanese Diaspora/1908-1925 | Stacy D. Fahrenthold
A Primeira Guerra Mundial pode ser compreendida utilizando-se distintas perspectivas de análise, que podem privilegiar os conflitos bélicos, as relações diplomáticas entre os países que se envolveram na guerra e o resultado da assinatura de tratados que impactaram na conformação de uma geopolítica. A relevância deste episódio é destacada por diferentes autores. Para o historiador Eric Hobsbawm, ele representou o fim dos Impérios e de uma forma de organização política que perdurou por grande parte do século XIX e início do XX (Hobsbawm, 2009, p. 24)1. Para a filósofa Rosa Luxemburgo, a guerra foi o resultado do desenvolvimento capitalista, que buscava a conquista dos mercados mundiais para assegurar as condições necessárias para a acumulação do capital, sendo “a expressão política do processo de acumulação do capital, em sua luta para conquistar as regiões não capitalistas que não se encontrem ainda dominadas” (Luxemburgo, 1970, p. 392). Leia Mais
Contact Strategies: Histories of Native Autonomy in Brazil | Heather F. Roller
Nas últimas décadas, apareceram numerosos estudos sobre a história das regiões fronteiriças das Américas, muitos deles focados nas estratégias dos europeus para afirmarem sua soberania sobre territórios e atraírem os povos indígenas a se tornarem súditos das monarquias1. No bojo dessa importante produção historiográfica, alguns autores têm atentado para a perspectiva indígena, demonstrando que, em realidade, foram os povos autônomos que iniciaram os contatos, impuseram as pautas nas negociações de paz, inseriram os europeus em redes nativas de diplomacia, comércio e parentesco, e, com isso, conseguiram manter sua autonomia para além do colapso dos impérios coloniais2. Leia Mais
Lembrança do presente: ensaios sobre a condição histórica na era da internet | Mateus Henrique de Faria Pereira
Para lidar com a finitude, os homens atribuíram sentido, em diferentes circunstâncias históricas, ao tempo e à ausência dele: inventariaram virtudes capazes de proporcionar uma vida feliz; filosofaram sobre os sentidos da existência; compuseram cosmogonias ou mitos originários; poetizaram sobre as relações entre deuses e mortais; figuraram o além; articularam premissas sobre a transubstanciação da alma; relataram experiências xamânicas; elaboraram regimentos para validar o ritual da apoteose ou da divinização dos reis. Conceber o tempo significa refletir sobre a existência mundana e a morte; forjar elos entre mundo físico e plano metafísico, muitos deles amparados em sacrifícios e libações; constituir vínculos entre memória e esquecimento, entre ser e não-ser. Assim, faraós redivivos, imperadores deificados, almas danadas, indivíduos beatificados são produzidos conforme interesses datados e imaginários, uma vez que os agentes históricos conferem sentido ao sagrado e ao profano, aos ritos fúnebres, aos cultos à memória, gestos ancestrais cujo sentido depende de aparatos técnicos, dinâmicas sociais, saberes e estruturas simbólicas; componentes que participam da historicidade do tempo e organizam sua (in)coerência por intermédio da narrativa. Leia Mais
M: o filho do século | Antonio Scurati
Por dever de ofício, historiadores com frequência riscam algumas palavras de seus dicionários. “Natural”, “espontâneo” e “inevitável” costumam ser algumas delas. Seu apelo autoexplicativo justifica a recusa: há nelas uma tendência em tornar evidente exatamente aquilo que precisa ser entendido, estudado. Agindo assim, terminam justamente por onde o fazer historiográfico deveria começar. Para o ofício, são um perigo. De qualquer forma, vale o risco em contrariar a cautela e dizer que o crescimento da extrema-direita ao redor do mundo torna o interesse por M: o filho do Século quase natural, espontâneo, e que a sua leitura vai, aos poucos, se tornando mais e mais inevitável. Lançada originalmente na Itália em 2018, a obra, que encontrou sua tradução brasileira pela Editora Intrínseca apenas um ano depois, não é propriamente um trabalho historiográfico. Tampouco seu autor é historiador. Escrito por Antonio Scurati, professor de Literatura Contemporânea da Universidade de Comunicação e Línguas (IULM) de Milão, o livro pode ser melhor definido como um “romance histórico”: uma classificação atestada não apenas pela formação e pela vinculação institucional de seu autor, mas também por ter sido laureado com o Prêmio Strega, um dos mais importantes da literatura italiana. Trata-se, portanto, de trabalho não muito frequente entre historiadores, algo que, longe de diminuir seu interesse para o grupo, o reforça. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.41, n.88, 2021.
- Criar e manter um periódico científico: discutindo a sustentabilidade das revistas acadêmicas no campo da História Editorial
- Slemian, Andréa; Sousa, Marcos Eduardo de
- Texto: pt
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- APRESENTAÇÃO DOSSIÊ: RACISMO EM PAUTA: “A HISTÓRIA QUE A HISTÓRIA NÃO CONTA” Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Arantes, Erika B.; Farias, Juliana Barreto; Santos, Ynaê Lopes dos
- Texto: pt
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- Miradas sobre o poder: A nova agência política do movimento negro brasileiro (2004-2021) Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Pereira, Aline; Pereira, Vantuil
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Entre a lembrança e o esquecimento: memória, história e patrimônio cultural afro-brasileiros Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Paiva, Marcelo Cardoso de
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- De inimigos a bons amigos? Os Camacã e o Barão Fernando Steigerno quadro da interiorização da colonização na província da Bahia Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Silva, Ayalla Oliveira
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Excluídos em nome da lei: práticas racistas no sistema jurídico da Guiana Inglesa Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Silva, João Italo de Oliveira e
- Resumo: en pt
- Texto: pt
- PDF: pt
- A “canalha de toda qualidade”.Ação, perseguição e racialização dos sujeitos delituosos, Bahia, 1823-1850 Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Santos, Igor
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Racismo, trabalho e ociosidade no processo de abolição: o Brasil e o Império Português numa perspectiva global (1870-1888) Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Terra, Paulo Cruz
- Resumo: en pt
- Texto: en pt
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- O Canadá Negro: Universal Negro Improvement Association, a Diáspora e a Amefricanidade Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Mattos, Pablo de Oliveira de
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- Texto: pt
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- Alguém falou em teoria quare? Pensando raça e sexualidade a partir da crítica de intelectuais LGBTQIA + negres norte-americanes à teoria queer Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Weimer, Rodrigo de Azevedo
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- Texto: pt
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- É possível indisciplinar o cânone da história da historiografia brasileira? Pensamento afrodiaspórico e (re)escrita da história em Beatriz Nascimento e Clóvis Moura Dossiê – Racismo E Relações Étnico-Raciais
- Assunção, Marcello Felisberto Morais de; Trapp, Rafael Petry
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Escrever a tradição, modernizar a nação: literatura e identidade nacional durante o Estado Novo de Vargas (1937-1945) Artigos Avulsos
- Grecco, Gabriela de Lima
- Resumo: en pt
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- Solidariedade intelectual Sul-Americana: ecos dos ensinamentos do Mestre Rodó no Paraguai Artigos Avulsos
- Santos, Elisângela da Silva
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Entre fuzis, cachaça e crucifixos: a catequese dos Munduruku no aldeamento do Bacabal (1872-1882) Artigos Avulsos
- Henrique, Marcio Couto
- Resumo: en pt
- Texto: pt
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- Fabricando consensos e conflitos: protagonistas e temas da primeira onda de congressos associativos em Portugal (1865-1934) Artigos Avulsos
- Pereira, Joana Dias
- Resumo: en pt
- Texto: en pt
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- Recontar para ressignificar: passado e presente em pauta no racismo estrutural Resenhas
- Lima, Priscila Nottingham de
- Texto: pt
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- Do mirante, um facho de luz: trajetória biográfica de um militante de esquerda Resenhas
- Mezzomo, Frank Antonio
- Texto: pt
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- O trabalho no Brasil e nos Estados Unidos: aproximações Resenhas
- Silva, Nauber Gavski da
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- Entrevista: Lélia Gonzalez – Intérprete do Brasil. Por seu filho Rubens Rufino Entrevista
- Castro, Amanda Motta; Moreira, Raylene Barbosa
Brasil: do ensaio ao golpe (1954-1964) | Revista Brasileira de História | 2004
Disse o poeta que o historiador “veio para ressuscitar o tempo e escalpelar os mortos”. Fiel ao vaticínio, este número da Revista Brasileira de História escarafuncha a memória de um lugar e de um tempo crítico para a nacionalidade: o Brasil, do ensaio ao golpe: 1954-1964. Nem lamentação, nem regozijo encontraremos nas páginas seguintes. Nos depararemos com história, ou melhor, historiografia. Mas não há nesse encontro descabida pretensão de prioridade ou de originalidade. Pelo contrário.
Há dez anos, isto é, três décadas após o golpe de Estado de 1964, a própria RBH publicava um dossiê com as mesmas características do presente número. Naquele momento, o título da revista er a Brasil 1954-1964, e trazia matérias representativas de uma radiografia de então sobre o conhecimento historiográfico do período. Estavam ali presentes temas como a atuação das esquerdas, a análise da historiografia sobre o golpe, a ação política dos camponeses e de trabalhadores urbanos, o comunismo, o nacionalismo nas relações externas, a vinculação entre política e cultura etc. Os recursos metodológicos adotados eram os mais variados, denotando a influência expressiva de novos métodos e abordagens da história cultural já então consolidados. A preocupação com o conceitual relativo à história do tempo presente era evidente. Na composição dos artigos, os historiadores valiam-se de instrumental tradicional como a pesquisa em periódicos, em papéis partidários ou em documentos de Estado, mas recorriam também à produção artística, às evidências fotográficas, às memórias e às histórias de vida. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.41, n.87, 2021.
- Considerações sobre a produção e a divulgação do conhecimento histórico em tempos de negacionismo Editorial
- Stein, Marcos Nestor
- Texto: PT
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- APRESENTAÇÃO – NEGACIONISMO: HISTÓRIA, HISTORIOGRAFIA E PERSPECTIVAS DE PESQUISA Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Valim, Patrícia; Avelar, Alexandre de Sá; Bevernage, Berber
- Texto: PT
- PDF: PT
- Entre a bomba atômica e os crimes de guerra: o negacionismo e a historiografia japonesa em perspectiva Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Marcello Neto, Mario
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Os vendedores de verdades: o dizer verdadeiro e a sedução negacionista na cena pública como problema para o jornalismo e a história (2010-2020) Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Meneses, Sônia
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Em busca da mentira: historiadores contra a falsificação do Holocausto Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Cardoso, Eduardo Wright
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- No Ceará não tem disso não?Negacionismos e povos indígenas e negros na formação social do Ceará Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Barboza, Edson Holanda Lima; Mariz, Silviana Fernandes
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Sergio Moro negacionista? Operação Lava Jato, transparência atualista e negação da política Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Pereira, Mateus Henrique de Faria; Silva, Daniel Pinha
- Resumo: EN PT
- Texto: EN PT
- PDF: EN PT
- Qual passado escolher? Uma discussão sobre o negacionismo histórico e o pluralismo historiográfico Dossiê – Negacionismos E Usos Da História
- Avila, Arthur Lima de
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Etnopaisagem Jê e reterritorialização do Brasil Meridional (1768-1773) Artigo
- Moura, Denise Aparecida Soares de
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Anormalidad y Cultura Psiquiátrica: una indagación a partir de la Revista de Psiquiatría y Disciplinas Conexas, Chile, 1935-1957 Artigo
- León, Marco Antonio
- Resumo: EN ES
- Texto: ES
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- Da renda inglesa aos diamantes do Brasil: as encomendas de D. Maria I a D. Vicente de Sousa Coutinho na corte de Paris Artigo
- Gomes, Ana Luiza de Castro Pereira
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
- PDF: PT
- Os choques percepcionaisdo falhado processo de descolonização do Timor (1974-1975) Artigo
- Mendes, Pedro Emanuel
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Escolas como postos de socorros: instituições escolares na epidemia de gripe espanhola no Rio de Janeiro (1918) Artigo
- Santos, Ademir Valdir
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Operários chineses em Moçambique. O engajamento de trabalhadores sob contrato no Império português (1857-1859) Artigo
- Gonçalves, Paulo Cesar
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- A missão gastronômica francesa no Brasil dos anos 1970 Artigo
- Previatti, Débora
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
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- Para além do humor e do sexo: hierarquias em negociação Resenha
- Garzoni, Lerice de Castro
- Texto: PT
- PDF: PT
- Episcopado, clero regular e regalismo na América portuguesa Resenha
- Britto, Michelle Carolina de
- Texto: PT
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- Ainda o populismo: desta vez, o protagonismo negro Resenha
- Flores, Elio Chaves
- Texto: PT
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- A lavoura do algodão no sul dos Estados Unidos antes da Guerra Civil: uma história de amor global entre capitalismo e escravidão Resenha
- Negro, Antonio Luigi
- Texto: PT
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A História (in)Disciplinada: teoria, ensino e difusão do conhecimento histórico. | Arthur Lima de Avila, Fernando Nicolazzi e Rodrigo Turin
Fernando Nicolazzi | Foto: Canal História da Ditadura
No dia 27 de abril de 2020, Jair Bolsonaro vetou integralmente o projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que previa a regulamentação da profissão de historiador. Entre muitos aspectos que podem ser explorados a partir da análise dessa ação controversa, um deles se refere ao concorrido campo da história. Longe de ser uma “ciência dedicada aos mortos”, a história – e o direito de enunciá-la ou de interditá-la – é ponto de embate ideológico, além de um importante instrumento político, intrinsecamente vinculado a questões do nosso presente. Leia Mais
State violence, torture, and political prisoners: on the role played by Amnesty International in Brazil during the dictatorship (1964-1985) | Renata Meirelles
Renata Meireles | Fotomontagem: RC/coldwarbrazil.fflch.usp.br
Em 2010, Samuel Moyn publicou aquele que seria seu principal livro sobre os direitos humanos: The last utopia: human rights in history. Nas palavras do historiador, se “os direitos do homem tinham relação com a reunião de um povo em torno de um Estado, e não com estrangeiros que podiam criticar outro Estado por suas violações” (Moyn, 2010, p. 26 [tradução do autor]), a primeira definição não mais se aplicaria ao mesmo conceito um século e meio depois de sua invenção nos Estados Unidos e na França revolucionários.
A grande mudança aconteceu após a Segunda Guerra Mundial, e mais intensamente ao longo da Guerra Fria, quando, nos anos 1970, a política internacional transformou-se em disputa pelo que então se queria entender por emancipação humana, ou por conquista de novas liberdades, quer no sentido anticolonial, quer no sentido da democracia repensada, restaurada, ampliada. A novidade do conceito de direitos humanos estava no ato de se acreditar que era mesmo possível agir-se para a elevação política e moral da humanidade, sem as limitações das fronteiras nacionais, se intervindo nos Estados de forma que seus governos, criticados externamente, respondessem por seus atos e promovessem mudanças positivas. Leia Mais
O Auge da História. História do curso de História da Universidade Federal do Paraná | Bruno Flávio Lontra Fagundes
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná na década de 1940. Foto: Divisão de Documentação Paranaense/Exatas.ufpr.br
Nota-se, nas últimas duas décadas, um adensamento nos esforços em prol da historicização dos cursos de História no Brasil. Constituem sua forma mais visível e direta os estudos de caso, em que se combinam, de maneiras variadas, histórias institucionais e políticas, bem como análises de programas e estudos populacionais (em particular, de docentes).[1] Não menos significativas, contudo, são as investigações de aspectos outros, indiretos, que reverberam na compreensão da história dos cursos. Seja analisando trajetórias de indivíduos ou grupos[2], seja apostando na etnografia de práticas que acompanham a criação de tais espaços[3], esse segundo conjunto de trabalhos ajuda a dimensionar com maior precisão a complexidade de objetos de estudo que nos são, ao mesmo tempo, próximos e caros.
É no cruzamento dessas duas sendas que vem se situar O Auge da História, livro escrito por Bruno Flávio Lontra Fagundes e dedicado ao estudo do curso de História da atual Universidade Federal do Paraná (doravante UFPR). Trata-se de mais uma inflexão na versátil e multidisciplinar trajetória de seu autor, que explorou, antes, o “livro-arquivo” de José Pedro Xavier da Veiga (2014a), ou então as representações do Brasil e de sua história na literatura contemporânea (2010 e 2011). Professor da Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) desde 2015, Fagundes apresenta nele as conclusões de um estágio pós-doutoral realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em alguma medida prefiguradas em artigos científicos já conhecidos na área (2014b e 2017). Leia Mais
Clichês baratos: sexo e humor na imprensa ilustrada carioca do início do século XX | Cristiana Schettini
Cristiana Schettini | Foto: cafehistoria.com
Em busca de diversão noturna, homens que viviam no Rio de Janeiro do início do século XX encontravam inúmeras opções de entretenimento no centro da cidade. Teatros, cinematógrafos, casas de chope e jardins são apenas alguns exemplos, dentre tantos outros locais de sociabilidade masculina. Não raro, nesses espaços, elementos relacionados ao sexo e ao humor eram mobilizados para atrair e satisfazer os anseios de uma ampla e diversificada clientela. “Estrangeiros no tempo”, leitoras e leitores de Clichês Baratos: sexo e humor na imprensa carioca do início do século XX, novo livro de Cristiana Schettini, iniciam seu percurso por esse mundo com um passeio que reproduz roteiros disponíveis a muitos consumidores desse lazer repleto de apelos eróticos. As perspectivas masculinas, porém, estão longe de serem as únicas, tampouco as mais enfatizadas pela historiadora.
Doutora em História pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), a autora fez uma tese sobre a prostituição carioca no início do período republicano. Esse trabalho foi premiado pelo Arquivo Nacional e deu origem ao livro “Que tenhas teu corpo”: uma história social da prostituição no Rio de Janeiro das primeiras décadas republicanas, publicado em 2006. Desde então, ela tem se dedicado a pesquisas sobre o tema e sobre imigração no Brasil e na Argentina, com ênfase na perspectiva de gênero. Publicou inúmeros artigos e organizou coletâneas, sendo a mais recente em parceria com Juan Suriano, intitulada Historias Cruzadas: diálogos historiográficos sobre el mundo del trabajo en Argentina y Brasil (2019). Atualmente, leciona no Instituto de Altos Estudios Sociales da Universidade Nacional de General San Martín (USAM) e é pesquisadora do Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET). Leia Mais
Estilo Avatar: Nestor Macedo e o populismo no meio afro-brasileiro | Petrônio Domingues
Petrônio Domingues | Foto: INFONET/Acervo pessoal
Eu quando estou com fome quero matar o Janio, quero enforcar o Adhemar e queimar o Juscelino. As dificuldades corta o afeto do povo pelos políticos (Carolina Maria de Jesus, 1960).
O historiador Petrônio Domingues (Universidade Federal de Sergipe) tornou-se documentalista de um campo de estudos que ajudou a formatar: o Pós-Abolição. Escolhido um determinado tema da República brasileira, sempre com recorte racial, não há acervo, fonte e documento que não acabe sendo visitado, folheado e interpretado pelo pesquisador, ávido por novas fontes e documentos nunca dantes arrolados. Nem todo historiador exercita a qualidade do documentalista, uma vez que não é incomum, na instituição historiadora, aquele vício soberbo que arrebata boa parte de nós, para a glória acadêmica e de currículos “serventes da erudição”. Imerso nos arquivos, o professor Domingues entra e sai de lá para escrever, à moda thompsoniana, “contra o peso das ortodoxias predominantes” (Thompson, 1987, p. 12). Leia Mais
Regalismo no Brasil Colonial: a coroa portuguesa e a Ordem do Carmo, Rio de Janeiro, 1750-1808 | Leandro Ferreira Lima da Silva
Palace Square, Rio de Janeiro. Ao fundo, a Igreja do Carmo (esquerda) e a Igreja da Ordem Terceira do Carmo (direita) | Imagem: Richard Bate, 1808
O regalismo pombalino e o processo de submissão da Igreja ao Estado no império português foram amplamente reconhecidos pela historiografia luso-brasileira. Entretanto, apenas nas últimas décadas houve tentativas de análise que ultrapassassem as interpretações clássicas que compreendiam a ação regalista da monarquia portuguesa como uma política exclusivamente antijesuítica[2]. As transformações no campo historiográfico e a ampliação da noção de documento (Rousso, 1996), sobretudo após o advento da Nova História Cultural, resultaram em pesquisas inovadoras sobre o período pombalino e, sobretudo, problematizadoras da primazia inaciana. Esta, apesar de ser central na construção da política pombalina, não é suficiente para a compreensão das múltiplas dimensões das ações estatais direcionadas aos religiosos, e das ações do episcopado e de agentes civis em sua aplicação no Reino e no ultramar. Aqui reside a originalidade da obra de Leandro Ferreira Lima da Silva, Regalismo no Brasil Colonial, resultante da sua dissertação de mestrado e vencedora do prêmio de História Social (2013-2014) pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo.
Graduado em História pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de São Paulo, Leandro Ferreira Lima da Silva possui uma trajetória de pesquisa sólida e em ascensão no campo de estudos sobre o regalismo pombalino. Além da obra resenhada, o autor escreveu “À sombra da “última ruína”: regalismo e gestão material na província de Nossa Senhora do Carmo do Rio de Janeiro” (Silva, 2013). Atualmente, Silva é doutorando em História pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo, no qual continua os estudos sobre os impactos da reforma regalista sobre o clero regular. Leia Mais
A metade que nunca foi contada: a escravidão e a construção do capitalismo norte-americano | Edward Baptist
Edward E. Baptist | Foto: nytimes.com
Enfim traduzido, o livro de Edward Baptist vem para estimular o conhecimento do passado e a compreensão do mundo contemporâneo. O autor propõe trazer a lume a metade da História nunca contada: a escravidão estadunidense fazendo par com o capitalismo industrial britânico, e, também, o seu papel na formação do capitalismo estadunidense, de 1790 a 1860. Debruçada sobre essa aliança entre lavoura escravista e Revolução Industrial no Atlântico Norte, a obra também faz ver a experiência de homens e mulheres escravizados, africanos ou afrodescendentes. Com cenas vívidas, ampla e minuciosa pesquisa, reconstitui a experiência e a ação – agency – dos trabalhadores. O livro de Baptist comprova, novamente, o “impacto dos em tese impotentes sobre os poderosos em termos econômicos e políticos” (Greenidge, 2020).
O autor Edward Baptist é professor da Universidade de Cornell e historiador dos Estados Unidos, tendo o século XIX como recorte cronológico. Estuda a vida de homens e mulheres escravizados no Sul, região que é cenário de uma maciça expansão da escravatura, devido à lucratividade do algodão (o que terminou por precipitar a Guerra Civil em 1861). O público a que o livro se destina é aquele que deseja conhecer melhor a força da escravidão, por um lado, e, por outro, também a força dos escravizados. Também mata a sede de quem quer entender o contemporâneo apego dos estadunidenses ao lado perdedor da guerra, o sulista, que quis se separar do país para fundar um outro, a fim de manter a escravidão. Os efeitos duradouros desse apego podem ser simbolizados hoje, mais do que nunca, nas imagens da tentativa de golpe de Estado em 6 de janeiro de 2021, a qual, embora um fiasco, conseguiu desfraldar a bandeira confederada dentro do Capitólio. Leia Mais
Taking possession: The Politics of Memory in a St. Louis Town House | Heidi Aronson Kolk
Heidi Kolk | Fotomontagem: RC/ amcs.wustl.edu
Em Tomando posse: as políticas de memória em uma casa em St. Louis (tradução livre), Heidi Kolk, professora da Washington University (St. Louis), analisa as políticas da memória e o processo de musealização da Campbell House, edificação localizada na cidade de St. Louis, no estado americano do Missouri. A casa, datada de 1851 e situada no antigo bairro exclusivo conhecido por Lucas Place, foi a residência de Robert Campbell – empresário e membro das elites locais -, sua esposa Virginia e seus filhos, Hugh e Hazlett. A residência dos Campbell foi transformada na Campbell House Museum (Casa-Museu Campbell), oficialmente aberta ao público em 1943.
O trabalho de Kolk pode ser compreendido como um estudo exemplar de história pública, analisando as ações e engajamentos de um conjunto diverso de agentes sociais para a produção da memória e de significados sobre o passado na esfera pública. Articulando um leque amplo de perspectivas teórico-analíticas – como história pública, história urbana, museologia, geografia cultural, antropologia e sociologia -, o estudo interdisciplinar de Kolk, estruturado em oito capítulos, considera os principais acontecimentos históricos e “atos de apropriação” da Campbell House, desenrolados ao longo de aproximadamente um século e meio. Para o desenvolvimento do estudo, a autora baseia-se primordialmente numa análise da cultura material e dos objetos que constituem as coleções e o acervo do Museu, além de documentos históricos e textos jornalísticos divulgados na imprensa. Leia Mais
Negacionismos e usos da história | Revista Brasileira de História | 2021
Negacionismos | Fotomontagem: Jornal da USP
Como certos passados, sistematicamente escrutinados pelos historiadores, amplamente debatidos e largamente documentados, podem ser simplesmente negados ou apresentados como invenções motivadas por interesses escusos? O que leva grupos e indivíduos a duvidarem da existência do Holocausto, da ditadura militar brasileira, dos incontáveis genocídios ao redor do mundo ou da escravidão que, ao longo de mais de três séculos, moldou as formas sociais do capitalismo moderno? Quais são as operações intelectuais, afetivas, políticas e ideológicas que envolvem e inscrevem os desafios e interrogações lançados pelos negacionismos à história, como conhecimento organizado do passado, aos seus usos políticos, apropriações e condições de produção da verdade?
Estas questões estiveram nas origens deste dossiê e agora são aprofundadas pelos artigos que o compõem. Eles apresentam um arco diversificado de reflexões acerca das variadas formas de visibilidade do negacionismo e do revisionismo ideológico no espaço público, bem como se propõem a pensar o papel da escrita da história e dos historiadores em seu enfrentamento. Evidentemente, explorar todas as respostas possíveis para as perguntas anteriores nos levaria a perscrutar um domínio inalcançável de análises produzidas por áreas que, ao longo das últimas décadas, procuraram decifrar a complexidade do fenômeno negacionista. Nossos objetivos são outros. Leia Mais
Conflictividad y violencia política en América Latina (siglos XX-XXI)/Historia Caribe/2021
El siglo XX latinoamericano, desde sus primeras dos décadas, fue testigo del desarrollo de luchas sociales por demandas, tales como el acceso a la tierra, los derechos laborales, la consecución de la vivienda, el mejoramiento de la calidad de vida, y el respeto a los derechos ciudadanos, por señalar solo los más importantes. Estas luchas, que movilizaron a miles de pobres de la ciudad y el campo en el contexto de un capitalismo concentrador de la riqueza y dependiente, se encontraron habitualmente con la respuesta negativa o insuficiente de los Estados y sus distintas formas de régimen político. Estos regímenes, ya sea como dictaduras militares, populismos, regímenes oligárquicos o como democracias excluyentes, recurrieron de forma extendida a la represión como recurso de control social y político. Esta diada de demandas radicales y respuestas represivas configuró buena parte del escenario histórico latinoamericano durante el siglo XX. No obstante, la centralidad de la violencia en la construcción histórica de las sociedades latinoamericanas en su análisis historiográfico solo ha sido parcial y tardíamente desarrollado. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.41, n.86, 2021
- O papel dos periódicos na publicação de dados de pesquisa Editorial
- Araujo, Valdei
- Texto: PT
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- Raça e antiescravismo no Caribe espanhol: o ativismo de Antonio Maceo e Ramón Emeterio Betances Artigos
- Mata, Iacy Maia
- Resumo: EN PT
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- A droga da subversão: anticomunismo e juventude no tempo da ditadura Artigos
- Brito, Antonio Mauricio Freitas
- Resumo: EN PT
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- Operações do pensamento histórico de jovens estudantes: um estudo sobre a concepção de evidência Artigos
- Reis, Aaron Sena Cerqueira
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- Texto: PT
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- Tráfico interprovincial e alforria em grandes propriedades do termo de Monte Alto, Século XIX Artigos
- Miranda, Rosângela Figueiredo
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- Séculos de silêncio: contribuições de um antropólogo para uma história da “homossexualidade” no sul de Moçambique (Séc. XVI-XX) Artigos
- Miguel, Francisco Paolo Vieira
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- A “biblioteca do impossível”: levantamento da produção editorial do DPDC/DNP Artigos
- Fraga, André Barbosa
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- A construção do poder em Angola nos romances de Pepetela: os novos ricos e a apropriação do Estado no pós-independência Artigos
- Machado, Carolina Bezerra
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- Percursos de pesquisa, caminhos de mediação* Entrevista com Mônica Raisa Schpun Entrevista
- Natal, Caion Meneguello; Marchetti, Fabiana
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- Por uma história (in)disciplinada: historiografia, teoria da história e politização do saber Resenhas
- Dalfré, Liz Andréa
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- Anistia chega ao Brasil, ou como uma organização britânica ultrapassou fronteiras, amparou presos políticos e escancarou crimes da ditadura militar Resenhas
- Mesquita, Gustavo
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- Sobre Ensino e Pesquisa Resenhas
- Benthien, Rafael Faraco
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- ERRATA: A Questão das Ilhas Åland: Irredentismo e Autonomismo no ‘Arquipélago Da Paz Errata
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Universidades Populares y experiencias de extensión educativa en América Latina en la primera mitad del siglo XX/Historia Caribe/2021
Las Universidades Populares, destinadas a la formación de obreros y artesanos en ámbitos tan diversos como la alfabetización, la formación política y ciudadana, la prevención sanitaria, las enseñanzas prácticas y profesionales o la difusión cultural, fueron instituciones que surgieron por toda América Latina en el primer tercio del siglo XX. Aunque contamos ya con estudios relevantes sobre algunas de estas iniciativas, el tema ha sido aún escasamente abordado por la investigación histórica. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.40, n.85, 2020.
- Novo Qualis: rumos e rumores Editorial
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Revista Brasileira de História. São Paulo, v.40, n.84, 2020.
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- Faversani, Fábio; Santos, Dominique Vieira Coelho dos; Rosillo-López, Cristina
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- A recusa da interação: um ensaio historiográfico sobre etnocentrismo e racismo na Grécia Antiga Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Jácome Neto, Félix
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- Recepções da Antiguidade e usos do passado: estabelecimento dos campos e sua presença na realidade brasileira Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Silva, Glaydson José da; Funari, Pedro Paulo; Garraffoni, Renata Senna
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- Horácio e o uso poético-político do passado Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Silva, Camilla Ferreira Paulino da; Leite, Leni Ribeiro
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- Recepção da Antiguidade: a tirania de Pisístrato na defesa da monarquia moderada no jornal Correio da Liberdade(Porto Alegre, 1831) Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Vargas, Anderson Zalewski
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- Palavra de Mulher: sobre a “voz das mulheres” e a história grega antiga Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Andrade, Marta Mega de
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- Retomando a Arqueologia da Imagem: entre iconografia clássica e cultura material Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Francisco, Gilberto da Silva; Sarian, Haiganuch; Cerqueira, Fábio Vergara
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- Os celtas na Antiguidade: cruzando a divisão entre História Antiga e arqueologia Dossier: Ancient History Between Local And Global: Integration, Conflict, And Uses Of The Past
- Karl, Raimund
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- ¿Tiene sentido estudiar historia antigua del cercano Oriente hoy? Tres razones y algunas reflexiones Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Zapata, Horacio Miguel Hernán
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- Estatuas antiguas en contextos islámicos: el discurso de DAESH – la respuesta a la Historia Dossiê – A História Antiga Entre O Local E O Global: Integração, Conflito E Usos Do Passado
- Ocón, Jorge Elices
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- O Brasil e a sombrados Estados Unidos: discursos sobre a autodeterminação nacional em Eduardo Prado e Araripe Júnior Artigos
- Armani, Carlos Henrique
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- Bezerra de Menezes e Gonçalves de Magalhães: muito além do cérebro. Tentativas de enfrentamento ao materialismo científico do século XIX Artigos
- Isaia, Artur Cesar
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- Ecos da Revolução Cubana no Chile da Unidade Popular: a “Declaración chilena”e a resposta de Enrique Lihn Artigos
- Schmiedecke, Natália Ayo
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- A atuação de Antônio Luis Cavalcanti e Albuquerque de Barros Barreto na Reforma Sanitária da Bahia (1924-1930) Artigos
- Batista, Ricardo dos Santos; Silva, Maria Elisa Lemos Nunes da
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- Arend, Silvia Maria F.; Moura, Esmeralda Blanco B. de; Sosenski, Susana (org.). Infâncias e juventudes no século XX: histórias latino-americanas Resenhas
- Santos Júnior, José Pacheco dos
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- Gonçalves, Leandro Pereira. Plínio Salgado: um católico integralista entre Portugal e o Brasil (1895-1975) Resenhas
- Oliveira, Rodrigo Santos de
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A História Antiga entre o local e o global: integração, conflito / Revista Brasileira de História / 2020
História Antiga: Diferentes Perspectivas
O presente dossiê surgiu em atendimento a uma chamada dos editores da Revista Brasileira de História e foi operacionalizado mediante uma rede de trabalho muito mais ampla do que aquela visível pelos nomes de seus organizadores. Desse modo, inicialmente, gostaríamos de agradecer aos colegas da coordenação do Grupo de Trabalho em História Antiga da Associação Nacional de História (GTHA-Anpuh), professores Alex Degan e Fábio Morales, ambos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que contribuíram para o sucesso dessa iniciativa ao lado do professor Dominique Santos, da Universidade de Blumenau (Furb), também integrante da Coordenação Nacional do GTHA-Anpuh e um dos editores do dossiê. O agradecimento é extensivo à comunidade de Antiquistas brasileiros, que atuou de forma intensa na divulgação deste dossiê tanto no Brasil quanto no exterior. A existência de diversos núcleos, laboratórios e grupos de pesquisa espalhados pelo Brasil [1] e com sólidas redes de colaboração internacional é a base sólida que permite que os estudos sobre a Antiguidade e suas recepções tenham se consolidado cada vez mais, a ponto de podermos construir um dossiê como este na Revista Brasileira de História. Essa ampla rede de cooperação representada pelas diversas ações regulares do GTHA-Anpuh [2] permitiu que o dossiê, apesar de ter sido lançado no final do ano e com prazo relativamente curto, encontrasse excelente acolhida. Desde o início, a contribuição da equipe da Revista Brasileira de História, muito particularmente do editor, professor Valdei Lopes de Araujo (Ufop), e do secretário, Marcus Vinicius Correia Biaggi (Anpuh), foi diligente, próxima e indispensável. As antiquistas que compõem o Conselho Editorial da Revista Brasileira de História, professoras Helena Papa (Unimontes) e Katia Pozzer (UFRGS), foram muito presentes, apoiando nosso trabalho em diversos momentos. Expressamos nossa gratidão!
Foram recebidas 15 excelentes contribuições de autores brasileiros e estrangeiros para a nossa chamada. Nesse ponto do processo, ganhou destaque e merece nosso mais efusivo agradecimento o trabalho dos pareceristas que se dedicaram não apenas a avaliar, mas também a qualificar com o máximo rigor e critério cada uma das propostas. A tarefa não era simples: havia 15 propostas muito qualificadas e só poderíamos publicar nove delas, por conta das normas do periódico. No total, trabalhamos com 36 pareceristas sediados no Brasil e no exterior para construirmos um quadro que permitiu a escolha cuidadosa dos artigos aqui apresentados. Essa seleção é ilustrativa, ainda que não seja exaustiva, da diversidade das pesquisas feitas pela nossa comunidade. Em que pese essa diversidade, há ainda alguma unidade que reflete o eixo proposto para o edital desde sua chamada inicial, que se expressava nestes termos:
Os desdobramentos dos vários processos de globalização e seus conflitos ao longo da história colocam em debate qual o papel das dinâmicas locais e de suas articulações ou interconexões em esfera global. Tal pauta assume relevância especial no tempo presente, em que a globalização apresenta paradoxalmente claros contornos de violenta exclusão. As pesquisas nesse campo para a Antiguidade são tão importantes que têm levado a uma redefinição do campo, como se vê em obras como Corrupting Sea, de Peregrine Horden e Nicholas Purcell (Horden; Purcell, 2000), e História Antiga, de Norberto Luiz Guarinello (Guarinello, 2013). As diversas abordagens teóricas, pensadas através dos processos de helenização, romanização, cristianização ou mediterranização, e também das críticas a seus limites, expressos sobretudo nas abordagens pós-coloniais e decoloniais, expressam a diversidade de estudos que temos produzido e debatido. Esse dossiê pretende servir como momento para um balanço e avaliação de possibilidades futuras de investigação.
Esses estudos sobre a Antiguidade que temos produzido e debatido no âmbito do GTHA-Anpuh, contudo, não se limitam à pesquisa sobre as sociedades antigas. Parte fundamental de nossas reflexões se volta para as tradições e representações que se produziram tendo como base fundamental a Antiguidade (tanto tradições intelectuais acadêmicas quanto culturais, expressas em linguagens tão diversas quanto as óperas e as séries em streaming, chegando aos jogos tradicionais ou de computador e narrativas populares e jornalísticas). Os estudos sobre os usos dos passados perpassam os vários momentos da existência de sociedades diversas ao longo do tempo. Isso ocorre com a nossa sociedade e com muitas e muitas outras que tomaram e tomam as várias Antiguidades como referência para se pensar a si mesmas (e é decisivo refletir criticamente sobre essas identidades construídas arbitrariamente por diferentes sociedades para si mesmas). O estudo da Antiguidade, sabemos, não pode ser pensado sem uma reflexão sistemática e aprofundada sobre os usos do passado, que são centrais para o estudo e releitura crítica desses passados (tanto os “antigos” quanto os que tomaram a esses “antigos” como elementos fundamentais para a construção de sua contemporaneidade, como apontam os estudos de François Hartog, na França, Francisco Murari e Pedro Paulo Funari, no Brasil, e José Antônio Dabdab Trabulsi com sua produção franco-brasileira).
Nesse campo dos usos do passado, ainda, assume relevância o ensino da História Antiga nos diversos níveis. O GTHA-Anpuh teve essa pauta no centro de seus debates desde sua criação (Silva, 2001), mas conheceu forte impulso a partir do debate sobre o lugar do Ensino da História com a reforma do Ensino Médio e a criação da BNCC no Brasil, além das mudanças que têm ocorrido na forma de se pensar o Ensino no mundo todo. Isso tem alimentado a discussão sobre esferas específicas no campo dos estudos sobre os usos do passado no que se refere especialmente à Antiguidade com a intensificação dos debates e o aprofundamento de práticas voltadas também para as atividades de Extensão. Esse movimento é percebido tanto pelo crescimento dos trabalhos apresentados nos encontros do GTHA-Anpuh quanto pelo aumento das publicações em nossos periódicos especializados.[3]
Em síntese, como expressa o título, este dossiê se volta à reflexão dos debates atuais na e sobre a História Antiga que têm sido produzidos no Brasil e no mundo, face aos dilemas e conflitos produzidos pela globalização e seus efeitos, sejam os positivos como os adversos. Trata-se, acima de tudo, de avivar e registrar um debate entre o mundo atual (em sua diversidade) e mundos antigos (idem), cuja conjunção permite fertilizar e tornar mais plural o próprio campo da História.
As contribuições publicadas neste dossiê refletem diferentes olhares para esse eixo geral proposto pelos editores. Problematizando as obras de Benjamin Isaac (2004) e Susan Lape (2010), Félix Jácome Neto faz importantes reflexões sobre racismo, etnocentrismo e preconceitos culturais. Localizando as deficiências conceituais e argumentativas dos discursos dos dois autores, Jácome Neto questiona a tese de uma suposta continuidade entre o racismo antigo e o moderno, pois as relações étnicas na Grécia Antiga seriam mais bem compreendidas se pensadas como formas não hereditárias de preconceito cultural ao invés de racismo, que tem uma história específica ligada à colonização europeia e ao tráfico negreiro da época moderna. Trata-se, então, de uma investigação sobre a relação entre etnicidade antiga e racismo moderno, com suas continuidades e permanências.
O estudo das recepções da Antiguidade e Usos do Passado se estabeleceu como um dos campos da área de História Antiga. Glaydson José da Silva, Pedro Paulo Funari e Renata Senna Garraffoni lembram, no entanto, que a reutilização do passado em contextos posteriores já era uma prática na própria Antiguidade. A frase de Horácio (epis., Il, 1, 156-7) “Graecia capta ferum victorem cepit et artes / Intulit agresti Latio” (“a Grécia conquistada conquistou a seu feroz conquistador e introduziu as artes no agreste Lácio”) é apenas um dentre tantos exemplos. Tais práticas tiveram continuidade com o Cristianismo, o Renascimento etc. Assim, há muito a ser explorado sob essa perspectiva. Objetivando compreender melhor esse fenômeno, os autores apresentam uma análise dessa dinâmica nos estudos de História Antiga e das definições, aproximações e distanciamentos entre recepção e usos do passado, contemplando, ainda, uma análise específica do caso de Curitiba, mostrando como a presença da Antiguidade greco-romana se manifesta na realidade brasileira.
Essas camadas temporais são exploradas e aprofundadas tanto nos artigos de Camila Ferreira Paulino da Silva e Leni Ribeiro Leite quanto no de Anderson Zalewski Vargas. No primeiro caso, investigam-se alguns usos do passado no próprio passado, quando as autoras discutem como o poeta Horácio se apropriou da tradição retórico-poética romana e grega de forma a estabelecer sua posição frente à sociedade romana, no contexto de alargamento de fronteiras e de fabricação de um novo regime político durante o Principado de Augusto. Ou seja, como estratégias retóricas foram utilizadas para fabricar, reinventar, atualizar, redefinir e reescrever o passado posicionando-o em relação aos jogos de poder em Roma. O tema da retórica também é predominante no segundo caso. No artigo de Vargas, porém, são avaliadas as dinâmicas entre Antiguidade e Contemporaneidade. O autor analisa como os recursos retóricos clássicos foram utilizados para persuadir os leitores do jornal Correio da Liberdade, publicado em Porto Alegre em 1831. A temática da recepção da Antiguidade no periódico gaúcho é percebida sobretudo a partir da peculiar apropriação da tirania ateniense de Pisístrato em matéria sobre o regime político brasileiro da época.
Em “Palavra de mulher”, Marta Mega de Andrade investiga a ação política das mulheres na história grega antiga, sobretudo na pólis. Compreendendo a questão como contemporânea, a autora analisa tragédias, comédias e epigramas funerários dedicados às mulheres no final do século V e início do século IV a.C, em Atenas, para pensar a persistência de requisições femininas aquém do direito políade, validadas pela comunidade e pela dimensão da “vida comum”, mesmo que as “vozes” não sejam passíveis de identificação a uma autoria feminina. A dimensão do cotidiano também é um espaço / tempo da política, e lá poderemos perceber esse logos gunaikos, uma “palavra de mulher”.
O estudo da chamada cultura material é fundamental para a compreensão das temáticas da área de História Antiga. Considerando isso, Gilberto da Silva Francisco, Haiganuch Sarian e Fábio Vergara Cerqueira partem do estudo de caso de uma ânfora de tipo panatenaico em figuras vermelhas atribuída ao artesão caracterizado como Pintor de Nicóxeno, conhecida na historiografia da área como “ânfora de Mississípi 1977.3.115”, para retomarem a Arqueologia da Imagem e posicioná-la entre a iconografia clássica e a cultura material. Para tal, discutem-se os conceitos de suporte e de contexto, elementos básicos para o tratamento arqueológico das imagens, realizando um debate teórico sobre esse tipo de metodologia. Pensando um mediterrâneo globalizado, os autores chegam à conclusão de que a integração não uniformizava a relação entre os povos específicos e o universo material ao seu redor. Assim, não se pode atribuir naturalmente um significado ático para imagens produzidas na Ática. Ao contrário, a imagem precisa ser pensada em um complexo quadro envolvendo materiais, circulação e recepção.
Essas complexas relações entre o local e o global também são temas das análises do austríaco Raimund Karl, da Bangor University. Autores clássicos, como Políbio, César, Estrabão e outros, escreveram sobre os “Celtas”, mas a Arqueologia permite realizar leituras diversas e aprofundar o conhecimento sobre esses atores históricos da Antiguidade. As fontes históricas clássicas e a Arqueologia não estabelecem uma relação simples de complementaridade, mas permitem colocar questões diversas e relativamente autônomas. A partir de algumas questões que percebeu quando coordenava um projeto sobre o sítio arqueológico de Meillionydd, na Península de Llŷn, localizada no País de Gales, Karl problematiza as diferenças, integrações e conflitos entre as várias sociedades “célticas” da Europa e seus vizinhos, bem como o próprio uso da temática “céltica”, tanto em passados mais recuados quanto em mais recentes.
Horacio Miguel Hernán Zapata questiona o pretexto de que não seria interessante para nós, latino-americanos, estudar a História Antiga oriental porque a temática não responderia aos interesses “nacionais” e não seria necessária para nosso contexto. Respondendo a esse tipo de provocação, o autor aponta três razões e algumas reflexões, defendendo que a História Antiga daquela parte do mundo é fundamental para nós e pode funcionar como uma espécie de “laboratório” que colabora para que possamos pensar todo um conjunto de diferenças socioculturais acerca dos modos de experiência social sob uma perspectiva histórica. Reconhecer essa diversidade de formas em que pode materializar-se a experiência humana ao longo da História é fundamental para nossa contemporaneidade.
Um exemplo da temática proposta por Zapata é apresentado no artigo de Jorge Elices Ocón, que aborda os monumentos antigos em contextos islâmicos. Analisando o discurso elaborado pelo DAESH, o autor aponta que, por trás de um caráter radical e destrutivo, a narrativa daquele grupo esconde complexos argumentos relacionados com a narrativa histórica que se objetiva construir a partir da Arqueologia, dos monumentos e dos museus. O grupo islâmico se apropria das ideias do discurso ocidental e colonialista e reinventa o passado, não somente ocultando a realidade de um tráfico de objetos antigos, mas também destruindo outras percepções dos monumentos elaboradas pelas comunidades locais a partir de suas memórias e tradições.
Como é possível perceber, desde que Eurípedes Simões de Paula – membro fundador da Anpuh e um de seus primeiros presidentes – deu as primeiras aulas de História Antiga em uma Universidade Brasileira, a área não parou de se ampliar, se ressignificar e se reinventar. Parte inseparável da historiografia brasileira, os debates produzidos pela área de História Antiga em nosso país têm colaborado para pensarmos questões sociais, econômicas e culturais próprias do nosso tempo, afinal, como dizia Benedetto Croce, “Ogni storia vera, è storia contemporanea” (Croce, 1912), e, de igual modo, Lucien Febvre, “L’histoire est fille de son temps” (Febvre, 1942, p. 2). Em um mundo cada vez mais glocal, é importante debatermos essas realidades interconectadas, evitando o que a escritora nigeriana Chimamanda Adichie chamou de “the dangers of a single story” (Adichie, 2009). Este dossiê aponta alguns direcionamentos. Boa leitura!
Notas
- Para uma informação detalhada sobre os grupos de pesquisa a que nos referimos, cf. o (novo!) sitedo GTHA: https: / / www.gtantiga.com / laboratorios-e-grupos-de-pesquisa. Acesso em: 11 maio 2020.
- O GTHA realiza, entre outras ações, um Encontro Nacional bianual e participa regular do Simpósio Nacional de História com a promoção de Simpósios Temáticos. Além disso, o GTHA mantém uma fanpageno Facebook e contas em outras redes sociais. Para deta- lhes, cf. https: / / www.gtantiga.com / . Acesso em: 11 maio 2020.
- Silva; Oliveira, 2017. Cf. dossiê completo: www.revistas.usp.br / marenostrum / issue / view / 10208. Acesso em: 11 maio 2020.
Referências
ADICHIE, Chimamanda Ngozi. The Danger of a Single Story. TEDTalks, TEDGLOBAL, 2009. Disponível em: Disponível em: https: / / goo.gl / 3BdPCc . Acesso em: 11 maio 2020. [ Links ]
CROCE, Benedetto. Storia, cronaca, e false storie. Memoria letta all’Accademia pontaniana nella tornata del 3 novembre 1912 dal socio Benedetto Croce. Atti dell’Accademia Pontiana, v. XLII. Napoli: F. Giannini e figli, 1912. [ Links ]
FEBVRE, Lucien. L’incroyance au XVIe siècle: la religion de Rabelais. Paris: Albin Michel, 1942. [ Links ]
GUARINELLO, Norberto L. História Antiga. São Paulo: Contexto, 2013. [ Links ]
HORDEN, Peregrine; PURCELL, Nicholas. The Corrupting Sea: A Study of Mediterranean History. Oxford, UK; Malden, MA: Blackwell, 2000. [ Links ]
SILVA, Gilvan V. da. Editorial do GT de História Antiga. Hélade, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 6-7, 2001. Disponível em: Disponível em: http: / / www.helade.uff.br / Helade_2001_volume2_ numero2_NE.pdf . Acesso em: 11 maio 2020. [ Links ]
SILVA, Uiran G. da; OLIVEIRA, Gustavo J. D. Editorial. Mare Nostrum – Estudos sobre o Mediterrâneo Antigo, v. 8, p. iv-vii, 2017. [ Links ]
Fábio Faversani – Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Mariana, MG, Brasil. E-mail: faversani@ufop.edu.br http: / / orcid.org / 0000-0002-3464-1020
Dominique Vieira Coelho dos Santos – Universidade de Blumenau (Furb), Blumenau, SC, Brasil. E-mail: vieiradominique@hotmail.com http: / / orcid.org / 0000-0002-0265-2921
Cristina Rosillo-López – Universidad Pablo de Olavide, Sevilla, España. E-mail: mcroslop@upo.es http: / / orcid.org / 0000-0001-5451-841X
FAVERSANI, Fábio; SANTOS, Dominique Vieira Coelho dos; ROSILLO-LÓPEZ, Cristina. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.40, n.84, mai / ago., 2020. Acessar publicação original [DR]
Plínio Salgado: um católico integralista entre Portugal e o Brasil (1895-1975) | Leandro Pereira Gonçalves
O filósofo da ciência Karl Popper (1980) costumava afirmar que o conhecimento científico é, acima de tudo, uma luta contra o marasmo e as supostas verdades preestabelecidas dentro do próprio campo científico. Podemos compreender esse “marasmo” e as “supostas verdades estabelecidas”, em parte, como os próprios estudos científicos que marcam época e criam um establishment em determinada área de pesquisa. Leia Mais
Infâncias e juventudes no século XX: histórias latino-americanas – AREND et al (RBH)
“Atenção! atenção! É uma nova era no Brasil, menino veste azul e menina veste rosa” (Pains, 2019). O ano de 2019 acabara de desabrochar quando a recém-empossada ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, proferiu tais palavras sob coro e aplausos calorosos. Carregada de significados e intenções, a declaração de Damares também dá voz, involuntariamente, ao questionamento: quais os atributos da infância na História do Tempo Presente? Se existem, quem os criou e com quais interesses? Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.40, n.83, 2020.
Sumário
Editorial
- Editorial – Escrito a várias mãos: revisitando a autoria e a coautoria na área de História, | Sousa, Marcos Eduardo de | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- (Nec) Plus Ultra: as epopeias antes e após as grandes navegações | Felipe, Cleber Vinicius do Amaral | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
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- From Mato Grosso to Chiquitos: Furtive Migrations in the Spanish-Portuguese Border | Martínez, Cecilia | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
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Resenha
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Um mundo sem guerras: a ideia de paz, das promessas do passado às tragédias do presente – LOSURDO (RBH)
O ano de 2019 certamente não será recordado pela ocorrência de grandes avanços em favor da paz mundial. Na África, a Líbia não conseguiu superar a instabilidade política instaurada com a derrubada de Muammar Kadhafi, em 2011, e a disputa pelo poder transformou-se em uma extensa guerra civil desde então. Naquele mesmo ano, no Oriente Médio, a Síria de Bashar Al-Assad foi arrastada para um conflito envolvendo agentes internos e externos, e até este momento o país devastado se defronta com o enfrentamento de grupos antagônicos que impedem a pacificação do país. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.39, n.82, 2019 / v.36, n.71, 2016.
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.39 no.82 São Paulo set./dez. 2019
Editorial
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Dossiê: Fronteiras Amazônicas
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- Domar as águas e os sertões da fronteira intra-americana: a centralidade dos caminhos fluviais nas disputas luso-espanholas do Tratado de Santo Ildefonso | Brito, Adilson Junior Ishihara | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Colonos, índios e negros na fronteira do Cabo Norte (1700-1750) | Rocha, Rafael Ale | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Antijesuitismo na Amazônia portuguesa (primeira metade do século XVIII) | Carvalho, Roberta Lobão | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- O pensamento de Jacques Maritain e de Emmanuel Mounier no campo católico brasileiro e a educação libertadora de Paulo Freire | Souza, Rogério Luiz de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “Transição política” e ditadura no Brasil: os anos 1970 e seus agendamentos políticos e intelectuais | Chaves, Wanderson da Silva; Cattai, Júlio Barnez Pignata | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O mundo dos Marcondes de Sá: educação e instrução em duas gerações de uma família da elite campeira no Paraná oitocentista | Anjos, Juarez José Tuchinski dos; Barbosa, Etienne Baldez Louzada | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Jews, Communists and International Brigades: Intersections and Ambivalences in the 1930s from a Transnational Perspective | Laffond, José Carlos Rueda | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
- “Plano Pirata” do poema possesso: tempo e humor na poesia brasileira dos anos 1970 | Moraes, Everton de Oliveira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- The Lost Gaze: Books on the Amazonian Region by the Blind Writer Gábor Molnár | Szente-Varga, Mónika | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
Resenha
- Duarte, Regina Horta. Noites circenses: espetáculos de circo e teatro em Minas Gerais no século XIX | Souza, Silvia Cristina Martins | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.39 no.81 São Paulo maio/ago. 2019
Editorial
- A caminho de uma “cultura de preprints”? | Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: Rios e Sociedades
- APRESENTAÇÃO – Movimentos dos rios / movimentos da História | Pádua, José Augusto; Chambouleyron, Rafael | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O poder contingente do rio Iaco no Território Federal do Acre (1904-1920) | Vital, André Vasques | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Baixada Fluminense: dinâmicas fluviais e sociais na constituição de um território | Britto, Ana Lucia; Quintslr, Suyá; Pereira, Margareth da Silva | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os negros d’água do rio Ribeira de Iguape: mito e história numa narrativa elaborada por comunidades negras do Vale do Ribeira | Paes, Gabriela Segarra Martins | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O papel da escrita na construção de causas públicas: uma análise do acervo de documentos produzidos por grupos de atingidos pela Usina Hidrelétrica de Tucuruí, Pará | Acselrad, Henri | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os “Hidronegócios” nos rios da Amazônia | Batista, Iane Maria da Silva; Miranda, Leila Mourão | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Rio Doce: riscos e incertezas a partir do desastre de Mariana (MG) | Espindola, Haruf Salmen; Nodari, Eunice Sueli; Santos, Mauro Augusto dos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Pessoas, manatins e o ambiente aquático na América moderna: confluência e divergência nas interações históricas entre humanos e animais | Brito, Cristina | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- O suplício de Tântalo: moeda, economia e sociedade brasileira entre 1845 e 1866 | Sáez, Hernán Enrique Lara | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Caminhos de ferro e desenvolvimento econômico na Índia e em Portugal: uma comparação entre as linhas de Mormugão e do Tua, c. 1880 – c. 1930 e adiante | Pereira, Hugo Silveira; Kerr, Ian J. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Memória
- Por que nós, de língua portuguesa, sentimos saudades? António Manuel Hespanha e a História do Brasil | Bicalho, Maria Fernanda | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Romeiro, Adriana. Vila Rica em sátiras: produção e circulação de pasquins em Minas Gerais, 1732 | Monteiro, Rodrigo Bentes | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Luna, Francisco Vidal; Klein, Herbert S. An Economic and Demographic History of São Paulo – 1850-1950 | Leite, Rosângela Ferreira | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Saylor, Ryan. State Building in Boom Times: Commodities and Coalitions in Latin America and Africa | Vale, Helder Ferreira do | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.39 no.80 São Paulo jan./abr. 2019
Editorial
- Retomar a história da RBH | Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Uma história feita de retalhos: o acervo da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal | Faria, Daniel; Torres, Mateus Gamba | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O historiador e a mídia: diálogos e disputas na arena da história pública | Ogassawara, Juliana Sayuri; Borges, Viviane Trindade | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “Fitas em chammas”: cinema, imprensa e sensacionalismo na Belle Époque carioca | Lapera, Pedro Vinicius Asterito | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Defesas jesuítas da escravidão voluntária no Japão e no Brasil | Ehalt, Rômulo da Silva | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Vestindo o escravismo: o comércio de têxteis e o Contrato de Angola (século XVIII) | Lopes, Gustavo Acioli; Menz, Maximiliano M. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Actors and Power in the Buenos Aires Cabildo, 1776-1810: A Contribution from the Social Network Analysis | Valle, Laura Cristina del; Larrosa, Juan M. C. | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
- Batuques negros, ouvidos brancos: colonialismo e homogeneização de práticas socioculturais do sul de Moçambique (1890-1940) | Pereira, Matheus Serva | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenha
- Iumatti, Paulo Teixeira. História, Dialética e Diálogo com as Ciências: a gênese de Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Jr. (1933-1942) | Brito, Leonardo Octavio Belinelli de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Armitage, David; Guldi, Jo. Manifesto pela História | Souza, Fabricio Leal de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Evans, Richard J. Terceiro Reich na história e na memória: novas perspectivas sobre o nazismo, seu poder político, sua intrincada economia e seus efeitos na Alemanha do pós-guerra | Oliveira Neto, Wilson de | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.38 no.79 São Paulo set./dez. 2018
Editorial
- Dossiês em perspectiva | Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: Por Escravos e Libertos
- APRESENTAÇÃO – Uma grande diferença | Lara, Silvia Hunold | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Utopias centro-africanas: ressignificações da ancestralidade nos calundus da América portuguesa nos séculos XVII e XVIII | Marcussi, Alexandre A. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A voz e a cruz de Rita: africanas e comunicação na ordem escravista | Lima, Ivana Stolze | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O perigo da (re)escravização: disputas judiciais de manutenção da liberdade na Mariana setecentista | Pinheiro, Fernanda Domingos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Trabalho compulsório e escravidão indígena no Brasil imperial: reflexões a partir da província paulista | Dornelles, Soraia Sales | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Rufina: uma escrava senhora de escravos em Pernambuco, 1853-1862 | Costa, Robson Pedrosa | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “Atrevidos e belicosos”: cativos insubmissos no comércio interprovincial de escravos | Teixeira, Luana | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Mães libertas, filhos escravos: desafios femininos nas últimas décadas da escravidão em São Paulo | Ariza, Marília B. A. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O samba no sobrado da baronesa: liberdade negra e autoridade senhorial no tempo da abolição | Albuquerque, Wlamyra | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Sobre as origens e motivações do Ato Institucional 5 | Motta, Rodrigo Patto Sá | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Communism and Democracy during the Latin American Cold War: The Case of the Uruguayan Communist Party in the 60’s | Yaffé, Jaime | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | Inglês | · Inglês ( pdf ) | Espanhol ( pdf )
Resenhas
- Silva, Daniel Domingues da The Atlantic Slave Trade from West Central Africa, 1780-1867 | Alfagali, Crislayne Marão Gloss | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Silva, Fernanda O.; Sá, Jardélia R.; Gomes, Luciano da C.; Rosa, Marcus Vinícius de F.; Perussatto, Melina K.; Silva, Sarah C. A.; Santos, Sherol dos. Pessoas comuns, histórias incríveis: a construção da liberdade na sociedade sul-rio-grandense | Costa, Hilton | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Hart, Jennifer. Ghana on the Go: African Mobility in the Age of Motor Transportation | Pandolfi, Fernanda | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.38 no.78 São Paulo maio/ago. 2018
Editorial
- Arquivos sob ameaça: os perigos de uma política antiarquivística | Venancio, Renato Pinto; Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: História e Arquivo
- Arquivos e Arquivologia na França e no Brasil: marcos históricos e contextos singulares | Marques, Angelica Alves da Cunha; Rodrigues, Georgete Medleg; Nougaret, Christine | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A documentação do Conselho Ultramarino como património arquivístico comum: subsídios à sua história | Martins, Ana Canas Delgado | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Resgatando arquivos: história custodial do fundo Secretaria de Governo da Capitania de São Paulo | Martins, Marcelo Thadeu Quintanilha | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O estudo dos arquivos de família de Antigo Regime em Portugal: percursos e temas de investigação | Nóvoa, Rita Sampaio da; Rosa, Maria de Lurdes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Arquivos pessoais e a escrita da história no Brasil: um balanço crítico | Iumatti, Paulo Teixeira; Nicodemo, Thiago Lima | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A institucionalização da arquivologia no Brasil e a reforma administrativa no primeiro governo Vargas (1935-1945) | Santos, Paulo Roberto Elian dos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Governança e arquivos: a gestão Luís Henrique Dias Tavares no Arquivo Público do Estado da Bahia (1959-1969) | Matos, Maria Teresa Navarro de Britto | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Como surgem as políticas arquivísticas: o 1o Leilão da Memória Nacional e o Sistema de Arquivos do Estado de São Paulo (Saesp) | Schmidt, Clarissa Moreira dos Santos; Mattos, Renato de; Tognoli, Natalia Bolfarini | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Projeto Resgate: História e arquivística (1982-2014) | Boschi, Caio César | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- A árvore da liberdade nagô: Marcos Theodoro Pimentel e sua família entre a escravidão e o pós-Abolição. Itaparica, 1834-1968 | Castellucci Junior, Wellington | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Embates na sociedade fluminense: a experiência do Prado Guarany (1884-1890) | Melo, Victor Andrade; Chevitarese, André Leonardo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Abreu, Jorge Phelipe Lira de. Existir em bits: arquivos pessoais nato-digitais e seus desafios à teoria arquivística | Campos, José Francisco Guelfi | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Souza, Vanderlei Sebastião de. Em busca do Brasil: Edgard Roquette-Pinto e o retrato antropológico brasileiro (1905-1935) | Carvalho, Leonardo Dallacqua de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Daston, Lorraine. Historicidade e objetividade | Ohara, João Rodolfo Munhoz | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.38 no.77 São Paulo jan./abr. 2018
Editorial
- Formação acadêmica e autoria na RBH | Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Performance religiosa e mobilidade social de mulheres no Portugal dos séculos XVII e XVIII | Bellini, Lígia; Pacheco, Moreno Laborda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O “y”, o artigo e as ortografias: a censura e o vernáculo português do século XVIII | DeNipoti, Cláudio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Entre o Congresso de Lisboa e a Constituinte brasileira: concepções de Estado do empresário luso-gaúcho Antônio José Gonçalves Chaves | Leme, Marisa Saenz | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Do aldeamento do Riacho do Mato à Colônia Socorro: defesa de terras e aprendizado político dos indígenas de Pernambuco (1860-1880) | Dantas, Mariana Albuquerque | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “¡Desorganización, Suciedad!, ¡Esto es progreso!”: Representations of Urban Insecurities through the Daily El Sur of Concepción (1920-1935) | León, Marco Antonio León | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
- Lúcio Rangel comendo “ovos quentes com Noel Rosa”: a invenção de uma historiografia da música popular | Moraes, José Geraldo Vinci de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Memória
- Um historiador que nunca dorme: os “anos vermelhos” de Luiz Alberto Moniz Bandeira | Rocha, Ana Vitoria Sampaio Castanheira | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Baena Zapatero, Alberto; Roselló Soberón, Estela (Coord.). Mujeres en la Nueva España | Alonso, Eduardo Torres | · texto em Espanhol | · Espanhol ( pdf )
- Morse, Richard (Org. Beatriz Helena Domingues). Cidades e cultura política nas Américas | Castro, Ana Claudia Veiga de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Franco Júnior, Hilário. Dando tratos à bola: ensaios sobre futebol | Hollanda, Bernardo Buarque de | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.37 no.76 São Paulo set./dez. 2017
Editorial
- EDITORIAL | Feitler, Bruno | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: Centenário 1917: Grande Guerra, greves e revoluções
- APRESENTAÇÃO | Castellucci, Aldrin; Toledo, Edilene; Correia, Silvia Adriana Barbosa | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Música e guerra: impactos da Primeira Guerra Mundial no cenário musical carioca | Fagundes, Luciana Pessanha | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Uma facada pelas costas: paranoia e Teoria da Conspiração entre conservadores no refluxo das Greves de 1917 na Alemanha | Liebel, Vinícius | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Mulheres, sindicato e organização política nas greves de 1917 em São Paulo | Fraccaro, Glaucia Cristina Candian | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Antonio Gramsci e a Revolução Russa: uma reconsideração (1917-1935) | Pons, Silvio | · resumo em Português | Inglês | Italiano | · texto em Português | Italiano | · Português ( pdf ) | Italiano ( pdf )
Artigos
- Apropriações possíveis de um protagonismo outro | Santos, Maria Cristina dos; Felippe, Guilherme Galhegos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Morfologia social e contextualização topográfica: a micro-história de Edoardo Grendi | Giuli, Matteo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Uma vitrine para os médicos do sertão: a Revista Goiana de Medicina e a doença de Chagas em Goiás (1955-1962) | Vieira, Tamara Rangel; Lima, Nísia Trindade | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Silva, Rafael Viana da. Elementos Inflamáveis: organizações e militância anarquista no Rio de Janeiro e São Paulo (1945-1964) | Santos, Kauan Willian dos | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Müller, Angélica. O Movimento Estudantil na resistência à Ditadura Militar (1969-1979) | Valle, Maria Ribeiro do | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Rossi, Gustavo. O intelectual feiticeiro: Edison Carneiro e o campo de estudos das relações raciais no Brasil | Herzman, Marc | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Erratum
- Erratum: O pequeno, o grande e o pequeno: Entrevista com Giovanni Levi | | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.37 no.75 São Paulo mai./ago. 2017
Editorial
- Editorial | Negro, Antonio Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: O protagonismo indígena na história
- Apresentação | Resende, Maria Leônia Chaves de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A atuação dos indígenas na História do Brasil: revisões historiográficas | Almeida, Maria Regina Celestino de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- As cachoeiras como bolsões de histórias dos grupos indígenas das terras baixas sul-americanas | Almeida, Fernando Ozorio de; Kater, Thiago | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma história da mandioca em perspectiva atlântica | Rodrigues, Jaime | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A escrita política e o pensamento dos Guarani em tempos de autogoverno (c.1753) | Neumann, Eduardo Santos; Boidin, Capucine | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Canibalismo e a legitimidade da guerra justa na época da Independência | Langfur, Hal | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Os índios do Ceará na Confederação do Equador | Costa, João Paulo Peixoto | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Passo Ruim 1868: as estratégias dos Xokleng nas fronteiras de seus territórios do alto rio Itajaí | Mota, Lúcio Tadeu | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Presente de branco: a perspectiva indígena dos brindes da civilização (Amazônia, século XIX) | Henrique, Márcio Couto | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “Protagonismo” como Vulnerabilização em Demarcação de Terras Indígenas: o caso do acordo judicial para demarcar a terra Tapeba | Barretto Filho, Henyo Trindade | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Garotas de loja, história social e teoria social | Cox, Pamela | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Characteristics and functioning of a specific labor market: domestic service in Buenos Aires (late 19th and early 20th century) | Allemandi, Cecilia L. | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | Inglês | · Inglês ( pdf ) | Espanhol ( pdf )
- União Internacional Protetora dos Animais de São Paulo: práticas, discursos e representações de uma entidade nas primeiras décadas do século XX | Ostos, Natascha Stefania Carvalho de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Navarrete Linares, Federico. Hacia otra historia de América: nuevas miradas sobre el cambio cultural y las relaciones interétnicas | Kalil, Luis Guilherme Assis | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Castilho, Celso Thomas. Slave Emancipation and Transformations in Brazilian Political Citizenship | Souza, Felipe Azevedo | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Silva, Maciel Henrique. Nem mãe preta, nem negra fulô: histórias de trabalhadoras domésticas em Recife e Salvador (1870-1910) | Sampaio, Gabriela dos Reis | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Valente, Rubens. Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura | Ascenso, João Gabriel | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.37 no.74 São Paulo jan./abr. 2017
Editorial
- Editorial | Negro, Antonio Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Bilhetes de namoro abertos ao público: mensagens e encontros às escondidas anunciados no Jornal do Commercio (década de 1870) | Far, Alessandra El | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Violência apaziguada: escravidão e cultivo do café nas fotografias de Marc Ferrez (1882-1885) | Muaze, Mariana de Aguiar Ferreira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A dança da política: trabalhadores, associativismo recreativo e eleições no Rio de Janeiro da Primeira República | Pereira, Leonardo Affonso de Miranda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- De Coronéis a Bacharéis: reestruturação das elites e medicina em Sergipe (1840-1900) | Petrarca, Fernanda Rios | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Crimes do texto, crimes verdadeiros:a máfia na voz de Leonardo Sciascia | Pinto, Júlio Pimentel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Os historiadores e seus públicos: desafios ao conhecimento histórico na era digital | Malerba, Jurandir | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Entrevista
- O pequeno, o grande e o pequeno: Entrevista com Giovanni Levi | Levi, Giovanni | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Rust, Leandro Duarte. Mitos Papais: política e imaginação na história | Bovo, Claudia Regina | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Souza, Robério S. Trabalhadores dos trilhos: imigrantes e nacionais livres, libertos e escravos na construção da primeira ferrovia baiana (1858-1863) | Vito, Christian G. De | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Snyder, Timothy. Terra Negra: o Holocausto como história e advertência | Bertonha, João Fábio | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.36 no.73 São Paulo set./dez. 2016
Editorial
- EDITORIAL | Negro, Antonio Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: Sérgio Buarque de Holanda: 80 anos de Raízes do Brasil
- Apresentação | Gomes, Ângela de Castro | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O imbróglio de Raízes: notas sobre a fortuna crítica da obra de Sérgio Buarque de Holanda | Vainfas, Ronaldo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Sérgio com Lima: um encontro inusitado em meio aos modernismos | Schwarcz, Lilia Moritz; Monteiro, Pedro Meira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Tentativas de desmitologia: a revolução conservadora em Raízes do Brasil | Mata, Sérgio da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Raízes do Brasil e o ensaio histórico brasileiro: da história filosófica à síntese sociológica, 1836-1936 | Nicolazzi, Fernando | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A montanha e os caminhos: Sérgio Buarque de Holanda entre Rio de Janeiro e São Paulo | Wegner, Robert | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Passados (im)perfeitos ou a ótica buarqueana sobre o Império do Brasil na América | Venancio, Giselle Martins; Furtado, André | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Para além de um prefácio: ditadura e democracia no diálogo entre Antonio Candido e Sérgio Buarque de Holanda | Nicodemo, Thiago Lima | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- A criação do Terceiro Corpo do Exército na província do Rio Grande do Sul: conflitos políticos resultantes da administração militar nos anos críticos da Guerra do Paraguai (1866-1867) | Izecksohn, Vitor; Mugge, Miquéias H. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A produção da invisibilidade intelectual do professor negro Nascimento Moraes na história literária maranhense, no início do século XX | Cruz, Mariléia dos Santos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Cândido de Abreu: projetos do primeiro urbanista da cidade de Curitiba do início do século XX | Bencostta, Marcus Levy | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Neumann, Eduardo. Letra de índios: cultura escrita, comunicação e memória indígena nas Reduções do Paraguai | Felippe, Guilherme Galhegos | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Farias, Juliana Barreto. Mercados Minas: africanos ocidentais na Praça do Mercado do Rio de Janeiro (1830-1890) | Carvalho, Marcus Joaquim Maciel de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Mata, Iacy Maia. Conspirações da raça de cor: escravidão, liberdade e tensões raciais em Santiago de Cuba (1864-1881) | Chira, Adriana | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Trindade, Hélgio. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas | Gonçalves, Leandro Pereira | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Magri, Lucio. O alfaiate de Ulm: uma possível história do Partido Comunista Italiano | Pomar, Valter | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.36 no.72 São Paulo mai./ago. 2016
Editorial
- EDITORIAL | Negro, Antonio Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: Perspectivas recentes da História Medieval no Brasil
- APRESENTAÇÃO | Silva, Marcelo Cândido da; Almeida, Néri de Barros | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A Cronaca di Partenope e o Reino de Nápoles: contribuições da e para a historiografia brasileira no século XXI | Teixeira, Igor Salomão | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Algumas experiências, perspectivas e desafios da Medievalística no Brasil frente às demandas atuais | Silveira, Aline Dias da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Uma calamidade insaciável: espaço urbano e hegemonia política em uma história dos incêndios (880-1080) | Rust, Leandro Duarte | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cartas políticas da Dinastia de Avis: a arte de ditar o bem comum (século XV) | Coelho, Maria Filomena | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- O crime da miscigenação: a mistura de raças no Brasil escravista e a ameaça à pureza racial nos Estados Unidos pós-abolição | Brito, Luciana da Cruz | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
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Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.36 no.71 São Paulo jan./abr. 2016
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- Hajari, Nisid Midnight’s Furies: The Deadly Legacy of India’s Partition | Stuenkel, Oliver | · texto em Inglês | · Inglês ( pdf )
Fronteiras Amazônicas / Revista Brasileira de História / 2019
A Amazônia e as fronteiras da História
Em audiência ocorrida no Senado brasileiro, no mês de junho de 1976, o paisagista e expoente do naturalismo Burle Marx denunciava que a Amazônia havia sido vítima do maior incêndio da história do planeta. Os satélites da Nasa tinham então registrado uma queimada florestal de 25 mil km2 no sudeste da região. A área atingida situava-se na intersecção de várias fazendas de gado. O fato foi amplamente comentado na imprensa internacional. Aquecia-se o debate em torno das estratégias desenvolvimentistas para se superar o chamado atraso regional (Acker, 2014, p. 22-23). No último quartel do século XX, a Amazônia tornou-se um capítulo importante da contestação da noção de progresso. Nela, o rápido avanço de novas frentes de exploração capitalista (protagonizado por grandes projetos agrominerais e por agências governamentais) era representado pelas classes dirigentes brasileiras como a aceleração do tempo histórico tendo em vista a antecipação do desenvolvimento. O otimismo em relação à alavancagem dos índices de bem-estar da população regional por meio de grandes projetos entrou em crise sobretudo nos anos 1980. Ao lado da denúncia dos negativos impactos sociais causados pela expansão das frentes de exploração, ganhava força a tese de que era necessária e urgente a criação de formas de produção econômica que não destruíssem a natureza e os modos de vida tradicionais.
Enfocar as fronteiras amazônicas nos permite colocar em discussão balizas de grandes narrativas históricas. De um lado, noções como progresso e atraso têm aí se desdobrado em formação de latifúndios, degradação ambiental e trabalho escravo ou degradante, num flagrante contraste entre promessa e realização. Por outro lado, a história nacional pretensamente monocultural encontra na sua diversidade sócio-histórica uma via de deslegitimação. Como já apontara Certeau (2008, p. 89), os fenômenos de fronteira nos possibilitam colocar em xeque modelos totalizantes, pois o contato com o diferente abala a pretensão de universalidade daquilo que, na verdade, é apenas uma parte. Dentro mesmo do espaço amazônico tem ocorrido, nas últimas décadas, a institucionalização de territórios (terras indígenas e quilombolas, reservas extrativistas, unidades de conservação ambiental…) visando à preservação da natureza e dos chamados povos tradicionais. Trata-se do desdobramento de uma longa história de lutas que foram conformando fronteiras intrarregionais ainda hoje contestadas, ameaçadas e corajosamente defendidas (Wanderley, 2018). Amazônias indígena, quilombola, ribeirinha e urbana, entre outras, compõem um mosaico que nega noções generalizantes como inferno verde, espaço vazio, região-problema… Noções que mais ocultam do que elucidam.
Ao possibilitar a problematização de abordagens totalizantes a história das fronteiras faz avançar as fronteiras da História. Trata-se de um campo temático fronteiriço, de caráter interdisciplinar, pois se constrói num permanente diálogo com a Antropologia, a Sociologia e a Geografia. Desde o final do século XIX avolumou-se a massa de publicações de militares, diplomatas e geógrafos que viam no estudo dos limites um importante instrumento de fixação da imagem do Brasil-República como nação. Raja Gabaglia, Everardo Backheuser e Jorge Latour, para ficar em poucos exemplos de destaque, mediante a apropriação de postulados de teóricos como Friedrich Ratzel e Camille Vallaux, criaram influente tradição intelectual centrada no imperativo da vivificação das zonas limítrofes do território nacional. A partir de um diálogo com a obra de Frederick Turner, Leo Waibel e Pierre Monbeig inauguraram, na década de 1940, duradoura e prolífica corrente interpretativa, cuja compreensão de fronteira conduzia à noção de frente pioneira (Sprandel, 2005, p. 153-203).
Os estudos publicados no Dossiê “Fronteiras amazônicas” da Revista Brasileira de História se inscrevem num movimento de renovação das formas de se entender e abordar as experiências fronteiriças. Nos últimos anos, pesquisadores das Ciências Humanas e Sociais passaram a elucidar múltiplas práticas de fronteirização, visíveis ou não, em distintas escalas e com uma infinidade de propósitos (Grimson, 2003; Boccara, 2007; Oliveira, 2016; Benedetti, 2018). Os novos estudos nos lembram que os espaços não são desde sempre recortados, delimitados, enfim, diferenciados. O processo de constituição de fronteiras deve ser compreendido à luz de contextos e sujeitos históricos específicos. Conquistas, conflitos, negociações, alianças e outros meios têm ensejado, na Amazônia, assim como em outras partes do Brasil e do mundo, sobreposições territoriais, ou fronteiras dentro da fronteira. Além disso, os sujeitos que aí vivem estabelecem relações e constituem redes que por vezes nos obrigam a relativizar a definição de fronteira como margem e a compreender constructos geográficos policêntricos, assim como polissêmicos.
Ganham destaque nas páginas deste Dossiê os discursos sobre a fronteira. Científicos, literários, diplomáticos, cartográficos e outros, ao longo do tempo, tais discursos depositaram camadas de significados que foram se sedimentando e gerando formas de imaginação espacial. Esses regimes de representação orientaram intervenções estatais no mundo da vida e ainda hoje são usados como justificativa de ações autoritárias, colonialistas e, portanto, não abertas ao diálogo com os sujeitos que vivem na e da fronteira, sobretudo com os dominados ou subalternizados. A relação entre saber e poder é destacada nos quatro primeiros artigos. Rômulo de Paula Andrade nos apresenta uma Amazônia rasgada pela política de rodovialização da década de 1960. A floresta abre então seus arcanos, revelando novo ecossistema viral e, deste modo, ensejando o avanço da fronteira do saber acerca das doenças tropicais. Francisco Bento da Silva e Gerson Rodrigues de Albuquerque abordam a retórica colonialista estruturante do relato de Paul Walle, publicado em 1910. Os autores apontam que esse viajante francês, atento à competição comercial entre os países colonizadores europeus pelos mercados da periferia global, produziu uma narrativa que, ao mesmo tempo, hierarquiza povos e exalta o potencial econômico do bioma amazônico. O artigo de Márcia Regina Capelari Naxara aborda escritos literários do início do século XX cujas páginas desvelam lugares sombrios: florestas tropicais que escondem seus segredos e riquezas do olhar cobiçoso e curioso do ádvena. No contexto de franco avanço imperialista das potências econômicas sobre o Sul global, as narrativas de Joseph Conrad e Alberto Rangel representam como trágico o fim das incursões “civilizatórias” nos vales do Congo e do Amazonas. O texto de Carlo Maurizio Romani analisa o litígio anglo-brasileiro pela posse da área fronteiriça do Pirara (situada entre o que hoje são o estado de Roraima e a Guiana). O autor argumenta que a superioridade dos investimentos científicos ingleses foi algo decisivo no arbitramento internacional, que culminou em decisão desfavorável ao Brasil.
Os três artigos seguintes analisam as convergências, incongruências e divergências entre agentes estatais (portugueses, espanhóis e franceses), povos indígenas, negros que fugiam da escravidão e missionários que atuaram na Amazônia, durante os dois primeiros séculos de sua colonização. Abordando o processo de demarcação de limites realizado a partir do Tratado de Santo Ildefonso (1777), Adilson Junior Ishihara Brito aponta para a importância econômica e geopolítica dos rios nas disputas das Coroas de Portugal e Espanha por territórios americanos. Numa atmosfera de desconfianças, as autoridades portuguesas usaram de estratégias variadas para não perder o controle de vias fluviais, tais como: mapeamento científico, descimentos de indígenas e improvisação de povoamentos. O artigo de Rafael Ale Rocha destaca que a constituição da fronteira não se dá apenas por meio de tratados (como o de Utrecht), pois ela decorre, amiúde, da desobediência, da rebeldia e da mobilização de sujeitos, como indígenas, negros e desertores. O autor também elucida como, no Cabo Norte da primeira metade do século XVIII, os aruãs usaram a situação de fronteira em proveito próprio. As fugas, o estabelecimento de alianças e o trato do comércio são sendas por onde podemos entrever o protagonismo de povos indígenas que então viviam na região da foz do rio Amazonas. Por fim, Roberta Lobão Carvalho enfoca o desencaixe e as divergências entre as expectativas da Coroa portuguesa e os interesses de grande parte da elite do Grão-Pará nas primeiras décadas do século XVIII. A pesquisadora igualmente põe em relevo os atritos entre membros do governo local e jesuítas, ocorridos por causa da espinhosa questão do controle do trabalho indígena.
O amplo e variado espectro de questões abordadas neste Dossiê evidencia a complexidade da história das fronteiras amazônicas e o trabalho competente de historiadores, de diferentes gerações, no sentido de compreendê-la. Resta desejar a todos uma mui proveitosa leitura.
Referências
ACKER, Antoine. “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a formar a Amazônia em uma arena política global. Revista Brasileira de História, São Paulo: Anpuh, v. 34, n. 68, p. 1333, 2014. [ Links ]
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BENEDETTI, Alejandro. Claves para pensar las fronteras desde una perspectiva geográfica. Geousp – Espaço e Tempo, São Paulo: USP / Depto. de Geografia, v. 22, n. 2, p. 309-328, 2018. [ Links ]
CERTEAU, Michel. A escrita da História. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. [ Links ]
GRIMSON, Alejandro. La nación en sus limites: contrabandistas y exilados en la frontera Argentina-Brasil. Barcelona: Gedisa, 2003. [ Links ]
OLIVEIRA, João Pacheco de. O nascimento do Brasil e outros ensaios: “pacificação”, regime tutelar e formação de alteridades. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2016. [ Links ]
SPRANDEL, Marcia Anita. Breve genealogia sobre os estudos de fronteiras e limites no Brasil. In: OLIVEIRA, Roberto C. de; BAINES, Stephen G. (org.). Nacionalidade e etnicidade em fronteiras. Brasília: Ed. UnB, 2005. p. 153-203. [ Links ]
WANDERLEY, Luiz Jardim de M. Repensando a noção de fronteira no contexto da reestruturação espacial da Amazônia no século XXI. Terra Livre, São Paulo: AGB, ano 31, v. 1, n. 46, p. 13-48, 2018. [ Links ]
Sidney Lobato – Universidade Federal do Amapá (Unifap), Departamento de Filosofia e Ciências Humanas (DFCH), Macapá, AP, Brasil. E-mail: lobato.sidney@yahoo.com.br http: / / orcid.org / 0000-0002-2357-3667
LOBATO, Sidney. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.39, n.82, set / dez, 2019. Acessar publicação original [DR]
Noites circenses: espetáculos de circo e teatro em Minas Gerais no século XIX – DUARTE (RBH)
A segunda edição de Noites Circenses: espetáculos de circo e teatro em Minas Gerais no século XIX, de Regina Horta Duarte, chegou aos leitores em 2018. Na sua primeira edição (Campinas: Ed. Unicamp, 1995), o livro foi saudado como trabalho muito bem escrito e cativante (Mello e Souza, 1996) e considerado referência para estudos sobre teatro e circo no Brasil (Silva, 1996). Os que lerem a nova edição constatarão que a obra não envelheceu e continua digna desses elogios. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.39, n.81, 2019.
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- Baixada Fluminense: dinâmicas fluviais e sociais na constituição de um território Dossiê: Rios E Sociedades
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- O suplício de Tântalo: moeda, economia e sociedade brasileira entre 1845 e 1866 Artigos
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- Caminhos de ferro e desenvolvimento econômico na Índia e em Portugal: uma comparação entre as linhas de Mormugão e do Tua, c. 1880 – c. 1930 e adiante Artigos
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- Por que nós, de língua portuguesa, sentimos saudades? António Manuel Hespanha e a História do Brasil Memória
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- Luna, Francisco Vidal; Klein, Herbert S. An Economic and Demographic History of São Paulo – 1850-1950 Resenhas
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- Saylor, Ryan. State Building in Boom Times: Commodities and Coalitions in Latin America and Africa Resenhas
- Vale, Helder Ferreira do
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Rios e Sociedades / Revista Brasileira de História / 2019
Movimentos dos rios / movimentos da História
Aos que entram nos mesmos rios afluem outras e outras águas.
Heráclito, fragmento 12, 2012, p. 47.
A relação estreita entre o desenrolar da história humana e os movimentos das águas na superfície terrestre, especialmente os movimentos dos rios que cruzam os continentes para além dos espaços litorâneos, pode ser pensada, de início, por meio de algumas poderosas metáforas. Heráclito de Éfeso, no século VI a.C., usou o rio como imagem da história em seu sentido mais amplo: o próprio fluxo da existência. A renovação permanente das águas do rio, que ao mesmo tempo persiste como uma unidade definida pelas suas margens, indica o jogo complexo entre mudança e continuidade que pode ser observado no acontecer do mundo. Milênios mais tarde, em seu livro clássico, publicado em 1946, O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrânico na Época de Filipe II, Fernand Braudel também usou o movimento das águas como metáfora para os diferentes níveis de profundidade em que se pode analisar a História, apresentando os “acontecimentos” como “cristas de espuma levantadas pelo poderoso movimento das marés” (Braudel, [1946]1995, p. 25).
Essas metáforas, assim como várias outras que poderiam ser mencionadas, adquirem um sentido humano concreto nas inumeráveis situações em que sociedades interagiram de maneira intensa com sistemas fluviais, de modo que estes últimos se tornaram agentes importantes para definir a localização geográfica e o próprio devir da vida cultural, social e econômica. Pensando apenas no mundo contemporâneo, pode-se observar como a proximidade e a relação intensa com rios de tamanho significativo ou, em sentido mais amplo, com bacias hidrográficas, estabeleceram padrões recorrentes no desenvolvimento de grandes cidades, de complexos agrícolas (em grande parte dependentes de obras de irrigação) e de estruturas industriais (que se valem dos rios para construir intrincados fluxos e metabolismos socioambientais que passam pela entrada constante de matéria e energia e pela saída de produtos mercantilizáveis e dejetos poluentes). Além dos exemplos acima, poderiam ser mencionados inúmeros outros casos históricos em que assentamentos humanos, dinâmicas de transporte, movimentos de lazer e turismo, expressões culturais e artísticas e crises de saúde pública, entre outros, passaram por uma interação aturada com sistemas fluviais.
No caso do território brasileiro, foco do presente Dossiê, é importante ressaltar que não se pode entender a formação da sociedade nacional, em sua grande diversidade, sem levar em conta o espaço continental onde o país foi construído, marcado por enormes e complexas redes fluviais. A vida social aqui existente, em sua variedade geográfica, econômica e cultural, interagiu de maneira acentuada com esse movimento incessante das águas, seja em termos de mobilidade, de processos de territorialização, de práticas culturais ou de dinâmicas de exploração econômica. Os rios também estiveram muito presentes nos conflitos armados e nas disputas por domínio político regional, assim como na própria construção objetiva do Estado nacional e de suas instituições. Amazonas, São Francisco, Paraná e Tietê, entre tantos outros rios, tornaram-se ícones no imaginário do Brasil. A interação com os rios, que já era essencial para as sociedades indígenas, transformou-se em aspecto inescapável da vida concreta das sociedades na América portuguesa e no Brasil enquanto país, inclusive nos seus espaços litorâneos.
Apesar da existência de farta documentação sobre o mundo dos rios em diferentes países, além da sua presença marcante em inúmeras descrições da vida social em diferentes latitudes, a atenção específica e explícita ao tema fluvial por parte da historiografia foi relativamente modesta até as últimas décadas. Em meados do século XX, no entanto, foi possível observar um esforço de inovação no recorte dos objetos de análise histórica, para além daqueles baseados em países e regiões definidos segundo um critério essencialmente político. Dentro dessa abertura, onde se situa o recorte da Zona da Mata nordestina como objeto de análise por Gilberto Freyre em 1937, ou do Mar Mediterrâneo por Fernand Braudel (no livro já citado de 1946), um importante precedente foi estabelecido por Lucien Febvre e Albert Demangeon com a publicação em 1935 de seu livro O Reno: Problemas de História e de Economia. Ironicamente, no entanto, uma iniciativa semelhante foi realizada quase ao mesmo tempo pelo escritor e jornalista Emil Ludwig, que em 1937 publicou um livro sobre a história de vida do rio Nilo (Ludwig, 1937). É natural, porém, que a obra de Febvre, por apresentar uma densidade de pesquisa bem mais sólida, tenha marcado com muito mais relevância a cena historiográfica. É certo que o trabalho foi escrito com uma clara perspectiva antropocêntrica, procurando descartar qualquer vestígio de determinismo geográfico. A ideia central é a do rio forjado pela história humana, mais do que pela natureza. O foco são as questões político-econômicas, servindo o rio como uma espécie de espelho geográfico para pensar, por exemplo, a transformação das fronteiras nacionais na Europa.
No período mais recente, já sob influência da nova história ambiental que emergiu a partir da década de 1970, a literatura histórica específica sobre os rios cresceu muito, tanto em termos quantitativos quanto no aspecto da diversidade temática. Não seria o caso de resumir essa literatura no curto espaço desta Apresentação.[1] De toda forma, uma tendência que se pode ressaltar na literatura recente, mesmo que de maneira muito geral, é a de considerar os rios em si mesmos, na sua materialidade biofísica e sociotécnica. Ou seja, ir além da visão do espelho exógeno que serve mais que tudo para observar diferentes aspectos da vida social. Os rios, nessa perspectiva, são introduzidos no corpo da história, nos seus movimentos endógenos. A materialidade dos rios, incluindo suas transformações ao longo da história, expressa em si mesma a rede de interações sociais, tanto culturais quanto tecnoeconômicas, que com ela vem interagindo. Essa mesma materialidade, porém, inclusive nos seus aspectos biofísicos e ecológicos, participa e influencia no destino dessa rede complexa (que vem sendo conceituada mediante expressões como sócio-natureza ou devir biocultural). Um trabalho de grande influência, que abriu importantes horizontes dentro dessa nova perspectiva, foi o livro de Richard White The Organic Machine: The Remaking of the Columbia River (White, 1995). Nesse livro, o rio Columbia é visto como uma paisagem híbrida construída pela natureza e pelas diversas intervenções sociotécnicas e culturais ao longo do tempo. A materialidade do rio, além disso, expressa as diferenças de concepção e de interesse dos vários atores sociais que com ele interagiram, tornando-se ao mesmo tempo um fenômeno material e um espaço em disputa.
Em que momento os historiadores se debruçaram sobre a história das intricadas relações entre rios e populações no Brasil? Talvez, uma historiografia muito centrada no litoral e na sua oposição ao sertão, como matriz fundante de uma ideia de nação (notadamente, a partir de finais do século XIX), tenha subestimado essa temática. De toda forma, uma historiografia mais explícita e substantiva com relação ao tema dos rios começou a emergir no país em período recente, na virada para o século XXI – o que não significa dizer que não existia nada de relevante no passado. Ao contrário, existe uma interessante herança intelectual a ser redescoberta nesse campo. É possível encontrar, em alguns historiadores do século XX, importantes análises indiretas que, sem tomar os rios como eixo do recorte analítico, perceberam muito bem a sua presença marcante em diferentes momentos da história do país. Cabe destacar, por exemplo, as fortes descrições de Gilberto Freyre na década de 1930, no livro já mencionado (Freyre, [1937]2004), sobre as dinâmicas de envenenamento dos rios do Nordeste pelos resíduos das usinas de açúcar. Ou então, de maneira ainda mais notável, os trabalhos de Sérgio Buarque de Holanda, nas décadas de 1940 e 1950, sobre a centralidade da navegação fluvial nos movimentos de exploração dos sertões do Centro-Oeste partindo de São Paulo. O livro Monções, de 1945, em especial, apresentou elegantes e inovadoras análises sobre as relações entre rios e sociedades naquele contexto, particularmente pelo conceito de “estradas móveis”, que foram pensadas, de maneira próxima das tendências mais recentes, em sua própria materialidade, considerando detalhadamente as corredeiras e cachoeiras, os períodos de cheias etc. Ainda em 1948, inspirado pelo tema da expansão paulista e pelo trabalho de Emil Ludwig, o poeta Humberto de Mello Nóbrega publicou um livro que recortava de forma inovadora, ao menos no contexto nacional, um rio específico como objeto de análise histórica. Apesar de não ser uma análise profunda, o livro História do Rio Tietê (Mello Nóbrega, [1948]1981) é bastante abrangente e informativo, discutindo diferentes aspectos da relação entre a sociedade paulista e aquele rio – desde os esforços para promover sua navegação até, por exemplo, seu papel como inspirador de arte e literatura. Na formulação do próprio autor, porém, o rio é visto “ora como cenário, ora como comparsa”, já que o protagonismo é sempre do homem.
Nas décadas seguintes, alguns ensaios foram publicados sobre rios emblemáticos, como no caso do São Francisco e do Amazonas,[2] mas trabalhos situados no quadro de uma historiografia acadêmica, com maior elaboração teórica e metodológica, só irão aparecer nas portas do século XXI. É o caso do belo trabalho de Victor Leonardi sobre o complexo do rio Negro e suas cidades abandonadas: Os historiadores e os rios: natureza e ruína na Amazônia brasileira (Leonardi, 1999); do amplo estudo de Haruf Espindola sobre a ocupação histórica de um importante vale fluvial entre Espírito Santo e Minas Gerais: Sertão do Rio Doce (Espindola, 2005); do estudo de Janes Jorge sobre o rio Tietê na cidade de São Paulo, mostrando a relevância de aproximar história urbana e história fluvial: Tietê – o rio que a cidade perdeu (Jorge, 2006); por fim, da rica e diversificada coletânea organizada por Gilmar Arruda com o título de A natureza dos rios (Arruda, 2008). Esses trabalhos, já participando de um diálogo aberto com a historiografia internacional e com a perspectiva da história ambiental, abriram caminho para o tipo de historiografia profissional e mais rigorosa, apesar da sua variedade de enfoques, que poderemos encontrar nos autores que responderam ao chamado para o presente Dossiê. Uma historiografia que se aproxima da temática dos rios a partir de diferentes dimensões e recortes, explorando as ricas conexões ecológicas, geográficas, socioeconômicas e culturais que podem ser observadas com relação ao mundo dos rios em diferentes momentos e lugares da história do Brasil.
O artigo de André Vasques Vital recupera a história do Território do Acre de princípios do século XX, no contexto de desenvolvimento da economia da borracha na Amazônia brasileira. Com base em uma discussão com bibliografia recente, o autor discute os limites da agência histórica pensada apenas a partir da ação humana. Seu texto aprofunda uma importante reflexão sobre o papel do rio Iaco, suas dinâmicas de cheias e vazantes e as consequências e imprevisibilidades desse regime na ação humana. Assim, os tumultuosos acontecimentos políticos e econômicos ocorridos no Território do Acre, depois de sua anexação ao Brasil, ganham novos sentidos também pela atuação (imprevisível muitas vezes) do rio e pelas implicações das dinâmicas fluviais (como o incremento de doenças decorrentes das águas empoçadas). O rio Iaco é aqui uma “coisa-poder”, nas palavras do autor, fundamental para compreender as articulações políticas locais da região.
Ana Lucia Britto, Suyá Quintslr e Margareth da Silva Pereira abordam a transformação da região da Baixada Fluminense entre finais do século XIX e a primeira metade do século XX. Apoiadas em uma sólida reflexão sobre os rios na historiografia, tanto no campo da história ambiental como no campo da história dos sistemas sociotécnicos, as autoras desvendam como os rios da região foram alvo de diversas formas de intervenção ao longo do tempo. Mais ainda, examinam os impactos dessas intervenções desde finais do século XIX. Trata-se de entender como se articularam as dinâmicas fluviais com as dinâmicas sociais, entendendo os rios como “sistemas tecnológicos e ambientais”. É a partir de meados do século XIX, com a introdução da ferrovia, que a região e seus rios sofrem transformações significativas. De região rica passa a ser considerada área insalubre e improdutiva, o que ensejará, nas primeiras décadas do século XX, diversas intervenções, no sentido de sanear a região e torná-la produtiva. Esse processo, levado a cabo pelo Estado, dá ensejo ao surgimento de uma “hidrocracia” responsável pelas políticas de intervenção nos rios da Baixada Fluminense.
Gabriela Segarra Martins Paes analisa o mito dos negros d’água do rio Ribeira de Iguape, na região do Vale do Ribeira. Trata-se de recuperar e compreender as matrizes culturais e os significados atribuídos pela população da região à existência desses seres encantados aquáticos geralmente identificados com um rapaz negro de baixa estatura, muitas vezes com pés e mãos de pato. O mito relaciona-se com a presença de africanos escravizados na região, desde o século XVII, e com as modernas comunidades remanescentes de quilombo. A autora aprofunda a sua reflexão, mostrando a relação histórica entre os escravizados da região do Vale do Ribeira e a África Centro-Ocidental, onde estavam enraizadas crenças acerca de espíritos das águas. Revela assim os diversos pontos em comum entre as crenças dos dois lados do Atlântico, como o local de habitação dos seres encantados e os temas do sequestro de mulheres, do sentido ventura-desventura e da relação e interferência entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Na realidade, o mito dos negros d’água remete ao tráfico negreiro e à escravidão. De fato, envolve a travessia de águas e o renascimento num novo mundo (muitos negros d’água teriam sido capturados e gerado descendência na região), mas também a violência (seus pés e mãos eram cortados), o aprendizado de uma nova língua, a relação entre seres diferentes e o uso do sal associado ao batismo. Enfim, para Gabriela Paes, o enraizamento do mito na região decorre da sua capacidade de “servir de metáfora” da experiência da viagem atlântica e da própria escravidão.
O texto de Henri Acselrad retoma as experiências dos atingidos pela construção da barragem da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no estado do Pará, nos anos 1970 e 1980. O barramento do rio Tocantins implicou não somente a inundação de uma imensa área para conformação do lago da usina. Teve, de fato, inúmeras implicações do ponto de vista ambiental (como a decomposição da matéria orgânica que ficou debaixo da água), por ensejar o aparecimento de pragas de mosquitos, por exemplo, mas igualmente do ponto de vista social. Inúmeros grupos populacionais que havia séculos viviam no e do Tocantins tiveram sua vida alterada, sendo deslocados para outros espaços ou para novos espaços criados pelo barramento. Essas populações heterogêneas, que viviam ao longo do curso do rio, mobilizaram-se contra autoridades públicas e empresariais, ligadas ao empreendimento, para denunciar os desmazelos, a negligência e a violência que significou esse processo. O texto, entretanto, não examina exatamente esses movimentos, mas sim, de maneira muito original, o processo de produção escrita dessas populações atingidas, por meio de manifestos, cartas, boletins e cordéis. A produção e circulação de impressos por parte de uma população vinculada majoritariamente à tradição oral permitiu transformar “um caso em uma causa”. Isso significou o aparecimento de um “novo autor” da história do rio – os atingidos pela barragem. O escrito produzido e publicado pelos diversos grupos afetados permitiu, assim, não somente a produção de um registro sobre a memória do rio Tocantins, mas também a produção de um registro para a ação. A força do “artefato impresso” reside na duração que lhe permite ser “recebido e reconhecido”. Nesse sentido, os impressos produzidos pelos atingidos pela barragem do rio Tocantins fizeram parte de suas lutas e serviram como forma de rememoração dessas próprias lutas.
Iane Maria da Silva Batista e Leila Mourão Miranda retomam a questão dos rios da Amazônia, mas a partir de uma perspectiva distinta do texto de Acselrad, embora se referindo ao mesmo contexto. As autoras partem de uma reflexão sobre os usos e representações das águas e de como essas formas se transformam ao longo do tempo. Assim, notadamente a partir da segunda metade do século XX, os rios se reconfiguram em recursos naturais por parte do Estado e de interesses privados. Disso deriva, desde os anos 1950, o seu reconhecimento para os planos de desenvolvimento da região, principalmente, relacionados aos projetos de exploração das riquezas minerais da Amazônia. Esse processo de comoditização da água, por meio da construção de usinas hidrelétricas na região amazônica, fez os rios se tornarem lugares de “hidronegócios”. Ora, argumenta-se no texto, esse tipo de representação e uso da água dos rios da região vai de encontro a outras relações, construídas secularmente pelas populações da região. Mais ainda, a transformação da água dos rios em mercadoria tem causado enormes impactos socioambientais. As implicações da reconfiguração da água dos rios em mercadoria nos obrigam, desse modo, a repensar a relação que construímos com a água nas últimas décadas.
Haruf Salmen Espindola, Eunice Sueli Nodari e Mauro Augusto dos Santos exploram um acontecimento recente, um desastre, ocorrido há quase 4 anos. Trata-se do rompimento da barragem de Fundão, que pertencia a dois grandes grupos de exploração mineral: as empresas Vale S.A. e BHP Billinton. Para os autores, é preciso compreender o termo desastre numa perspectiva ampla, uma vez que a fatalidade significou não somente o rompimento da barragem, mas uma série de acontecimentos que envolveram e ainda envolvem áreas rurais, áreas urbanas, rios, reservas e a zona costeira, impactando a vida de seres humanos, da flora e da fauna. O artigo revela a complexidade das consequências do desastre, uma vez que os efeitos (e as ações mitigadoras) foram diversos ao longo de toda a área afetada. O texto introduz, também, a noção de “incerteza” para se pensar a constatação de que a mineração industrial representa um “grande risco” (não há aqui como não pensar no recente caso do desastre de Brumadinho). A reflexão do texto finalmente aborda o problema da diversidade de narrativas sobre o acontecimento, envolvendo diferentes grupos e instituições, muitas vezes contraditórias entre si, ensejando o próprio aumento das incertezas.
Por fim, o texto de Cristina Brito examina, por meio dos rios, a relação das sociedades com os manatis, na América colonial. A partir de uma reflexão sobre o lugar dos rios, a autora busca compreender a relação histórica com esses animais, inclusive na sua dimensão simbólica. Para ela, os manatis (como os rios) se tornaram metáforas dos “ritmos naturais e sociais”. Assim, a autora examina diversas representações textuais e imagéticas desses animais, produzidas no período colonial, mostrando como a chegada dos europeus à América impactou as populações dos manatis e como se reconfiguraram as representações sobre eles (embora estas não tenham sido muito abundantes). Discutem-se no texto até mesmo os múltiplos usos e representações indígenas sobre os manatis, com base na documentação produzida por europeus. A reflexão de Cristina Brito insere-se numa discussão sobre a relação entre o mundo humano e o não humano. Trata-se aqui de frisar o próprio protagonismo desses animais aquáticos no seu percurso de interações com as sociedades indígenas e com a sociedade colonial. Segundo a autora, os rios (onde habitavam os manatis) podem ser pensados como lugares de confluência de interações entre seres humanos e entre eles e os animais, enfim, entre “pessoas e a natureza”.
Rio poder; rio saneado; rio metáfora; rio protesto; rio negócio; rio desastre; rio animais. Embora referindo-se ao mesmo objeto – a história dos rios e sua relação com as sociedades -, os enfoques apresentados pelos textos deste Dossiê não somente são muito diversos, mas igualmente dialogam com campos de conhecimento distintos. Mais ainda, tratam de espaços / tempos múltiplos: a América colonial, os vários rios da Amazônia, do século XIX ao século XX, o rio Ribeira de Iguape e a África, a Baixada Fluminense da virada do século, o rio Doce de “ontem”. O que articula as discussões presentes neste Dossiê é certamente a necessidade de incorporar os rios – na sua agência, nas suas representações, na sua simbologia, nos impactos da ação antrópica sobre eles, enfim, na sua complexidade – à reflexão dos historiadores. É que, para um país composto por uma intrincada rede de milhares de rios, oficialmente agrupados em 12 bacias hidrográficas, não há como esquecer que, embora em grande parte ignorada, a “fluvialidade” é parte fundamental da formação histórica do Brasil.
Notas
- Uma amostra bastante significativa, reunindo historiadores de vários países, pode ser encontrada em MAUCH; ZELLER, 2008.
- Vale mencionar, por sua qualidade, trabalhos como O Médio São Francisco(LINS, 1952), O rio comanda a vida: uma interpretação da Amazônia (TOCANTINS, 1952) e Jângala: Complexo Araguaia (BERNARDES, 1994). Em período mais recente, é importante citar a informativa e interessante trilogia, com bastante material histórico, publicada pelo jornalista Marco Antônio Coelho: Rio das Velhas: memória e desafios (COELHO, 2002); Os descaminhos do São Francisco(COELHO, 2005) e Rio Doce: a espantosa evolução de um vale (COELHO, 2011).
Referências
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José Augusto Pádua – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Instituto de História, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: jpadua@terra.com.br http: / / orcid.org / 0000-0002-4524-5410
Rafael Chambouleyron – Universidade Federal do Pará (UFPA), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Faculdade de História, Belém, PA, Brasil. E-mail: rafaelch@ufpa.br http: / / orcid.org / 0000-0003-1150-5912
PÁDUA, José Augusto; CHAMBOULEYRON, Rafael. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.39, n.81, mai / ago., 2019. Acessar publicação original [DR]
An Economic and Demographic History of São Paulo – 1850-1950 – LUNA; KLEIN (RBH)
Este livro é continuação do volume anterior, que tratava dos períodos colonial e imperial. Nesta nova obra, os autores estabelecem como balizas temporais os anos de 1850 e 1950. Juntos, os dois volumes buscam analisar as histórias econômica e social de São Paulo, desde o período colonial até a primeira metade do século XX. Leia Mais
State Building in Boom Times: Commodities and Coalitions in Latin America and Africa – SAYLOR (RBH)
Os fatores históricos relacionados à construção de instituições públicas mais fortes têm sido sistematicamente estudados em muitas disciplinas. No entanto, as condições e os processos históricos que fortaleceram certas instituições públicas em alguns países, mas não em outros, permanecem pouco compreendidas. State Building in Boom Times suscita novo interesse por esse tema ao analisar as condições para a construção do Estado para além da Europa. Com esse objetivo, o livro destaca o papel dos setores exportadores de matérias-primas no fortalecimento das instituições públicas durante períodos de forte crescimento econômico. Leia Mais
Vila Rica em sátiras: produção e circulação de pasquins em Minas Gerais, 1732 – ROMEIRO (RBH)
O trabalho de interpretação documental é sempre um desafio para historiadores competentes, ainda mais quando envolve formas textuais e mídias peculiares. Adriana Romeiro está entre os mais talentosos pesquisadores dedicados à cultura política no Brasil da Época Moderna, com grande potencial de argumentação associado a uma bela escrita. Nesse livro que conta com a colaboração valorosa de Tiago C. P. dos Reis Miranda, a historiadora se lança ao estudo de peças de perfil satírico produzidas sobre o governo de Lourenço de Almeida na capitania de Minas Gerais, de 1721 a 1732. Leia Mais
Revista Brasileira de História. São Paulo, v.39, n.80, 2019.
- Retomar a história da RBH Editorial
- Feitler, Bruno
- Texto: PT
- PDF: PT
- Uma história feita de retalhos: o acervo da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal Articles
- Faria, Daniel; Torres, Mateus Gamba
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
- PDF: PT
- O historiador e a mídia: diálogos e disputas na arena da história pública Articles
- Ogassawara, Juliana Sayuri; Borges, Viviane Trindade
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
- PDF: PT
- “Fitas em chammas”: cinema, imprensa e sensacionalismo na Belle Époquecarioca Articles
- Lapera, Pedro Vinicius Asterito
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
- PDF: PT
- Defesas jesuítas da escravidão voluntária no Japão e no Brasil Articles
- Ehalt, Rômulo da Silva
- Resumo: EN PT
- Texto: EN PT
- PDF: EN PT
- Vestindo o escravismo: o comércio de têxteis e o Contrato de Angola (século XVIII) Articles
- Lopes, Gustavo Acioli; Menz, Maximiliano M.
- Resumo: EN PT
- Texto: PT
- PDF: PT
- Actores y poder en el Cabildo del Buenos Aires, 1776-1810: una contribución desde el análisis de redes sociales Articles
- Valle, Laura Cristina del; Larrosa, Juan M. C.
- Resumo: EN ES
- Texto: ES
- PDF: ES
- Batuques negros, ouvidos brancos: colonialismo e homogeneização de práticas socioculturais do sul de Moçambique (1890-1940) Articles
- Pereira, Matheus Serva
- Resumo: EN PT
- Texto: EN PT
- PDF: EN PT
- Iumatti, Paulo Teixeira. História, Dialética e Diálogo com as Ciências: a gênese de Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Jr. (1933-1942) Resenha
- Brito, Leonardo Octavio Belinelli de
- Texto: PT
- PDF: PT
- Armitage, David; Guldi, Jo. Manifesto pela HistóriaBook-Review
- Souza, Fabricio Leal de
- Texto: PT
- PDF: PT
- Evans, Richard J. Terceiro Reich na história e na memória: novas perspectivas sobre o nazismo, seu poder político, sua intrincada economia e seus efeitos na Alemanha do pós-guerra Resenha
- Oliveira, Wilson de
- Texto: PT
- PDF: PT
Manifesto pela História – ARMITAGE; GULDI (RBH)
Manifesto pela História é uma apologia da história de longa duração que reacende as discussões sobre o lugar dos historiadores na sociedade contemporânea. Publicado originalmente em 2014 pela Cambridge University Press (Armitage; Guldi, 2014), o livro foi prontamente disponibilizado na internet, o que permitiu sua rápida difusão. Após as traduções para os idiomas chinês, coreano, espanhol, italiano, japonês, turco e russo, finalmente está disponível para o leitor brasileiro a versão publicada pela editora Autêntica. 1 Leia Mais
Terceiro Reich na história e na memória: novas perspectivas sobre o nazismo, seu poder político, sua intrincada economia e seus efeitos na Alemanha do pós-guerra – EVANS (RBH)
O suicídio de Adolf Hitler, em 1945, assinalou o fim da Segunda Guerra Mundial na Europa e do regime nacional-socialista. Experiências históricas que marcaram a memória e a história de diversas maneiras. De lá para cá, inúmeros estudiosos estão a narrar e a interpretar o nazismo. A cada livro novo, a cada geração de pesquisadores, os saberes históricos sobre o nacional-socialismo são revisados e ampliados. Leia Mais
História, Dialética e Diálogo com as Ciências: a gênese de Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Jr. (1933-1942) – IUMATI (RBH)
Como produzir uma grande obra de pensamento em um contexto periférico? É com essa pergunta que Paulo Teixeira Iumatti abre o seu História, dialética e diálogo com as ciências: a gênese de Formação do Brasil contemporâneo, de Caio Prado Jr. (1933-1942), livro originado de sua tese de doutorado, produzida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade de São Paulo (USP) e concluída em 2001. De saída, cabe destacar a potência que o qualificativo “contexto periférico” dá à pergunta, pois afasta dela o idealismo próprio às posições que frisam o talento superior do indivíduo ou àquelas que acreditam numa espécie de circulação mundial igualitária de ideias. Já aqui a dimensão materialista, tão ao gosto do seu objeto, aparece com discreta precisão. Leia Mais
Por Escravos e Libertos / Revista Brasileira de História / 2018
Dossiês em Perspectiva
Antes de adentrar o tema escolhido para este Editorial (a organização de dossiês), não podemos deixar de chamar a atenção para o fato de a Revista Brasileira de História vir a público num momento muito tenso da história do Brasil. Após a decisão do eleitorado no segundo turno em 28 de outubro de 2018, o presidente eleito Jair Messias Bolsonaro começa a definir seu Ministério e suas principais políticas para a gestão que começará em 1º de janeiro de 2019. Entre as políticas anunciadas que causam justificadamente mais controvérsia estão: 1) a vinculação do Ensino Superior ao Ministério da Ciência e Tecnologia, saindo do Ministério da Educação (MEC); 2) o apoio à aprovação do Projeto de Lei 7180 / 2014, que institui a chamada “Escola sem Partido”, ameaça à liberdade de ensino e uma forma de discriminar e, eventualmente, punir docentes por pretensos “delitos de opinião”; 3) a promessa de intervenção na autonomia universitária. Tudo isso significará, para a disciplina História, muitos desafios, e exigirá muita atenção e resistência. A Associação Nacional de História (Anpuh-Brasil) une-se a outras associações científicas no intuito de garantir a liberdade de pensamento e o crescimento da qualidade da pesquisa e do ensino de História.
A publicação de dossiês, ou seja, de conjuntos de artigos sobre uma mesma temática mais ou menos estrita, faz parte integrante dos periódicos acadêmicos e evoluiu em suas formas ao longo do tempo. Esse tipo de instrumento, mesmo se usado por títulos especializados, é de grande importância para publicações como a Revista Brasileira de História que, sumamente generalista, publica artigos sobre os mais variados temas. Os dossiês têm originalmente como função dar um estado da arte sobre o tema abordado. Mais ainda do que os próprios periódicos acadêmicos, que “fixam-se no presente”, perdendo muitas vezes sua atualidade com o tempo,1 os dossiês estão claramente vinculados ao momento em que são publicados, pretendendo dar a ver novas abordagens de temas antigos, e também temas novos, em todo caso em sua abordagem histórica. Isso, é claro, apesar de tudo o que escrevemos estar fatalmente vinculado ao seu tempo.
Pode, no entanto, acontecer de dossiês se tornarem clássicos da historiografia, como é o caso daquele organizado neste periódico por Silvia Hunold Lara sob o tema da escravidão há exatos 30 anos. Tratava-se de aproveitar o centésimo aniversário da Lei Áurea não para comemorá-lo, mas para dar a ver temas até então pouco ou nada abordados pelos historiadores, como o da criança e da família escravas, ou o da diversidade regional mas também social da escravidão no Brasil (Lara, 1988). Os historiadores então convidados a colaborar com a revista, já eram ou rapidamente se tornariam referências nos estudos sobre a condição escrava no Brasil, assim como os textos que aqui publicaram. Pareceu natural que chegando os 130 anos da abolição, a mesma especialista do tema coordenasse mais um número da RBH, não só por conta da efeméride, mas igualmente pelo fato de o tema da escravidão contemporânea e as discussões de como defini-la e combatê-la preocuparem cada vez mais historiadores e cientistas sociais.2 No entanto, diferentemente do que foi feito 30 anos atrás, não se buscou mostrar a diversidade de temas passíveis de serem abordados em torno do tema da escravidão, mas, com o foco na importância das experiências individuais para a compreensão da realidade histórica, a chamada feita por Lara para o dossiê deste ano buscou incitar a produção de textos sobre como os próprios cativos e os libertos entendiam e viam suas condições. Tendo em vista o modo como são atualmente produzidos os dossiês, os resultados foram diferentes do esperado, mas nem por isso (muito pelo contrário) insatisfatórios, como a Apresentação que se segue a este Editorial claramente mostra.
As mudanças no modo como o dossiê devia ser elaborado de 30 anos para cá levam a pensar nas justificativas dessa organização. Com efeito, em 1988 Silvia Lara convidou individualmente os possíveis autores e com eles dialogou – antes e depois da recepção dos textos – sobre o conteúdo do que seria publicado. Outro modelo de dossiê (ou de coletânea, como eram chamados) era a publicação de trabalhos apresentados em conjunto em eventos acadêmicos, como no nº 5 (1983), com publicações resultantes do encontro da diretoria da Anpuh durante a 34ª reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), sobre o tema “Documentação e pesquisa histórica”; ou ainda o nº 11 (1985 / 1986), com coletânea sobre “Sociedade e trabalho na História”, resultante do XIII Simpósio da Anpuh. Naquela época não se mobilizavam pareceristas, cabendo ao eventual organizador do dossiê, ao Editor e ao Conselho Editorial da revista decidirem sobre a relevância dos textos submetidos e, assim, sobre sua eventual aceitação ou recusa. O que se buscava, em 1988, era não só a qualidade dos textos, mas também certo diálogo entre eles e sua coesão, naquele caso relacionada à maior amplitude possível de abordagens.
Atualmente, os organizadores convidados elaboram a chamada do dossiê, que é aberta. Mesmo se um ou outro autor pode (e é) convidado a enviar um texto, sua submissão passa, como todos os demais textos da RBH, pelo processo de avaliação às cegas por pares. Uma primeira triagem feita pelo corpo editorial e pelos organizadores deixa de lado propostas que não se adequam à proposta do dossiê. Uma vez os textos retidos avaliados e aceitos pelos avaliadores, mesmo que condicionalmente, os organizadores também fazem correções e sugestões. Esse sistema de chamada universal e de avaliação às cegas, imposto pelas instâncias avaliadoras dos periódicos, tem como objetivo obter garantias da maior diversidade institucional dos autores e da maior isenção na avaliação possíveis. Ele tira uma parte do protagonismo dos organizadores, como de modo geral do próprio Editor, mas creio que apesar disso temos conseguido intervir positivamente nos dossiês. Se o sistema em uso poderia resultar em dossiês pouco coesos ou de relevância limitada, não é esse habitualmente o caso na RBH. Que o leitor o julgue.
O próprio formato dos dossiês mudou nas últimas décadas. Era habitual, nos anos 1980, haver dossiês sem apresentação específica; os artigos eram apenas publicados em conjunto sob um título único para o volume. Em outros casos a Apresentação, a cargo do Conselho Editorial, era bastante sumária e raramente fazia mais do que descrever os artigos publicados. Ultimamente a RBH vem pedindo aos organizadores apresentações mais densas, com algum tipo de discussão historiográfica que não só situe e justifique a temática abordada pelo dossiê, mas também se sustente enquanto contribuição acadêmica. Esperamos, com isso, que os dossiês aqui publicados tenham ganhado em relevância.
Desde que a RBH assumiu o formato quadrimestral, a praxe tem sido a publicação de dois números com dossiês por ano, deixando um número exclusivamente para artigos avulsos, o que não exclui estes últimos de também serem publicados nos outros números. Desse modo, o leitor encontrará aqui dois artigos de temática diferente da do dossiê. Os textos retidos abordam ambos a realidade política dos anos 1960 no contexto de maior tensão da Guerra Fria. O primeiro, de autoria de Rodrigo Patto Sá Motta, revê, nos 50 anos de sua promulgação, e a partir de fontes inéditas, as origens do Ato Institucional 5, chamando a atenção para o seu uso como instrumento de controle de segmentos integrantes do próprio campo do regime. Jaime Yaffé, por sua vez, analisa a atuação do Partido Comunista Uruguaio levando em conta suas posições heterodoxas entre a retórica incendiária cubana e o caminho pacífico, por via democrática, ao socialismo.
Este número também traz três resenhas, duas delas com análises de obras que dialogam com a temática do dossiê: “Por escravos e libertos”.
Ao lhes desejarmos uma boa leitura, não podemos deixar de agradecer ao Conselho Editorial, à Editoria Associada Internacional, aos Assistentes Editoriais Pablo Serrano e Marcus Vinicius Correia Biaggi, assim como à equipe de edição da RBH – Armando Olivetti, Flavio Peralta e Roberta Accurso.
A RBH não teria a qualidade que tem sem o apoio do Programa de PósGraduação em História, Cultura e Práticas Sociais da Universidade do Estado da Bahia (PPGHCPS-Uneb) e do CNPq.
Notas
- Enquanto os livros, por exemplo, teriam uma temporalidade mais longa (CALDEIRA, 2018).
- Veja o evento organizado também por Silvia Hunold Lara no dia 24 de setembro deste ano sobre as “Condições de trabalho no Brasil contemporâneo: políticas públicas e memória institucional” na Unicamp (programa disponível em: https: / / www.foruns.unicamp.br / eventos / condicoes-de-trabalho-no-brasil-contemporaneo-1; acesso em: 29 out. 2018) e o livro recentemente publicado por Ângela de Castro Gomes e Regina Guimarães Neto (GOMES; GUIMARÃES NETO, 2018) sobre o trabalho forçado na Região Amazônica.
Referências
CALDEIRA, Ana Paula S. Editorial: o tempo das revistas. Varia Historia, Belo Horizonte: UFMG, n.65, 2018. http: / / dx.doi.org / 10.1590 / 0104-87752018000200001. [ Links ]
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Bruno Feitler – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: rbh@anpuh.br http: / / orcid.org / 0000-0003-1468-5680
FEITLER, Bruno. Editorial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.38, n.79, set / dez, 2018. Acessar publicação original [DR]
Ghana on the Go: African Mobility in the Age of Motor Transportation – HART (RBH)
A principal contribuição de Ghana on the Go é abordar a questão da mobilidade social na África colonial focalizando uma variável explicativa pouco intuitiva: o advento do transporte motorizado na Costa do Ouro (atual Gana) na década de 1910. O livro mostra que mesmo os africanos mais pobres eram capazes de identificar, nas brechas do regime colonial, formas de empreender, o que contradiz a interpretação de boa parte da literatura sobre o tema, a qual explícita ou implicitamente assume uma inadequação das populações nativas africanas ao desenvolvimento de ideias e técnicas vindas de fora. Ao abordar a questão dessa perspectiva, o livro amplia a discussão sobre mobilidade social, incluindo aspectos que vão além da maior mobilidade física propiciada pelos veículos a motor, como o impacto da nova tecnologia na configuração de valores, experiências e oportunidades criados no cotidiano. Leia Mais
Pessoas comuns, histórias incríveis: a construção da liberdade na sociedade sul-rio-grandense – SILVA (RBH)
O Brasil não sofre de falta de passado, talvez ele conviva com um excesso de passado. A questão que se coloca não é a ausência de uma noção do passado nacional, mas sim de qual passado se preserva. Essa ideia foi apresentada por Fernando Nicolazzi na conferência “História e Historiografia em tempos de transição”, oferecida no XVI Encontro Regional de História (Anpuh/Paraná, 2018). O passado que se cultiva no Brasil pode ser pensado nos termos propostos por Manoel Bomfim, ainda na primeira metade do século XX. Bomfim destacou em suas obras como o Brasil incorporava narrativas postas a deturpar sua trajetória histórica, bem como perpetuava um padrão de socialização calcado no parasitismo social (Bomfim, 2005; 2013). Esse passado que se cultiva é, em grande medida, aquele que perpetua as premissas estamentais da sociedade brasileira. Leia Mais
História e Arquivo / Revista Brasileira de História / 2018
Arquivos sob ameaça: os perigos de uma política antiarquivística
Vivemos a era da extinção do papel. Não cabe aos historiadores assumirem uma posição conservadora, defendendo suportes documentais tradicionais. Porém, não cabe também a eles abraçarem ingenuamente a tecnologia. Duas iniciativas em curso devem ser acompanhadas com preocupação. Uma delas é a adoção, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Sistema Eletrônico de Informações (SEI). Essa ferramenta consiste em um sistema informatizado de Gestão Eletrônica de Documentos (GED) e está sendo implantada na administração federal, sendo também crescentemente adotada por administrações estaduais e municipais. O SEI prevê a extinção, na administração pública, de documentos produzidos em papel. Frente a tal proposta, o Arquivo Nacional emitiu nota técnica afirmando que esse sistema não cumpre requisito algum de preservação digital, complementando: “O órgão ou entidade que adotar o SEI, ou qualquer outro sistema informatizado para a produção de documentos digitais, precisa prever uma política de preservação digital para garantir o acesso de longo prazo a estes documentos” (Arquivo Nacional, 2015, grifo no original).
Conforme é possível observar, no SEI, a preservação digital não é um requisito obrigatório, abrindo caminho para que muitos órgãos públicos não a implementem de fato. Além da insegurança jurídica que isso pode causar, também há o gravíssimo risco de perdas substanciais do patrimônio arquivístico brasileiro. Mais grave ainda é o Projeto de Lei (PL) 7.920 / 2017, que atualmente – ou seja, em junho de 2018 – tramita na Câmara de Deputados. Essa proposta, na forma de Projeto de Lei do Senado – PLS 146 (Senado Federal, 2007), foi aprovada nessa última casa legislativa. Na Câmara dos Deputados, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática votou favoravelmente ao PL 7.920, acrescentando “prazo mínimo de dois anos para guarda dos documentos após efetuar-se o processo de digitalização”. Esse acréscimo revela um desconhecimento monumental a respeito dos instrumentos legais (Tabelas de Temporalidade e Destinação de Documentos de Arquivo), que definem os prazos de guarda dos documentos públicos. Além disso, essa Comissão fez algumas alterações, no projeto original, no que diz respeito à certificação digital ou à menção ao Conselho Nacional de Arquivos (Conarq). Contudo, a essência do PLS 146 não foi alterada, pois continuou a admitir que: “O documento digitalizado produzido a partir do processo de digitalização disciplinado em regulamento terá o mesmo valor legal, para todos os fins de direito, do documento não digital que lhe deu origem” (Câmara dos Deputados, 2017).
Tais projetos também autorizam esses procedimentos em relação aos documentos privados, sejam de empresas ou pessoais. O PLS 146 indica, em seu artigo 1, que os “órgãos públicos federais, estaduais e municipais, e de entidades integrantes da administração pública indireta das três esferas de poder político serão regidos pela presente lei”. O Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), órgão da administração pública federal encarregado de formular a política nacional de arquivos, emitiu nota técnica criticando duramente essas iniciativas. Alerta-se que a proposta de digitalização seguida da eliminação dos documentos originais “possui equívocos ao alterar importantes dispositivos legais”, pois extingue “a função genuína de ‘prova’ e / ou ‘testemunho’ de grande parte dos documentos arquivísticos” (Conselho Nacional de Arquivos, 2016). Mais ainda: “a fácil manipulação” das imagens digitais inviabiliza a “análise forense ou diplomática forense, em casos de contestação de veracidade, impugnação e / ou denúncias de adulteração e falsificação de documentos”.
Cabe aqui lembrar que esse debate não diz respeito aos documentos gerados em meio digital (os denominados nato-digitais), mas sim aos que são produzidos em papel e depois digitalizados. Embora a presença de documentos digitais seja comum, a maior parte da administração pública e privada brasileira ainda trabalha com sistemas híbridos, em que são produzidos documentos em formato digital e em suporte de papel. Além disso, o mais preocupante é que há imensos conjuntos documentais da administração pública, posteriores a 1950, ainda não avaliados e, portanto, não recolhidos aos arquivos públicos. Ao que tudo indica, eles seriam digitalizados e os respectivos originais seriam eliminados.
A eliminação em massa de documentos teria efeitos danosos ao patrimônio arquivístico brasileiro. O Conarq sublinha a inconsistência de um dos principais argumentos dos defensores dessas propostas. Esses últimos alegam que a medida implicaria substancial economia de recursos públicos, devido à “redução de áreas destinadas aos arquivos físicos” ou à “redução dos gastos com papel, o que favorece a preservação do meio ambiente”. Frente a esse argumento, a nota técnica do Conarq alerta que a “preservação e acesso de longo prazo” dos documentos digitalizados implica a “previsão de planejamento e investimentos constantes”, assim como “custos elevados com a manutenção do ambiente tecnológico ao longo dos anos”.
Os defensores do PLS-146, por sua vez, contra-argumentam que o segundo inciso do artigo 2 da versão do Senado prevê que: “Os documentos de valor histórico, assim declarados pela autoridade competente, embora digitalizados, não deverão ser eliminados, podendo ser arquivados em local diverso da sede do seu detentor”. Alerta semelhante pode ser observado na versão do texto que atualmente tramita na Câmara de Deputados: “A Administração Pública deverá preservar os documentos não digitais avaliados e destinados à guarda permanente, conforme previsto na Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, ainda que também armazenados em meio eletrônico, óptico ou equivalente”. Destaca-se aqui a menção à Lei de Arquivos (Lei nº 8.159 / 1991), que prevê em seu Art. 9º: “A eliminação de documentos produzidos por instituições públicas e de caráter público será realizada mediante autorização da instituição arquivística pública, na sua específica esfera de competência”.
Cabe ainda sublinhar que em nenhum momento o PLS 146 ou o PL 7.920 definem as noções de “documentos de valor histórico” ou “destinados à guarda permanente”. Igualmente, não se define quem seria a “autoridade competente” ou o gestor da “Administração Pública” que se encarregaria de avaliar os documentos enquanto patrimônios históricos. Na prática, há risco de se preservar apenas os registros esparsos referentes às grandes personalidades, sem consideração por séries documentais de natureza econômica e demográfica, ou as demais que preservam registros da memória das camadas populares.
Em outras palavras, essas proposições normativas abrem as portas para que a escolha dos “documentos de valor histórico”, a serem preservados, fique sujeita a critérios altamente subjetivos do gestor público do momento. No contexto administrativo brasileiro, em que a gestão de documentos arquivísticos ainda está em fase de implantação, é bem provável que esses agentes simplesmente não considerem nenhum documento público como tendo “valor histórico”, eliminando sua totalidade após a reformatação digital. Dessa maneira, há grande chance de se perderem tanto os documentos originais quanto suas representações digitais, principalmente quando se tem em vista os elevados custos de mantê-las a longo prazo. Fere-se, assim, de maneira mortal a formação do patrimônio documental brasileiro. Caminha-se, na prática, para a legalização da destruição em massa dos documentos arquivísticos, seja em sua função de evidência, seja para o acesso a direitos ou para preservar a memória brasileira para as futuras gerações.
A Anpuh vem acompanhando esses debates e tem se posicionado claramente contra esses danosos projetos. O Dossiê publicado neste número, intitulado “História e Arquivo”, ao trazer um panorama da atual produção sobre a história dos arquivos e da arquivologia, tem como objetivo, em nome da Associação, alertar para as problemáticas que suscitam os projetos legislativos e administrativos em curso.
Este número da RBH apresenta, assim, novas perspectivas de análise sobre o patrimônio arquivístico e a arquivologia. Através da história desse campo de conhecimento, assim como das instituições e das políticas de formação de acervos, lança-se luz sobre as potencialidades de pesquisa nos, por assim dizer, “arquivos dos arquivos”, ou seja, na documentação acumulada pelos arquivos públicos no exercício de suas atividades. Procura-se também promover uma reaproximação entre a história e a arquivologia, áreas muito conectadas no passado, mas que conheceram desenvolvimentos específicos no século XX, gerando afastamentos ou mesmo mal-entendidos (Blouin Jr.; Rosenberg, 2011).
O primeiro texto do dossiê, de autoria de Angelica Alves da Cunha Marques, Georgete Medleg Rodrigues e Christine Nougaret, explora a evolução histórica da arquivologia no Brasil e na França, apontando influências e singularidades nas respectivas configurações nacionais dessa área, principalmente em sua relação com a ciência da informação. O segundo texto, de autoria de Ana Canas Delgado Martins, desvela as complexas relações da constituição do fundo Conselho Ultramarino, assim como de sua custódia, tema de grande importância para o Brasil e Portugal. O terceiro artigo, de Marcelo Thadeu Quintanilha Martins, traça a história do fundo arquivístico da Secretaria de Governo da Capitania de São Paulo, revelando as potencialidades dos estudos sobre a evolução desse tipo de custódia, tema ainda muito pouco conhecido no Brasil.
Rita Sampaio da Nóvoa e Maria de Lurdes Rosa investigam, em seguida, as potencialidades dos arquivos de família. Trata-se de um tema fundamental, não apenas para entender a gestão patrimonial privada no Antigo Regime, como também o próprio funcionamento da monarquia. Sabe-se que antes do surgimento dos arquivos nacionais, havia arquivos dinásticos (Delmas; Nougaret, 2004), que recolhiam documentação das casas aristocráticas responsáveis por várias funções do Estado. O estudo desses conjuntos documentais, que eventualmente também permaneceram em posse de famílias, em muito permite entender o funcionamento da antiga administração portuguesa no reino e ultramar. O texto seguinte, de Thiago Lima Nicodemo e Paulo Teixeira Iumatti, desloca o eixo de discussão para um tema caro ao Brasil: a escrita da história a partir dos arquivos pessoais, particularmente a história social e cultural dos intelectuais, como no caso das redes de sociabilidade que esse segmento constituía ou as relações que mantinha com a esfera pública, dimensões que ficaram ali registradas.
Em sua contribuição, Paulo Roberto Elian dos Santos aborda a formação do campo arquivístico do Brasil contemporâneo, focalizando a primeira grande reforma administrativa federal, ocorrida na década de 1930, responsável pela criação do Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), que atuou como autoridade arquivística, influenciando em muito a constituição desse campo. O texto de Maria Teresa Navarro de Britto Matos desloca essa discussão para o caso da Bahia, onde tentativas de modernização do arquivo público estadual foram frustradas. Esse episódio revela a existência de agentes públicos que, embora sintonizados com a discussão contemporânea da gestão documental, não puderam contar com base política, ou mesmo apoio na burocracia estatal, para que suas iniciativas prosperassem. Complementando esse ambíguo quadro das iniciativas modernizantes, o texto de Clarissa Moreira dos Santos Schmidt, Renato de Mattos e Natalia Bolfarini Tognoli mostra a natureza fortuita da criação do Sistema Estadual de Arquivos em São Paulo da década de 1980. Esse caráter fortuito, ironizado no título do artigo, decorre do fato de essa iniciativa não ter sido precedida de diagnósticos da documentação e da infraestrutura existentes, assim como de estudos sobre o quadro de profissionais disponíveis ou das necessidades dos potenciais usuários desse sistema. Na realidade, tal iniciativa decorreu de um leilão ilegal de documentos. A desconexão entre essa iniciativa e a gestão documental talvez ajude a compreender o atraso em sua implantação. O caso paulista serve de exemplo da fragilidade das políticas arquivísticas e de sua demora de implantação no Brasil. Concluindo o Dossiê, Caio César Boschi apresenta o Projeto Resgate, iniciativa que influenciou uma geração de historiadores e foi responsável pela digitalização de milhões de páginas de acervos relevantes para a história luso-brasileira. Esse texto sintetiza a evolução e dilemas desse projeto e, de forma inédita, fornece um guia de seus principais instrumentos de pesquisa, também anunciando a retomada dos trabalhos após alguns anos de arrefecimento.
Esse conjunto de reflexões em muito contribui para entender a arquivística brasileira contemporânea. Embora a utilização de documentos de arquivo seja frequente em várias áreas de conhecimento, ainda são raras as histórias de sua custódia institucional e das formas de uso dessas fontes. Espera-se que os textos presentes no Dossiê inspirem novas investigações. Ainda há muito a ser estudado a respeito de como se deu a formação dos acervos arquivísticos luso-brasileiros ou as mudanças nas definições de fundos e coleções. Isso para não mencionar como esses registros foram utilizados na escrita da história política, econômica, social e cultural, ou quando, e de que forma, a antropologia, a sociologia, a ciência política e demais áreas do conhecimento começaram a recorrer a eles. Também se conhece muito pouco a respeito da evolução da gestão dos arquivos públicos brasileiros e de seus serviços, bem como sobre a história dos procedimentos técnicos de classificação dos documentos de arquivos, de sua avaliação, conservação, descrição, difusão e acesso.
Embora estudos seminais tenham sido realizados por vários historiadores e arquivistas (Santos, 2010; Estevão; Fonseca, 2010; Marques, 2013, 2014; Bellotto, 2014; Bottino, 2014 – somente para citar alguns exemplos), esse continente de pesquisa ainda está à espera de novos e necessários desbravadores.
Para além do Dossiê, este número traz dois artigos avulsos. Numa abordagem original dentro da área da História dos esportes, Victor Andrade Melo e André Leonardo Chevitarese, recorrendo aos jornais da época, analisam aspectos sociais das atividades de um turfe carioca de fins do século XIX, o Prado Guarany. Já Wellington Castellucci Junior revela, pela trajetória de Marcos Pimentel e de seus descendentes, as origens da linhagem dos sacerdotes do candomblé Ilê Axé Opô Afonjá de Itaparica, e ao mesmo tempo traz um detalhado exemplo das estratégias de construção patrimonial de libertos na Bahia da segunda metade do século XIX. Finalmente, dentre as três resenhas publicadas, uma complementa em boa hora o Dossiê “História e Arquivo”. Nela, José Francisco Campos aborda a atualíssima questão da preservação dos arquivos nato-digitais por meio da análise de Existir em bits: arquivos pessoais nato-digitais e seus desafios à teoria arquivística, de Jorge de Abreu.
Ao lhes desejarmos uma ótima leitura, não podemos deixar de agradecer ao Conselho Editorial, à Editoria Associada Internacional, aos Assistentes Editoriais Pablo Serrano e Marcus Vinicius Correia Biaggi, assim como à equipe de edição da RBH – Armando Olivetti, Flavio Peralta e Roberta Accurso.
A RBH não teria a qualidade que tem sem o apoio do Programa de Pós-Graduação em História, Cultura e Práticas Sociais da Universidade do Estado da Bahia (PPGHCPS-Uneb) e do CNPq.
Referências
ARQUIVO NACIONAL. Considerações do Arquivo Nacional, órgão central do Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo – SIGA, da administração pública federal acerca do Sistema Eletrônico de Informações – SEI (2015). Disponível em: Disponível em: http: / / www.arquivonacional.gov.br / images / conteudo / artigos / SEI_analise_AN.pdf ; acesso em: 18 jun. 2018. [ Links ]
BELLOTTO, Heloísa Liberalli. Arquivo: estudos e reflexões. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2014. [ Links ]
BLOUIN JR, Francis X.; ROSENBERG, William G. Processing the Past: Contesting Authority in History and the Archives. New York: Oxford University Press, 2011. [ Links ]
BOTTINO, Mariza. O legado dos congressos brasileiros de arquivologia (1972-2000). Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2014. [ Links ]
BRASIL. Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 9 jan. 1991. Seção 1, p.457. Disponível em: http: / / www.planalto.gov.br / ccivil_03 / Leis / L8159.htm; acesso em: 20 jun. 2018. [ Links ]
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº 7.920, de 2017. Altera a Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012, a Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para dispor sobre a digitalização de documentos. Disponível em: Disponível em: http: / / www.camara.gov.br / proposicoesWeb / prop_mostrarintegra;jsessionid=421A6AC547B83C872583B3D3DBCC846C.proposicoesWebExterno2?codteor=1583747&filename=Avulso+-PL+7920 / 2017 ; acesso em: 18 jun. 2018. [ Links ]
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. Projeto de Lei nº 7.920, de 2017. Altera a Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012, a Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para dispor sobre a digitalização de documentos. Disponível em: Disponível em: http: / / www.camara.gov.br / proposicoesWeb / prop_mostrarintegra?codteor=1632805&filename=Tramitacao-PL+7920 / 2017 ; acesso em: 20 jun. 2018. [ Links ]
CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS. Nota do CONARQ sobre o PLS 146 / 2007 (2016). Disponível em: Disponível em: Disponível em: Disponível em: http: / / www.conarq.gov.br / noticias / 533-nota-do-conarq-sobre-o-pls-146-2007.html ; acesso em: 18 jun. 2018. [ Links ]
DELMAS, Bruno; NOUGARET, Christine. Archives et nations dans L’Europe du XIX siècle. Paris: Ecole Nationale des Chartes, 2004. [ Links ]
ESTEVÃO, Silvia Ninita de Moura; FONSECA, Vitor Manoel Marques da. A França e o Arquivo Nacional do Brasil. Acervo, Rio de Janeiro, v.23, n.1, p.81-108, 2010. [ Links ]
MARQUES, Angelica A. da Cunha. A arquivologia brasileira: busca por autonomia cientifica no campo da informação e interlocuções internacionais. Rio de Janeiro: Associação dos Arquivistas Brasileiros, 2013. [ Links ]
MARQUES, Angelica A. da Cunha et al. (Org.) História da Arquivologia no Brasil: instituições, associativismo e produção científica. Rio de Janeiro: AAA; Faperj, 2014. [ Links ]
SANTOS, Paulo Roberto Elian dos. Arquivística no laboratório: história, teoria e métodos de uma disciplina. Rio de Janeiro: FA-PERJ, 2010. [ Links ]
SENADO FEDERAL. Projeto de Lei do Senado no 146, de 2007. Dispõe sobre a digitalização e arquivamento de documentos em mídia ótica ou eletrônica, e dá outras providências. Disponível em: Disponível em: https: / / www25.senado.leg.br / web / atividade / materias / – / materia / 80337 ; acesso em: 18 jun. 2018. [ Links ]
Renato Pinto Venancio – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Escola da Ciência da Informação, Departamento de Organização e Tratamento da Informação. Diretoria de Arquivos Institucionais (DIARQ-UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil. Editor convidado. Pesquisador do CNPq 1D. E-mail: rvenancio@eci.ufmg.br
http: / / orcid.org / 0000-0003-0819-3671
Bruno Feitler – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: rbh@anpuh.br http: / / orcid.org / 0000-0003-1468-5680
VENANCIO, Renato Pinto; FEITLER, Bruno. Editorial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.38, n.78, mai / ago., 2018. Acessar publicação original [DR]
Existir em bits: arquivos pessoais nato-digitais e seus desafios à teoria arquivística – ABREU (RBH)
Fruto da dissertação orientada por Aline Lopes de Lacerda e Luciana Heymann, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Gestão de Documentos e Arquivos da UniRio, Existir em bits: arquivos pessoais nato-digitais e seus desafios à teoria arquivística, recém-editado pela Associação de Arquivistas de São Paulo, marca, de certa forma, a entrada de Jorge Phelipe Lira de Abreu na bibliografia brasileira sobre arquivos pessoais. Não se trata, convém notar, de estreia propriamente dita, tendo em vista que o autor vem publicando artigos em periódicos especializados e capítulos em coletâneas e anais de eventos realizados no país e no exterior. Leia Mais
Em busca do Brasil: Edgard Roquette-Pinto e o retrato antropológico brasileiro (1905-1935) – SOUZA (RBH)
Publicado em 2017, Em busca do Brasil, de autoria de Vanderlei Sebastião de Souza, é fruto da tese de doutorado defendida na Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz e agraciada com o III Prêmio de Teses da Anpuh, no biênio de 2011-2012. Os cinco capítulos que compõem o livro trazem à tona a preocupação com o tema da identidade nacional na trajetória política e científica do médico e antropólogo Edgard Roquette-Pinto. Em especial, a obra analisa a sua relação com a antropologia física, suas interlocuções transoceânicas e a ampla discussão racial mobilizada durante as primeiras décadas do século XX. Leia Mais
Mujeres en la Nueva España – ZAPATERO; SOBERÓN (RBH)
El libro Mujeres en la Nueva España, coordinado por Alberto Baena Zapatero y Estela Roselló Soberón, forma parte de la prestigiada serie “Historia Novohispana” del Instituto de Investigaciones Históricas de la Universidad Nacional Autónoma de México y es producto de coloquio internacional, celebrado en dicha institución, con el mismo título, en octubre de 2012. Los participantes en el acto académico, ahora coautores del libro, dispusieron de tiempo para transformar sus presentaciones orales en textos escritos formales, actualizados y corregidos. El índice de la obra advierte al lector que se analizarán una variedad de temas: la construcción historiográfica de las mujeres en la segunda mitad del siglo XX; los conventos femeninos y el monacato novohispano; la joyería femenina y la estética de los adornos; las mujeres fandangueras; en fin, el castigo judicial de los pecados públicos.
La introducción corre a cargo de Pilar Pérez Cantó, misma que no sólo consiste en un discurso sobre los trabajos reunidos, sino que ofrece una reflexión sobre la condición, papel y circunstancias de las mujeres a lo largo del tiempo en América Latina, y sobre las teorías que han moldeado los comportamientos entre los géneros.
El primer capítulo, escrito por Isabel Morant, se titula “Mujeres e historia. La construcción de una historiografía 1968-2010”, cuyo contenido ofrece una periodización de la etapas por las que a atravesado la historia de las mujeres, rescatando los más significativos debates, problemas epistemológicos y autoras.
El análisis de las mujeres privilegiadas en el Valle de Orizaba, con el recurso a la microhistoria, es lo que se presenta en el segundo capítulo, “El Condado del Valle de Orizaba a través de sus mujeres”, de Javier Sanchiz. El tratamiento investigativo a las mujeres con títulos nobiliarios, titulares o consortes, tiene que hacerse, muchas veces, con relación a su esposo ya que, con base en la documentación, su papel era de gestoras de la “casa nobiliaria”, haciendo a un lado su protagonismo, quedando, en consecuencia, bajo la sombra masculina. De esta manera, el papel hombre-esposo era determinante y predominante en el destino de las condesas y, podríamos decir, de las mujeres novohispanas.
“Hermanas en Cristo. Balances, aproximaciones y problemáticas del monacato novohispano” es el capítulo que sigue, el tercero, en el que su autora, Rosalva Loreto López, analiza los conventos de mujeres, en particular de los franciscanos, cuyo legado cultural es profundo en la Nueva España (fansciscanismo femenino cultural), su implantación y expansión, así como los éxitos de la rama femenina de los mendicantes; asimismo, se señalan las diferencias entre las hermanas de la orden.
Por su parte, Antonio Rubial García examina en el capítulo cuatro, “Las beatas, la vocación de comunicar”, con base en las fuentes de la Inquisición y la hagiografía, a las mujeres que formaban parte del espacio beateril: aquellas que no estaban casadas y no eran profesas recluidas en un monasterio o beaterio, vestidas con atuendos particulares, y piadosas, situadas, no obstante, en los márgenes de alguna orden religiosa que les diera legitimidad.
“La joyería femenina novohispana. Continuidades y rupturas en la estética del adorno corporal” de Andreia Martins Torres, es el capítulo número cinco, en donde se señala que vida de la Nueva España, simbólicamente vista, fue organizada sobre la base de un complejo sistema social con personajes de tierras continentales diversas: indias, españolas, negras y chinas asimilaron los signos “externos dentro de los límites de su estructura mental” (Baena Zapatero; Roselló Soberón, 2016, p.172). Con todo, la singularidad de la joyería de la época radica en la “añadidura” o combinación que le dio la población heterogénea del territorio; es decir, la joyería europea o asiática que llegaba fue usada por grupos distintos con significados también diferentes.
El único capítulo escrito en coautoría es el sexto, “Surcando el lado oscuro de la luna. Mujeres fandangueras”, de Lizette Alegre González, Gonzalo Camacho Díaz, Lénica Reyes Zúñiga y José Miguel Hernández Jaramillo. En él, los autores rastrean las “huellas” de la mujer como símbolo de subversión, mediante el fandango – son de mujeres -, ya que ellas, las “fandangueras”, usaban la fuerza simbólica de su cuerpo para exhibir a la sociedad que las negaba como personas, viéndolas, entonces, de forma exclusiva como cuerpos-símbolos.
El trabajo de Andrea Rodríguez Tapia, “‘La Castrejón’, una ‘alcahueta’ o ‘lenona’ ante la justicia criminal en Nueva España, 1808-1812”, integra el séptimo capítulo, en el que se examina el proceso judicial contra María Manuela González Castrejón, formado por la Real Sala del Crimen por el delito de lenocinio, que había sido reconocido como tal desde Las Siete Partidas. Rodríguez Tapia señala que la actitud de las autoridades asentadas en sus territorios continentales de Occidente, a diferencia de aquellas en los ayuntamientos de Madrid y Sevilla, durante la Edad Moderna, era ambigua, ya que las mujeres que incurrían en la prostitución eran descalificadas, mientras que el hombre que se relacionaba con ellas no sufría sanción alguna. Manuela González fue sometida a proceso no por las prácticas que tenían lugar en su casa sino por el escándalo que denunciaron los vecinos. La sanción hacia ella fue más bien una advertencia para quienes ejercían la prostitución o “alcahueteaban” a las “mujeres públicas”. En fin, conviene decir que los delitos sexuales, como el imputado a “La Castrejón” eran, hasta cierto punto, menores.
El penúltimo capítulo, el octavo, es responsabilidad de Estela Roselló Soberón y se titula “El mundo femenino de las curanderas novohispanas”. Con un esbozo biográfico de María Calderón – curandera y mujer lejos de ser pasiva, encerrada y callada -, la autora centra su atención, precisamente, en las curanderas y en su actuar en las fronteras o márgenes de la sociedad como “negociadoras culturales”, haciendo evidente los estereotipos que quienes practicaban ese oficio tenían sobre sí y el posterior reconocimiento, prestigio y fama de los que fueron merecedoras.
En fin, en el noveno capítulo, “Salir del silencio: lecturas y escritos femeninos en la prensa mexicana de principios del siglo XIX”, de Esperanza Mó Romero, se destaca la participación de las mujeres en las discusiones en la prensa, particularmente a través del Diario de México y se estudian el modelo de sociedad ilustrada al que se enfrentaron las mujeres decimonónicas y sus respuestas a dicho marco, enriqueciendo, con ello, el debate público. La presencia de algunas mujeres en los periódicos supuso un quiebre cualitativo significativo en la sociedad, ya que se proyectaba una “nueva imagen femenina, a la cual las lectoras podían conformarse, que desbordaba los límites del modelo tradicional que se divulgaba a través de [las] páginas” (Baena Zapatero; Roselló Soberón, 2016, p.273).
En suma, los trabajos contenidos en Mujeres en Nueva España exponen, con un lenguaje diáfano, las circunstancias, coyunturas y pormenores de las mujeres durante el siglo XIX, a excepción del texto de Isabel Morant, cuyo aporte teórico en torno a las etapas por las que ha pasado la historia de las mujeres, lo hace singular.
Referências
BAENA ZAPATERO, Alberto; ROSELLÓ SOBERÓN, Estela (Coord.) Mujeres en la Nueva España. México: Universidad Autónoma de México, Instituto de Investigaciones Históricas, 2016. [ Links ]
Eduardo Torres Alonso – Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM), Facultad de Ciencias Políticas y Sociales. Ciudad Universitaria, Delegación Coyoacán, D.F., México. E-mail: etorres.alonso@gmail.com
ZAPATERO, Alberto Baena; SOBERÓN, Roselló Estela. Mujeres en la Nueva España. México: Universidad Nacional Autónoma de México, Instituto de Investigaciones Históricas, 2016. 280p. Resenha de: ALONSO, Eduardo Torres. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.38, n.77, jan./abr. 2018. Acessar publicação original [IF]
Cidades e cultura política nas Américas – MORSE; DOMINGUES (RBH)
MORSE, Richard. DOMINGUES, Beatriz Helena. Cidades e cultura política nas Américas. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2017. 277p. Resenha de: CASTRO, Ana Claudia Veiga de. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.38, n.77, jan./abr. 2018
Mais conhecido no Brasil por ter publicado nos anos 1980 o livro O Espelho de Próspero (Morse, 1988), uma polêmica tese sobre as duas Américas, o historiador norte-americano Richard Morse também é o autor de uma série de ensaios sobre as cidades latino-americanas e o papel do pesquisador social. É um conjunto expressivo desses ensaios que vem agora a público no volume organizado pela historiadora Beatriz Domingues: Cidades e cultura política nas Américas. O livro reúne textos escritos por Morse entre 1954 e 1992, meio século de uma intensa produção intelectual enquanto era professor e pesquisador de algumas das principais universidades norte-americanas.
Morse iniciou seu percurso acadêmico nos anos 1940, e após graduar-se em História na Universidade de Princeton veio ao Brasil, em 1947, para realizar a pesquisa de campo de seu doutorado em Columbia, sob orientação do antropólogo Frank Tannenbaum. Interessado em compreender como uma pequena vila sem grande importância no sistema colonial português vinha se tornando a principal metrópole latino-americana, Morse passou mais de um ano em São Paulo, onde travou relações duradouras com Antonio Candido e seu grupo na Universidade de São Paulo, encantando-se pelo Modernismo e pela vibração daquela metrópole em formação. O resultado da tese foi o livro Formação Histórica de São Paulo: de comunidade à metrópole, publicado pela primeira vez nas comemorações do IV Centenário de São Paulo, com o título De comunidade à metrópole: a biografia de São Paulo, e republicado em 1970 na famosa coleção Corpo e Alma do Brasil, dirigida por Fernando Henrique Cardoso (Morse, 1954; Morse, 1970). A obra tornou-se um clássico da história urbana de São Paulo, podendo também ser lida como um esquema de interpretação sobre a forma de desenvolvimento da cidade capitalista no mundo ibero-americano e, talvez, como vislumbre de uma outra modernidade. Pode-se dizer que essa tese (e sua experiência em São Paulo) abriu os olhos de Richard Morse para o problema da urbanização latino-americana e para a cultura urbana em geral – definindo a importância dessa perspectiva analítica para seu entendimento do mundo social -, resultando em textos, intervenções e organização de livros.
Parte dessa produção é agora publicada: nunca traduzidos e de difícil acesso ao pesquisador brasileiro, estes artigos podem ser lidos de maneira complementar aos trabalhos de maior fôlego do pesquisador, desenhando o percurso de seu pensamento ao longo dos anos e revelando a erudição e a perspicácia de um intelectual que não se contentava com visadas ortodoxas, buscando escapar da ideia de modelos e desvios, valendo-se da compreensão de sistemas de pensamentos.
O primeiro desses ensaios, “Rumo a uma teoria de governo para a América Espanhola”, publicado ainda em 1954 no Journal of History of Ideas, recupera a presença hispânica na América e discute as heranças medieval e renascentista na formação do novo continente, sobretudo nas suas cidades, indicando a impossibilidade de se lidar com as nações de origem ibérica na América seguindo a régua da América anglo-saxã, formada desde uma origem diversa não apenas espacial, mas também temporal. O ensaio anuncia um tema que Morse revisita ao longo da carreira e que encontra sua forma final no já citado Espelho de Próspero.
Em seguida, “São Paulo desde a independência: uma interpretação cultural”, publicado no mesmo ano, desta vez na Hispanic American Historic Review – a mais importante publicação dos estudos históricos latino-americanos nos Estados Unidos -, apresenta uma espécie de síntese de sua tese sobre São Paulo e introduz o leitor à compreensão das cidades a partir de uma mirada cultural. Num momento em que os pesquisadores se debruçavam sobre os problemas advindos da intensa urbanização das cidades latino-americanas – que sem o necessário lastro na industrialização resultava num conjunto expressivo da população empregado nas margens do sistema, abrigado em imensas áreas periféricas sem infraestrutura urbana adequada -, Morse indicava a potência da cultura para o conhecimento dessas cidades, e a própria importância das cidades, com suas instituições culturais, para que se pudesse tratar “de forma eficaz [até mesmo] os insistentes problemas agrários da América Latina” (p.106). Esta última afirmação do ensaio evidencia como, para Morse, o trabalho intelectual não era desprovido de intenções, comprometendo-se, ao fazer história, a discutir o desenvolvimento do subcontinente, em diálogo com pesquisadores como Robert Redfield e Oscar Lewis, que se dedicavam naqueles anos à compreensão das especificidades do fenômeno urbano latino-americano.
Dois outros ensaios publicados na mesma Hispanic American Historic Review, “Algumas características da história urbana da América Latina” (de 1962) e “Prolegômenos para a história urbana da América Latina” (de 1972), foram escritos quando Morse era professor de História da América Latina, primeiro na Universidade do Estado de Nova York e em seguida em Yale, onde se envolveu em diversas ações para a consolidação da história urbana como uma disciplina, participando de congressos, coordenando simpósios, organizando volumes – entre os quais, alguns trabalhos com o argentino Jorge Enrique Hardoy que geraram aportes decisivos ao campo.
No primeiro, Morse retoma ideias trabalhadas em um texto publicado em 1957 na revista Estudios Americanos, “La ciudad artificial”, escrito como comentário da mesa “Expansão urbana na América Latina durante o século 19”, em uma reunião da American Historical Association no qual anunciara a cidade na América Latina como algo “artificial” ao ser lida à luz da história urbana europeia. Já ali Morse defendia a necessidade de uma história cultural urbana como a única forma de não ver a América Latina como desvio da “civilização ocidental”. Mas se havia especificidades em relação à urbanização europeia e também à da América anglo-saxã, havia um paradoxo que valia tanto para a América do Norte quanto para a do Sul: “que a cidade, notória na Europa por seu raio comercial e por sua atividade manufatureira, serviu, no Novo Mundo, como ponto de partida para o contato com o solo, em territórios onde nenhuma rota de comércio interno havia sido definida e onde a manufatura era restringida pelas políticas do mercantilismo” (p.135). Isso teria feito do espaço, e não do tempo, “o principal fator da experiência americana”, tornando a cidade na América uma força centrípeta. Com isso, Morse anuncia a urbanização latino-americana como chave para a compreensão dos sentidos da América. E que, se quisermos lembrar, seria o mote de Ángel Rama em seu fundamental La ciudad letrada (1984): o reconhecimento do papel das cidades (e das letras) na constituição da América Latina (Rama, 1986).
No segundo ensaio, discutindo com uma bibliografia clássica que ia de Henri Pirènne a Max Weber, Morse uma vez mais trabalha a especificidade da urbanização latino-americana desde sua origem, recuando desta vez aos primórdios da urbanização na Europa, a polis grega, de modo a definir a gênese mesma da cidade enquanto instituição política e social, para compreender o papel das cidades na constituição dos Estados nacionais modernos europeus. Buscando definir caminhos para construir uma história urbana latino-americana, não teve receio em enfrentar outros pesquisadores, recuperando e debatendo com suas teses de modo a indicar os “furos”, as incongruências, e mais que tudo, um eurocentrismo de fundo que impedia um olhar menos formatado para a América Latina. Em tempos de Cepal e de outros órgãos que enfrentavam questões latino-americanas para a construção de sua autonomia, Morse se colocava como um interlocutor importante àqueles que queriam formular um pensamento próprio do e para o subcontinente.
Completando o volume, a resenha de um livro publicado nos anos 1960, o texto “O antropólogo como consultor político”, e por último o ensaio “Cidades como pessoas”, publicado na obra Rethinking the Latin American City, organizada com Hardoy já em 1992, espécie de balanço de seu pensamento sobre o papel das cidades e as diferenças e as aproximações entre os modelos urbanos do norte e do sul.
Vale destacar que os textos de Morse são precedidos por um ensaio de fôlego da sua organizadora, Beatriz Domingues, que conheceu o pesquisador em 1991. Sua apresentação introduz o leitor aos temas de eleição de Morse e propõe uma sistematização de sua trajetória a partir de um “pressentimento metodológico”, como ela diz, adaptando as etapas de um trabalho do pedagogo Alfred North Whitehead para organizar sua obra em três fases. A historiadora já havia nos oferecido uma série de textos críticos sobre Richard Morse no livro organizado com Peter Blasenheim, O Código Morse: ensaios sobre Richard Morse (2010), também editado pela UFMG (Domingues; Blasenheim, 2010). Aqui, dá início ao trabalho de publicização dos escritos do autor e já anuncia sua continuação em um segundo volume. As traduções bem cuidadas, feitas pela jornalista Maria Bitarello (filha de Beatriz e que conheceu Morse na infância), garantem uma leitura fluida e agradável. O livro conta também com uma apresentação do jornalista Matthew Shirts (ex-aluno de Morse em Stanford) e um posfácio da historiadora Helena Bomeny, autora de uma entrevista com o historiador no final dos anos 1980 (Bomeny, 1989). A edição, que traz ao final a cronologia das obras de Richard Morse, é portanto muito bem-vinda, pois oferece um importante material para pensarmos nosso lugar no mundo, sobretudo hoje, neste momento crucial de definição de caminhos. Vale a pena ler, conhecer e refletir.
Referências
BOMENY, Helena. Uma Entrevista com Richard Morse. Estudos Históricos, Rio de Janeiro: Ed. FGV, v.2, n.3, p.77-93, 1989. [ Links ]
DOMINGUES, Beatriz; BLASENHEIM, Peter (Org.) Código Morse: ensaios em homenagem a Richard Morse. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2010. [ Links ]
MORSE, Richard. De comunidade a metrópole: biografia de São Paulo. Trad. Maria Aparecida Madeira Kerberg. São Paulo: Comissão do IV Centenário, 1954. [ Links ]
_____. O Espelho de Próspero: cultura e ideias nas Américas [1982]. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. [ Links ]
_______. Formação histórica de São Paulo: de comunidade a metrópole. Trad. complementares Antonio Candido. São Paulo: Difel, 1970. [ Links ]
RAMA, Ángel. A cidade das letras [1984]. Trad. Emir Sader. São Paulo: Brasiliense, 1986. [ Links ]
Ana Claudia Veiga de Castro – Universidade de São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. São Paulo, SP, Brasil. E-mail: anacvcastro@usp.br.
[IF]Historicidade e objetividade – DASTON (RBH)
Lorraine Daston/Stijn Debrouwere from London UK wikimedia.org.
Como notam Tiago Santos Almeida e Francine Iegelski em sua apresentação à edição brasileira de Historicidade e objetividade, de Lorraine Daston, a história da ciência permanece uma especialidade marginalizada na historiografia contemporânea. É sintomático que apenas em 2017 o leitor brasileiro possa tomar conhecimento, em língua portuguesa, dos escritos de Lorraine Daston – e que ainda não possamos ler uma boa tradução de Steven Shapin.1 Dado o crescimento recente dos estudos em história da historiografia, é relativamente espantoso que a história da ciência não tenha servido como uma das interlocutoras privilegiadas. Nesse sentido, a publicação de Historicidade e objetividade começa a preencher uma lacuna enorme, que ainda carece de mais esforços.
Daston trabalha no Instituto Max Planck para a História da Ciência, onde coordena o departamento II (Ideais e Práticas de Racionalidade). Publicou em 2008, com Peter Galison, o livro Objectivity, em que traçam uma história da objetividade enquanto virtude epistêmica nas ciências. No prefácio à edição brasileira, ela define seu trabalho com base na expressão “epistemologia histórica”, definida como “a história das categorias e práticas que são tão fundamentais para as ciências humanas e naturais que parecem muito autoevidentes para ter uma história” (p.9-10). Daston detalha mais a definição à frente, no capítulo “Uma História da Objetividade Científica”, considerando a epistemologia histórica como “a história das categorias que estruturam nosso pensamento, que modelam nossa concepção da argumentação e da prova, que organizam nossas práticas, que validam nossas formas de explicação e que dotam cada uma dessas atividades de um significado simbólico e de um valor afetivo” (p.71).
A similaridade entre essas duas caracterizações e trabalhos como o de Michel Foucault não é acidental. O termo “epistemologia histórica”, de definição pouco clara, aparece com frequência para designar certa tradição epistemológica da qual fazem parte, além de Foucault, nomes como Gaston Bachelard e Georges Canguilhem, mas Daston faz questão de mencionar que seu uso da expressão difere daquele da tradição francesa.2 Além disso, ela é enfática em recusar as acusações de relativismo que rapidamente surgem contra várias correntes na história e na filosofia das ciências: “o fato de que ideias, práticas e valores tem [sic] histórias, de que tiveram origem em um lugar e época determinados, nada diz sobre sua validade” (p.10); “historicizar categorias como fato, objetividade ou prova não a [sic] debilita, não mais do que a [sic] prejudicaria escrever a história da teoria da relatividade especial … ‘Se histórico, então relativo’ é um non sequitur” (p.124).3
Entre os textos selecionados por Tiago Almeida, organizador do volume, apenas um – “Science Studies e História da Ciência” – destoa do restante, como a própria autora aponta em seu prefácio. Exceção feita, os outros textos ilustram com clareza as longas reflexão e pesquisa empreendidas por Daston em torno do problema da história da objetividade – primeiro na história das ciências da natureza, que culminou na publicação do já mencionado livro Objectivity, com Peter Galison, e, finalmente, nas ciências humanas. É possível acompanhar o trajeto empreendido pela autora conforme as categorias que aparecem no livro ganham forma (por exemplo, a de objetividade mecânica). Aos leitores que a acompanham em língua inglesa, esse percurso talvez possa esclarecer uma curiosidade ou outra acerca do processo de feitura do livro de 2008; aos que ainda não tiveram acesso ao livro (ainda não traduzido), trata-se de uma excelente introdução.
O extenso e difícil trabalho de tradução é meritoso em si; quando se trata de uma autora de vasta erudição como Daston, ainda mais. As possíveis discordâncias com uma ou outra escolha de palavras por parte dos tradutores, assim como os poucos erros que escaparam à revisão, não tiram em nada o brilho da empreitada. Derley Alves e Francine Iegelski fizeram um bom trabalho.
Notas
1. Historiador da ciência, coautor de Leviathan and the Air Pump, um dos livros mais importantes da história da ciência (já não tão) recente, publicado em 1985. The Scientific Life, um de seus livros mais recentes (2008), trouxe grande contribuição às histórias da “ciência encarnada”.
2. GINGRAS (2010) discute os problemas da expressão “epistemologia histórica” no sentido anglo-saxão. 3 Ian Hacking, outro autor frequentemente relacionado às questões da epistemologia histórica anglo-saxã, desenvolve argumento semelhante. Cf. HACKING, 1999, esp. p.67-68.
Referências
GINGRAS, Yves. Naming Without Necessity: On the Genealogy and Uses of the Label “Historical Epistemology”. Revue de Synthèse, Paris, v.131, n.6, p.439-454, 2010.
HACKING, Ian. The Social Construction of What? Cambridge (Mass.): Harvard University Press, 1999.
João Rodolfo Munhoz Ohara – Doutor em História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Programa de Pós-Graduação em História. Assis, SP, Brasil. ohara. E-mail: jrm@gmail.com.
DASTON, Lorraine. Historicidade e objetividade. São Paulo: LiberArs, 2017. 143p. Apresentação de Tiago Santos Almeida e Francine Iegelski. Tradução de Derley Menezes Alves e Francine Iegelski. Resenha de: OHARA, João Rodolfo Munhoz. Historicidade e objetividade. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 38, n. 78, p. 269-27, 2018.
Dando tratos à bola: ensaios sobre futebol – FRANCO JÚNIOR (RBH)
FRANCO JÚNIOR, Hilário. Dando tratos à bola: ensaios sobre futebol. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. 464p. Resenha de: HOLLANDA, Bernardo Buarque. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.38, n.77, jan./abr. 2018.
Dez anos após a sua entrada “em campo”, o historiador medievalista Hilário Franco Júnior, professor da Universidade de São Paulo, volta a oferecer ao público brasileiro um livro sobre futebol. Se em 2007 sua estreia no tema foi marcada por um trabalho de cunho sistemático, elaborado depois de longa maturação, Dando tratos à bola colige escritos esparsos do autor no último decênio. Parte deles é constituída de ensaios inéditos, enquanto a outra vem sendo publicada sob a forma de artigos em jornais de grande circulação e em periódicos científicos especializados.
É certo que a obra anterior apresentava um projeto mais ambicioso e completo. A dança dos deuses: futebol, sociedade, cultura propunha-se realizar uma macro e uma micro-História do mundo contemporâneo, com recortes longitudinais capazes de articular um Brasil “agrícola e mestiço, desigual e combinado” a uma Europa “industrial e colonialista, dividida e integrada”. Essas escalas e ordens de grandeza foram desenvolvidas sob uma perspectiva diacrônica, a cobrir um amplo painel histórico, que ia de meados do século XIX a princípios do século XXI. Em paralelo, o livro compreendia o esforço de examinar o futebol como metáfora dessa mesma contemporaneidade, a se valer de uma miríade de exemplos colhidos em cinco áreas de saber: a sociologia, a antropologia, a religião, a psicologia e a linguística.
Se a ambição e a completude do livro inaugural acedem aqui a textos pontuais, motivados por circunstâncias excepcionais, como a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, o resultado atualiza o acompanhamento que Franco Jr. faz de seu tema. A adoção do ensaio como gênero narrativo, que tantos frutos legou à tradição do pensamento social brasileiro e dos estudos histórico-literários, confere ao autor liberdade para transitar pelas temáticas mais díspares e pelas situações mais inusitadas suscitadas pela prática do futebol profissional ao redor do mundo.
A publicação de inéditos em formato ensaístico compõe uma nova totalidade, estruturada no livro em seis partes: “Copa do Mundo”; “Em torno da Copa de 2014”; “Identidade, memória, sociedade”; “Personagens do jogo”; “O jogo”; e “Observando o observador”. Essa disposição dá sentido ao modo como Hilário Franco Junior pensa o Brasil contemporâneo e o fenômeno futebolístico em dimensão global.
A abordagem do autor destaca-se por seu método de pesquisa e por seu processo de levantamento bibliográfico. Residente há muitos anos na França, sua bibliografia e seu material de consulta se diferenciam tanto dos estudos acadêmicos sobre o futebol no Brasil quanto dos escritos jornalísticos da imprensa esportiva local. Característica já presente no livro anterior, o acesso a obras de menor circulação no Brasil demarca um modo próprio de expor seus conhecimentos futebolísticos. O primeiro ponto a notar é a sua erudição, que possibilita trafegar com facilidade da história antiga à moderna, da estrutura à conjuntura, do conceito abstrato ao lance anódino de um jogo. Está-se diante de um historiador equipado de um arsenal de informações, muitas delas factuais e enciclopédicas, é bem verdade, mas que dão outro tipo de historicidade, de inteligibilidade e de concretude ao universo futebolístico.
A marca expositiva do historiador ampara-se em um tema-guia, seguido de um sem-número de casos e de exemplos extraídos de uma bibliografia que procura fugir ao crivo do território nacional. Desse ângulo, Franco Jr. procura enfrentar a tão decantada brasilidade, embora não considere neste caso que boa parte dessa crítica já venha sendo praticada, seja por parte da comunidade científica (Helal; Lovisolo; Soares, 2001), seja por parcela expressiva da crônica especializada (Kfouri, 2017; Tostão, 2016; Giorgetti, 2017).
Os livros, as revistas e os jornais que sustentam sua argumentação são na maioria estrangeiros, e poucos deles chegaram a circular no Brasil. Trata-se de referências que versam não apenas sobre futebol, mas também sobre as ciências humanas e até mesmo as ciências exatas. Consultadas diretamente em línguas alemã, francesa, espanhola, inglesa e italiana, as citações não constituem simples gesto de distinção e repercutem na fatura da obra, a pôr em prática exercícios de deslocamentos “de fora” e “para fora” do Brasil.
Com efeito, o autor confronta os renovados debates acerca da identidade nacional, supostamente encarnada na Seleção brasileira, e elabora uma crítica própria à alcunha “país do futebol”. Se a metáfora se desgastou ainda mais após os polêmicos megaeventos esportivos e a “humilhante” derrota por 7 a 1 para a seleção alemã nas semifinais do Mundial de 2014, a coletânea traz um ensaio originalmente publicado em 2013, em que a imagem era alvo de objeções por parte do autor, somando-se a autores como Helal, Soares e Lovisolo que, em 2001, já se referiam a essa “invenção” (Helal; Lovisolo; Soares, 2001). Longe de ser uma questão de ordem apenas conceitual, o argumento agrega números concretos e estatísticas atualizadas, constituindo-se a seu juízo um critério diferencial decisivo para demonstrar a impropriedade do seu uso nos dias de hoje. Malgrado a utilização desses dados quantitativos possa ser questionada como prova cabal por pesquisadores menos afeitos a tal método, o autor levanta uma série de informações contemporâneas sobre médias de público frequentador de estádios, números de praticantes, equipamentos disponíveis, audiência de canais televisivos e vendagem de periódicos esportivos no Brasil, entre inúmeras outras variáveis, para dar evidências de que o culto ao futebol no país é inferior em cada um desses quesitos quando comparados a outros países.
Outro traço metodológico caro ao presente livro se articula com o anterior pela capacidade de armazenamento de materiais extraídos de jornais e revistas de esporte internacionais. O banco de dados acumulado pelo autor conduz o leitor por tempos e espaços distintos, iluminando, com uma torrente, às vezes excessiva, de exemplos, personagens e competições, clubes e selecionados, eventos e cenários ignotos do mundo do futebol.
Um gosto um tanto exagerado do autor pelo anedótico leva-o a dedicar muitas páginas à identificação de situações pitorescas sobre o goleiro das Índias Orientais Holandesas na Copa de 1938, sobre um jogador islandês que tomou parte na excursão do Arsenal de Londres ao Brasil, em 1949, ou ainda sobre a introdução de traves cilíndricas no Maracanã dos anos 1960. Como já frisado, tais informações só são possíveis porquanto se mobiliza uma profusão de fontes, que vão do periódico francês L’Auto à revista italiana Guerin Sportivo, do jornal britânico The Sunday Mirror ao periódico austríaco Kurier, do diário português A Bola ao semanário inglês World Soccer, entre muitos outros meios informativos a que não se tem acesso costumeiro no Brasil.
O trânsito entre “o interdisciplinar da universidade e o unidirecional do jornalismo” permite a Hilário Franco Júnior enfrentar em igual proporção as questões internas (técnicas e táticas) e externas (sociais, culturais e políticas) do futebol. Se os pesquisadores acadêmicos foram criticados por José Miguel Wisnik em Veneno remédio (Wisnik, 2007), por quase nunca tratarem da dinâmica do jogo propriamente dito, tal reparo não se pode imputar a Dando tratos à bola.
Em pelo menos três instigantes capítulos – “O treinador revolucionário”, “A geometria variável das táticas” e “O tabuleiro do futebol” –, o autor demonstra conhecimento específico de toda a evolução da linguagem futebolística, das regras que a codificaram ao longo do tempo, da racionalidade associada às estratégias de ocupação dos espaços e das infindáveis análises combinatórias, franqueadas pelos sortilégios do acaso no jogo.
Em brevíssimas linhas, eis os traços de um livro dedicado à longa duração das relações entre futebol e cultura, com interesse acadêmico, mas também capaz de satisfazer um curioso e renitente boleiro, cronista ou antiquarista esportivo. Espelho da sociedade, ao mesmo tempo cristalino e dissimulado, o futebol é aqui tomado como vetor de fenômenos estruturais e conjunturais, que permitem ao autor pensar temas transversais como a guerra, a migração, o racismo, a geopolítica, a violência, a decadência e a rivalidade, entre inúmeros outros. Quanto à sociedade brasileira, a obra traz um balanço e um retrato em nada complacentes do Brasil do século XXI, na ressaca do “Mineirazo”, do “Maracanazo social” e de tudo o mais que conturba a intrincada conjuntura política dos últimos anos.
Referências
GIORGETTI, Ugo. Dando tratos à bola. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 5 nov. 2017. [ Links ]
HELAL, Ronaldo; LOVISOLO, Hugo; SOARES, Antonio Jorge. A invenção do país do futebol: mídia, raça e idolatria. Rio de Janeiro: Mauad, 2001. [ Links ]
KFOURI, Juca. Confesso que perdi: memórias. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. [ Links ]
TOSTÃO. Tempos vividos, sonhados e perdidos: um olhar sobre o futebol. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. [ Links ]
WISNIK, José Miguel. Veneno remédio: o futebol e o Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. [ Links ]
Bernardo Buarque Hollanda – Professor-pesquisador da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC-FGV). Bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq. Fundação Getúlio Vargas, Escola de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: bernardobuarque@gmail.com
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Elementos Inflamáveis: organizações e militância anarquista no Rio de Janeiro e São Paulo (1945-1964) – SILVA (RBH)
SILVA, Rafael Viana da. Elementos Inflamáveis: organizações e militância anarquista no Rio de Janeiro e São Paulo (1945-1964). Curitiba: Prismas, 2017. 338p. Resenha de: SANTOS, Kauan William dos. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.76 São Paulo set./dez. 2017
Uma visão clássica do anarquismo no Brasil e em algumas partes do mundo afirma que essa corrente política, predominante no movimento operário nas primeiras décadas do século XX, apresentou declínio evidente após 1920, sofrendo sua derrota em nosso país na Era Vargas, com suas mudanças no mundo sindical. Nas análises de certos militantes que buscam legitimar outras propostas de transformação, o anarquismo seria um movimento prematuro, com a ausência de alianças concretas e apresentando um projeto falho para a sociedade. Enquanto isso, para um número significativo de pesquisas atentas ao mundo do trabalho, reverberando em parte tal visão, o anarquismo quase desapareceu desde então e não apresentou grande influência para o movimento operário, principalmente depois da segunda metade do século XX.
Buscando rebater e relativizar tais visões temos em mãos Elementos inflamáveis, livro ligeiramente modificado da dissertação de mestrado de Rafael Viana da Silva, defendida em 2014 no programa de pós-graduação em História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Aproveitando pesquisas recentes e também proeminentes que já apontaram a resistência dos anarquistas, seja no âmbito cultural ou sindical, durante os anos de 1930 e 1945, o autor tenciona mostrar a reorganização do anarquismo durante a chamada redemocratização, entre os anos 1945 e 1964. Sem ignorar o contexto para tal, Silva mostra como, em meio à crise do Estado Novo, os anarquistas vão aproveitar brechas para se organizarem de forma mais sistemática e tentarem aumentar sua influência entre as classes populares, assim como incrementar suas fileiras militantes, fato que se deu nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro e, em certa medida, no estado do Rio Grande do Sul.
Entre as primeiras atitudes dos adeptos da bandeira negra esteve a criação e a reativação de seus periódicos. Entre eles cita-se o Remodelações, que circulou entre 1945 e 1947 e era coordenado pelos militantes cearenses Moacir Caminha e Maria Iêda, contando também com militantes clássicos como José Oiticica. Em 1947 foi relançado o periódico A Plebe, um dos mais importantes para o anarquismo anos atrás e também essencial para a nova aproximação com as demandas sindicais. Outro importante órgão para a difusão da cultura política anarquista foi o Ação Direta, essencial para as propostas de organização interna do movimento.
Nesse último sentido surgem as primeiras contribuições importantes de Rafael Silva para o tema. Com a aproximação de diferentes gerações militantes concluiu-se em seus debates ser inadmissível ver as estratégias anarquistas como imóveis e imutáveis – era necessário encaixar as demandas libertárias aos novos condicionamentos. Esses militantes referiam-se principalmente à ausência de organização política entre os anarquistas durante as primeiras décadas do século XX, que seria uma das causas, nessa visão, da perda de suas influências. Os anarquistas brasileiros, diferentemente do que se observou em outros países, não conseguiram efetivar suas propostas de organização interna, chamadas de alianças ou partidos, que se protegeriam em momentos de refluxo e também garantiriam certa homogeneidade em suas práticas. Estando os anarquistas enraizados profunda e quase exclusivamente no movimento sindical, este quando foi transformado na década de 1930 garantiu o declínio da estratégia do sindicalismo revolucionário e da consequente influência anarquista, restando apenas seus grupos de afinidade dispersos para a continuação de suas propostas, perdendo assim o contato com os trabalhadores. Na perspectiva dos militantes anarquistas entre 1945 e 1964, portanto, antes de tudo era necessário se organizar politicamente e então garantir formas e estratégias diversas para recuperar esse e outros contatos.
Seguindo esse debate, Silva examina na primeira parte do livro as discussões e dilemas internos do anarquismo. No primeiro capítulo dessa seção, evidencia-se a importância da participação dos militantes em congressos internacionais, absorvendo e disseminando experiências transnacionais para o anarquismo em nível global. O autor segue analisando os congressos anarquistas no país, em 1948, 1953, 1959 e 1963, essenciais para a reorganização do movimento. No terceiro capítulo, debate-se a retomada da estratégia do sindicalismo revolucionário no papel da transformação da realidade para os anarquistas no período. Nesse sentido, longe de se ater principalmente a propostas culturais como se imaginou, a intentona majoritária anarquista continuou sendo, ao menos até 1959, o sindicalismo e o movimento operário, onde seus militantes dispensaram numerosas energias (p.182).
Percebemos que as principais referências metodológicas do livro nessa parte são os autores que desenvolvem as concepções de cultura política como Serge Berstein, já que é importante, para Rafael Silva, perceber o desenvolvimento do anarquismo dentro de suas próprias referências, da sua família política, suas leituras e dilemas. Já na segunda parte da obra o autor analisa como tais estratégias foram absorvidas e articuladas no movimento operário, em meio aos trabalhadores e, também, aos grupos militantes de outras vertentes ideológicas. Por isso, decide utilizar como referência Edward Palmer Thompson, inspirado nos estudos que mostram as ideologias e práticas como não estanques aos comportamentos de classe.
Seguindo essa tendência, no quarto capítulo, primeiro dessa seção, evidencia-se o importante papel dos jornais e impressos também para disseminar a influência do anarquismo e de seus debates externos com outras correntes políticas, assim como em sua adaptação ao contexto. Nesse sentido, até mesmo a forma de venda ou doação desses periódicos foi importante, como numa banca de jornais em frente ao posto de trabalho da Light.
No quinto capítulo, Silva adentra com mais profundidade as relações e articulações políticas dos anarquistas em âmbito internacional e nacional. Na primeira parte, além de ver suas influências e ligações com a Federação Anarquista Ibérica (FAI) e a Solidariedade Internacional Antifascista (SIA), evidencia-se a recepção dos anarquistas aos imigrantes, principalmente saídos das ditaduras de Franco e Salazar, alguns com experiências na Revolução Espanhola. Esse contato foi essencial para a reformulação de estratégias e táticas e para alavancar o próprio movimento anarquista no país. Após isso, o autor nos mostra os embates no anarquismo com o Partido Comunista Brasileiro, principal força de esquerda do período. A principal crítica dos libertários ao partido se referia exatamente às posições do sindicalismo – os primeiros eram contrários a disputar a estrutura corporativista desses espaços, propondo novos organismos e frentes que respondessem aos interesses dos trabalhadores fora de um ambiente supostamente impregnado pelos mecanismos da classe dominante. O autor discorda da historiografia que viu os trabalhadores e militantes desse período como estagnados, presos à estrutura e aos condicionamentos do período, mas também rebate a corrente que afirma total liberdade e agência dos personagens em torno do sindicalismo do período. Sua posição é a de que os trabalhadores, de fato, negociavam e barganhavam em meio às regras do sindicalismo e da política do período, mas também, por vezes, se sentiam pressionados a essa estrutura e, além de não conseguirem alcançar seus alvos, também decidiam lutar recorrendo a outros instrumentos.
Esse debate se estende ao último capítulo da obra, no qual o autor adentra a inserção social do anarquismo. Na primeira parte, Rafael Silva analisa como as estratégias sindicais dos anarquistas foram recebidas e efetuadas na prática. Os anarquistas conseguiam dialogar com os marxistas críticos do stalinismo e sindicalistas independentes criando o Grupo de Orientação Sindical dos Trabalhadores da Light e deixando uma influência visível no Sindicato dos Trabalhadores Gráficos, também de caráter combativo, convergindo, posteriormente, para a criação do Movimento de Orientação Sindical (MOS). A inserção libertária nesses ambientes garantiu posições nas manifestações importantes no período, como a greve dos 400 mil em 1957. Na última parte da obra, o autor mostra como as ações culturais dos anarquistas eram mediadas entre as culturas de classe dos trabalhadores e dos grupos subalternos, ainda os principais alvos do anarquismo. Nesse sentido, mostra-se a importância de espaços como o Centro de Cultura Social para a formação de novos militantes e de trabalhadores, principalmente informais. Os periódicos também foram importantes para a criação de centros de cultura e estudos, poemas e debates públicos, inserção que se dava muito fortemente entre os estudantes universitários. As táticas educativas e o apoio às ações culturais nesse período foram importantes para garantir um lugar a partir do início da década de 1960, quando os militantes libertários deixavam aos poucos os ambientes estritamente sindicais, interpretando que gastavam muita energia para barrarem o reformismo e a disputa com outras tendências de esquerda. O apoio a outros ambientes, dessa vez discutidos e minimamente organizados nos congressos citados, garantiu a sobrevivência mínima do anarquismo nas décadas posteriores, durante a Ditadura Militar, quando os anarquistas enfrentaram outros dilemas.
Tudo isso torna o livro de Rafael Viana da Silva uma importante contribuição a um período não muito estudado, inclusive entre os próprios anarquistas contemporâneos, que preferem visualizar o anarquismo áureo a se ater em épocas nas quais foi mais difícil implementar e articular suas estratégias. Ainda assim, aprendemos que quando o anarquismo não foi um elemento explosivo, certamente foi um elemento inflamável.
Kauan Willian dos Santos – Doutorando em História Social. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. E-mail: kauanwillian@usp.br.
[IF]O Movimento Estudantil na resistência à Ditadura Militar (1969-1979) – MÜLLER (RBH)
MÜLLER, Angélica. O Movimento Estudantil na resistência à Ditadura Militar (1969-1979). Rio de Janeiro: Garamond; Faperj, 2016. 224p. Resenha de: VALLE, Maria Ribeiro do. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.76, set./dez. 2017.
O livro O Movimento Estudantil na resistência à Ditadura Militar (1969-1979), de autoria de Angélica Müller, dialoga com os estudiosos que afirmam não ter havido continuidade da organização do movimento estudantil depois de decretar-se o Ato Institucional no 5 (AI-5), em dezembro de 1968. Sua tese principal é a de que, apesar da mudança de tática na luta dos estudantes, ela foi fruto de uma autocrítica das lutas do período anterior e responsável por gestar uma nova cultura política que passou a privilegiar as liberdades democráticas.
O percurso da reconstituição da União Nacional dos Estudantes (UNE), foco da análise, instigou a autora a costurar a colcha de retalhos das ações estudantis após o Congresso de Ibiúna, em outubro de 1968, quando a organização passa a agir na clandestinidade absoluta, até a sua extinção. Com a Lei n. 477, considerada o AI-5 da educação, o Conselho da UNE, já em 1970, optava pela organização de frentes de vanguarda por turmas e faculdades. Suas principais ações foram o Plebiscito do ensino pago em 1972, as lutas pela revogação dos Decretos-Leis números 477 e 464, e a crítica ao Projeto Rondon e à criação da disciplina de Moral e Cívica. Elas são consideradas por Müller como microrresistências pacíficas que contribuíram para gerar uma nova cultura no seio das oposições.
Mereceu destaque a luta estudantil contra a Política Educacional do governo que propunha a criação da disciplina Estudos sociais. Esta passaria a aglutinar as disciplinas de História, Geografia e Ciências Sociais, passando a desempenhar um papel de sustentação ideológica da política da ditadura.
Aqui eu gostaria de abrir um breve parêntese, chamando atenção para a proposta educacional do atual governo do presidente ilegítimo Michel Temer: típica de regimes autoritários, defende também a supressão das disciplinas críticas como a História e as Ciências Sociais.
O livro enfatiza também o vínculo entre o Movimento Estudantil (doravante ME) e os outros movimentos sociais de resistência à ditadura, tendo como fio condutor a Educação. Citam-se como emblemáticas a criação de grupos de teatro, a arte engajada, a publicação de jornais e a música de protesto, pelo fato de evidenciavam o conteúdo autoritário do regime. Aqui explicita-se o trabalho artesanal na confecção de uma colcha de retalhos, tecida pela historiadora com base no garimpo de formas de lutas diferentes e dispersas nos vários estados e cidades, travadas pela Igreja, pelos deputados e artistas. Os jornais estudantis tiveram importância ímpar tanto no engajamento político do ME, quanto na divulgação de suas ações e táticas. Apesar dos períodos mais duros do regime, os relatos da imprensa alternativa e clandestina ancoraram a crítica de Müller à historiografia que aponta os anos 1970 como marcados pela inexistência do movimento.
Também são elencadas as medidas tomadas pela ditadura na década anterior e que continuavam em vigor nos anos 1970, incidindo diretamente no ME: vigilância, repressão e censura por meio do Serviço Nacional de Informações (SNI), criado logo após o golpe de 64, e da Divisão de Segurança e Informações (DSI), criada em julho de 1967. A vigilância e a punição no Ensino Superior eram efetuadas pela instalação de inquéritos e regulamentadas pela criação das ASIs (nomeação de uma pessoa pelo MEC para fazer o elo entre a universidade e o governo) e da DSI (responsável pelas ações de normatização, vigilância e punição do ensino superior), garantindo os processos de expulsão de professores e estudantes que foram catalogados como um conjunto de subversivos, considerados um perigo para a nação.
No embate entre repressão e resistência, Müller enfatiza que o ME foi pioneiro na retomada do espaço público com a luta pelas liberdades democráticas. Sua pesquisa revela que, já nos primeiros anos do governo Geisel, a luta do ME vem à tona com as greves das universidades que ocorreram entre 1974 e 1975, respaldando a reorganização das correntes e das entidades representativas estudantis nas diferentes cidades e estados, quais sejam os DCEs, as UEEs e, finalmente, a reconstrução da UNE.
As greves, formas tradicionais de lutas estudantis, permitiram maior visibilidade às suas reivindicações e contribuíram para que o ME assumisse papel articulador nos diferentes movimentos sociais de resistência à ditadura. A greve da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, que se estendeu por mais de um semestre letivo, desencadeou a discussão dos problemas da realidade e preparou o terreno para a criação do DCE-Livre da USP em 1976. Esses episódios coincidiram com o assassinato de Vladimir Herzog pelo DOI-Codi e foram um marco importante para a defesa das liberdades democráticas pelo ME e pelos demais movimentos de contestação do regime militar.
A análise aprofundada da reorganização das novas e diferentes tendências do ME – bem como de suas diversas concepções de democracia – feita por Müller respalda, de forma consistente, sua tese de que a retomada do movimento estudantil na segunda metade da década não foi o despertar de uma inércia, nem o preenchimento de um vazio, apontado por boa parte dos historiadores. Ao contrário, depois de 10 anos de resistência restrita ao ambiente universitário, as greves e a volta às ruas sacramentaram a rearticulação da UNE e reforçaram o pioneirismo dos estudantes. Estas palavras de ordem começaram a ser abraçadas também por outros movimentos de oposição: pelas Liberdades Democráticas; Abaixo a carestia; pelo fim das torturas, prisões e perseguições políticas; pela anistia ampla e irrestrita. Foi emblemática da conjunção de diversas lutas a frase “Soltem os Nossos Presos operários e estudantes” presente nas passeatas.
É importante ressaltar que a pesquisa de Müller não se restringiu ao eixo Rio-São Paulo, o que lhe permitiu mostrar como efetiva a criação nacional de uma entidade estudantil. Além da Uerj, da Unesp e da PUC-RIO e da PUC-SP, a UFMG, a UFPE, UFBA e a UFRGS também iniciaram suas greves contra os cortes de verbas da universidade, pelo ensino público e gratuito e pelo boicote ao pagamento das anuidades.
Peço licença novamente para abrir outro parêntese: acredito que estamos vivenciando um retrocesso político, pois esses direitos são mais uma vez retaliados, numa amplitude inusitada, pelo governo do ilegítimo presidente Michel Temer.
Para Angélica Müller,
o ressurgimento das movimentações de massa ocorreu em novos moldes e em situação bem diversa da que caracterizou aquelas de 1968: não havia grandes líderes, não houve enfrentamentos nem uso de armas, e a plataforma de luta era bem ampla, ou seja, não restrita às reivindicações do ME. O que se exigia era o fim da ditadura militar. (p.134)
Há, a meu ver, uma fragilidade na análise de Müller, que dá muita ênfase às diferenças entre as bandeiras e formas de luta na década de 1970 e as do período anterior, e lança pouca luz sobre as semelhanças existentes. Se retomarmos as formas de luta do ME em 1968, notaremos uma grande cisão entre duas vertentes centrais: a que defendia as lutas específicas dos estudantes e a que defendia a luta política contra a ditadura, o capitalismo e o socialismo real. Apesar de, ao longo do ano, a segunda posição ter ganhado o maior espaço, em razão da conjuntura política, não podemos reduzir às suas as bandeiras estudantis. A luta pelo ensino público e gratuito, por exemplo, esteve presente o ano todo.
Ao contrário de Müller, acredito que a defesa dos princípios democráticos não é uma especificidade da década de 1970. Nesse sentido seria importante trazer à tona as ações, táticas e propostas estudantis desde o início da ditadura, em 1964, quando o ME já era um dos principais alvos do regime. A opção pelo caráter pacífico foi vitoriosa nas passeatas de 1966, enquanto a utilização da violência foi levada às ruas em 1968. Mas isso não significava existir uma hegemonia entre as diferentes entidades do ME. Acredito que o contraponto proposto pela historiadora entre a década de 1970 e 1968 ficaria, assim, mais bem delimitado.
O livro de Angélica Müller adquire importância histórica e social ao trazer à cena o movimento do ME na década de 1970, uma vez que nos devolve várias páginas da luta estudantil arrancadas pela ditadura militar. Vale muito a pena conhecê-las e, em grande medida, elas estão na ordem de nosso dia.
Maria Ribeiro do Valle – Departamento de Sociologia, Faculdade de Ciências e Letras (FCL) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp). Araraquara, SP, Brasil. E-mail: mrvalle@fclar.unesp.br.
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O intelectual feiticeiro: Edison Carneiro e o campo de estudos das relações raciais no Brasil – ROSSI (RBH)
ROSSI, Gustavo. O intelectual feiticeiro: Edison Carneiro e o campo de estudos das relações raciais no Brasil. Campinas: Ed. Unicamp, 2015. 280p. Resenha de: HERZMAN, Marc. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.37, n.76, set./dez. 2017.
Apesar da grande repercussão de sua obra e do fato de ter sido colega e amigo de figuras já muito tratadas na história e na historiografia do Brasil, Edison Carneiro ainda não recebeu a devida atenção do meio acadêmico. Jornalista, etnógrafo, historiador, folclorista e ativista, Carneiro deixou uma rica coleção de escritos que, como ele, são frequentemente citados, mas não estudados da maneira reservada aos de escritores brancos como Arthur Ramos e Gilberto Freyre. Carneiro e sua obra, poderíamos dizer, são partes da paisagem, mas aparecem fora de foco.
A ausência de trabalhos sobre Edison Carneiro é particularmente notável considerando o número de obras que escreveu, uma vastidão igualada à diversidade e à complexidade de sua vida e de sua carreira, que se estendeu de Salvador até o Rio e influenciou múltiplas gerações de intelectuais em distintas áreas, como da cultura e da política. Com tantos possíveis ângulos e linhas narrativas – e com tão pouco já escrito sobre ele -, as questões por onde começar e terminar não são óbvias ou fáceis. Gustavo Rossi começa seu excelente trabalho O intelectual feiticeiro: Edison Carneiro e o campo de estudos das relações raciais no Brasil não em 1912, quando Carneiro nasceu, mas na virada para o século XX, terminando não em 1972, quando morreu, mas em 1939, quando ele se deslocou de Salvador para o Rio. A escolha é indicativa do fato de que Rossi não empreende escrever uma biografia; de fato, o livro é muito mais que um estudo biográfico.
O texto divide-se em três épocas, cada uma correspondente a um capítulo. O primeiro é ambientado em Salvador na virada do século, com foco no pai de Edison, Antônio Joaquim de Souza Carneiro (1881-1942), professor na Escola Politécnica da Bahia e também ele um indivíduo extraordinário. Rossi localiza os Souza Carneiro no contexto político e cultural da Bahia, destacando os laços entre a família e J. J. Seabra, que controlou “a engrenagem política baiana” entre 1912 e 1924 (p.55). O capítulo também analisa a poesia escrita por Edison durante a juventude.
A despeito de rica produção intelectual de pai e filho, nem Antônio Joaquim nem Edison deixaram muitas indicações óbvias de como pensavam sobre si mesmos, especialmente no tocante à raça. Rossi enfrenta esse desafio com análise inovadora e uso criativo de fontes já bem conhecidas, como, por exemplo, o livro As elites de cor numa cidade brasileira, de Thales de Azevedo, e outras inéditas, que incluem documentos escavados em arquivos públicos e privados.
Munido de ricas fontes, Rossi confessa que o livro não traz “um retrato verossímil da forma como a raça e a negritude foram vivenciadas” (p.96) por Carneiro e sua família. Tal retrato, sem dúvida, seria impossível, de modo que a precaução de Rossi é bem justificada. O livro obriga o leitor, nesse sentido, a enfrentar perguntas cujas respostas ficarão, muitas vezes, em disputa. Inspirado por Olívia Maria Gomes da Cunha e outros/as antropólogos/as que interrogam a construção de arquivos e a relação entre etnografia e história, Rossi apresenta o livro não como estudo dos mundos de Edison, mas como um estudo em relação com esses mundos (p.245). Em outras palavras, Rossi entende sua própria produção intelectual em diálogo com um passado que nunca poderemos entender perfeitamente, mas que ainda influencia as perguntas e as categorias que utilizamos em nossos próprios trabalhos.
No primeiro capítulo essa postura abre perguntas que seguramente suscitarão debate. Rossi sugere que “pelo menos, na maior parte do tempo” os membros da família Souza Carneiro “não se viam e não foram vistos… como negros” (p.91). A observação baseia-se em situações instigantes, como, por exemplo, o atestado de óbito de Antônio Joaquim, que descreve o professor como “branco”. Rossi analisa o documento como signo do potencial limitado e frágil do escape em relação ao racismo. Rossi também descreve como a antropóloga norte-americana Ruth Landes surpreendeu-se quando viu Edison pela primeira vez. O tom da cor de sua pele “era significativo”, Landes escreveu, “porque as cartas de apresentação vinham de colegas brancos, que não haviam mencionado a sua raça ou cor” (p.76). Junto ao atestado de óbito, o exemplo reforça a asserção de que muitas vezes Edison e seu pai “não foram vistos como negros”.
Outros exemplos, contudo, põem a ideia em questão. Como Rossi explica, Antônio Joaquim era um dos únicos professores negros em Salvador, e é difícil imaginar que esse fato não afetasse, diariamente, a percepção de outros professores e alunos. O autor também se pergunta se a observação de Landes não revela mais sobre ela e suas experiências nos Estados Unidos do que sobre os colegas brancos, que em privado poderiam ter visto e definido Edison de uma maneira, e tê-lo descrito de outra na carta de apresentação.
Isso não representa crítica ao livro. Ao contrário, tais tensões enfatizam a utilidade da escolha de Rossi por trabalhar com a história e todos os seus espaços obscuros. Fechando o primeiro capítulo, Rossi escreve: “categorias de raça e negritude seriam, em diferentes momentos da vida de Carneiro, um significativo móvel de tensões e disputas de sentidos, não sem consequências para compreendermos suas práticas e tomadas de posição no campo intelectual” (p.93). Esse excerto parece capturar a questão melhor do que a sugestão, ainda se bem qualificada, de que os dois homens foram vistos “na maior parte do tempo” não como negros. Mas um dos muitos presentes desse livro é a maneira como ele admite a possibilidade de que ambos argumentos estejam corretos a um só tempo.
Se o primeiro capítulo revela perspectivas inéditas sobre Edison e sua família, o segundo apresenta mais contexto intelectual e cultural do que detalhes sobre o próprio Edison. O foco é a Academia dos Rebeldes, a turma literária formada por Edison, Jorge Amado e outros no final da década de 1920. Há menos ênfase aqui em questões de raça e identidade do que na trajetória da Academia, que funcionou como veículo de expressão política e resposta aos modernistas de São Paulo e do Rio.
A ascensão de Getúlio Vargas em 1930 e a chegada de Juracy Magalhães como interventor da Bahia no ano seguinte assinalaram uma transição (e decadência) para os Souza Carneiro e para o estado, cujos poderes oligárquicos se fragmentaram. No capítulo 3, Rossi agilmente vincula essa trajetória à formação de Edison como militante esquerdista, escavando detalhes interessantíssimos nos escritos de Carneiro da década de 1930. Dando ênfase à perspectiva marxista de Edison e sua correspondente visão materialista da história, Rossi lança argumentos e observações instigantes, como a sugestão de que foram as ideias de Carneiro – e não de Freyre e Ramos – que se combinavam mais claramente com as de Raymundo Nina Rodrigues. Apesar de rejeitar a hierarquia biológica racial adotada por Rodrigues, Carneiro acreditou, como o “mestre”, no poder da estrutura, nesse caso o das instituições que marginalizavam negros após a abolição. Essa crença, Rossi ressalta, aproxima Carneiro de Rodrigues, apesar de suas diferenças. Carneiro também antecipou por décadas a ênfase que Florestan Fernandes daria ao vínculo entre raça e classe, fato, Rossi observa, que aumenta nosso entendimento da riqueza e diversidade “de análise sobre o negro brasileiro” (p.206) dos anos 1930 e do papel importante que Carneiro teve na formulação de ideias muitas vezes atribuídas a Fernandes e outros.
Carneiro criticou Freyre, Ramos e outros estudiosos da cultura negra pela ausência de “capacidade de se porem na pele de um negro” (p.214). Carneiro também parecia advogar pela criação de um “‘Estado negro’ autônomo” (p.218-219), e é interessante pensar se essas expressões radicais refletem uma evolução de pensamento ou indicam uma disparidade entre as fontes. Nesse sentido, a coleção de documentos da primeira parte da sua vida – mais parca que a posterior – esconderia ideias e argumentos já existentes, que seriam expressados mais forte e claramente apenas nos anos 1930, quando é possível identificar um material mais abundante escrito por ele. Apesar de criticar Freyre e outros intelectuais, Carneiro também se considerava parte de seus círculos, muito mais próximo deles do que os homens e mulheres negros que estudavam. Ao mesmo tempo, figuras como Ramos possuíam privilégios que eles evidentemente não tinham – por exemplo, na posição de Ramos na Biblioteca de Divulgação Científica (p.228).
O último capítulo do livro conclui com uma consideração acerca da relação entre Carneiro e Landes, bem como da identidade complexa de Carneiro, visto agora pelas lentes da colega, amiga e amante que encontrou nele uma combinação de guia, “protetor” e tipo de assunto etnográfico (p.233, nota 150). Por meio de sua relação, vemos como “a ‘raça’ de Carneiro não era estável ou fixa, somente fazia sentido quando inserida em outros grupos naquele contexto, ou quando vista em relação a eles” (p.236). Rossi faz essa afirmação logo antes de terminar o último capítulo, nas vésperas da saída de Carneiro para o Rio. Supõe-se a possibilidade de aplicar a mesma caracterização ao restante de sua vida, que se estenderia por mais três décadas e que, graça a esse rico livro, começou finalmente a receber o tratamento cuidadoso e inteligente que merecia já há muito tempo.
Marc Herzman– Associate Professor, Department of History, University of Illinois at Urbana-Champaign. Urbana, IL, USA. E-mail: mahertzman@gmail.com.
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Centenário 1917: Grande Guerra, greves e revoluções / Revista Brasileira de História / 2017
Neste ano do centenário das grandes greves e revoluções ocorridas no contexto da Primeira Guerra Mundial e que, com ela, transformaram a face do mundo a tal ponto de inaugurarem o que alguns historiadores consideram um novo período histórico – o breve século XX, na expressão de Hobsbawm -, a Revista Brasileira de História não poderia deixar de apresentar ao público um conjunto de análises profundas e inovadoras sobre esses importantes eventos.
À data do centenário da Primeira Guerra Mundial, jay Winter, responsável por coordenar a importante Cambridge History of the First World War (Winter, 2014a), apresenta-nos quatro gerações de historiadores que se dedicaram e se dedicam ao estudo da Primeira Guerra Mundial (Winter, 2014b). Em 2004, o mesmo autor, em colaboração com Antoine Prost – autor de referência no estudo da guerra em França -, publicou Penser la Grande Guerre. Un essai d’historiographie.[1] Na obra declararam a existência de três gerações: “a primeira configuração explica a história pelas decisões dos atores; a segunda pelo jogo das forças sociais; a última faz da cultura o motor da história e encontra nela as suas explicações. As representações determinam os atos” (Winter; Prost, 2004, p.47-48).[2] Trata-se de um conjunto de movimentos que se seguem, coexistem e se entrecruzam. Um processo sempre em devir a que os contextos de produção de conhecimento não são inalienáveis. Atualmente, as “vanguardas” assumem um cunho transnacional, isto é, o foco é global na forma como atravessa as fronteiras nacionais, analisando experiências que, não obstante serem condicionadas por elas, se tornam globais (Winter, 2014b). Vejamos como Prost e Winter apresentam essas gerações historiográficas. A geração da Grande Guerra, contemporânea ao conflito e às suas consequências mais imediatas, foca sua atenção na ação do Estado. Numa análise de cima para baixo, procura apurar responsabilidades pela eclosão do conflito, entender as condições da sua origem e possíveis lições a serem aprendidas no sentido de evitar que se repita. Entre os anos 1960 e 1970, mudanças mais amplas da prática histórica irão influir na forma de entender a guerra, seja pela integração dos protagonistas na narrativa, seja pela adoção de novas perspectivas. A afirmação do paradigma marxista permite uma valorização política dos movimentos sociais e do seu lugar no fenômeno da guerra. Muda, definitivamente, a compreensão da natureza e a dimensão do conflito, entendido como consequência do imperialismo. Emerge, então, um segundo eixo de compreensão dedicado a uma história do social (Winter, 2009, p.2-4). Nesse ambiente instala-se, entre os anos 1970 e 1980, aquilo que Winter e Prost denominaram de Vietnam generation (geração Vietnã). Uma terceira geração que, profundamente afetada pelas consequências da Guerra do Vietnã, e de forma mais ampla pela Guerra Fria, não mais considera a just war como algo plausível, apresentando a Primeira Guerra Mundial como desastrosa para vencedores e vencidos (Winter, 2014a).
Os trabalhos que neste Dossiê se debruçam sobre a Primeira Guerra Mundial, mais especificamente sobre seus impactos na retaguarda e para além do conflito, integram fórmulas de compreensão da guerra propostas nos anos 1980 no âmbito de uma história cultural da guerra. Trata-se de olhar para “um conjunto de práticas, de representações, de atitudes, de criações dos anos de 1914-1918. E também dos anos seguintes, tanto é verdade que este tipo de história [cultural] dá um largo espaço à recordação e à comemoração do pós-guerra”.[3] Assim, uma série de temas em torno das representações da experiência no e além do tempo e espaço da guerra passam a corporizar essa guinada cultural.
A Grande Guerra impactou fortemente as vidas de todas as classes e grupos sociais do mundo de então. O segundo tema do Dossiê buscou contemplar essas relações. As greves e revoltas ocorridas nos anos finais da Primeira Guerra Mundial e nos anos iniciais do pós-guerra, especialmente no ano de 1917, configuraram um ciclo de agitação social global, como o define a historiadora portuguesa joana dias Pereira (2014). Esses são, portanto, eventos e processos históricos particularmente importantes para serem analisados na perspectiva do que o historiador holandês Marcel Van der Linden chamou de História Global do Trabalho, inserindo as lutas de cada país em contextos geográficos mais amplos, construindo uma história transnacional dos movimentos sociais trabalhistas, com comparações entre os países e análises das conexões entre eles (Van der Linden, 2013).
As condições de trabalho, a insuficiência dos salários e a repressão foram fatores que estimularam os conflitos e protestos daqueles anos, criando um clima de tensão permanente, às vezes explosivo, como os que ocorreram em São Paulo, Nova York, Turim, São Petersburgo, Sydney e tantas outras cidades. As experiências e as elaborações feitas a partir das greves daquele período foram tão marcantes que configuram para a historiografia o início de um novo ciclo de lutas trabalhistas e até mesmo de formação de uma nova classe operária (Procacci, 2013). A economia de guerra contribuiu para intensificar a solidariedade entre os trabalhadores ao evidenciar as contradições do capitalismo e da economia de mercado.
O centro do debate historiográfico sobre as greves de 1917 no Brasil, assim como em outros países, acabou sendo o grau de espontaneidade dos movimentos, polêmica que implicava a explicação das relações existentes entre a multidão de grevistas e os militantes anarquistas, socialistas e sindicalistas que participaram como lideranças dos movimentos. Hoje podemos falar de certo consenso em relação à ideia de que esses movimentos foram caracterizados por impulsos diversos, tanto espontâneos quanto organizados, que coexistiam e que constituíram o pano de fundo dessas agitações, cuja característica mais marcante foi a passagem da greve à revolta (Biondi, 2011). A tendência atual da historiografia sobre esses movimentos é a de analisar as diferentes redes formais e informais na mobilização dos trabalhadores e as mediações entre diferentes repertórios de ação coletiva, destacando, por exemplo, a relevância do papel das mulheres.
O terceiro tema central do Dossiê está centrado na história das revoluções russas de 1917, contada e recontada inúmeras vezes e sob as mais diversas perspectivas, mas sempre aberta a novas investigações. Em termos gerais, o processo revolucionário na Rússia de 1917 foi invariavelmente conectado à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), da mesma forma que o “Ensaio Geral” ocorrido 12 anos antes no Império dos Czares foi associado à Guerra Russo-Japonesa (1904-1905). As revoluções, assim como a Guerra Civil e a formação da União Soviética, despertaram paixões políticas profundas e alimentaram debates teóricos acalorados, tanto no movimento operário dos mais diversos matizes, como nas instituições universitárias. Não foi sem razão que tantos intelectuais se engajaram na produção de suas versões sobre os acontecimentos de 1917 na Rússia. Ao longo de seu centenário, esses eventos serviram de exemplo e inspiração para incontáveis partidos e movimentos políticos ao redor do mundo. Não cabe fazer aqui uma longa e minuciosa exposição sobre tudo quanto já se escreveu sobre o assunto ao longo desses cem anos. Também não faremos referências às “histórias oficiais soviéticas” ou aos escritos dos “emigrados”. Mas é interessante lembrar algumas obras e momentos marcantes a respeito do tema e sua recepção no Brasil. Os primeiros relatos foram produzidos por intelectuais diretamente envolvidos nos acontecimentos, o que não chega a ser uma surpresa.
Nesse sentido, o primeiro título a ser mencionado é Ten days that shook the world, do jornalista estadunidense john Reed, escrito em perspectiva engajada no calor dos acontecimentos e publicado nos Estados Unidos em 1919, 2 anos depois da queda do czarismo e da ascensão dos bolcheviques. Trata-se, como dito pelo próprio autor, de uma crônica do que ele observou e viveu. Reed retornou ao país dos sovietes ainda em 1919, vinculado à Internacional Comunista, e faleceu em 1920, vítima de tifo. No Brasil, Dez dias que abalaram o mundo foi publicado com uma defasagem de mais de quatro décadas pelas editoras Fulgor (Rio de Janeiro, 1963), Record (Rio de Janeiro, 1967) e Global (São Paulo, 1978), entre outras (Reed, 2010).
Victor Serge foi outro “estrangeiro” que produziu uma memória sobre os acontecimentos que vivenciou no país dos sovietes. Serge era um jornalista anarquista de origem francesa, filho de exilados russos. Chegou à Rússia em fevereiro de 1919, passando a trabalhar para a Internacional Comunista, da mesma forma que john Reed. Seu L’an 1 de la révolution russe foi escrito na Rússia entre 1925 e 1928, quando já sofria as perseguições do stalinismo, e foi publicado na França em 1930. Serge integrou, por um tempo, as fileiras da Oposição de Esquerda, liderada por Trotsky, mas também rompeu com ela, morrendo isolado no México em 1947. A publicação de O ano I da Revolução Russa ocorreu no Brasil apenas em 1993, pela Editora Ensaio, e em 2007, pela Boitempo (Serge, 2007).
O terceiro testemunho feito por um partícipe dos acontecimentos de 1917 foi dado por Leon Trotsky, The History of the Russian Revolution, escrito em 1930, traduzido para o inglês por Max Eastman e publicado em 1932 pela The University of Michigan Press em três volumes. Como se sabe, o autor teve papel protagonista não apenas na chamada Revolução de Outubro, como também no comando do Exército Vermelho, durante a Guerra Civil, e na construção do Estado Soviético. Portanto, a escolha dos “fatos” e a forma de narrá-los também foram fortemente condicionadas pelo papel que o autor-ator desempenhou em 1917 e depois, apesar das declarações de que sua obra primava pela “objetividade histórica”, sendo baseada em “documentos rigorosamente controlados” e não em “recordações pessoais”. A primeira edição brasileira foi feita pela Saga (Rio de Janeiro, 1967), ao passo que a Paz e Terra fez a segunda e a terceira (Rio de Janeiro, 1977 e 1978-1980).[4]
O bloco dos escritos legados pelos intelectuais vinculados ao movimento revolucionário pode ser fechado com uma referência à obra de Volin ou Voline, codinome de Vsevolod Mikhailovich Eichenbaum. de acordo com o pequeno esboço biográfico escrito por Rudolf Rocker em 1953, Volin era filho de médicos russos, fluente em francês e alemão tanto quanto em russo. Enviado a São Petersburgo para estudar direito, engajou-se no movimento operário desde a virada do século XIX para o XX, vinculando-se ao Partido Socialista Revolucionário. Foi preso por envolvimento na Revolução de 1905 e sentenciado ao exílio em 1907, escapando para a França, onde rompeu com os SRs em 1911 e se ligou ao anarquismo. Suas atividades antibeligerantes o indispuseram com o governo francês, forçando-o a uma fuga para os Estados Unidos, onde participou das atividades da União dos Trabalhadores Russos nos EUA e Canadá, uma organização inspirada na CGT francesa. Em 1917, quando a Revolução teve início na Rússia, ele voltou a sua terra natal, tomando parte ativa nas atividades dos libertários daquele país. Em 1919, quando começaram os conflitos entre libertários e bolcheviques, Volin foi preso e deportado em 1921, estabelecendo-se na Alemanha por 2 anos e, em seguida, indo para a França, onde morreu de tuberculose em 1945. Sua obra foi publicada postumamente em francês sob o título La Révolution inconnue, em 1947 e 1969, em três volumes. Edições em inglês foram publicadas em 1954 e 1955 sob o título de The unknown revolution 1917-1921. No Brasil, até onde se sabe, publicou-se apenas o primeiro volume de A Revolução Desconhecida, em 1980 (Volin, 1980).
O ano de 1950 foi um divisor de águas na historiografia sobre o tema, já que foi então que se produziu a primeira grande obra escrita por um historiador de ofício. Trata-se de The Bolshevik Revolution, 1917-1923, de autoria do britânico Edward Hallett Carr. Ela foi publicada na Inglaterra em três grandes volumes pela editora Macmillan em 1950, 1951 e 1952, respectivamente. E. H. Carr destacou-se pela capacidade analítica e pela vasta pesquisa que realizou para escrever sua obra. A edição inglesa foi traduzida para o português e publicada pela Editora Afrontamento, do Porto, com o título A Revolução Bolchevique. Os três volumes foram dados ao público em 1977, 1979 e 1984. A História da Rússia Soviética de Carr se completava com outros volumes dedicados ao “Interregno 1923-1924”, de 1954, “Socialismo num só país, 19241926”, publicado em três volumes em 1958, 1959 e 1964, e a última parte, “As origens duma economia planificada, 1926-1929”, cujo primeiro volume foi publicado em 1969 em coautoria com R. W. Davies.[5]
Ainda nas décadas de 1960 e 1970, outros historiadores publicaram obras específicas sobre as revoluções de 1917, a exemplo da síntese feita por Marc Ferro em 1967 (Ferro, 1967) ou da pesquisa de William G. Rosenberg, de 1974, sobre os liberais aglutinados no Partido Constitucional democrático durante o processo revolucionário (Rosenberg, 1974).
Contudo, foi na década de 1980 que surgiram os trabalhos mais inovadores no sentido de deslocarem o foco dos grandes atos e atores (individuais e institucionais) e centrarem atenção no envolvimento direto dos trabalhadores nas revoluções russas de 1917. Essas obras superaram as narrativas tradicionais, mais preocupadas em destacar o papel das grandes lideranças dos partidos bolchevique, menchevique e socialista revolucionário, e investiram na análise detida do protagonismo operário na derrubada da autocracia e na ascensão dos revolucionários em fevereiro e outubro de 1917. A partir do uso intensivo de uma quantidade e variedade maiores de fontes e sob a influência da história social, essas obras deram grande contribuição à história da classe operária, suas condições de trabalho e de vida, organizações, greves e interfaces com a tomada do poder em 1917. Nesse sentido, podemos citar as contribuições de diane P. Koenker, Moskow Workers and the 1917 Revolution, de 1981 (Koenker, 1981); Diane P. Koenker e William G. Rosenberg, Strikes and Revolution in Russia, 1917, de 1989 (Koenker; Rosenberg, 1989), e de S. A. Smith, Red Petrograd: revolution in the factories, 1917-1918, de 1983 (Smith, 1983).
A partir da década de 1990 houve uma ampliação dos temas estudados para além das revoluções de 1917 stricto sensu. de acordo com Smith, isso foi possível graças à abertura dos arquivos da antiga União Soviética, o que possibilitou o estudo de aspectos e períodos pouco conhecidos até então, como a era stalinista. Em artigo recente, o autor passou em revista as pesquisas preocupadas em aprofundar o conhecimento sobre as conexões entre a Primeira Guerra Mundial e as Revoluções Russas de 1917, o papel dos boatos na erosão da autoridade sagrada da família real, o conteúdo emocional e moral da linguagem popular, o recrutamento e as experiências de soldados e oficiais russos como prisioneiros na Alemanha e durante a Guerra Civil, as relações entre nacionalidades e império, variações do processo revolucionário nas províncias e nas pequenas cidades e o comportamento dos camponeses e da nobreza em face da revolução, entre outros.[6] O próprio Smith investiu em um estudo comparativo entre as revoluções russas e chinesa, com particular atenção para os camponeses de ambos os países que migraram do campo para Petrogrado e Xangai (Smith, 2008). já Silvio Pons, autor de um dos artigos do presente Dossiê, publicou, em 2014, um amplo painel sobre as relações entre a União Soviética e os partidos comunistas ao redor do mundo ao longo do século XX, até o colapso de 1991 (Pons, 2014).
Em diálogo com essa historiografia, os textos aqui reunidos tratam de modo complementar de diferentes aspectos do contexto da Grande Guerra e dos movimentos sociais do período. Os textos “Música e guerra: impactos da Primeira Guerra Mundial no cenário musical carioca”, de Luciana Fagundes, e “Uma facada pelas costas: paranoia e Teoria da Conspiração entre conservadores no refluxo das Greves de 1917 na Alemanha”, de Vinicius Liebel, vão ao encontro da compreensão da experiência do conflito como Guerra Total[7] na forma como imaginários, sua transmissão e apreensão, são mobilizados além da frente de batalha e do tempo da guerra. Luciana Fagundes procura mostrar como a guerra se lutou para além das trincheiras pela mobilização político-diplomática de ideias numa propaganda que mediaria fórmulas e embates culturais do cenário musical do Rio de Janeiro. Vinicius Liebel ensaia mostrar de que forma a guerra e seus efeitos imediatos foram capitalizados nas lutas ideológicas do entre guerras instalando uma paranoia a que não se pode alienar a Segunda Guerra Mundial.
O artigo de Glaucia Fraccaro, “Mulheres, sindicato e organização política nas greves de 1917 em São Paulo”, analisa uma dimensão ainda pouco explorada no estudo das greves no Brasil, isto é, a participação das mulheres nas ligas operárias de bairro e nos sindicatos. Ela procura localizar as trabalhadoras examinando os pontos de pauta que interessavam diretamente as mulheres por ocasião das greves deflagradas em São Paulo no ano de 1917. Sua pesquisa dá relevo às dificuldades enfrentadas pelas operárias para encontrar colocação no mercado de trabalho e assegurar igualdade salarial em relação aos trabalhadores do sexo masculino que exerciam as mesmas atividades.
O artigo de Silvio Pons, “Antonio Gramsci e a Revolução russa: uma reconsideração (1917-1935)”, apresenta-nos uma análise política aprofundada e inovadora do pensamento do intelectual italiano. Na análise de seus escritos sobre a Revolução russa e a construção de uma nova estatalidade, Pons nos mostra o processo de formação das principais categorias do pensamento político de Gramsci e sua originalidade no panorama do comunismo de sua época. Pons nos mostra também como, longe das visões deterministas, Gramsci inscreve as próprias considerações no campo das possibilidades históricas.
Notas
- Esta análise tem por orientação fundamental o trabalho de WINTER & PROST, 2004.
- Citado por CORREIA, 2014.
- Citado por LEMOINE, 2006, p.136.
- TROTSKY, 1978-1980. Observe-se que em 1909 Trotsky já havia escrito sobre outra revolução russa, a de 1905. A obra foi originalmente publicada na Alemanha, em 1909, depois na Rússia, em 1922. Para a edição brasileira, cf. TROTSKY, 1975 e 1987.
- CARR, 1977-1984. Não deve ser simples coincidência que essa edição tenha sido publicada apenas 3 anos depois da queda da ditadura do Estado Novo em Portugal (1933-1974).
- Para um balanço abrangente sobre a historiografia a respeito do tema a partir dos anos 1990, cf. SMITH, 2015.
- Aproveitamos o termo de CHICKERING & FORSTER, 2008. Para compreensão da ampla controvérsia que envolve seu uso, ver SEGESSER, 2014.
Referências
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Os organizadores do Dossiê desejam a todos uma boa leitura!
Aldrin Castellucci – Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Alagoinhas, BA, Brasil. E-mail: aldrin.castellucci@hotmail.com
Edilene Toledo – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: edilene.toledo@uol.com.br
Silvia Adriana Barbosa Correia – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: sabcorreia@gmail.com
CASTELLUCCI, Aldrin; TOLEDO, Edilene; CORREIA, Silvia Adriana Barbosa. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.76, set / dez, 2017. Acessar publicação original [DR]
Hacia otra historia de América: nuevas miradas sobre el cambio cultural y las relaciones interétnicas – FEDERICO (RBH)
FEDERICO, Navarrete Linares. Hacia otra historia de América: nuevas miradas sobre el cambio cultural y las relaciones interétnicas. México: Universidad Nacional Autónoma de México (Instituto de Investigaciones Históricas), 2015. 178p. Resenha de: KALIL, Luis Guilherme Assis. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.37, n.75, mai./ago. 2017.
Pensemos em um membro de uma comunidade indígena do centro da Nova Espanha no século XVI. Ele poderia ter identidades culturais e de gênero, praticar determinado ofício, ser cristão e, no campo das identidades étnicas, estar associado a seu “barrio” e comunidade além de ser vassalo da Coroa espanhola. Esse exemplo hipotético analisado por Federico Navarrete Linares revela muitos dos temas abordados em sua obra, associados, principalmente, aos conceitos de alteridade e identidade.
Nos dois ensaios que compõem a obra,2 o professor da UNAM apresenta um amplo panorama das reflexões associadas a esses conceitos dentro da história do continente americano, bem como propõe caminhos de interpretação. Com esse intuito, Navarrete amplia os recortes temporal e geográfico em sua análise, adotando uma perspectiva continental ao longo de mais de cinco séculos, sob o argumento de que, a despeito das especificidades, existiriam muitas convergências entre as trajetórias históricas dos países americanos, como o pertencimento a um “sistema comum” centrado no mundo Atlântico.3 Da mesma forma, todos teriam se organizado após a independência dentro do marco das novas ideias liberais, o que o leva a defender a importância de uma perspectiva compartilhada – mais do que comparada – da história da América.
Em seu primeiro ensaio – “El cambio cultural en las sociedades amerindias: una nueva perspectiva” -, Navarrete analisa os diferentes tipos de relações culturais estabelecidas pelos ameríndios a partir dos primeiros contatos com o Velho Mundo, passando pelas múltiplas formas de resistência, alianças e lutas por direitos. O historiador inicia o texto analisando as formas em que os índios foram concebidos como objetos de conhecimento e dominação e os consequentes projetos de transformação cultural desenvolvidos. Entre os séculos XVI e XVII, a dimensão religiosa teria sido o foco principal de atenção dos europeus acerca das culturas ameríndias. Dessa forma, a transformação cultural dos considerados “bárbaros” e “pagãos” passaria, necessariamente, pela conversão. No século XVIII, com a ascensão das ideias ilustradas e do conceito de civilização, a religião teria perdido espaço para a educação como estratégia de incorporação dos indígenas. Uma nova mudança teria ocorrido a partir da segunda metade do século XIX, com a crescente hegemonia do pensamento científico associada ao evolucionismo biológico e cultural e a ideais positivistas. Nesse período de consolidação dos Estados nacionais, teriam surgido dois modelos de atuação diante da “raça” indígena: as políticas de mestiçagem, adotadas em países como Brasil e México, e de segregação estrita, presentes nos Estados Unidos e na Guatemala.
No século XX, Navarrete identifica o surgimento de outro projeto de interpretação e atuação sobre as culturas ameríndias: a teoria da aculturação, que reforça a pluralidade cultural e teria se institucionalizado mediante políticas que buscavam facilitar a integração final das culturas indígenas menos avançadas à cultura nacional. Nas últimas décadas, outras teorias teriam ganhado força, como as abordagens que destacam a resistência indígena diante dos europeus e as continuidades culturais com o período pré-hispânico, as interpretações multiculturais (associadas a diferentes formas de organização indígena que visam reforçar seu papel como atores políticos) e os projetos baseados em conceitos como o de hibridação e mestiçagem, que negam a existência de identidades ou culturas “puras”.4
Navarrete enfatiza que todas essas propostas não se limitaram ao campo intelectual, estabelecendo estreitas relações com as políticas de dominação e transformação cultural estabelecidas nos últimos cinco séculos. Além disso, seriam marcadas por forte conteúdo moral, baseado em concepções universalistas de verdade e sobre o curso da história. Mas o autor também ressalta que todas elas encontraram entraves e limitações, relacionados às divergências existentes entre os missionários, funcionários da Coroa ou dos Estados independentes e às formas de resistência, adaptação e criação por parte dos ameríndios.
Ao final, o autor substitui o caráter descritivo e analítico por uma abordagem propositiva, visando apresentar “un marco alternativo de comprensión de las transformaciones culturales de las sociedades amerindias” (p.15). Com base no conceito de rizoma proposto por Gilles Deleuze e Félix Guattari, Navarrete propõe uma abordagem das trocas culturais que prescinde de premissas como a unidade das culturas e a existência de fronteiras claras entre elas, além de colocar em xeque a ideia de que a “entrada de elementos exógenos debe provocar necesariamente una transformación en el conjunto de la cultura de un grupo y, sobre todo, en sus identidades culturales y étnicas y que el valor identitario de los rasgos externos está determinado por su origen” (p.47). Adotando essa perspectiva, o autor problematiza visões que abordam a conversão ao cristianismo ou a adoção do idioma espanhol como rupturas irreversíveis, apontando o conceito de etnogênese5 como importante ferramenta de interpretação para ressaltar a capacidade de invenção, renovação e redefinição cultural e étnica por parte dos indígenas, bem como superar perspectivas que veem as trocas culturais como um “jogo de soma zero”, onde a adoção de um elemento cultural ou identitário externo significaria necessariamente a perda de outro elemento indígena, gerando uma dissolução de sua identidade étnica (p.81-82).
No segundo ensaio, “Estados-nación y grupos étnicos en la América independiente, una historia compartida”, Navarrete concentra suas atenções no período pós-independência com base nas questões que envolvem a construção de identidades dentro dos Estados nacionais. Com a proposta de ressaltar que as definições das diferenças entre grupos humanos são produto de circunstâncias históricas e sociais de cada sociedade (não o reflexo de uma realidade biológica, racial ou cultural), o autor apresenta um panorama da dinâmica dos “regimes das relações interétnicas”, ressaltando os aspectos comuns a todo o continente bem como algumas especificidades nacionais.
O primeiro regime abordado é o “estamentário”, presente em países que conservaram durante parte de sua história independente a categorização étnica e a exploração do trabalho forçado, como a escravidão africana nos Estados Unidos e no Brasil e a tributação de indígenas bolivianos, peruanos e guatemaltecos. Em seguida, viriam os “regimes liberais discriminatórios”, implantados em quase todo o continente durante o século XIX e caracterizados por assumir a concepção liberal de cidadania universal e igualitária ao mesmo tempo que excluía amplos setores da população, formando o que Navarrete denomina como uma “cidadania étnica”. Os regimes “integradores” teriam surgido no século XX em países como México, Argentina e Brasil com uma perspectiva da nação como unidade racial, muitas vezes baseada na mestiçagem. Por fim, o historiador analisa os “regimes multiculturais”, surgidos na América do Norte a partir da década de 1960 e que teriam se espalhado pelo continente com a premissa da nação como um conjunto de grupos distintos cujos direitos deveriam ser reconhecidos e protegidos. Para o autor, esse novo modelo mantém e institucionaliza as diferenças entre uma maioria hegemônica e as minorias definidas como diferentes, além de conceber as identidades culturais e étnicas dos grupos minoritários como uma realidade quase inamovível.
Em ambos os ensaios, podemos observar que Navarrete se preocupa em ressaltar o caráter fluido, múltiplo e histórico das culturas e identidades, em detrimento das abordagens que as imobilizam e essencializam. Outro aspecto comum é a busca por definir e sistematizar conceitos, projetos de transformação cultural e regimes de relações interétnicas tendo como premissa um recorte continental (ainda que dedique atenção às especificidades nacionais). Dessa forma, o autor aproxima a proibição do consumo de chicha na Colômbia, a perseguição à capoeira no Brasil e as leis Jim Crow nos Estados Unidos como práticas discriminatórias associadas a regimes liberais (p.134-135). Como apontado por Berenice Alcántar Rojas na introdução do livro, essa característica se revela como uma das principais virtudes, mas, simultaneamente, uma limitação da obra (p.12). Nesse mesmo sentido, a identificação de grandes movimentos, projetos ou regimes ao longo dos séculos sugere uma linearidade combatida pelo próprio autor.
Contudo, ao final, esta obra se apresenta como importante contribuição que aprofunda conceitos e questões fundamentais não só às pesquisas acerca da História das Américas, mas também a debates que ocupam espaços centrais na política e na cultura brasileira e de outros países americanos, como as políticas de ações afirmativas e as demarcações de terras para grupos indígenas e comunidade quilombolas, que ganham novos contornos quando analisadas sob uma abordagem continental.
Notas
2 Disponível gratuitamente em: http://www.historicas.unam.mx/publicaciones/catalogo/ficha?id=633.
3 Navarrete faz referência nesse trecho à abordagem de “sistema-mundo” trabalhada por Immanuel Wallerstein, apontando seu caráter “eurocêntrico”, que impediria maior compreensão das complexidades dos espaços “periféricos” (p.70 e 101).
4 O autor identifica duas vertentes associadas a essa perspectiva. A seguida por autores como Serge Gruzinski e Néstor García Canclini, em que a expansão ocidental é vista como marco do início do processo de hibridização e mestiçagem; e outra, apontada por Navarrete como mais interessante, a qual assume que as culturas têm sido híbridas e mestiças desde sempre (p.37-38).
5 Navarrete remete a origem desse conceito à antropologia russa e afirma que estudiosos como Cynthia Radding e Jonathan Hill o utilizaram para analisar o continente americano: “Aunque estos autores lo utilizan exclusivamente para explicar la adaptación de pueblos indígenas a la dominación europea, me parece que puede ser empleado de manera más amplia para todos los procesos de conformación de identidades étnicas” (p.97).
Luis Guilherme Assis Kalil – 1 Professor adjunto A-1 de História da América Colonial e América Independente no século XIX da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ-IM). Doutor em História cultural pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ-IM). Nova Iguaçu, RJ, Brasil. E-mail: lgkalil@yahoo.com.br.
[IF]
Slave Emancipation and Transformations in Brazilian Political Citizenship – CASTILHO (RBH)
CASTILHO, Celso Thomas. Slave Emancipation and Transformations in Brazilian Political Citizenship. Pittsburgh, PA: University of Pittsburgh Press, 2016. 264p. Resenha de: SOUZA, Felipe Azevedo. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.37, n.75, mai./ago. 2017.
Eis um livro notável para os interessados nas mais recentes produções da História Política, área que vem sendo revisitada com publicações que trazem novas possibilidades de interpretação ao que, até recentemente, resumia-se às tramas partidárias e de gabinete. No caso do estudo de Celso Castilho, há a intenção de evidenciar como as jornadas abolicionistas foram, pouco a pouco, moldando o campo político institucional em um movimento de fora para dentro. Das ruas e dos teatros para os parlamentos, em dinâmicas que envolviam parcelas da sociedade tradicionalmente alijadas do sistema político formal, mediante um enredo no qual se destacam as vozes e os atos de mulheres, escravizados e libertos em meio ao coro difuso que grassou progressivamente durante as duas décadas de ativismo que antecederam o 13 de maio de 1888. Como o autor enfatiza na conclusão, “o abolicionismo fomentou a ‘política de massas’ em nível nacional”, e o objetivo da obra é justamente orientar a trajetória desse movimento em meio ao que chamou de “longa história da democracia no Brasil” (p.192).
Com a atenção voltada para a apresentação detalhada das táticas e estratégias que remodelaram as formas de manifestação e a pauta contenciosa do debate público mediante uma abordagem processualista, desfilam em suas páginas as diversas fases do movimento em um quadro a quadro que parte dos primeiros debates em torno da Lei do Ventre Livre e se estende até a disputa de memória no pós-1888. O exame desse panorama histórico repleto de manifestações e associações que envolviam milhares de pessoas é o que fundamenta a tese de que o sucesso do movimento só foi possível dado o amplo engajamento popular, granjeado com um variado repertório de mobilização política.
Esses aspectos evidenciam um fluxo de ideias alinhadas ao pensamento democrático que dava lastro conceitual ao movimento, o que de certa maneira rompe com a ideia reducionista de que o sistema político brasileiro da época era operado unicamente por um padrão de práticas que se distendiam em um círculo vicioso, limitado a reproduzir clientelismo e corrupção. Nesse aspecto o livro acabou por adicionar complexidade ao tema, mostrando que iniciativas democráticas podiam florescer mesmo em contextos políticos tradicionalmente compreendidos em torno de práticas autoritárias e arcaicas.
O livro explora o processo de mudança histórica entre o fim da década de 1860, quando os debates sobre abolição ainda encontravam resistência em meio ao establishment imperial, e meados da década de 1880, fase em que o tema se tornou a pauta mais importante dos debates nacionais. A narrativa acompanha a paulatina difusão do movimento abolicionista a partir dos debates na imprensa, da formação de clubes e sociedades, bem como as reações gestadas por essa expansão em meio a setores de proprietários de escravos, que, de maneira análoga, também passaram a se organizar, promovendo eventos e utilizando metodicamente a opinião pública por intermédio de folhas políticas.
Ainda que boa parte da pesquisa gire em torno de eventos ocorridos entre Pernambuco e Ceará, a obra faz uma análise circunstanciada das pautas e debates nacionais, tomando para isso eventuais consultas a fontes primárias do governo e mantendo estreito diálogo com ampla produção historiográfica sobre o tema. O caráter interativo das sociedades abolicionistas e o intercâmbio constante de seus membros expandem ainda mais o recorte espacial. O movimento tinha um grau de articulação complexo e não passa despercebida à análise a capacidade dos abolicionistas em repercutir fatos e estratégias ocorridos nas mais diversas províncias. A seção na qual Castilho discute o 25 de março cearense, trazendo novas perspectivas que colocam em questão a justificativa clássica de que a abolição naquela província derivou meramente de aspectos econômicos decorrentes da seca de 1877-1878, é representativa de como a preocupação do autor está mais voltada à questão da cidadania política do que a particularismos da história local.
No entanto, a escolha por escrever essa história principalmente a partir de Pernambuco não aconteceu em vão. Foi provavelmente naquela província que a luta dos abolicionistas mais fomentou debates em torno da ampliação da cidadania política e da participação popular, questão que se expressava com grande intensidade durante as eleições. Durante a década de 1880, abolicionistas vinculados ao partido liberal fizeram de suas candidaturas plataformas para que o abolicionismo tomasse a política e para que esta ganhasse as ruas, até mesmo em manifestações dirigidas aos operários, artistas, trabalhadores do comércio, caixeiros e trabalhadores do mercado, entre outros. Joaquim Nabuco e José Mariano tornaram-se os porta-vozes da causa e o fizeram com base em estratégias de divulgação que iam desde sarais em clubes, passando por eventos no Teatro Santa Isabel, até os famosos meetings, em eventos que reuniam milhares de espectadores de “todas as camadas da sociedade” (como registraram os jornais da época).
As eleições gerais da década de 1880 são analisadas uma a uma pelo autor, que explorou as disputas para mensurar a intensidade com que a pauta abolicionista se espraiava pelo terreno da política. E de fato, aqueles pleitos não eram percebidos pelos contemporâneos como uma contenda entre liberais e conservadores, mas entre abolicionistas e escravocratas. Eram projetos em disputa e, sendo assim, acabavam por preencher uma lacuna persistente nas eleições oitocentistas: davam sentido social e programático às eleições.
O projeto de política popular dos abolicionistas motivou forte reação por parte dos republicanos, que em conluio com os conservadores passaram a adotar expedientes de criminalização e de racialização como forma de deslegitimar a participação da população pobre e de cor, em um esboço do que viria a se concretizar como o projeto de cidadania política excludente que se tornou uma das dimensões mais marcantes do período pós-abolição.
Em oposição aos discursos que marginalizavam a atuação da população negra e que compreendiam escravizados e libertos em uma esfera de classificação pré-política e reativa, a perspectiva de Celso Castilho os situa como parte fundamental do movimento. Ao longo do livro encadeiam-se casos em que escravizados tomaram a frente do processo para conquistar suas alforrias ou articular suas próprias fugas do cativeiro, ações que eram facilitadas, ou até mesmo instrumentalizadas com fins de propaganda, pelo movimento abolicionista. Essas interações substanciam o argumento do livro ao demonstrar que mesmo em engenhos distantes dos centros urbanos as lutas dos abolicionistas ecoavam e fomentavam os desejos por liberdade, dando a ver o amplo alcance de circulação dos ideais políticos e de cidadania propalados pelo grupo.
Uma das novidades trazidas pelas novas maneiras de organização e manifestação engendradas pelos abolicionistas foi a inclusão das mulheres no mundo predominantemente masculino da política e da opinião pública. O acompanhamento dessa inserção é um dos pontos altos do livro. O envolvimento que começou em fins da década de 1870, com a presença constante de mulheres em atividades públicas do movimento como bazares, passeatas e peças de teatro, ganhou vigor em meados da década seguinte com a criação de sociedades formadas exclusivamente por mulheres. Associadas à premissa de que eram naturalmente caridosas, elas representavam a face filantrópica da causa e portavam-se como senhoras respeitáveis, mães, esposas e “guardiãs do lar”. Ainda que sob uma identidade de gênero tradicional, essas mulheres conseguiram romper as barreiras do mundo político e tiveram atuação bastante enérgica no movimento – estiveram à frente, por exemplo, dos comitês de liberação de bairros em Recife e lograram grande sucesso na popularização do abolicionismo.
A mais famosa dessas associações, a Ave Libertas, foi, por alguns anos, a sociedade que mais conseguiu promover alforrias na cidade. Aliás, o levantamento das muitas sociedades e suas composições é bem explorado no livro, quesito que explicita especialmente a pesquisa pormenorizada desenvolvida por Celso Castilho, que computou estimativas sobre a quantidade de liberdades conquistadas por essas sociedades em comparação com os fundos de emancipação provinciais em uma série de tabelas. Os números levantados pelo autor são certamente uma ótima contribuição para o acompanhamento progressivo da ação do movimento civil em libertar escravos, montante muito superior ao atingido pelos fundos de emancipação organizados pelos governos provinciais.
Ainda assim, com a chegada da abolição, como a última parte do livro ressalta, os líderes (homens) dessas associações acabaram sendo os mais homenageados. Mesmo que nos dias imediatamente posteriores ao 13 de maio alguns jornais tenham comemorado a abolição como uma conquista coletiva e popular, a memória que se perpetuou sobre o abolicionismo foi pouco a pouco resumindo-se a um panegírico de estadistas e figuras proeminentes. Essa memória que se começou a criar já no dia 14 de maio de 1888 ia batizando passeios públicos com nomes de figurões da política e celebrava a vitória abolicionista, ao passo que olvidava cada vez mais o papel que os escravizados e libertos desempenharam no movimento e, mais que isso, acabaram por negligenciar os debates sobre a inserção dos negros na nova ordem social.
Ao seu fim, o livro demarca a distância entre a forma com que o abolicionismo era percebido em sua vigência e a maneira como foi lembrado por muito tempo. Essa perspectiva é alcançada com sucesso ao combinar análises sobre a cultura política com os debates sobre abolicionismo, em uma simbiose onde um tema acabou por iluminar aspectos de outro, revelando nuances de um pensamento democrático em estado embrionário (e que foi vigorosamente combatido) por muito tempo ignorado pela historiografia. Nesse aspecto, o variado elenco de temas presentes em Slave Emancipation and Transformations in Brazilian Political Citizenship é tanto uma injeção de ânimo para a revisão de temáticas em torno da cidadania política no Império, quanto uma inspiração para que historiadores e historiadoras olhem com mais cuidado para a atuação e o engajamento de setores tradicionalmente alijados dos direitos políticos.
Felipe Azevedo Souza – Doutorando em História na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Bolsista Fapesp. Campinas, SP, Brasil. E-mail: felipeazv.souza@gmail.com.
[IF]Nem mãe preta, nem negra fulô: histórias de trabalhadoras domésticas em Recife e Salvador – SILVA (RBH)
SILVA, Maciel Henrique. Nem mãe preta, nem negra fulô: histórias de trabalhadoras domésticas em Recife e Salvador. Jundiaí, SP: Paco Editorial, 2016. 416p. Resenha de: SAMPAIO, Gabriela dos Reis. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.37, n.75, mai./ago. 2017.
Quando falamos do trabalho doméstico no Brasil, devemos ter em mente uma instituição sólida, antiga, perene em nossa sociedade. Trabalho pesado, tradicionalmente exercido por mulheres pobres, muitas vezes negras, sujeito a regras incertas e subjetivas que, na intimidade das casas de família, podem proteger da insegurança das ruas e, ao mesmo tempo, oprimir de maneira brutal as trabalhadoras.1 Conviver com a possibilidade onipresente de humilhação, violência e abuso sexual é o cotidiano de milhares de trabalhadoras que vivem nesse universo complexo, escorregadio, avesso à regulamentação. Essa instituição, ainda tão presente no Brasil do século XXI, tem história; uma importante parte dela, situada entre as últimas décadas da escravidão legal no país e a primeira do século XX, é contada pelo historiador Maciel Silva.
Com cuidado e sensibilidade, o autor narra experiências de trabalhadas domésticas em duas grandes capitais brasileiras, Salvador e Recife, com base em pesquisa densa e rigor interpretativo. O autor trata do período compreendido entre as décadas de 1870, quando libertas, escravas e mulheres livres pobres eram recrutadas para as tarefas de “portas a dentro”, como se dizia então, e 1910, escolhido como marco em função da consolidação de diversas reformas urbanas no país, e consequente mudança nos hábitos, ritmos de vida e na dinâmica do trabalho doméstico. Originalmente apresentado como tese de doutorado em História Social na Universidade Federal da Bahia (UFBA), o livro é um estudo importantíssimo para o tema.
Ao marcar o início do seu estudo na década de 1870, o autor vincula a situação das trabalhadoras domésticas à organização do trabalho que viria com o fim da escravidão, inevitável com a promulgação da lei de 28 de setembro de 1871, a chamada Lei do Ventre Livre. Sem dúvida, como afirma Silva, aquela lei alterou a percepção sobre o trabalho doméstico livre, uma vez que traria, com os contratos, mudanças nas regras de trabalho, nos horários, na moradia das domésticas – não mais necessariamente fixa na casa dos patrões -, nas expectativas, aliás, de ambas as partes. O contexto dos anos 1870 seria, então, um marco para pensar a formação da classe, já que o autor analisa trabalhadoras livres e libertas em ação como domésticas bem antes do marco oficial do fim da escravidão.
Impossível separar as origens do trabalho doméstico do ambiente da escravidão em sociedades onde essa forma de exploração do trabalho grassou por tantos séculos; para Silva, entretanto, se a escravidão marca o trabalho doméstico, e muitas das lutas das trabalhadoras domésticas livres e libertas foram forjadas nas lutas por autonomia dentro da escravidão, ela não define a classe das domésticas, isso é, não se encontra a classe na escrava doméstica. Isso porque Maciel Silva busca – e aqui tratamos de uma parte central de seu livro – explicar a “formação da classe das trabalhadoras domésticas no Brasil”, classe que, para o autor, só teria se formado na experiência da liberdade, ainda que precária, daquelas trabalhadoras. Inspirado em uma leitura perspicaz de E. P. Thompson, Silva enfatiza bem mais a formação aqui, isto é, prefere pensar em processo histórico, conflitos e heterogeneidade para lidar com o conceito de classe, recorrendo à experiência dos sujeitos mais do que à fixidez de uma categoria preestabelecida.
Escravas, portanto, não fariam parte da classe vislumbrada pelo autor. Silva pretende, com essa premissa, fugir dos estereótipos tanto da “mãe-preta”, a generosa escrava que cuidava dos meninos brancos, quanto da “Negra Fulô”, a mucama bela e sedutora, que tantas vezes, na literatura e nas análises de intelectuais, apareceram na caracterização da trabalhadora doméstica, inviabilizando sua análise enquanto protagonistas de suas próprias histórias. Os estereótipos já explicariam e reduziriam suas vidas à condição de passividade, vítimas de um sistema inescapável. Assim, o esforço do autor se dá no sentido de definir as trabalhadoras domésticas como uma classe marcada por lutas contra a exploração, por direitos, e também em tratar dos conflitos no interior da classe.
Se definir essa classe sem incluir as trabalhadoras escravas que viviam dentro das casas resolve o problema de lidar com as diversas especificidades legais das trabalhadoras naquela condição, nem por isso o autor se livra de outro problema teórico: lidar com uma “classe de domésticas” dentro da classe trabalhadora. Esta não parece ser uma preocupação de Maciel Silva, que não entra no debate sobre ofícios e classe, evitando enfrentar a questão. Sua opção para comprovar a tese da formação da classe das trabalhadoras domésticas é partir para a análise, ao invés da discussão teórica sobre classe; para isso, traz uma pesquisa monumental e uma interpretação sofisticada de fontes, revelando as trabalhadoras em movimento. Constrói, dessa maneira, uma história humana, em que mulheres livres e libertas lutam, atuam com solidariedade contra os patrões em alguns momentos e com disputas entre si em outros, sofrem estupros e outras violências, enfrentam acusações de furto, recorrem à fofoca, se ajudam, e também competem entre si. Lidam com noções de honra, fidelidade, gratidão, proteção, bondade, zelo e liberdade, entre outras, específicas daquela sociedade, e, ao fazê-lo, agem como classe, da mesma forma como seus patrões e patroas também o fazem.
Embora a classe seja a noção central a partir da qual o autor quer pensar a experiência das trabalhadoras domésticas, gênero e raça estão contempladas em sua análise. Sem buscar uma solução fácil, Silva busca os momentos em que o gênero se sobrepõe à classe ou mesmo à raça, mostrando que a realidade é bem mais complexa do que as categorias que usamos para tentar entendê-la. Se é verdade que as trabalhadoras eram majoritariamente negras, também havia não negras entre elas. Em alguns momentos, a pobreza e o fato de serem mulheres marcava mais a posição das domésticas do que a própria raça. Novamente, com riqueza de fontes, cuidado analítico e grande capacidade narrativa, vão surgindo Marias, Creuzas, Donatas, Theodoras e tantas outras meninas e mulheres, com suas histórias e maneiras de lidar com os problemas, resistir, viver.
Merece destaque especial o capítulo em que o autor utiliza romances, memórias, contos e outros textos ficcionais como fontes para a história social. Com base na invenção de literatos baianos e pernambucanos sobre quem eram as domésticas, Silva recupera, com maestria na escrita, muito das sensibilidades da época estudada. Em textos que revelam muito mais a visão de mundo dos senhores do que qualquer realidade sobre as trabalhadoras, o historiador captou medos, angústias, violência e sutilezas das relações paternalistas entre criadas e patrões, marcada por conflitos. Porém, é no capítulo em que analisa os processos criminais que esses conflitos aparecem com todas as cores da violência do mundo real. Em acusações de furtos, agressões físicas, ataques à honra, Maciel Silva vai descortinando aos leitores a experiência de defloramentos e estupros, violência física e verbal, humilhações e precariedade que marcaram a vida das trabalhadoras, permeadas também por solidariedades, redes de apoio na vizinhança, fofocas e outras formas de aproximação – e, às vezes, competição – entre elas. Ao longo do texto, o talento de escritor aparece e enriquece a interpretação do historiador. O resultado é um universo doloroso e complexo que surge, tirando da invisibilidade tantas mulheres que viveram essas histórias.
Um grande esforço de comparação entre as duas grandes capitais caracteriza os capítulos iniciais do livro; a falta de documentação equivalente nas duas cidades, porém, faz Salvador aparecer bem mais que o Recife. Para completar o estudo, Silva faz uma análise cuidadosa da legislação desse universo de trabalho e dos contratos que passam a regulá-lo. Acompanha também trajetórias de jovens saídas da Santa Casa de Misericórdia da Bahia para trabalhar como domésticas em casas de tradicionais famílias baianas – uma rica documentação que nos últimos anos vem sendo utilizada com mais atenção por historiadores. Se na primeira parte do livro o esforço maior é o de situar o leitor nos contextos específicos de Salvador e Recife e nas imagens construídas na literatura sobre as domésticas e seu universo, nessa segunda parte o autor se preocupa em resgatar a experiência das trabalhadoras.
Ao reconstruir trajetórias cheias de conflitos intensos, como nos casos das expostas da Santa Casa e suas experiências infelizes nas casas dos patrões, Silva defende o argumento de que a instabilidade e violência do universo da escravidão e as solidariedades estabelecidas entre as trabalhadores colocaram em xeque, em diversas situações, o paternalismo vigente, construindo possibilidades de vida para as trabalhadoras, ainda que em condições desiguais e precárias. Sem cair em heroísmos ou simplificações binárias, o autor interpreta as relações de poder daquele mundo, mostrando sua complexidade e as dificuldades em regulamentar um trabalho que é tão pautado pela subjetividade das relações que se estabelecem na intimidade das casas.
Um tema tão atual e importante remete, necessariamente, à luta das trabalhadoras domésticas nas últimas décadas da nossa história por cidadania, direitos, respeito, dignidade no trabalho e na vida. São temas recuperados pelo autor no desfecho do livro, embora se afaste de qualquer tentativa de linearidade na interpretação da luta daquelas trabalhadoras. Em tempos sombrios como os que enfrentamos, em que os direitos dos trabalhadores são tão duramente ameaçados, o livro de Maciel Silva é ainda mais necessário, recolocando problemas fundamentais na nossa sociedade que se pretende moderna e é tão barbaramente marcada por valores arcaicos e desumanos. Este livro nos faz pensar na força do trabalho doméstico no Brasil, nesse modo de mandar, de incluir em casa sem incluir de fato, de tratar “bem” sem tratar como igual, de marcar o lugar de classe e a situação de privilégio de um e a de dependência e humilhação de outros. Tantas incongruências e contradições, o ir e vir da constituição da classe, são revelados com primor neste livro imprescindível.
Referências
GRAHAM, Sandra Lauderdale. Proteção e obediência: criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, 1860-1910. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. [ Links ]
Notas
1 Refiro-me aqui ao binômio proteção e obediência, conforme o trabalho doméstico foi caracterizado em um livro já clássico sobre o assunto, da historiadora Sandra Graham. As criadas, sendo trabalhadoras obedientes, receberiam proteção de seus senhores, vivendo na intimidade dos lares, longe dos perigos e da imprevisibilidade das ruas. A autora mostra, porém, que esses significados convencionais eram ambíguos: a casa podia ser o lugar da injustiça para os criados, assim como a rua poderia significar liberdade, longe do controle e vigilância dos patrões. Ver GRAHAM, 1992, p.16.
Gabriela dos Reis Sampaio – Universidade Federal da Bahia (UFBA). Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: grsampaio@hotmail.com.
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Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura – VALENTE (RBH)
VALENTE, Rubens. Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. 518p. Resenha de: ASCENSO, João Gabriel. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.75, mai./ago. 2017.
Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura é um trabalho verdadeiramente monumental, publicado em edição impecável pela Companhia das Letras como segundo livro da coleção Arquivos da Repressão no Brasil. Ao longo de 398 páginas de texto e mais de cem de notas, referências e imagens, Rubens Valente monta uma série de painéis que reconstroem paisagens, cenários, trajetórias individuais e eventos que marcaram a atuação de diversas personalidades envolvidas na chamada “questão indígena”, entre os anos 1960 e o início da década de 1980. A pesquisa, que contou com um ano de entrevistas e 14 mil quilômetros atravessados entre dez estados do país, incluindo dez aldeias, é tributária da própria trajetória de Valente, que, desde os anos 1990, realizou diversas reportagens em terras indígenas e, a partir de 2010, escreve para a sucursal de Brasília do jornal Folha de S. Paulo.
Os fuzis e as flechas é, portanto, um texto jornalístico. Seu tom biográfico é fruto do uso de um amplo leque de fontes orais cruzadas com material escrito, como entrevistas de época, relatórios e comunicações oficiais sobre casos ou indivíduos específicos. Trata-se de documentos muitas vezes sigilosos e que apenas puderam vir à tona depois do fim da ditadura – relativos, por exemplo, ao Serviço de Proteção ao Índio (SPI), à Fundação Nacional do Índio (Funai), ao Ministério do Interior e à Assessoria de Segurança e Informação (ASI) instalada na Funai como braço do Serviço Nacional de Informação (SNI). A própria relação desses documentos, ao fim do livro, constitui referência de riquíssimo material para pesquisadores que resolvam dedicar-se ao estudo desse período.
Entretanto, o livro não tem um problema, uma questão central a ser perseguida dentro do amplo eixo temático “indígenas durante a ditadura militar”. Não há uma linha de investigação definida nessas quase quatrocentas páginas – o que resultaria em uma hipótese a ser comprovada. As ações do Estado, dos indígenas, ou dos indigenistas indicados carecem de contornos mais nítidos e contextuais. Deve-se destacar, de qualquer forma, que, ainda que isso gere um estranhamento imediato por parte dos historiadores, a construção desses contornos não é objetivo do livro, como obra jornalística que é. De todo modo, uma convicção, elaborada empiricamente com base no amplo material analisado, atravessa toda a obra: o genocídio indígena não foi fruto de mero descaso, irresponsabilidade ou falta de preparo, ele foi consentido pelo Estado.
A apresentação biográfica de alguns personagens destacados puxa um fio que leva a outros personagens, contextos e depoimentos. Ocorre que a passagem de um tema específico para o outro não tem uma direção certa: há um eixo mais ou menos cronológico a partir do qual assuntos e eventos se aglutinam, sem que sua escolha seja clara ao leitor. Para que possamos nos movimentar por um conjunto tão pouco coeso de informações, entretanto, contamos com um excelente índice remissivo, que nos socorre muitas vezes. O livro se inicia quando somos apresentados à figura do sertanista do SPI Antonio Cotrim, a partir de quem se desenha o primeiro quadro de uma tônica que se fará presente ao longo de todo o livro: o massacre de índios (neste caso, os Kararaô, do Pará) como resultado do despreparo das chamadas “frentes de atração”, que acabavam levando doenças para as terras nativas.
Daí, passamos pelo tema das remoções forçadas (como a dos Xavante do Mato Grosso) e pelas denúncias de violações de direitos humanos de grupos indígenas contidas no chamado Relatório Figueiredo. Passamos, ainda, pela atuação dúbia das missões religiosas junto aos indígenas: há evidência de uma mentalidade integracionista que desprezava as culturas nativas, ao mesmo tempo que os próprios missionários aparecem, algumas vezes, como defensores da integridade física desses povos. A ação de missionários religiosos num sentido oposto ao da assimilação também é discutida, particularmente a partir da formação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) que, dentro da perspectiva da Teologia da Libertação, articulou as chamadas “assembleias indígenas”, mobilizando diferentes lideranças de todo o país e viabilizando a resistência desses grupos à ditadura.
A mentalidade integracionista do Estado e sua truculência são ainda apresentados pela criação da famigerada Guarda Rural Indígena (Grin) e pelo plano do ministro do Interior Maurício Rangel Reis de “emancipar” os índios, retirando-lhes o direito à terra. Além disso, discute-se o projeto de grandes obras de integração nacional, como a Transamazônica e diversas outras rodovias, que tiveram consequências fatais sobre os Parakanã, Asurini e Waimiri-Atroari, por exemplo, bem como a evidência do favorecimento, por parte do Estado, de grupos de mineradores, fazendeiros e empreiteiras com interesses em terras indígenas.
Em meio a isso tudo, um grande acerto de Valente é mostrar que a conivência de instituições como o SPI e a Funai com a ofensiva da ditadura não significou a concordância dos sertanistas e funcionários, que muitas vezes reagiram de maneira veemente, articulados a antropólogos e membros da sociedade civil e, sobretudo a partir dos anos 1970, com o apoio de boa parte da opinião pública internacional. Além disso, figuras que se tornariam icônicas no indigenismo brasileiro, como os irmãos Villas-Bôas, Francisco Meireles e seu filho José Apoena Meireles, e mesmo Darcy Ribeiro, são representados com a complexidade de figuras humanas. Ainda que nem sempre o autor consiga escapar de certa heroicização, aspectos controversos desses homens são destacados, como o relacionamento claramente abusivo de alguns dos Villas-Bôas com mulheres indígenas, a opinião dos Meireles de que o indígena fatalmente seria integrado à sociedade nacional, ou a recusa de Darcy Ribeiro em reconhecer a existência do povo Ofayé, dando argumentos aos fazendeiros que pretendiam tomar as terras desse grupo. Tanto por parte dos Villas-Bôas quanto dos Meireles, a crítica interna à Funai se alternava com uma defesa da instituição, em momentos nos quais graves denúncias pareciam caminhar para escândalos – levando-os até mesmo a posicionamentos contrários ao Cimi.
Na segunda metade do livro, tomam vulto algumas lideranças indígenas que se tornariam referência da luta dos anos 1970 e 1980. A trajetória do guarani Marçal de Souza (cuja foto serve de capa ao livro) ganha muito destaque: seu engajamento político, seguido de deportação interna, sua fala de denúncia junto ao papa João Paulo II e, finalmente, seu assassinato na aldeia Campestre. Outra liderança, o xavante Juruna, também recebe grande atenção: primeiro (e, até hoje, único) deputado federal indígena, com seu gravador em punho, sua trajetória no livro é retratada em todas as suas contradições, que evidenciam a dificuldade de articulação de um indígena em um modo de fazer política que não lhe é, a princípio, próprio. Além disso, instituições como a União das Nações Indígenas (Unid, posteriormente UNI) e o Núcleo de Direitos Indígenas (NDI), origem do atual Instituto Socioambiental (ISA), são descritas como resultado do processo de mobilização pela causa indígena – ainda que a afirmação de que a UNI “deu errado” seja bastante questionável.
Contudo, outras importantes lideranças, como o cacique Raoni e seu sobrinho Megaron Txucarramãe, Marcos Terena, o kayapó Paulinho Paiakan e o yanomami Davi Kopenawa são mencionados muito brevemente, sem que possamos entender o que levou à escolha de certas lideranças em detrimento de outras. No epílogo do livro, discute-se a rearticulação da Funai após a ditadura, a permanência da visão integracionista da cúpula militar e, chegando aos anos 2010, até mesmo as atuais propostas de emenda à Constituição de 1988, que recuam direitos conquistados. Mas essa Constituição não é analisada, embora seja o primeiro documento do Estado brasileiro a garantir ao indígena o direito de permanecer em sua terra e com a sua cultura, sem a necessidade de uma assimilação, e a articulação em torno da Assembleia Constituinte não é sequer mencionada. Surpreende negativamente a total ausência da figura de Ailton Krenak, que se notabilizou por sua potente fala na Constituinte, e o segundo plano a que são relegados a CPI do Índio, de 1968, e o Estatuto do Índio, de 1973. Mais uma vez, o que fica patente é a falta de clareza quanto às opções do autor a respeito de quais temas priorizar.
Toda obra tem lacunas, e uma com o porte e a ambição de Os fuzis e as flechas não poderia ser exceção. Se essas lacunas saltam aos olhos dos historiadores, de forma alguma desmerecem o esforço tremendo de Valente em reunir um corpo documental volumosíssimo e apresentá-lo em um texto muito bem escrito. Ao fim, em meio aos retrocessos de nossa década em relação aos direitos indígenas, o autor encontra espaço para a esperança, destacando os altos índices de natalidade dos povos indígenas e a resistência de suas culturas. Tanto em aldeias quanto nas cidades, muitos indígenas afirmaram que “preferem viver entre os seus, a despeito do preconceito, da marginalização e da incompreensão geral”, o que nos leva a perceber “um tipo de vitória, entre tantas derrotas”.
João Gabriel Ascenso – Doutorando em História Social da Cultura, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: jgascenso@gmail.com.
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O protagonismo indígena na história / Revista Brasileira de História / 2017
Durante os séculos XVI e XVII, professores das universidades do “quadrilátero da luz”, conhecidas como Escola Ibérica da Paz, produziram uma tratadística, expressão de uma consciência crítica, ao colocarem em causa a legitimidade do processo de conquista e colonização das Américas, desafiando os poderes imperial e papal, bem como propugnando o direito de resistência ativa contra a tirania. Em travessia atlântica, na Universitas do aquém-mar, cumprindo seu papel de Alma Mater como promotora seminal de conhecimento, professores e investigadores respondem aos desafios atuais propondo a reescrita dessa história com o foco nas formas de resistência dos povos indígenas.
A Revista Brasileira de História atendeu, precisamente, ao imperativo de repensar esse “protagonismo indígena” ao colocar o agenciamento dos sujeitos individuais ou coletivos em múltiplos cenários e diferentes dinâmicas ao longo da história. Essas releituras historiográficas evocam a atuação dos povos indígenas como epicentro de análise para a compreensão, explicação e construção de outras narrativas que manifestam formas criativas de resistência, composição de novas identidades, campos de saberes nativos, ressignificação de práticas e discursos, constituição e organização de movimentos, entre outros tópicos que vicejam na América Latina. Abarcando um largo espectro temporal e geográfico, o corpus do Dossiê atendeu a um amplo cenário, desde tempos imemoriais plasmados nos vestígios de cultura material à luta contemporânea pelo direito à terra.
No artigo “A atuação dos indígenas na História do Brasil: revisões historiográficas”, Maria Regina Celestino de Almeida contextualiza o importante debate acadêmico dos anos 1990 que provocou uma renovação teórico-metodológica na tessitura entre as histórias dos índios, as histórias regionais e a história do Brasil. Recorrendo a um amplo conjunto documental, apresenta um percurso sobre temas de investigação, com o estabelecimento de acordos e negociações entre o domínio português e indígenas, assegurado no sentido da vassalagem ao rei, dentro da lógica da economia do dom do Antigo Regime, que foi apropriado pelos indígenas no Rio de Janeiro para alcançarem seus próprios objetivos.
“As cachoeiras como bolsões de histórias dos grupos indígenas das terras baixas sul-americanas”, escrito em coautoria por Fernando Ozorio de Almeida e Thiago Kater, traz um viés arqueológico, numa articulação criativa, densa e interdisciplinar com a história, sobre o entorno de cachoeiras das terras baixas sul-americanas, tomadas como lugares para realização de rituais, que se constituíram como locus privilegiado de memórias partilhadas e percebido como espaço ancestral, sendo, portanto, um marco cultural da paisagem. Nesse sentido, o protagonismo das sociedades indígenas também se perscruta no horizonte geográfico.
“‘De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem’: uma história da mandioca em perspectiva atlântica”, de Jaime Rodrigues, trata de uma instigante e inédita abordagem sobre a produção nativa da mandioca e sua apropriação pelos europeus. O autor destaca que a domesticação, a produção e a disseminação desse conhecimento marcam a originalidade dos povos indígenas no estabelecimento desses saberes. Contraditoriamente, foi justamente o cultivo da mandioca que possibilitou o comércio atlântico e, por decorrência, a permanência no ultramar.
“A escrita política eo pensamento dos Guarani em tempos de autogoverno (c.1753)”, de Eduardo Santos Neumann e Capucine Boidin, propõe uma análise fecunda da dimensão política do protagonismo indígena no marco das discussões sobre a transmigração territorial das reduções jesuíticas que acabou por resultar na guerra guaranítica. Recorrendo a uma exegese minuciosa e crítica das fontes vertidas do original guarani, percebidas mediante o recurso à antropologia política e à análise semântica, os autores descortinam a frontalidade de algumas lideranças por meio da apropriação e instrumentalização da cultura escrita para defender os interesses de parte dos naturais, que se opunham às determinações de transmigração definidas pelo Tratado de Madri. Expressaram o grau de autonomia frente à ingerência jesuítica no sentido de resguardar o autogoverno guarani.
Hal Langfur, com “Canibalismo e a legitimidade da guerra justa na época da Independência”, contribui com uma arguta percepção sobre a dinâmica dos Botocudo frente à implementação da política indigenista encetada por d. João, em 1808, que foi conduzida pelos indígenas entre confrontos, recuos e, sobretudo, comprometimento estratégico com os invasores combatentes, levando à dispersão do conflito e favorecendo visões defensoras de políticas brandas de pacificação e de incorporação dos povos indígenas à sociedade dominante.
“Os índios do Ceará na Confederação do Equador”, de João Paulo Peixoto Costa, apresenta uma versão instigante da decisiva participação dos indígenas do Ceará nesse evento de 1824, tendo em conta seus próprios interesses, marcadamente a garantia da liberdade e do domínio sobre suas terras. Para o autor, a atuação das lideranças, subsumida nos relatos da historiografia tradicional, demonstra a importância estratégica de sua inserção no movimento rebelde, atentando, no entanto, para o fato de que assumiram posições ambivalentes e particulares.
“Passo Ruim 1868: as estratégias dos Xokleng nas fronteiras de seus territórios do alto rio Itajaí”, de autoria de Lúcio Tadeu Mota, analisa criteriosamente, a partir de um ataque dos indígenas, no Paraná, o complexo contexto de relações socioculturais na dinâmica de desterritorialização dos indígenas e suas estratégias para lidar com os invasores e expedições de contato.
“Presente de branco: a perspectiva indígena dos brindes da civilização (Amazônia, século XIX)”, de Márcio Couto Henrique, aborda os múltiplos sentidos dos “presentes”, uma das tópicas mais recorrentes no processo de “mediação” de contato com os naturais. Articulando a discussão na interface entre história e antropologia, o autor desconstrói, de forma engenhosa e muito perspicaz, a ideia da mera sujeição às estratégias da política indigenista. Ele desloca o argumento em direção aos recursos performáticos, apresentando um estudo de caso dos Munduruku, na Amazônia do século XIX, em que os “brindes” foram interpretados de forma distinta ao atribuírem outros sentidos e usos aos objetos.
Henyo Trindade Barretto Filho encerra o dossiê com “‘Protagonismo’ como Vulnerabilização em Demarcação de Terras Indígenas: o caso do acordo judicial para demarcar a terra Tapeba”, um polêmico e complexo debate sobre os recentes procedimentos referentes à demarcação dessa terra no município de Caucaia, zona metropolitana de Fortaleza (CE). O desfecho do acordo sugere o protagonismo dos Tapeba, quando, de fato, tratou-se de expediente escuso das agências do poder público para forçá-los a aceitarem os termos propostos (mesmo que em condições desfavoráveis) como possível solução para contornar a morosidade e os entraves para a demarcação definitiva da TI. O alegado “protagonismo” encobria, efetivamente, um longo processo de “vulnerabilização” dos indígenas a partir da “manipulação dirigida” dos agentes.
Com este Dossiê, os autores constroem “outras” narrativas, que provocam (e exigem) a reescrita da nossa própria história, na qual a atuação dos povos indígenas é tomada na urdidura desse processo. Ao refletirem sobre o longo processo de conquista (ainda em pleno “curso”), atualizam a indagação incisiva e nada retórica de Domingo de Soto: “Com que direito retemos o império ultramarino?”. Hoje, bem sabemos! São tempos reeditados de violações dos direitos dos povos indígenas assegurados pela Constituição de 1988; da destruição da paisagem e do ecossistema, com a devastação de florestas e a ruína de rios pelas mineradoras e pelo agronegócio; criminalização de professores, historidores, antropólogos, missionários, lideranças indígenas, funcionários da Funai e do Incra, integrantes de ONGs; da expulsão covarde dos territórios, despejo compulsório e massacres bárbaros alimentados pela impunidade dos brutais agressores, entre outras expressões da “banilização do mal” assistida pelo Estado brasileiro – que espera-se seja responsabilizado em nome da devida e proporcional reparação (se é que possível) pelos sacrifícios inomináveis dos povos originários. Até esse porvir, lamentavelmente, o apelo atemporal de Francisco de Vitória ainda ecoará retumbante nestes tristes trópicos: “Não é lobo o homem para o homem, senão homem!”.
Maria Leônia Chaves de Resende – Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), Investigadora no CHAM / Universidade Nova de Lisboa (Marie Curie Actions – International Fellowships), Pesquisadora do CNPq e da Fapemig. São João del-Rei, MG, Brasil. E-mail: leoniachaves@gmail.com
RESENDE, Maria Leônia Chaves de. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.75, mai. / ago., 2017. Acessar publicação original [DR]
Mitos Papais: política e imaginação na história – RUST (RBH)
RUST, Leandro Duarte. Mitos Papais: política e imaginação na história. Petrópolis: Vozes, 2015. 248p. Resenha de: BOVO, Claudia Regina. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.37, n.74, jan./abr. 2017.
Eis uma obra provocativa. Essa é a primeira constatação sobre Mitos Papais, trabalho que articula a análise histórico-historiográfica do poder pontifício com suas interpretações “mitológicas”, intepretações estas que ainda sustentam calorosos debates sobre qual deve ser o papel político do papado. Ah, a política! Sim, mais uma vez a política. Essa arte da negociação, área tão negativamente avaliada nos nossos dias, é o campo sobre o qual Leandro Duarte Rust se debruça para trazer a um público não acadêmico a construção histórica dos mitos em torno da atuação papal. A abertura do texto já marca o tom desafiador da proposta: “Mito ou realidade?”. Ao superar a dicotomia rasa que definiu vulgarmente o mito e as mitologias como a falsificação do real, Rust marca a abertura do seu texto reconhecendo outro modo de defini-los. Inspirado por Joseph Campbell, para quem a mitologia soava como poesia, Rust define os mitos como meio de se conhecer as relações políticas, forma de interpretar a política e também como maneira de expressá-la.
Essas experiências de significado são, nada mais nada menos, do que pistas para descortinar as potencialidades humanas, rastros da experiência humana no tempo, algo que se aplica ao que somos e explica como somos. Não há lugar para invenção, não há lugar para a desrazão, os mitos nos envolvem porque são um mecanismo de interpretação da experiência humana. Portanto, a ideia do livro não é simplesmente desconstruí-los, mas aprender com eles. Tirar deles o conhecimento que nos qualifica enquanto seres políticos. É importante reiterar que o objeto de análise aqui não está restrito ao papado, mas é extensivo à política e às suas diversas formas de negociação, conflito e acordo. Os Mitos Papais não poderiam ser melhor substância para exemplificar o exercício de análise proposto.
Com narrativa envolvente e cadenciada, o livro apresenta cinco mitos que ajudaram a estabelecer e a manter o papado romano no centro dos debates políticos da Contemporaneidade. Chamamos de contemporânea a leitura sobre a experiência política pontifícia do final do século XIX até os dias atuais. Desde a busca pela ossada de seu fundador – Pedro – ao silêncio pontifical durante o genocídio judaico promovido pelos nazistas, os mitos escolhidos por Leandro Rust aguçam a curiosidade de qualquer leitor ávido por história e, principalmente, ensinam como a historização das narrativas pode ajudar a instrumentalizar as consciências históricas contemporâneas. Um caminho investigativo que ajuda a nos aventurarmos pela complexidade das experiências históricas papais.
Interessado em aprender com os mitos, com a leitura histórica que eles fomentam, Leandro Rust trata no primeiro capítulo da empresa incentivada pelo papa Pio XII para encontrar, sob o solo da basílica de São João de Latrão, os restos mortais do apóstolo Pedro. Rust se pergunta “por que, a certa altura da vida contemporânea, a tradição religiosa deixou de saciar a certeza a respeito da realidade histórica do fundador da Igreja Romana?” (p.67). Em outras palavras, por que justamente durante os conturbados anos da década de 1940 houve o impulso a essa saga arqueológica para provar a existência das relíquias e da tumba de Pedro? A resposta segue esta lógica: só o discurso de fé não era mais suficiente. Era preciso uma prova material, com atestado científico, para legitimar a saga fundadora de Pedro. A narrativa do autor nos leva a atestar o papel dos mitos na política e a condição indelével do apelo à renovação cristã – Renovatio Christiana.
A saga lançada por Pio XII em busca da tumba de Pedro atuou como remédio para as políticas de secularização que havia algumas décadas esvaziavam as fileiras dos bancos católicos, resultando na atualização do discurso católico às demandas racionais da modernidade. Por meio da verificação científica de sua materialidade santa – o encontro com a tumba de Pedro – o catolicismo demonstrava sua base inequívoca. Conforme apresenta o autor, “o reencontro com o primeiro papa seria a prova de que o Vaticano tinha saída para superar os abismos que os homens cavam entre si e uni-los em uma harmonia palpável. Poucas instituições poderiam oferecer uma resposta tão contundente para populações mergulhadas em traumas e incertezas” (p.72).
Não é por acaso que o mesmo Pio XII que abre com destaque os Mitos Papais seja o mesmo personagem discutido no último capítulo do livro. Visto por alguns como o estandarte da modernização da Igreja Apostólica Romana e por outros como o “papa de Hitler”, a disputa pela memória coletiva de sua atuação pontifícia ainda está aberta. Santo dos católicos e algoz dos semitas, essa emblemática dicotomia sobrevive como mitos políticos de uma mesma experiência humana. Herói e vilão são interpretações conflitantes que figuram lado a lado quando se fala sobre a atuação política do papa Pio XII. Daí nossa insistência em definir a proposta deste livro como provocativa e desafiadora. Como demostra Rust, a luta pela memória a ser preservada sobre Pio XII tem início logo depois de sua morte. De peça de teatro que o ridicularizava ao boom literário dos anos 1990 que ora o criticou ora o valorizou, Pio XII representa o fardo dos Mitos Políticos. Ao mesmo tempo que se opõem, ambas versões se complementam. Dito de outra forma, ambas versões são expressões do modo de se pensar e se fazer política contemporaneamente, elas estão embasadas na premissa da divisão dicotômica das disputas políticas, da divisão partidária da vida social. Aventurar-se por esses mitos que envolvem a figura de Pio XII é ter a mais clara exposição das nossas relações políticas e de como não estamos alheios a elas.
Em tempos de impeachment, de estandartes e histerias coletivas que atribuem à política as mazelas do mundo, o mito aparece como meio de descortinar nossas práticas políticas, de compreendê-las. Enquanto meio de interpretação legítimo para conhecer as relações políticas o mito tira do senso comum, ou melhor, devolve a ele a necessidade de avaliação constante das expressões narrativas com as quais compactuamos, dessas razões práticas às quais, enquanto grupos sociais, recorremos “para justificar e legitimar nossos interesses”. Sim, nós fazemos isso; conscientemente ou não, fazemos.
Portanto, como bem advoga Rust, o mito político não é uma inverdade, mas uma narrativa que idealiza o passado para legitimar ou desacreditar um regime de poder. Uma chave de leitura do mundo que nos orienta a tomar posicionamentos – políticos, por sinal – nas disputas pelo poder. Cientes do que a leitura deste livro pode provocar, é preciso reconhecer: não há melhor maneira de escancarar a utilidade do conhecimento histórico e político. Ainda mais em tempos nos quais se dão amplas discussões da política pública educacional, cujo cerne é a ideia já batida de renovação: a Base Nacional Curricular Comum, a Base Comum para Formação Docente, a PEC da Escola sem Partido, a Medida Provisória do Ensino Médio. Nesse sentido, o livro de Leandro Duarte Rust nos desafia a olhar para dentro de nós mesmos, para aquilo que usamos como definição das coisas, e nos força a reavaliar, a reconhecer a historicidade de nossas razões práticas. A História, a Política, o Papado e a Idade Média não soam como perfumaria curricular. Pelo contrário, desses imaginários diversos, dessas mitologias pseudodespretensiosas, retiramos muitas interpretações que ainda respondem aos nossos interesses mais vorazes. Contextualizá-las ainda se faz necessário. Falar sobre elas é mais urgente do que nunca!
Claudia Regina Bovo – Departamento de História, Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Uberaba, MG, Brasil. E-mail: claudia@historia.uftm.edu.br.
[IF]Trabalhadores dos trilhos: imigrantes e nacionais livres, libertos e escravos na construção da primeira ferrovia baiana (1858-1863) – SOUZA (RBH)
SOUZA, Robério S. Trabalhadores dos trilhos: imigrantes e nacionais livres, libertos e escravos na construção da primeira ferrovia baiana (1858-1863). Campinas: Ed. Unicamp, 2016. 272p. Resenha de: VITO, Christian G. de. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.74, jan./abr. 2017.
Há muito tempo a história do trabalho é escrita exclusivamente sob as perspectivas do trabalho assalariado, da “proletarização” (ou mudança para o trabalho assalariado) e das organizações de trabalhadores assalariados. Enquanto esses aspectos têm sido confundidos com “modernidade” e com o surgimento e expansão do capitalismo, a escravidão e outras relações de trabalho forçado têm sido marginalizadas como “atrasadas” e não-capitalistas. Neste livro convincente e bem escrito, Robério S. Souza subverte essas abordagens tradicionais e mostra uma história do trabalho mais inclusiva, baseada em novas conceituações. O autor aborda a construção da ferrovia Bahia and San Francisco Railway no período de 1858 a 1863, mas em vez de vê-la como um símbolo da modernidade tecnológica, de investimentos estrangeiros “progressistas” e do trabalho livre, ele aponta para a compatibilidade do capitalismo com o trabalho forçado, indica múltiplas imbricações entre o capital britânico e os universos da escravidão, e destaca a presença de escravos na força de trabalho, contrariando os regulamentos da legislação imperial de 1852. Da mesma forma, o autor aborda os trabalhadores migrantes europeus – especialmente os “italianos” -, mas, em vez de corroborar a narrativa padrão de que eles seriam vetores de mão de obra livre qualificada, traz à baila a precariedade de sua liberdade e a compara com a dos “nacionais livres” e com as condições dos escravizados. Em termos mais gerais, Souza insiste na complexidade da composição da força de trabalho, em vez de buscar os trabalhadores assalariados ideais típicos dentro dela: dessa perspectiva, ele consegue abordar as relações concretas entre os trabalhadores permeando as condições legais e as relações de trabalho e apontando para as suas experiências e momentos de solidariedade compartilhados, bem como os conflitos que surgiram entre eles.
Esses argumentos fundamentais são brilhantemente apresentados na introdução, a estrutura do livro é bem projetada e o estilo mescla bem panoramas quantitativos precisos, momentos de reflexão e descrições detalhadas de eventos e biografias individuais. Os três primeiros capítulos informam o leitor sobre o mundo dos “senhores dos trilhos” e sua conexão com a economia escravista da província da Bahia (cap. 1), esboçam a “demografia social” da força de trabalho da ferrovia (cap. 2) e, em seguida, abordam a reconstrução da materialidade das tarefas, incluindo detalhes das obras em cada uma das cinco seções diferentes em que o canteiro de obras foi dividido (cap. 3). Os dois últimos capítulos focalizam, em detalhe, a agência e as experiências dos trabalhadores. O Capítulo 4 centra-se naqueles que migraram para o Brasil provenientes do Reino da Sardenha, descreve a greve que organizaram em 1859 e discute suas conexões mais amplas com as mobilizações de outros trabalhadores (incluindo os escravos) e as práticas de repressão e controle social implementadas pelas autoridades. O capítulo 5 examina de perto a multidão aparentemente desconexa e desordenada que compunha a força de trabalho e aborda as “lógicas internas que forjaram ou dificultaram a experiência e o processo de conformação de identidades” (p.34-35). Acompanhando o texto, um mapa histórico permite visualizar os territórios atravessados pela ferrovia (p.116), e 19 belas fotografias históricas – a maioria delas da Coleção Vignoles do Instituto de Engenheiros Civis de Londres – fazem que os trabalhadores, as localidades e as obras adquiram concretude para os leitores. De fato, em vez de serem apenas um suporte visual passivo, especialmente no capítulo 3, as fotografias são diretamente integradas e discutidas no texto. A maior parte das fontes primárias é extraída de várias seções do Arquivo Público do Estado da Bahia (Apeb) e inclui a correspondência entre várias autoridades, listas de passageiros que entraram no porto da Bahia e documentos produzidos pela polícia e pelas autoridades portuárias que se revelaram fundamentais para a compreensão tanto da dinâmica do controle social quanto da vida dos trabalhadores como indivíduos.
Como seu livro anterior sobre os emaranhados das relações de trabalho na Bahia no período imediatamente seguinte à abolição da escravidão, este trabalho mais recente de Souza está profundamente inserido na nova e revolucionária historiografia brasileira sobre o trabalho.1 O autor reconhece especialmente a sua dívida intelectual às obras de Sidney Chalhoub e Henrique Espada Lima (p.30). Ainda assim, precisamente por causa da qualidade deste livro, poder-se-ia esperar também um diálogo mais amplo do autor com as obras internacionais que abordam contextos comparáveis e questões relacionadas. Esse diálogo poderia ter fortalecido a sua interpretação em vários pontos e, simultaneamente, realçado o impacto deste volume para uma comunidade acadêmica maior. Por exemplo, os estudos sobre a força de trabalho igualmente complexa, mas montada de forma diferente, empregada na construção das ferrovias cubanas antes da abolição da escravidão na ilha caribenha (1880) poderiam ter fornecido referências comparativas úteis sobre a questão-chave da conexão entre liberdade e não-liberdade.2 Ao mesmo tempo, o livro de Souza é um complemento significativo às investigações recentes na História do Trabalho nos transportes, com as quais ele compartilha a crítica aos “binários padronizados entre coerção e liberdade” e para as quais contribui indiretamente expandindo o foco do “trabalho no transporte” para o trabalho que construiu as infraestruturas do transporte.3 A obra é também uma contribuição preciosa para a renovação da história da migração italiana do século XIX e início do século XX, para além das limitações dos estudos tradicionais que tendem a ver os trabalhadores italianos isolados do resto da força de trabalho e, particularmente, fora do trabalho forçado. Por sua vez, a nova abordagem acadêmica sobre a diáspora italiana, com a consciência da importância das conexões translocais e da pesquisa arquivística em múltiplos locais, poderia ter respaldado a sugestão de Souza sobre a relação entre as demandas dos trabalhadores sardos no Brasil e a turbulência política na Itália às vésperas da unificação nacional (p.188-190).4
Em um nível diferente, o argumento central do autor sobre a compatibilidade entre o capitalismo e o trabalho não-livre ecoa, entre outras, as descobertas do estudo pioneiro de Alex Lichtenstein sobre a economia política do trabalho de prisioneiros no período pós-emancipação do Sul dos Estados Unidos e as de um recente volume sobre trabalho forçado após a escravidão, organizado por Marcel van der Linden e Magaly Rodríguez García.5 De maneira mais geral, o argumento de Souza sobre as fronteiras fluidas entre liberdade e não-liberdade coincide com a questão-chave do longo debate sobre o trabalho livre e não-livre e também está alinhado com a reconceituação da classe operária proposta pelos estudiosos da História Global do trabalho, apontando para a necessidade de ir além do foco padrão sobre o trabalho assalariado, passando a estudar todos os tipos de relações trabalhistas que foram imbricadas no processo de mercantilização do trabalho.6 Finalmente, e de forma semelhante a outras obras brasileiras sobre a história do trabalho, os capítulos 4 e 5, em especial, mostram a importância do estudo simultâneo das relações de trabalho e da agência e organização dos trabalhadores – uma combinação que tem sido particularmente rara na História Global do trabalho até agora. De fato, a adoção do conceito de “experiência” – explicitamente tomado de empréstimo a E. P. Thompson – fornece a Souza uma ferramenta para adentrar a questão da formação contraditória da identidade de classe entre os trabalhadores que estavam “juntos, mas não misturados” (p.237) e, assim, frequentemente presos entre a unidade e a divisão em fronteiras nacionais, étnicas e legais.
Essas imbricações entre o trabalho de Souza e a historiografia do trabalho mais ampla ressaltam seu potencial para intervir em debates ainda maiores, beneficiando-se dela, ao mesmo tempo, em alguns pontos interpretativos. De modo algum essas observações críticas ofuscam os méritos deste livro. Na realidade, este volume é um daqueles preciosos estudos empíricos que podem inspirar e moldar pesquisas em outros locais e épocas, para além do seu tópico específico e do seu escopo cronológico. Por essa razão, traduções múltiplas deste livro são altamente desejáveis.
Referências
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Notas
1 SOUZA, 2011. Ver esp.: CHALHOUB, 1990; LIMA, 2005; CHALHOUB, 2012; FORTES et al., 2013.
2Por exemplo: OOSTINDIE, 1984; FADRAGAS, 1998.
3 BELLUCCI et al., 2014. Citação da Introdução dos editores, p.5.
5 LICHTENSTEIN, 1996; LINDEN; RODRÍGUEZ GARCÍA, 2016.
6 BRASS; LINDEN, 1997; LINDEN, 2010.
Christian G. de. Vito – Research Associate, University of Leicester; Lecturer, Utrecht University. Utrecht University, Department of History and Art History. Utrecht, The Netherlands. E-mail: c.g.devito@uu.nl.
[IF]Terra Negra: o Holocausto como história e advertência – SNYDER (RBH)
SNYDER, Timothy. Terra Negra: o Holocausto como história e advertência. Garschagen, Donaldson M.; Guerra, Renata. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. 488p. Resenha de: BERTONHA, João Fábio. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.37, n.74, jan./abr. 2017.
O livro de Snyder (Black Earth no original) é mais um representante da vertente historiográfica que procura compreender o genocídio dos judeus por parte da Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial por meio de uma visão cultural e de história das ideias, no limite de uma abordagem antropológica. A proposta é a de compreender o acontecido com base no mundo das ideias e mitologias dos próprios nazistas, daquilo que eles imaginavam estar fazendo, suas motivações e preconceitos.
Na sua avaliação, o mundo mental nazista estava intimamente ligado à ecologia e a uma visão radical do darwinismo social. As raças humanas estavam numa guerra total pela sobrevivência num mundo em que os recursos – especialmente, a terra, fonte dos alimentos – eram escassos. Quaisquer sentimentos ou solidariedade deviam ser esquecidos, pois a competição sem limites era uma lei da natureza e só os mais fortes e impiedosos sobreviveriam. Hitler, nesse sentido, teria rompido radicalmente com a tradição humanista que afirmava que os homens são diferentes dos animais e da natureza por serem capazes de imaginar e criar novas formas de associação além da concorrência e da disputa.
O darwinismo social, em suas várias formas, foi uma constante no pensamento político e social do século XIX, atingindo, por exemplo, os liberais e até mesmo alguns socialistas. O nazismo, contudo, o levou ao limite, pois a luta implacável contra os inimigos passou a ser vista como um fim em si mesmo, aquilo que dava sentido à vida. Sobreviver num mundo ecologicamente limitado seria para os fortes e apenas para eles.
Essa era a realidade histórica e natural, a qual teria sido escondida pelos judeus. Esses eram uma não-raça, incapaz de competir honesta e violentamente pela sobrevivência. Dessa forma, eles teriam trabalhado nas sombras para criar conceitos e perspectivas (o cristianismo, o humanismo, o socialismo etc.) que escondiam a realidade e enganavam os homens com a ilusão de que podiam se separar das duras leis naturais. Todos os princípios morais e éticos existentes serviriam apenas para impedir que os superiores dominassem os inferiores, como era devido. Eliminar os judeus significaria recolocar a humanidade dentro da ordem natural, o que seria o desígnio de Deus.
No contexto pós-1918, os fatos pareciam indicar a realidade da mitologia. Os alemães, a raça superior, só haviam sido derrotados por causa da força dos ideais humanistas e universalistas judeus. Num novo conflito, no qual os alemães novamente exerceriam seu direito de conquista dos outros, os judeus também deveriam ser exterminados, para garantir que a Alemanha vencesse e que as leis naturais voltassem a dominar a Terra. Sem os ideais do judaísmo, as Nações estariam livres para a guerra total de todos contra todos e, nessa luta, a vitória germânica seria inevitável.
A hipótese de Snyder é, com certeza, muito interessante, pois só entendendo o mundo mental nazista, seus preconceitos e imagens, é que podemos compreender o massacre sistemático de milhões de pessoas sem razões militares, econômicas ou de segurança que as explicassem.
O foco do autor no mundo mental e mitológico, contudo, o faz superestimar esses aspectos e congelá-los no tempo. A proposta de eliminar todos os judeus da face da Terra por motivos ecológicos ou metafísicos pode ter se consolidado e ter força explicativa, por exemplo, após 1939, quando a guerra e a conquista da Polônia e de parte da União Soviética amplificaram o “problema judeu” nas mentes nazistas. Para o período anterior, apesar do antissemitismo evidente, a perspectiva era de forçar a emigração dos judeus ou de excluí-los da vida alemã, e não de eliminá-los até o último homem.
Do mesmo modo, seu foco na mitologia e no discurso faz Snyder esquecer o mundo real por trás dele. O autor menciona, por exemplo, que o pensamento nazista era circular e tão fechado que não aceitava a hipótese de que a ciência poderia mudar o meio ambiente e fornecer alimentos a todos. Para ele, aceitar essa hipótese significaria admitir que haveria alternativas para a luta sem tréguas por terras aráveis e, portanto, ela seria descartada de imediato.
Isso não é automaticamente incorreto em linhas gerais. No entanto, não apenas o regime não era tão avesso aos avanços da ciência agronômica como Snyder sugere, como ele esquece que a questão ia muito além do abastecimento alimentar. O imperialismo alemão, desde o fim do século XIX, procurava não apenas fontes de alimentos, mas também as matérias-primas necessárias para manter seu capitalismo industrial. Uma revolução no campo poderia fornecer os alimentos para sustentar os alemães, mas não o ferro, o petróleo e outros produtos necessários para esse capitalismo. A Alemanha ocidental pós-1945 resolveu isso se incorporando ao sistema global montado pelos Estados Unidos.
Já no mundo de Hitler, apenas a invasão da União Soviética daria conta do problema, e a bandeira da sobrevivência alimentar (apesar da sua importância crucial, especialmente depois da trágica experiência do bloqueio naval britânico na Primeira Guerra Mundial) também foi, em boa medida, apenas isso, um discurso para sustentar interesses muito maiores. O mesmo se poderia dizer do mito bolchevique-judaico, que era visto como real, determinou políticas e engendrou massacres, mas que também era uma cobertura para os interesses imperialistas alemães no Leste europeu, os quais já existiam no século XIX e mesmo antes, quando o comunismo ainda não era uma questão. O foco no discursivo, no mental, nos impede de ter essa consciência de que o material e o ideológico se associam e se articulam.
Um ponto interessante no livro é o estudo da política de vários Estados do Leste europeu – como a Polônia – no período entre as duas guerras mundiais, o que é pouco conhecido no Brasil. Sua hipótese de que a Polônia poderia ter sido uma aliada de Hitler em nome do anticomunismo e do antissemitismo é pouco crível, dado que os poloneses eram alvo privilegiado do racismo nazista. Mesmo assim, sua exposição das facetas e dos meandros do relacionamento entre Varsóvia e Berlim é de muita utilidade para o leitor.
Outro aspecto relevante na obra é o destaque que dá à ausência do Estado como algo fundamental para sustentar ações genocidas ou de extrema violência por parte dos nazistas. Na Alemanha já haviam sido criados, na sua percepção, áreas sem Estado, onde o partido e as SS (Schutzstaffel) tinham carta branca para agir, como os campos de concentração. Do mesmo modo, privar os judeus alemães da sua cidadania, ou seja, da proteção do Estado, tinha sido um pré-requisito para acelerar a perseguição a eles.
No Leste europeu, isso teria ido além, com a destruição total de Estados e a criação de áreas onde as SS e o NSDAP (Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei) podiam agir sem freios. Para tanto, teria sido fundamental a atuação prévia da União Soviética. Ao ocupar a Polônia e os países bálticos e destruir os seus Estados, isso teria facilitado a tarefa de Hitler e o próprio genocídio dos judeus.
A proposta – que o autor defende à exaustão, até cansar o leitor – de que a destruição de um Estado e a privação dos direitos de cidadania a seus habitantes facilitavam a adoção de políticas radicais é bastante lógica. Do mesmo modo, pode-se aceitar a ideia de que o terror estalinista facilitou a conquista e a submissão de boa parte do Leste europeu pela Alemanha. O que incomoda é a facilidade com que Snyder acaba vendo intenções explícitas onde, provavelmente, houve apenas contingências. Chega a afirmar (p.141) que, quando Hitler assinou o Pacto Germano-soviético, já tinha consciência plena de que os comunistas eram especialistas na destruição de Estados e que, anos depois, ele se aproveitaria daquele trabalho. De forma implícita ou explícita, Snyder acaba por atribuir à União Soviética um papel ativo e direto na formatação do Holocausto, o que é, no mínimo, questionável. Stalin cometeu inúmeros crimes e, de forma indireta, pode ter colaborado para o horror nazista, mas não da forma direta (e anacrônica) apresentada pelo autor.
Uma das novidades do presente livro frente a outros que seguem uma abordagem teórica semelhante é seu esforço em retirar, da experiência histórica, elementos que nos permitam refletir sobre o nosso momento. A visão de mundo de Hitler e do nazismo se tornou realidade num contexto específico, que não se repetirá, mas algo semelhante pode ocorrer e o livro é, em boa medida, uma advertência nesse sentido.
Para o autor, o mundo atual, globalizado, coloca a maioria das pessoas frente a contingências planetárias que elas não têm condições de compreender. Isso oferece o risco de elas aceitarem um diagnóstico simplista que explica o mundo com base em uma chave conspiratória, de desastre ecológico ou de outro tipo iminente. Num momento em que o populismo de direita está a se fortalecer com essas bandeiras, sua advertência se torna bastante atual.
Também muito relevante a sua advertência – dirigida essencialmente ao público norte-americano, mas que pode servir a todos – de que há uma falta de entendimento sobre a relação entre a autoridade do Estado e o assassinato em massa. Ao contrário da crença liberal, Snyder propõe – em sintonia com a proposta do livro – que é a ausência ou enfraquecimento do Estado que abre as portas para os massacres e a perda da liberdade, não o contrário. Um Estado sem freios é uma ditadura que tolhe liberdades, mas a ausência total do Estado é simplesmente barbárie.
Snyder indica, aliás, como a competição desenfreada do neoliberalismo se aproximaria do nazismo, sendo impressionantes as similaridades entre Hitler a Ayn Rand, uma das teóricas neoliberais: só a competição importa, e tudo o que a cerceia deve ser eliminado. Na minha visão, isso apenas indica a conexão entre nazismo e neoliberalismo dentro do campo da direita e sua valorização da competição e da hierarquia.
É possível pensar que esse caráter militante, de advertência moral, diminuiu o valor historiográfico do trabalho. Não é o caso, especialmente no mundo atual, no qual advertências como essas são mais do que bem-vindas. O livro tem problemas metodológicos e é tão focado nos aspectos mentais e mitológicos do nazismo que acaba por perder de vista o mundo material onde esses aspectos existiam. Mesmo assim, sua contribuição para a historiografia e a advertência moral que carrega fazem dele um livro que vale a pena ser lido.
João Fábio Bertonha – Universidade Estadual de Maringá (UEM). Maringá, PR, Brasil. E-mail: fabiobertonha@hotmail.com.
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Letra de índios: cultura escrita, comunicação e memória indígena nas Reduções do Paraguai – NEUMANN (RBH)
NEUMANN, Eduardo. Letra de índios: cultura escrita, comunicação e memória indígena nas Reduções do Paraguai. São Bernardo do Campo: Nhanduti, 2015. 240p. Resenha de: FELIPPE, Guilherme Galhegos. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.
Os estudos sobre a experiência missionária vivenciada por indígenas e catequizadores na região da Bacia do Rio da Prata colonial beneficiam-se da profícua produção textual que acompanhou toda a época da empresa missional. A grande quantidade de registros, apesar de marcada pela diversidade e riqueza de informações contidas em relatos, é caracterizada por ser predominantemente uma escrita produzida pelos estrangeiros. A escrita, para os membros da Companhia de Jesus, era prática de obediência às determinações da Ordem – que remontavam às Constituições de Inácio de Loyola – e ratificação da hierarquia que determinava a eficácia da circulação da correspondência e, consequentemente, das informações merecedoras de serem compartilhadas, a fim de estabelecer a união dos seus membros (Arnaut; Ruckstadter, 2002, p.108).
A escrita epistolar jesuítica, essa “laboriosa persistência na missão” (Hansen, 1995, p.99), garantia a contínua construção da retórica da evangelização do selvagem americano por meio do discurso edificante: escrever não era apenas registrar para manter a comunicação; era, também, justificar a conversão. O trabalho catequético, no cotidiano do meio reducional, implicava aos missionários uma aproximação com os indígenas que deveria ir além do ensino diário de bons comportamentos e das genuflexões nas missas. Os membros da Companhia de Jesus destacaram-se dos missionários de outras Ordens pela imersão que realizaram no contato e convívio com os índios reduzidos por meio da linguagem. A conversão, souberam desde o início, só seria uma possibilidade se os obstáculos da língua fossem superados com o desenvolvimento de meios materiais e simbólicos pelos quais os nativos se incorporassem às relações coloniais por seus próprios termos (Montero, 2006, p.41). Em dois movimentos vetoriais aparentemente contraditórios, os jesuítas aprenderam a língua dos índios para depois ensiná-los a escrevê-la (Agnolin, 2007, p.293).
O domínio da escrita foi, pode-se arriscar, o maior legado que os jesuítas deixaram aos Guarani na época das missões platinas. Contudo, isso não quer dizer que houve uma simples transmissão de conhecimento, em que o indígena, receptor passivo, tenha adquirido os manejos de uma tecnologia da qual não dava conta a não ser no âmbito da repetição e da cópia. É o que Eduardo Neumann procura demonstrar em seu livro Letra de Índios: os Guarani não só aprenderam a escrever – em espanhol e em sua língua nativa -, como, também, apropriaram-se dos métodos, técnicas e funcionalidades que a escrita possibilita para adaptarem-na às suas necessidades.
Publicado pela Nhanduti – editora especializada em estudos indígenas -, o livro de Eduardo Neumann apresenta a sua pesquisa realizada no Doutorado em História Social pela UFRJ, defendida em 2005. Em exaustiva pesquisa em arquivos do Brasil, da Argentina, do Paraguai, de Portugal e da Espanha, o autor coletou dados empíricos que lhe forneceram evidências suficientes para compreender “como os guaranis reorganizaram suas atitudes e seus costumes diante das novas demandas e desafios da sociedade colonial” (Neumann, 2015, p.30).
Para isso, o autor desconstruiu duas considerações que por muito tempo foram tomadas como dados irrefutáveis da história das reduções jesuítico-guaranis: que os poucos indígenas que tiveram acesso ao papel e à pena só haviam conseguido exercer a função de copistas, anulando-se, assim, qualquer possibilidade de uma atuação deliberativa por parte dos índios; e, em decorrência disso, que os missionários foram os únicos a produzirem registros que poderiam ser usados como fontes de pesquisa sobre as Missões. A documentação cotejada por Eduardo Neumann comprova não apenas uma intensa e contínua produção textual realizada pelos indígenas durante o período tardio das missões platinas (segunda metade do século XVIII), como, também, uma importante atuação no que competia aos trâmites internos da administração e da burocracia das reduções, principalmente naquilo que cabia às responsabilidades do Cabildo.
A partir disso, o autor ressalta que quase toda a produção escrita pelos indígenas foi produzida, fundamentalmente, por uma elite missioneira composta por membros que ocupavam cargos administrativos. Isto é, o ensino da escrita foi uma atividade restrita àqueles indígenas cuja apreciação, por parte dos missionários, posicionava-os em um grupo seleto, com prestígio e responsabilidades específicas. Escrever possibilitou a essa elite destacar-se dentro das reduções, principalmente para atuar na organização e definições dos expedientes da administração local, mas, também, “adquirindo competências e habilidades que os credenciam como mediadores e protagonistas nesse novo mundo letrado” (Neumann, 2015, p.53).
O acesso à escrita permitiu aos índios a produção de uma variedade de obras, dentre as quais o autor destaca as memórias, as atas administrativas, os vocabulários, as gramáticas e uma importante participação na elaboração de textos devocionais – sem contar os inúmeros bilhetes e cartas, escritos em guarani ou espanhol (algumas vezes, nas duas línguas), que as lideranças indígenas fizeram circular entre si, diminuindo as distâncias entre as reduções e dinamizando a comunicação oficial com as autoridades. Esse intenso trânsito epistolar demonstra “o quanto os guaranis não eram passivos, e como atuavam a partir de dinâmicas emanadas da interação com a sociedade colonial” (Neumann, 2015, p.90).
O livro, dividido em cinco capítulos, inicia apresentando o problema do contato linguístico, em que os jesuítas, que pretendiam fundar as reduções na Bacia do Rio da Prata, buscaram normatizar a língua guarani por meio de uma “redução gramatical” (Neumann, 2015, p.49). Ao definir a escrita como um instrumento a serviço da conversão, os esforços dos missionários voltaram-se para traduzir os signos linguísticos do Guarani a fim de torná-lo o idioma oficial da sociedade missioneira. Como consequência imediata, os índios apropriaram-se da escrita sem, com isso, inferiorizar a importância da oralidade enquanto tradição coletiva. Apesar disso, escrever não foi uma tarefa difundida entre todos os Guarani, restringindo-se apenas à elite que ocupava cargos administrativos nas reduções.
Assim, o Cabildo é descrito como espaço de atuação dos índios que possuíam a habilidade da escrita. A instrução escolar era oferecida a um seleto grupo de meninos e homens nos quais os jesuítas depositavam a expectativa de virem a ser colaboradores no funcionamento e bom andamento da redução. Não demorou muito para que os índios alfabetizados passassem a ter autonomia no envio de correspondências e, por isso, revelassem seu engajamento às causas que lhes eram pertinentes. Exemplo disso foi a época da assinatura do Tratado de Madri, em 1750, e a consequente Guerra Guaranítica. Não só os conflitos armados e as diferenças ideológicas potencializaram a troca de correspondência, como o próprio fato de a aliança entre os jesuítas e as lideranças indígenas ter se enfraquecido em razão das desavenças no que competia à administração das reduções: “a escrita, nesse momento, conferia uma identidade comum no modo de fazer política por parte dos índios rebelados, ao expressarem suas insatisfações com os acontecimentos em curso” (Neumann, 2015, p.125).
Se, por um lado, o uso da escrita esteve reservado a um grupo restrito de índios, por outro, o formato dessa escrita não ficou preso às demandas da burocracia missioneira. Fica evidente que “qualquer novo sistema de escrita constitui-se e é reformulado na dependência de fatores que, além de serem de natureza ‘técnica’ ou ‘científica’, são políticos, ativos ou reativos” (Franchetto, 2008, p.32). Ainda que grande parte dos textos escritos pelos índios fosse de cunho administrativo, os indígenas letrados escreveram memoriais e diários que se tornam fontes para “avaliar os modos pelos quais os índios percebiam os acontecimentos e o seu interesse em estabelecer um registro dos mesmos” (Neumann, 2015, p.144).
Com a expulsão dos jesuítas do território da América espanhola, em 1767, a instalação de uma administração laica nas reduções alterou consideravelmente a forma como a elite indígena passou a se comportar frente à gestão reducional. O novo contexto retirou as reduções e suas lideranças do isolamento político, elevando o grau de relação que os indígenas instruídos passaram a manter com as autoridades coloniais, refletindo-se em um aumento da correspondência trocada – até mesmo em um maior número de cartas bilíngues. Ainda assim, mesmo que a expressão escrita tenha sido fundamental para que as lideranças pudessem deixar registradas as suas opiniões e descontentamentos em relação à nova ordem administrativa, não houve uma disseminação do aprendizado da escrita entre os índios, mantendo-se restrita a uma elite que escrevia entre si, mas assinava por todos.
Referências
AGNOLIN, Adone. Jesuítas e Selvagens: a negociação da fé no encontro catequético-ritual americano-tupi (século XVI-XVII). São Paulo: Humanitas, 2007. [ Links ]
ARNAUT, Cézar; RUCKSTADTER, Flávio M. Martins. Estrutura e organização das Constituições dos jesuítas (1539-1540). Acta Scientiarum, v.24, n.1, p.103-113, 2002. [ Links ]
FRANCHETTO, Bruna. A guerra dos alfabetos: os povos indígenas na fronteira entre o oral e o escrito. Mana, v.14, n.1, p.31-59, 2008. [ Links ]
HANSEN, João Adolfo. O Nu e a Luz: Cartas Jesuíticas do Brasil. Nóbrega – 1549-1558. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, v.38, p.87-119, 1995. [ Links ]
MONTERO, Paula. Índios e missionários no Brasil: para uma teoria da mediação cultural. In: _______. (Org.) Deus na aldeia: missionários, índios e mediação cultural. São Paulo: Globo, 2006. p.31-66. [ Links ]
Guilherme Galhegos Felippe – Doutor em História, Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Pós-doutorando, PUC-RS. Professor Colaborador (PNPD/Capes) do Programa de Pós-Graduação em História da PUC-RS.
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Sérgio Buarque de Holanda: 80 anos de Raízes do Brasil / Revista Brasileira de História / 2016
Sérgio Buarque de Holanda e seu mais famoso livro, Raízes do Brasil, vêm despertando a atenção de pesquisadores de vários campos do conhecimento – história, ciências sociais, literatura etc. – há décadas. Ou melhor, desde as últimas décadas do século XX, já que o interesse pelos grandes autores do pensamento social brasileiro, entre os quais Sérgio Buarque, pode ser datado, grosso modo, dos anos 1980. A própria categoria, “pensamento social brasileiro”, também nome de Grupo de Trabalho da Associação Nacional de Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), difundiu-se a partir de então. Do mesmo modo, mais especificamente nos domínios dos historiadores, o estudo dos chamados intérpretes do Brasil foi se impondo como uma exigência, na medida em que a história da historiografia se tornou área de trabalho e especialização, delimitada, estabelecida e florescente, além de contar com muitos participantes. Os debates ocorridos em mesas-redondas e seminários temáticos da Anpuh, em todo esse período, sejam regionais ou nacionais, são indicadores do fato.
Os anos 1990 e seguintes registraram, assim, o aparecimento de diversas pesquisas que se dedicaram à trajetória de autores e livros; a seus contextos de ação e produção editorial; aos diálogos que mantiveram com o “pequeno mundo intelectual” de sua época; à recepção que tiveram quando do lançamento de seus livros; à fortuna crítica posterior de suas obras etc. Com vários instrumentais teórico-metodológicos, o que só fez enriquecer o conjunto, a bibliografia sobre o tema cresceu em número e sofisticação. Um movimento que se articulou à afirmação da história cultural no Brasil e no mundo, com atenção especial sendo dirigida à história do livro e da leitura, à história dos intelectuais, à história dos conceitos, à história das ciências e à história da historiografia, como mencionado. A quantidade e variedade de fontes para o desenvolvimento desse trabalho também se multiplicou, bem como a preocupação em traçar os vínculos entre o que se pensava e fazia no Brasil e fora do Brasil.
Pode-se dizer, contudo, que alguns autores ocuparam lugar de relevo nessa reconfiguração do campo da história e das ciências sociais, e esse é caso de Sérgio Buarque de Holanda e de seu livro de estreia. Raízes do Brasil foi publicado em 1936 pela editora José Olympio, a mais prestigiosa do país na época, inaugurando a coleção Documentos Brasileiros. Ela era então dirigida por Gilberto Freyre, também prefaciador do volume, um nome já consagrado por livro igualmente clássico: Casa-grande e senzala (1933).
Na historiografia, Sérgio Buarque de Holanda se afirmaria – como certamente desejou desde os anos 1950 – entre as maiores referências da disciplina, talvez ao lado, apenas, de Varnhagen e Capistrano de Abreu. Nem tanto, me parece, de Caio Prado Júnior, cuja contribuição não tem, até hoje, o status que a de Sérgio Buarque ganhou. Quanto a Oliveira Vianna, para retomar as referências de Antonio Candido em seu famoso prefácio à 5a edição de Raízes do Brasil, de 1969, o caminho seguiu outro curso. Nas ciências sociais, ambos são reconhecidos entre os maiores pensadores da sociedade brasileira, formando com Alberto Torres, Sílvio Romero, Azevedo Amaral e outros, um conjunto de intérpretes decisivos para o contexto histórico anterior à redemocratização de 1945. Porém, de antípoda de Sérgio Buarque, Oliveira Vianna foi se tornando seu interlocutor, o que deu mais dinamismo às análises sobre esses autores e permitiu melhor conhecimento do campo intelectual das décadas de 1930 e 1940.
Uma transformação que tem claros vínculos com o crescimento dos estudos interdisciplinares sobre a construção de memórias individuais e coletivas, em que se reconhecem os esforços dos próprios indivíduos e dos guardiões de sua memória em produzir uma imagem de intelectual para seus contemporâneos e para a posteridade. Algo que igualmente interferiu na própria forma como todos os autores que contribuíram para o conhecimento (histórico ou qualquer outro) são pensados e tratados nas pesquisas mais recentes: sem mitificações e em redes de sociabilidade. Uma postura que busca uma mais proveitosa compreensão e, por conseguinte, uma melhor avaliação de suas contribuições, o que gera maior reconhecimento e não o contrário.
Justamente por tudo isso, a comemoração dos 80 anos da primeira edição de Raízes do Brasil não poderia passar em branco em uma revista como a RBH. Mas, também por tudo isso, considerei, como organizadora do Dossiê, que essa era uma excelente oportunidade para tratar de Sérgio Buarque de Holanda como um autor que teve uma rica e instigante trajetória, com atuação multifacetada como intelectual, tanto antes como depois de seu mais famoso livro. Este, portanto, é um Dossiê que parte de Raízes do Brasil, não se atendo, propositadamente, a esse livro, embora ele seja central para muitos dos artigos que o compõem, como o leitor verá.
O Dossiê é composto por sete artigos. Como abertura, temos o texto de Ronaldo Vainfas, sugestivamente intitulado “O imbróglio de Raízes: notas sobre a fortuna crítica da obra de Sérgio Buarque de Holanda”. Nele, Ronaldo começa por observar como a recepção desse livro, de um lado, acabou por obscurecer a produção historiográfica posterior de Sérgio Buarque, que só começou a ter reedições praticamente nos anos 1970; e de outro, paradoxalmente, como Raízes demorou a ser reconhecido quando de sua publicação, pois sua segunda edição data de 1948, 12 anos depois da primeira. Demarcando a parca repercussão inicial do livro, ele chega ao citado prefácio de Antonio Candido, que produz um duradouro e quase canônico enquadramento do livro e do autor, este como o de um “democrata radical”. A partir daí, o texto se abre para o debate de diversas questões que têm marcado as apreciações sobre a obra de Sérgio Buarque, algumas delas que serão discutidas com mais ênfase em outros artigos do Dossiê. Estão em pauta o planejamento inicial de Raízes, que envolveria o projeto de uma “Teoria da América”, e as ideias que ele abraçava ou rejeitava ao escrevê-lo. Outra vez, volta-se à apreciação de Candido que, vale lembrar, data de momento em que o Brasil mergulhava nos anos sombrios e violentos da ditadura civil-militar, instalada em 1964. Nessa viagem sobre o imbróglio de Raízes, muitos dos mais atentos analistas de Sérgio Buarque são visitados, o que tece para o leitor uma espécie de mapa de por onde andar para melhor conhecer o autor de tantos e tão diferenciados comentadores. Por fim, o próprio Sérgio é também mobilizado como figura decisiva que é na construção da fortuna crítica de sua obra, em especial porque o leitor é advertido de que nem todas as questões têm respostas completas.
Os dois artigos que se seguem versam sobre as raízes de Raízes do Brasil, escolhendo abordagens originais e provocadoras. Lilia Moritz Schwarcz e Pedro Meira Monteiro produzem um inusitado encontro, com doses de desencontro, entre os literatos Sérgio Buarque de Holanda e Lima Barreto, no Rio de Janeiro das décadas iniciais da Primeira República. Fazem-no como uma estratégia para recuperar os desdobramentos do ambiente político e estético da capital federal sobre os intelectuais que aí trafegavam, dando destaque aos anos 1920, quando Sérgio Buarque estabelece constante interlocução com Mário de Andrade, sendo, ao lado de Prudente de Morais Neto, um dos editores da revista modernista Estética. No artigo, os autores se beneficiaram muito do fato de terem organizado juntos a edição crítica comemorativa dos 80 anos de Raízes do Brasil, bem como de estarem trabalhando nas biografias de Lima Barreto (Lilia) e de Sérgio Buarque (Pedro). Dois autores que praticamente nunca são cotejados, porque frequentemente vistos como opostos: Sérgio, um modernista, e Lima, um antimodernista, nas letras e na vida. Porém, na vida e na história intelectual muitas vezes as coisas não são bem assim. É o que pretendem demonstrar, sobretudo no que diz respeito às desconfianças sobre o liberal regime republicano; algo que poderia ter ressoado em Raízes, anos depois. Da mesma forma que Ronaldo, Lilia e Pedro concluem seu texto com “discreta inquietação”.
Sérgio da Mata em “Tentativas de desmitologia: a revolução conservadora em Raízes do Brasil” mergulha fundo em um dos pontos que mais têm agitado os debates sobre autor e livro, desde que eles começaram a se fazer. Trata-se de esquadrinhar as leituras e apropriações do jovem Sérgio Buarque, no que se refere à “constelação de autores ligados à chamada ‘revolução conservadora’ alemã da época da República de Weimar”. Ou seja, a questão do germanismo desse intelectual, que teria voltado ao Brasil com um plano do livro (não executado), o que faz Sérgio da Mata recolocar em pauta e dialogar com diversos e recentes estudos sobre essa questão, levando-nos a Berlim e aos bastidores de Raízes. Recorrendo à documentação inédita e investindo numa escrita de tom biográfico – “quase sempre, a biografia de um livro está umbilicalmente ligada à de seu autor” -, ele constrói sua interpretação valendo-se, para prazer do leitor, de correspondência e anotações feitas por Sérgio Buarque em seus livros, agora acessíveis pela disponibilização da biblioteca na Unicamp.
Já os dois artigos que dão continuidade ao Dossiê podem ser lidos em duas chaves fundamentais, uma de forma e outra de conteúdo, que poderiam ser enunciadas como “a escrita de Sérgio Buarque de Holanda: o ensaio e as fronteiras”. Assim, Fernando Nicolazzi, para situar Raízes do Brasil na tradição do ensaio de interpretação histórica, gênero muito praticado no Brasil durante a primeira metade do século XX, dedica-se a fazer uma longa análise das formas de escrita do que eram os estudos históricos desde 1830 até 1930 / 40. O artigo é minucioso ao acompanhar intelectuais, como o romântico Gonçalves de Magalhães, passando por autores de textos famosos, produzidos no IHGB – como o discurso do cônego Januário da Cunha Barbosa, a proposta de Von Martius e a dissertação de Cunha Matos -, para chegar a Varnhagen, Sílvio Romero, Pedro Lessa e também Capistrano de Abreu e Oliveira Vianna. É dessa forma que ele examina “as condições de emergência da tradição do ensaio”, para defender que nelas estão presentes “as relações entre a erudição crítica, definidora do método histórico, e a intenção sintética, característica da filosofia da história moderna”. Dessa forma, acredito, o artigo vai se prestar aos interessados nos debates travados no período, a respeito da escrita não só da história como também das ciências sociais, todas ainda muito próximas, quando não inseparáveis, da literatura.
Robert Wegner é o autor do artigo que vai apontar o contexto de elaboração do projeto que marcaria a trajetória de Sérgio Buarque após Raízes do Brasil. Segundo ele, tal projeto é concebido como uma alternativa à tradição ibérica que reinava no livro de estreia, constituindo-se no estudo da história da sociedade paulista. Assim, ele vai se centrar na expansão territorial e nos caminhos que levaram “os paulistas” ao traçado de novas fronteiras para o Brasil. Daí o tema das bandeiras e monções, que tinham, aliás, forte tradição no estado, bastando lembrar os nomes de Afonso Taunay, Alcântara Machado, Alfredo Ellis Jr., Cassiano Ricardo e outros, na poesia, no romance e na pintura histórica, por exemplo. Por isso, seu belo título: “A montanha e os caminhos: Sérgio Buarque de Holanda entre Rio de Janeiro e São Paulo”.
Dois artigos encerram o dossiê, voltando-se, mais uma vez, para os projetos de Sérgio Buarque e a fortuna crítica de sua obra. Giselle Martins Venancio e André Furtado irão focar no trabalho desenvolvido pelo autor ao organizar a coleção História Geral da Civilização Brasileira (HGCB), publicada pela editora Difusão Europeia do Livro (Difel) nas décadas de 1960 e 1970. Assumindo o formato de coletânea, considerado inovador ante o modelo experimentado com sucesso desde os anos 1920 / 30, como ilustram as coleções Brasiliana (da Companhia Editora Nacional) e Documentos Brasileiros (da José Olympio), a HGCB inauguraria outro tempo em termos editoriais. A essa coleção Sérgio Buarque se dedica com afinco, sendo o organizador dos volumes sobre Colônia e Império. Neste último caso, entretanto, ele acabaria sendo o principal autor, o que conduz o artigo a uma análise sobre o tipo de tratamento que foi dado à monarquia brasileira. Retomando a questão do projeto de “teoria da América”, presente em artigos anteriores, Giselle e André defendem que Sérgio Buarque o teria em mente ao situar o Império sob a ótica da historiografia latino-americana, inovando ao estabelecer novos marcos cronológicos para o período.
No último artigo, de Thiago Lima Nicodemo, Sérgio Buarque e Antonio Candido se encontram mais uma vez, desta feita no traçado de uma biografia cruzada, que remete ao tema da construção de memória daquele autor, mas em outra perspectiva. A interlocução montada entre os dois parceiros ressalta questões-chave no trato com intelectuais, quais sejam, os processos de apropriação de ideias, os dilemas e formas de engajamento político e os esforços para a delimitação de uma “obra” que guarde coerência com a figura de um “autor”. Dessa maneira, acredito que o Dossiê se soma à produção já vasta e cuidada sobre Sérgio Buarque de Holanda, inovando em pontos muito frequentados e polêmicos, o que é marca de boa contribuição intelectual.
Ângela de Castro Gomes – Professora titular da Universidade Federal Fluminense (UFF); professora visitante nacional sênior da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). E-mail: angelamariadecastrogomes@gmail.com
GOMES, Ângela de Castro. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set. / dez., 2016. Acessar publicação original [DR]
Mercados Minas: africanos ocidentais na Praça do Mercado do Rio de Janeiro (1830-1890) – FARIAS (RBH)
FARIAS, Juliana Barreto. Mercados Minas: africanos ocidentais na Praça do Mercado do Rio de Janeiro (1830-1890). Rio de Janeiro: Prefeitura do Rio de Janeiro/Arquivo Geral da Cidade, 2015. 295p. Resenha de: CARVALHO, Marcus Joaquim Maciel de. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.
Antes de defender sua tese em 2012, Juliana Barreto Farias já era uma pesquisadora reconhecida, autora de trabalhos sólidos, tanto individualmente como em coautoria com historiadores renomados. A tese então defendida era fruto de uma pesquisa densa e bem sedimentada. Agora, expurgados os ranços que caracterizam as teses – aqueles que tornam a leitura pesada, difícil – e com alguns acréscimos bem situados, foi finalmente publicado esse importante estudo, que promete influenciar a literatura sobre a escravidão urbana no Rio de Janeiro, particularmente sobre a presença de africanas minas no comércio a retalho.
A inspiração confessada da autora é uma fotografia de uma africana vendendo frutas e verduras numa bancada de mercado. É uma daquelas fotos de Marc Ferrez diante das quais os especialistas às vezes se lembram de que, talvez, já as tenham visto em algum lugar. Mas Juliana não se contentou com essa curiosidade, a estética vigorosa da “dama mercadora”, talvez Emília Soares do Patrocínio, a principal personagem do livro, uma africana liberta que deixou 30 contos de patrimônio inventariado e que alforriou outros 11 cativos. Dali em diante, fazendo uma ligação nominativa de fontes, percorrendo um rol considerável de documentos sobre o mercado, inventários, jornais, processos de divórcio e fontes paroquiais, a autora foi descobrindo outras pessoas, processos, histórias de vida, lendas urbanas, rumores e espaços, até que, finalmente, pôde apresentar aos leitores outro retrato, mais amplo, com mais profundidade e contextualização: o retrato do próprio mercado da Candelária, o “mercado do peixe”, na atual Praça XV de Novembro. Por intermédio desse trabalho denso e arguto entramos no cenário de muitas tramas que haviam caído em certo esquecimento da história urbana do Rio de Janeiro escravista. A foto daquela negra mina com uma urupema no colo inspirou a pesquisa, mas ela não é a única protagonista neste livro. O próprio mercado, que ganha vida, é o personagem principal deste importante estudo.
Inspirado no Les Halles de Paris, o mercado tinha absolutamente tudo de brasileiro, expressando os detalhes multiétnicos e as tensões que caracterizavam a vida social no Rio de Janeiro oitocentista. Nele percebe-se a dinâmica própria da escravidão na capital imperial, pois, a rigor, não se podia alugar banca de peixe a cativo, mas eles estavam lá o tempo todo, se não como vendedores independentes, com certeza, como prepostos. Em 1836, houve de fato uma queixa de que a posse de bancas havia sido concedida a escravos. Entre atritos, reclamações – até mesmo contra “pretos cativos atravessadores” – e rearranjos espaciais, a partir de 1844 só gente livre poderia ser locatária, embora seus cativos pudessem pernoitar no ambiente de trabalho. A autora crê, todavia, que os requerimentos iludiam à condição forra de muita gente, afinal de contas, salvo os “africanos livres”, não havia como essas pessoas com marcas de nação serem livres. Os minas eram os mais bem representados no mercado e, entre eles, havia uma distribuição entre os sexos bastante equitativa. As áreas internas, todavia, eram majoritariamente ocupadas por homens.
Apesar de muita confusão, greve até, em longo prazo houve uma razoável estabilidade entre os que se estabeleciam no mercado, pois a média de ocupação no mesmo local era de 15 a 20 anos. Era comum transferir a banca para gente da mesma família ou da mesma procedência, e, embora fosse possível ceder a posse e o uso do espaço, não se podia repassá-lo a terceiros por conta própria, sem interferência das autoridades competentes. Havia locatários ocupando mais de uma banca. José da Costa e Souza, ou José da Lenha, era tão onipresente nos negócios que, segundo um relatório de 1865, ficou também conhecido como “dono do mercado”. A trajetória de vida de alguns personagens, como Domingos José Sayão, um calabar forro, ilustra o tráfico de influência para se conseguir bancas. O fato de já estar lá trabalhando era importante para renovação, mas havia um jogo na Câmara Municipal envolvendo complexas relações patronais. E, nesse jogo burocrático e legal, as minas também eram protagonistas. Casavam-se, divorciavam-se, participavam de irmandades, querelavam e demandavam direitos nos termos da “lei do branco”.
Uma das partes mais ricas do livro é o estudo das posições relativas dos trabalhadores do mercado, desde os donos de banca até os cativos. À parte a condição servil, livre ou liberta de cada um, havia a cor da pele matizando as relações sociais. Entre os negros, os que não eram africanos aparentemente procuravam ressaltar esse dado nas petições. E eram muitos os africanos. A autora cita Holanda Cavalcanti, para quem bastava ir lá para vê-los ostentando suas marcas de nação. Os requerimentos, todavia, disfarçavam a condição dos requerentes forros, que não deviam ser poucos. Havia, entretanto, certa especialização naquela multidão. Os brasileiros dominavam a venda de pescados, os africanos concentravam-se na venda de legumes, verduras, aves e ovos. Os portugueses estavam em tudo, mas dominavam a venda de secos. Embora tenha encontrado até uma briga entre dezenas de ganhadores e 11 trabalhadores brancos do mercado, a autora não encontrou uma rivalidade permanente, inevitável entre portugueses e africanos, o que contraria o senso comum historiográfico. Os atritos eram muitos, mas cruzavam barreiras simplistas. A condição servil, livre ou liberta, a nacionalidade, a procedência e as relações patronais entrecruzavam-se marcando o cotidiano das relações de trabalho e convivência no mercado do peixe.
Empoderada pela riqueza que o comércio lhe proporcionou, Emília fez tudo o que poderia caber a uma africana liberta na capital imperial. Afirmou-se diante de outras mulheres e dos homens que cruzaram seu caminho. No comércio, liderava. Os homens que passaram por sua vida foram apenas coadjuvantes. Submersa numa sociedade que tentava conquistar, previsivelmente tornou-se senhora de escravos, e Juliana Barreto não encontrou evidências de que fosse melhor, mais generosa nas alforrias, do que as outras sinhás do seu tempo. Questões desse tipo – Como era ser escrava de uma africana liberta? Qual o significado do casamento cristão para as africanas cativas ou libertas? E o que significava ser uma “mina”, afinal de contas? – integram um rol de perguntas clássicas da historiografia brasileira para as quais este livro acrescenta novos elementos de discussão.
Embora com objeto bem delimitado, circunscrito no tempo e no espaço, este livro é também oportuno no momento presente, quando precisamos ampliar nossos horizontes de estudo, reabrir perspectivas comparadas. Nestes tempos de tantas e tantas teses a serem lidas, talvez já seja possível reavaliar tendências bem assentadas na historiografia. A escravidão no Rio de Janeiro das africanas retratadas neste importante livro precisa ser cotejada com aquela das africanas das Minas setecentistas, sobre as quais já existe sólida literatura, ou mesmo da Bahia e Pernambuco, revisitadas por estudos recentes. Aos poucos, os detalhes desse universo mais amplo da escravidão no Brasil oitocentista vão sendo desvelados por estudos densos, como este, que irão compor as futuras sínteses da vasta e rica historiografia brasileira sobre a escravidão.
Marcus Joaquim Maciel de Carvalho – Ph.D. em História, University of Illinois System (UILLINOIS). Professor Titular de História, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Recife, PE, Brasil. E-mail: marcus.carvalho.ufpe@hotmail.com
[IF]Conspirações da raça de cor: escravidão, liberdade e tensões raciais em Santiago de Cuba (1864-1881) – MATA (RBH)
MATA, Iacy Maia. Conspirações da raça de cor: escravidão, liberdade e tensões raciais em Santiago de Cuba (1864-1881). Campinas: Ed. Unicamp, 2015. 303p. Resenha de: CHIRA, Adriana. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.
O complicado relacionamento entre as pessoas de cor e os movimentos nacionalistas latino-americanos esteve no centro de um vasto conjunto de pesquisas historiográficas. Algumas das questões que os estudiosos enfrentaram foram estas: o que levou as pessoas de cor a participar nesses movimentos? Como os modelaram? E por que endossaram ideologias nacionalistas que celebravam a harmonia racial e que as elites brancas viriam a usar como meio para silenciar as reivindicações baseadas na raça? As pessoas de cor foram sendo cooptadas pelas elites brancas, ou conseguiram dar forma ao teor geral dos movimentos e das ideologias nacionalistas? Historiadores cubanos envolveram-se nessas discussões, muito embora Cuba tenha discrepado cronologicamente em comparação com outras colônias espanholas nas Américas, alcançando sua independência apenas em 1898. O paradoxo que faz de Cuba um tema particularmente interessante de pesquisa é por que o maior produtor de açúcar para o mercado global poderia abrigar um ideal nacionalista de fraternidade racial, no momento em que o racismo científico tornava-se o lastro ideológico para os segundos impérios europeus na Ásia e na África, e para as chamadas leis Jim Crow no sul dos Estados Unidos. Realizando rica pesquisa em arquivos cubanos e espanhóis e tecendo uma bela narrativa que coloca na frente e no centro as vozes e as ações das próprias pessoas de cor, Iacy Maia Mata oferece, em sua monografia, novas abordagens sobre essas questões.
Estudos anteriores sobre fraternidade racial em Cuba centraram o foco sobretudo na experiência militar durante a prolongada Guerra de Independência contra a Espanha (1868-1898). Estudiosos e intelectuais já desde José Martí argumentaram que o esprit de corps militar que se desenvolveu entre os rebeldes pró-independência através das linhas de segregação oficiais serviu como catalisador de ideologias radicais de inclusão nacional e racial. Mata, porém, sustenta que há indícios nos arquivos de uma cultura política popular em Santiago que parece ter preexistido à campanha militar de 1868. Introduzindo um novo recorte cronológico para a emergência de ideologias de igualdade racial em Cuba, Iacy Mata não está apenas oferecendo o relato mais completo. Ela também está sugerindo que a população de cor de Santiago havia considerado a igualdade antes mesmo de as elites liberais de pequenos proprietários na província vizinha de Puerto Príncipe terem iniciado a guerra de independência.
O objetivo de Iacy Mata é traçar as origens da cultura política popular de Santiago e explicar como, entre meados dos anos 1860 e o início da década de 1880, a população de cor local superou as divisões de status e criou laços e solidariedades que alcançaram sua expressão completa na ideia de uma raza de color unificada. A autora argumenta que essa visão particular de uma comunidade política centrada na raça estava alinhada com a causa nacionalista de uma Cuba livre. Como ela coloca adequada e incisivamente, as pessoas de cor de Santiago passaram, no começo da década de 1860, da condição de la clase de color, um rótulo oficial nelas fixado pelas autoridades coloniais espanholas, para a de la raza de color, termo que intelectuais e líderes políticos e militares de cor começaram a usar para se autoidentificar no início da década de 1880.
Ao longo da maior parte de sua existência colonial, Santiago de Cuba, província situada na extremidade leste da ilha, foi uma zona de fronteira colonial, ator marginal na política imperial e local de pouco investimento da agricultura de plantation em larga escala. Os refugiados da Revolução Haitiana que migraram para essa região por volta de 1803 ali introduziram plantações de café, muitas das quais faliram no começo da década de 1840. Até o final dos anos 1850, as principais fontes de renda locais eram a criação de gado, a plantação de café e tabaco e a mineração de cobre (que as autoridades concederam a uma companhia inglesa). Como resultado da localização de Santiago nas margens do domínio açucareiro, a pequena propriedade permaneceu ali muito mais comum do que na parte centro-oeste de Cuba. Além do mais, Santiago também se destacou entre as demais províncias cubanas pelo peso demográfico relativamente maior da população de cor. No começo dos anos 1860, muitos deles eram pequenos proprietários e alguns possuíam um pequeno número de escravos. Era essa população que começou a se mobilizar politicamente no início daquela década, argumenta a autora, em resposta aos acontecimentos econômicos locais e aos movimentos internacionais antiescravagistas.
Nos primeiros anos da década de 1860, o açúcar começou a deitar raízes mais profundas em Santiago e a produção de café voltou a se expandir ali. Como consequência, as plantações começaram a invadir áreas onde os pequenos proprietários ou arrendatários cultivavam tabaco, deixando a população de cor insatisfeita. Ademais, em meados da década, teriam chegado a Santiago notícias e rumores sobre a emancipação dos escravos no sul dos Estados Unidos. A população local também teria consciência, havia bastante tempo, dos protestos britânicos contra a escravidão e o comércio de escravos para o Império Espanhol (em razão da proximidade da Jamaica), bem como da reputação do Haiti como república construída a partir de uma bem-sucedida revolução de escravos. Fazendo uma leitura cuidadosa de registros criminais e judiciais, Iacy Mata recupera como essas notícias impactaram a vida cotidiana entre os escravos e a população de cor livre e o que fizeram com elas. Quer fosse a exibição sutil e irônica de uma bandeira haitiana, trazendo inscrita a palavra Esperança, quer fosse o uso de um vocabulário pró-republicano, antiescravidão e antidiscriminação, sustenta a autora, as conversas de natureza política se espalharam pela cidade e pelas áreas rurais antes de 1868.
As conversas políticas locais culminaram em uma série de conspirações que transpirou entre 1864 e 1868 na província de Santiago e em áreas adjacentes. Iacy Mata interpreta a evidência dessas conspirações cuidadosamente, identificando os objetivos e as alianças dos participantes que emergiam entre escravos, população de cor livre e brancos. Os desiderata incluíam uma república independente, o fim da escravidão e a igualdade de direitos no que diz respeito ao status de raça. Nos dois capítulos finais, a autora coloca em discussão que essas metas políticas receberiam maior articulação durante a Guerra de Independência, quando as pessoas de cor tentariam radicalizar a agenda principal da liderança branca liberal para incluir a igualdade política e a abolição imediata.
A monografia baseia-se em extensa pesquisa nos arquivos imperiais espanhóis (Arquivo Histórico Nacional, Arquivo Geral das Índias), bem como em fontes dos Arquivos Nacionais Cubanos e do Arquivo Histórico Provincial de Santiago de Cuba. Esses diferentes repositórios forneceram a Iacy Mata fontes que lhe permitiram deslocar-se entre diferentes percepções dos mesmos eventos ou processos: elite/subalterno, centro imperial (Madri)/elite política centrada no açúcar (Havana)/zona de fronteira cubana (Santiago). Adicionalmente, o trabalho de Iacy Mata mostra como o estudo de uma área de fronteira do Caribe pode ser importante para se entender o radicalismo político na região. Por muito tempo, os historiadores permaneceram focando as áreas produtoras de açúcar como os principais espaços onde a mudança social se deu. Embora seu trabalho tenha nos munido de ferramentas e abordagens analíticas indispensáveis, Iacy Mata sugere que é importante olhar para além dessas áreas se quisermos compreender a cultura política local.
A monografia também abre importantes caminhos para novas pesquisas. A unidade discursiva do termo raza de color esconde as complexas políticas e as fraturas existentes entre as pessoas de cor em Santiago que sobreviveram nos anos 1880 e moldariam a política clientelista nos primórdios da Cuba republicana. Seria fundamental considerar que as origens e os desdobramentos posteriores dessas fraturas estariam em Santiago. Em segundo lugar, o estudo de Iacy Mata alude à presença de aliados brancos liberais em Santiago, que, ocasionalmente, ajudaram os combatentes pela liberdade ou participaram de conspirações antiescravidão. A historiadora cubana Olga Portuondo Zúñiga explorou a história do liberalismo na parte ocidental da ilha, revelando um vibrante campo de ideias liberais que se mostravam, às vezes, contraditórias ou contraditórias em si mesmas. Puerto Príncipe e Bayamo foram terrenos particularmente férteis para o pensamento liberal, mas Santiago não esteve alheia a ele antes da Guerra de Independência (ver, por exemplo, o governo de Manuel Lorenzo nos anos 1830). Algumas dessas ideologias liberais podem também ter escoado através de redes que alcançaram ex-colônias latino-americanas depois da década de 1820 e a República Dominicana durante a Guerra da Restauração nos anos 1860. Estudar os ideais políticos da população de cor de Santiago em relação a essas outras correntes políticas, tanto internas quanto externas à ilha, parece ser um terreno especialmente importante para futuras pesquisas.
O trabalho de Iacy Mata é uma bela ilustração de como as ferramentas da história social e política podem capturar a dinâmica dos movimentos políticos populares. Assim sendo, eu o recomendo vivamente para os estudiosos interessados em sociedades escravistas e pós-escravistas e nos papéis que as pessoas de cor desempenharam no interior delas.
Adriana Chira – Ph.D., University of Michigan. Assistant Professor of Atlantic World History, Emory College of Arts and Sciences (USA). Emory College of Arts and Sciences. Atlanta, GA, USA. E-mail: adriana.chira@emory.edu.
[IF]A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas – TRINDADE (RBH)
TRINDADE, Hélgio. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2016. 837p. Resenha de: GONÇALVES, Leandro Pereira. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.
São 17 horas em Brasília. Com os olhos inchados, o rosto deformado pelos anos e após acordar de uma longa sesta, o antigo (e eterno, para os militantes) chefe dos integralistas concedeu uma entrevista ao então doutorando em Ciência Política da Université Paris 1 (Panthéon-Sorbonne) Hélgio Trindade, que teve um segundo encontro com o líder dos camisas-verdes em São Paulo. Na ocasião das pesquisas, foram realizadas entrevistas com Miguel Reale, Dario Bittencourt e Rui Arruda, dentre outros integralistas ou simpatizantes, como Alceu Amoroso Lima e Menotti Del Picchia.
O momento não era nada propício para o desenvolvimento de uma pesquisa dessa estirpe, pois estávamos vivendo os duros tempos da ditadura civil-militar e muitos dos integralistas dos anos 1930 eram figuras ativas no contexto do regime autoritário, como o general Olympio Mourão Filho, que recebeu de pijama e chinelos o então doutorando em seu apartamento, em Copacabana. Detalhes pitorescos e impensáveis que serão descobertos nas 837 páginas do livro A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas.
Não há estudioso que não tenha esbarrado com o nome de Hélgio Trindade. A tese de doutorado denominada L’Action intégraliste brésilienne: um mouvement de type fasciste au Brésil, traduzida e publicada no Brasil, em 1974, sob o título Integralismo: o fascismo brasileiro na década de 30 (Trindade, 1974), é cada vez mais viva na Ciência Política e nos trabalhos historiográficos. Esse estudo promoveu a entrada da temática no meio acadêmico, sendo também responsável por tornar conhecido o movimento e tê-lo interpretado. O pesquisador gaúcho foi o precursor dos estudos e é referência cada vez mais atuante para os que buscam compreender esse fenômeno político do século XX que arrastou multidões e mobilizou milhares de pessoas em torno de um grande nome: Plínio Salgado.
A nova produção de Hélgio Trindade é lançada em contexto acadêmico extremamente oposto ao do momento de divulgação da tese, em 1974, quando não havia amplos diálogos. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistas é uma espécie de “promessa” do professor emérito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Em 1979, o ex-reitor da UFRGS e da Unila anunciou, na 2ª edição da tese, publicada pela Difel, que um volume seguinte teria como objeto de análise um conjunto de depoimentos gravados, inéditos, colhidos com dirigentes e militantes integralistas, mas, por implicações éticas, faria a divulgação após a morte de todos.
Há muitos anos os pesquisadores comentavam sobre as entrevistas, e muitos se questionavam onde elas estavam e se realmente existiam, visto que o material sempre foi objeto de desejo de todos os estudiosos do tema. Agora, finalmente, há a possibilidade de termos em mãos uma parte significativa dos depoimentos que foram concedidos a Hélgio Trindade. Vejo como um feito da publicação o trabalho que o autor teve em organizar as entrevistas de maneira temática, pois o livro não é apenas uma simples transcrição, há um árduo trabalho metodológico acompanhado por referências e contextualizações amplas sobre o período e o Movimento.
Em “Nota prévia” o autor defende o uso fascista para a caracterização do integralismo frente ao debate da década de 1970 e suas repercussões no contexto acadêmico contemporâneo, polêmica existente desde a defesa da tese. O prefácio da segunda edição (Trindade, 1979), reproduzido no novo livro e escrito pelo cientista político da Universidade de Yale, Juan J. Linz, falecido em 2013, destaca a importância da investigação no cenário acadêmico, principalmente por identificar um tipo fascista fora do contexto europeu, temática que segue a introdução escrita pelo autor, demonstrando em uma visão continental a particularidade do movimento integralista – “O fascismo na América Latina em debate”. Antes de nos brindar com as entrevistas, faz uma síntese da tese, expondo o universo ideológico do integralismo para que o leitor possa identificar elementos da estrutura da Ação Integralista Brasileira.
Plínio Salgado, o líder do movimento, mereceu um capítulo exclusivo: “Entrevistas com dirigentes e militantes da AIB”. Nele, o chefe supremo dos camisas-verdes aponta questões sobre o passado e sobre um presente utópico. São palavras que permitem ao historiador identificar elementos até então conhecidos no campo das hipóteses, nos aspectos político, cultural, internacional, religioso ou mesmo pessoal. Com as entrevistas, é possível contribuir com diversas investigações, como a força exercida pela intelectualidade portuguesa em Plínio Salgado, tanto na juventude, pela leitura de obras ligadas aos católicos lusitanos, como no contexto do pós-guerra, quando António de Oliveira Salazar estabeleceu papel preponderante na composição de um novo Plínio Salgado após o exílio (cf. Gonçalves, 2012).
Em “Imaginário da elite dirigente e Dirigentes e Militantes Locais” Trindade oferece entrevistas realizadas entre maio de 1969 e setembro de 1970 com representantes do movimento e líderes de destaque no cenário político: Frederico Carlos Allendi, Rui Arruda, Dario Bittencourt, Margarida Corbisier, Roland Corbisier, José Ferreira da Silva, Arnoldo Hasselmann Fairbanks, Antonio Guedes Hollanda, Américo Lacombe, José Ferreira Landin, Edgar Lisboa, José Loureiro Júnior, Jeovah Mota, Olympio Mourão Filho, Erico Muller, Zeferino Petrucci, Miguel Reale, João Resende Alves, Goffredo da Silva Telles, Ângelo Simões Arruda, Ponciano Stenzel, Antonio de Toledo Pizza e Aurora Wagner. Como as entrevistas estão no anonimato, uma relação foi inserida no fim do livro, mas no início de cada entrevista há uma pequena biografia do depoente que permite ao estudioso a identificação, mas isso não é tão simples para os demais leitores.
Em sequência, Trindade traz em “Olhares externos de intelectuais independentes” entrevistas de personalidades que viveram o período e que conviveram em algum momento com Plínio Salgado e outros membros do movimento: Alceu Amoroso Lima, Cruz Costa, Candido Morra Filho, Menotti Del Picchia e Antonio Candido, sendo este último o único depoente ainda vivo. Como não há relações políticas e comprometimentos em algumas passagens, os nomes desses são identificados nas entrevistas.
A obra, que marca o retorno do autor ao debate (apesar de nunca ter deixado de fazer parte da discussão),2 tem dois aspectos principais e de grande relevância: 1º) permite identificarmos o olhar do ator no contexto histórico; nas entrevistas é possível verificar passagens e trechos inimagináveis, pérolas recolhidas por Trindade; 2º) com tal produção, tem-se a possibilidade de revolucionar a historiografia, pois são documentos até então desconhecidos que, graças aos depoimentos, podem confirmar questões que se encontram no campo da hipótese ou verificar possibilidades investigativas. Além disso, o autor faz parte de um seleto rol de pesquisadores, pois, seja na história ou na ciência política, Hélgio Trindade é responsável pela construção de uma interpretação, um pensamento único e, portanto, estabelece uma composição central na esfera acadêmica.
Esta obra busca, além de identificar o imaginário dos militantes integralistas, contribuir para o entendimento de questões acaloradas da sociedade contemporânea, em que as forças políticas conservadoras estão cada vez mais atuantes e com tentações antidemocráticas, reflexões que são realizadas no epílogo: “Ainda a tentação fascista no Brasil?”.
O livro de Hélgio Trindade vem em momento oportuno, pois não pensemos que o pesadelo acabou, uma vez que a intolerância e o autoritarismo estão longe de ser página virada na história da humanidade, principalmente com a complexa crise política que culminou com as ações do dia 31 de agosto de 2016. O livro não poderia ter desfecho mais atual, pois ao citar Karl Marx, conclui: “a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”.
Referências
GERTZ, René E.; GONÇALVES, Leandro P.; LIEBEL, Vinícius. Camisas Verdes, 45 anos depois – uma entrevista com Hélgio Trindade. Estudos Ibero-americanos, Porto Alegre, v.42, n.1, p.189-208, abr. 2016. [ Links ]
GONÇALVES, Leandro P. Entre Brasil e Portugal: trajetória e pensamento de Plínio Salgado e a influência do conservadorismo português. 2012. Tese (Doutorado em História) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). São Paulo, 2012. [ Links ]
TRINDADE, Hélgio. Integralismo: o fascismo brasileiro da década de 30. São Paulo: Difel, 1974. [ Links ]
_______. Integralismo: o fascismo brasileiro da década de 30. 2.ed. São Paulo: Difel; Porto Alegre: Ed. UFRGS, 1979. [ Links ]
Nota
2 Em recente entrevista para a revista Estudos Ibero-Americanos, Hélgio Trindade aponta questões sobre sua trajetória e, principalmente, sobre o impacto da tese na academia brasileira (GERTZ; GONÇALVES; LIEBEL, 2016). Repercussões foram publicadas na edição seguinte e podem ser consultadas em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/fo/ojs/index.php/iberoamericana/issue/view/1032/showToc.
Leandro Pereira Gonçalves – Professor adjunto do Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Pesquisador e autor de diversos estudos sobre o integralismo, notadamente, a trajetória de Plínio Salgado, é doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) com estágio no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL) e com pós-doutoramento pela Universidad Nacional de Córdoba (Centro de Estudios Avanzados), Argentina. Programa de Pós-Graduação em História, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: leandro.goncalves@pucrs.br.
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O alfaiate de Ulm: uma possível história do Partido Comunista Italiano – MAGRI (RBH)
MAGRI, Lucio. O alfaiate de Ulm: uma possível história do Partido Comunista Italiano. Boitempo, São Paulo: 2014. 415p. Resenha de: POMAR, Valter. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.73, set./dez. 2016.
O alfaiate de Ulm é a última obra de Lucio Magri (1932-2011), intelectual comunista italiano e um dos responsáveis pela criação de Il Manifesto, periódico lançado em 1969 e que segue sendo publicado (http://ilmanifesto.info/).
O alfaiate de Ulm pode ser lido em várias claves: relato autobiográfico e testamento político, panorama do século XX, ensaio sobre a história e as perspectivas do movimento comunista italiano (especialmente o apêndice, um documento de 1987 intitulado “Uma nova identidade comunista”).
O movimento comunista da Itália tem gênese histórica distinta, onde confluem as características próprias daquele país, o impacto da revolução russa de 1917, a luta contra o fascismo e as batalhas da Guerra Fria.
Nesse contexto, o Partido Comunista não foi apenas uma organização política: foi também uma instituição cultural com imenso enraizamento na classe trabalhadora, na juventude e na intelectualidade, que teve na obra de Antonio Gramsci sua feição teórica mais conhecida e reconhecida.
Apesar disso tudo – ou por causa disso tudo, como fica claro da leitura de O alfaite de Ulm – o Partido Comunista Italiano cometeu suicídio em 1989.
Diferente das pequenas seitas militantes, que conseguem sobreviver em condições variadas e inóspitas, os partidos de massa parecem sobreviver apenas em determinadas condições. E como demonstra Lucio Magri, várias das condições que tornaram possível a existência de um forte comunismo reformista italiano e europeu desapareceram com a União Soviética e com a reestruturação capitalista simultânea à ofensiva neoliberal.
Dito de outra forma, a força das duas grandes famílias da esquerda europeia (o reformismo social-democrata e o reformismo comunista), assim como o brilho dos grupos de ultraesquerda que viviam à sombra daquele duplo reformismo, dependiam das condições “político-ecológicas” existentes na Europa enquanto durou a chamada bipolaridade entre União Soviética e Estados Unidos.
Quando esse conflito cessou, com a vitória dos Estados Unidos, a social-democracia experimentou uma deriva neoliberal, e o reformismo comunista, uma deriva social-democratizante.
Claro que esse não foi um processo uniforme. Uma das qualidades de O alfaiate de Ulm é apresentar uma interpretação do que teria ocorrido no caso italiano. Vale destacar esta palavra: interpretação. Há muitas outras interpretações, e sempre haverá o que estudar acerca das desventuras em série que atingiram o movimento comunista, o conjunto da esquerda e da classe trabalhadora, especialmente na Europa dos anos 1980 e 1990. A Itália constitui caso destacado, em boa medida pelo fato de lá estar baseado o tantas vezes denominado de maior partido comunista do Ocidente.
O alfaiate de Ulm pode ser lido com muito proveito por quem tem interesse em compreender os dilemas da classe trabalhadora, da esquerda brasileira e especialmente do Partido dos Trabalhadores.
Época e circunstâncias muito diferentes, obviamente. A começar pelo fato de que as variáveis internacionais que fortaleciam o reformismo social-democrata e comunista na Europa produziam efeitos muito distintos na América Latina e no Caribe, inclusive no Brasil.
Isso ajuda a entender por que, na mesma época em que o PCI cometia suicídio, abandonando suas tradições e até mesmo seu nome, o Partido dos Trabalhadores estava convertendo-se em força hegemônica na esquerda brasileira.
Guardadas essas diferenças, é impossível não enxergar certas semelhanças entre os dilemas vividos pelo Partido Comunista Italiano nos anos 1970 e 1980 e os impasses vividos mais de 20 anos depois pelo Partido dos Trabalhadores brasileiro.
Os dilemas do PCI são descritos detalhadamente em O alfaiate de Ulm. Segundo Lucio Magri, a “peculiaridade do PCI … era a de ser um ‘partido de massas’ que ‘fazia política’ e agia no país, mas também se instalava nas instituições e as usava para conseguir resultados e construir alianças” (p.333).
Magri demonstra que a atuação na institucionalidade não foi apenas uma estratégia. Mais do que isso, converteu o PCI em parte estrutural do Estado italiano, naquilo que Magri chama de um “elemento constitutivo de uma via democrática. Uma medalha que, no entanto, tinha um reverso” (p.333).
Esse “reverso”, que soa tão familiar aos que acompanham as vicissitudes atuais da esquerda brasileira, é assim apresentado por Lucio Magri:
Não me refiro apenas ou sobretudo às tentações do parlamentarismo, à obsessão de chegar a todo custo ao governo, mas a um processo mais lento. No decorrer das décadas, e em particular em uma fase de grande transformação social e cultural, um partido de massas é mais do que necessário, assim como sua capacidade de se colocar problemas de governo. Mas, por essa mesma transformação, ele é molecularmente modificado em sua própria composição material. (p.333)
Talvez esteja nisto a maior contribuição de O alfaiate de Ulm: essa abordagem profundamente histórica da vida de um partido político, ou seja, a compreensão de que a história de um partido só pode ser adequadamente compreendida como parte da história de uma sociedade, enquanto processo integrado entre as opções estritamente políticas, as tradições culturais e as relações sociais mais profundas, num ambiente nacional e internacional determinado.
A descrição que Lucio Magri faz do processo de seleção e promoção dos dirigentes partidários fala por si:
a formação de novas gerações, mesmo entre as classes subalternas, ocorria sobretudo na escola de massas e mais ainda por intermédio da indústria cultural; os estilos de vida e os consumos envolviam toda a sociedade, inclusive os que não tinham acesso a eles, mas alimentam a esperança de tê-lo; as “casamatas” do poder político cresciam em importância, mas descentralizavam-se e favoreciam aqueles que ocupavam as sedes; a classe política, mesmo quando permanecia na oposição e incorrupta, à medida que a histeria anticomunista diminuía, criava relações cotidianas de amizade, amálgama, hábitos e linguagem com a classe dirigente. (p.333)
Essa “mescla de costumes” da “classe política” com a “classe dirigente”, como sabemos, não é uma peculiaridade italiana. Tampouco seus efeitos organizativos, assim descritos por Magri:
as seções não estavam mais acostumadas a funcionar como sede de trabalho das massas, de formação cotidiana de quadros; eram extraordinariamente ativas apenas na organização das festas do Unità, e mais ainda nos períodos de eleição nacional e local; as células nos locais de trabalho eram poucas e delegavam quase tudo ao sindicato. Nos grupos dirigentes, a distribuição dos papéis havia mudado muito: o maior peso e a seleção dos melhores haviam se transferido das funções políticas para as funções administrativas (municípios, regiões e organizações paralelas, como as cooperativas). Portanto, mais competência e menos paixão política, mais pragmatismo e horizonte político mais limitado. Os intelectuais sentiam-se estimulados para o debate, mas sua participação na organização política havia declinado e o próprio debate entre eles era frequentemente eclético. A exceção era o setor feminino, em que um vínculo direto entre cúpula e base criava uma agitação fecunda. (p.334)
Noutras palavras, Lucio Magri descreve como as transformações “moleculares” causaram uma metamorfose no Partido Comunista: pouco a pouco foi deixando de ser um fator de subversão, transformando-se em peça importante na engrenagem do Estado e da política italiana. Uma peça diferente das outras, como demonstraria a Operação Mãos Limpas, a qual confirmaria que o PCI soubera resistir à corrupção sistêmica. Mas uma peça da engrenagem, como demonstra o fato de o PCI não ter sobrevivido ao colapso da estrutura política italiana.
Nesse sentido, a interpretação feita por Lucio Magri parece demonstrar que o Partido Comunista Italiano não foi vítima do fracasso, mas sim do sucesso da “estratégia” que alguns denominaram, na Itália e aqui no Brasil, de “melhorista”.
Essa estratégia não apenas melhorou a vida da classe trabalhadora italiana, como converteu o comunismo numa força influente e vista como ameaçadora pela classe dominante e pelos Estados Unidos, que atuaram tanto aberta quanto secretamente para evitar o êxito da aliança entre o PCI e a Democracia Cristã. Lucio Magri trata dessas operações, especialmente visíveis no caso Aldo Moro.
Bloqueado pela direita, o PCI tentou – sob a direção de Berlinguer – uma saída pela esquerda. Os capítulos que tratam dessa fase são talvez os mais interessantes de O alfaiate de Ulm, em parte por discutirem se a história poderia ter seguido um caminho diferente.
Como sabemos, entretanto, não foi isso o que ocorreu. Ao longo dos anos 1970 e 1980, alteraram-se profundamente os parâmetros dentro dos quais se movera a política no pós-Segunda Guerra Mundial, tanto na Itália quanto no mundo. O PCI não conseguiria chegar ao poder nos marcos daqueles parâmetros em vias de desaparecimento. Não conseguiria tampouco defendê-los frente à ofensiva neoliberal e à crise do socialismo. Nem conseguiria sobreviver para atuar nas novas condições.
Lucio Magri descreve, num tom profundamente autocrítico e em certo momento impiedoso consigo mesmo, as opções feitas pela maioria dirigente do PCI, que levaram à mudança do nome e das tradições políticas e culturais do Partido. Mostra como havia energias vivas na base militante do comunismo italiano, energias que não foram suficientes para dar vida ao projeto da Refundação Comunista.
Enfim, pelo que descreve, pelas conclusões a que chega e pelas perguntas que deixa, O alfaiate de Ulm de Lucio Magri é leitura mais do que relevante para os que têm interesse em compreender os dilemas atuais do Partido dos Trabalhadores e do conjunto da esquerda e os rumos da política brasileira neste terceiro milênio.
Valter Pomar – Doutor em História Econômica, Universidade de São Paulo (USP). Professor de economia política internacional no Bacharelado de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC. Universidade Federal do ABC. São Bernardo do Campo, SP, Brasil. E-mail: pomar.valter@gmail.com.
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Conceiving Freedom: Women of Color, Gender, and the Abolition of Slavery in Havana and Rio de Janeiro – COWLING (RBH)
COWLING, Camillia. Conceiving Freedom: Women of Color, Gender, and the Abolition of Slavery in Havana and Rio de Janeiro. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2013. 344p. Resenha de: SANTOS, Ynaê Lopes dos. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, no.72, MAI./AGO. 2016.
Ramona Oliva e Josepha Gonçalves de Moraes poderiam ter sido heroínas dos folhetins e romances que enchiam de angústia e compaixão a alma dos leitores do final do século XIX. Negras, cativas ou ex-escravas, essas mulheres foram em busca do aparato legal disponível em Havana e no Rio de Janeiro, respectivamente, e fizeram de sua condição e do afeto materno as principais armas na longa luta pela liberdade de seus filhos na década de 1880. Todavia, a saga dessas mulheres não era fruto da vertente novelesca do século XIX e tampouco foi fartamente estampada nos jornais da época. Para conhecer e nos contar essas histórias, Camillia Cowling fez uma intensa pesquisa em arquivos do Brasil, de Cuba, Espanha e Grã-Bretanha, tecendo com o cuidado que o tema demanda a trajetória de mulheres negras – libertas e escravas – que entre o fim da década de 1860 e a abolição da escravidão em Cuba (1886) e no Brasil (1888) utilizaram o aparato legal disponível nas duas maiores cidades escravistas das Américas para lutar pela liberdade de seus filhos e filhas.
A fim de dar corpo a uma história que muitas vezes é apresentada como estatística, a autora examinou uma série de documentos legais produzidos a partir da década de 1860 para compreender os caminhos traçados por algumas mulheres em busca da liberdade. Em pleno diálogo com as importantes bibliografias sobre gênero e escravidão produzidas nos últimos anos, Camillia Cowling nos brinda com um livro sobre mulheres negras, maternidade, escravidão e liberdade, demonstrando como as histórias de Ramona, Josepha e outras tantas libertas e escravas, longe de serem anedotas do sistema escravista, podem ser tomadas como portas de entrada para a compreensão mais fina da dinâmica da escravidão no Novo Mundo nas duas últimas localidades em que essa instituição perdurou.
A complexidade do tema abordado e o ineditismo das articulações entre história da escravidão nas Américas, abolicionismo, dinâmica urbana, agência de mulheres negras, maternidade e processos jurídicos se expressam na forma como a autora organizou sua obra.
Na primeira parte de seu livro, Camillia Cowling trabalhou com a relação entre escravidão e espaço urbano naquelas que foram as maiores cidades escravistas das Américas, Havana e Rio de Janeiro. Analisando as dinâmicas de funcionamento da escravidão urbana, a autora sublinhou que as cidades não devem ser tomadas como mero pano de fundo dos estudos sobre escravismo nas Américas, e assim construiu uma narrativa que corrobora boa parte do que a historiografia aponta: a força que a escravidão exerceu sobre o funcionamento dessas urbes. Tal força poderia agir tanto nas especificidades geradas em torno das atividades executadas pelos escravos urbanos – sobretudo no que tange à maior autonomia dos escravos de ganho -, como nos sentidos e usos que essas cidades passaram a ter para a população escrava e liberta, a qual muitas vezes fez do emaranhado espaço citadino esconderijos e refúgios de liberdade. O engajamento jurídico das mulheres escravas e libertas frente às políticas graduais de abolição de cada uma dessas cidades é, pois, apresentado como mais uma característica da complexa dinâmica que permeou a escravidão urbana no Rio de Janeiro e em Havana.
A escolha pelas duas cidades não foi aleatória, muito menos pautada apenas por índices demográficos. Ainda que a autora tenha anunciado trabalhar com base na metodologia da micro-história, a abordagem comparativa que estrutura sua análise se pauta no diálogo com perspectivas mais sistêmicas da escravidão das Américas, principalmente com as balizas que norteiam a tese da segunda escravidão (Tomich, 2011). Como vem sendo defendido por uma crescente vertente historiográfica, a paridade entre Havana e Rio de Janeiro – pressuposto fundamental da análise de Camillia Cowling – seria resultado de uma série de escolhas semelhantes feitas pelas elites de Cuba e do Brasil em prol da manutenção da escravidão desde o último quartel do século XVIII até meados do século XIX, mesmo em face do crescente movimento abolicionista. Tal política pró-escravista (que também foi levada a cabo pelos Estados Unidos) teria permitido que a escravidão moderna se adequasse à expansão capitalista, criando assim um chão comum na dinâmica da escravidão nessas duas localidades, inclusive no que concerne às possibilidades legais que os escravos acionaram para lutar pela liberdade – possibilidades essas que se ampliaram após a abolição da escravidão nos Estados Unidos. Não por acaso, as capitais de Cuba e do Brasil transformaram-se em espaços privilegiados para que mulheres negras, apropriando-se do próprio conceito de maternidade e ressignificando-o, utilizassem as leis abolicionistas reformistas, nomeadamente a Lei Moret de Cuba (1870) e a Lei do Ventre Livre do Brasil (1871), para resgatar seus filhos do cativeiro.
Os caminhos percorridos pelas mulheres escravas e libertas e as muitas maneiras por meio das quais elas conceberam a liberdade (de seus filhos e delas próprias) passam a ser examinados pormenorizadamente a partir da segunda parte do livro. A pretensa universalidade do direito sagrado da maternidade foi uma das ferramentas utilizadas nos discursos abolicionistas do Brasil e de Cuba, os quais apelavam para um sentimento de igualdade entre as mães, independentemente de sua cor ou condição jurídica. Como destaca a autora, a evocação do sentimento de emoção transformou-se numa estratégia importante do movimento abolicionista que, a um só tempo, pregava a sacralidade da maternidade e ajudava a forjar um novo código de conduta da elite masculina, que começava a enxergar a mulher escrava de outra forma.
Camillia Cowling demonstra que a sacralidade universal da maternidade foi apreendida de diferentes formas nas sociedades escravistas. Se por um lado, a partir da década de 1870, tal assertiva ganhou força quando a liberdade do ventre ganhou status de lei, por outro lado a pretensa igualdade que a maternidade parecia garantir para as mulheres muitas vezes parecia restringir-se ao campo jurídico, mais especificamente, à luta gradual pela liberdade. Revelando uma vez mais a complexidade dos temas abordados, Camillia Cowling destaca que esses mesmos abolicionistas muitas vezes descriam na feminilidade das mulheres negras (brutalizadas pela escravidão), colocando-se contrários às relações inter-raciais, embora defendessem a manutenção das famílias negras.
Todavia, nesse contexto, o ponto alto do livro reside justamente no exame das estratégias empregadas pelas mulheres negras para lutar, juridicamente, pela liberdade não só de seu ventre, mas de seus filhos. A compreensão que essas mulheres tinham das leis graduais de abolição; o entendimento também compartilhado por elas de que as cidades do Rio de Janeiro e de Havana não eram apenas espaços privilegiados para suas lutas, mas também uma parte importante para a definição do que a liberdade poderia significar; e as redes de solidariedade tecidas por essas mulheres, que muitas vezes extrapolavam os limites urbanos, são algumas das questões trabalhadas pela autora.
Os desdobramentos dessas questões são muitos, a maioria dos quais analisada por Camillia Cowling na última parte de seu livro. As concepções que as mulheres negras desenvolveram sobre liberdade e feminilidade com base na maternidade merecem especial atenção, pois elas permitem, em última instância, redimensionar os conceitos de escravidão e, sobretudo, de liberdade nos anos finais de vigência da instituição escravista das Américas e nos primeiros anos do Pós-abolição. Se é verdade que, assim como aconteceu como Josepha Gonçalves e Ramona Oliva, a luta jurídica pela liberdade de seus filhos não teve o desfecho desejado e eles continuaram na condição de cativeiro, os caminhos e lutas trilhados por elas não só criaram outras formas de resistência à escravidão – que por vezes, tiveram outros desfechos -, como ajudaram a pautar práticas de liberdade e de atuação política que ganhariam novos contornos na luta pela cidadania plena alguns anos depois.
O tratamento dado pela autora sobre a luta de mulheres/mães pela liberdade de seus filhos e a forma por meio da qual ela enquadra tais questões naquilo que se convém chamar de “contexto mais amplo” faz que Conceiving Freedom possa ser tomado como uma importante contribuição nos estudos da escravidão urbana, não só por sua perspectiva comparada, mas também por trabalhar num território de fronteira da historiografia clássica, demonstrando que os limites entre o mundo escravista e o mundo da cidadania não podem ser balizados apenas pela declaração formal da abolição da escravidão. A luta começou antes dessas datas oficiais e continuou nos anos seguintes, sobre isso não restam dúvidas. Todavia, o protagonismo desse movimento não se restringiu às ações dos homens que lutaram pela abolição. Ao invés de fechar uma temática, o trabalho de Cowling indica novos caminhos num campo que poderá trazer contribuições promissoras para os estudos da escravidão e da liberdade nas Américas.
Por fim, vale ressaltar que num momento político como o atual, em que tanto se fala, se discute e se experimenta o empoderamento de mulheres negras, o livro de Camillia Cowling é igualmente bem-vindo. Não só por iluminar trajetórias que foram silenciadas ou tratadas como simples anedotas (demonstrando que a luta não é de hoje), mas igualmente por permitir repensar os moldes e os modelos por meio dos quais as histórias e as memórias da escravidão e da luta pela liberdade são construídas.
Referências
TOMICH, Dale. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e economia mundial. São Paulo: Edusp, 2011. [ Links ]
Ynaê Lopes dos Santos – Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Professora Adjunta de História da Escola Superior de Ciências Sociais CPDOC-FGV. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: ynae.santos@fgv.br.
Um estilo de história: a viagem, a memória, o ensaio: sobre Casa-grande & senzala e a representação do passado – NICOLAZZI (RBH)
NICOLAZZI, Fernando. Um estilo de história: a viagem, a memória, o ensaio: sobre Casa-grande & senzala e a representação do passado. São Paulo: Ed. Unesp, 2011. 484p.Resenha de: PALLARES-BURKE, Maria Lúcia Garcia. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, no.72, MAI./AGO. 2016.
Tanto já se escreveu sobre Gilberto Freyre, e particularmente sobre Casa-grande & senzala, que está cada vez mais difícil se dizer alguma coisa nova e significativa sobre o autor ou sobre o livro de 1933. O risco de “chover no molhado”, como o próprio Nicolazzi diz, é bastante grande. Entre os estudiosos anteriores de Casa-grande, Nicolazzi está mais próximo de Ricardo Benzaquen, cujo trabalho reconhece como inspirador, mas oferece uma visão propriamente sua da obra de Freyre.
Um estilo de História é uma versão ligeiramente modificada de uma tese de doutorado defendida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 2008, que recebeu o prêmio Manoel Luiz Salgado Guimarães da Anpuh em 2010. Apesar de Nicolazzi não ter aproveitado esse lapso de 7 anos entre a defesa e a publicação de 2015 para fazer referência aos estudos publicados nesse intervalo, dá uma contribuição original para a montanha do que se pode chamar de “Estudos Freyreanos”, examinando Casa-grande de vários ângulos. Como o próprio autor confessa logo no início, seu livro é “um conjunto de ensaios travestido em tese universitária”, o que é muito apropriado no caso do estudo de um autor que adorava o gênero ensaístico e descrevia até mesmo sua volumosa obra de novecentas e tantas páginas, Ordem e Progresso, como um “ensaio”. O que mantém Um estilo de História mais ou menos coeso é o argumento do autor de que Freyre escolheu um estilo de representação do passado, um modo de proximidade, que diferia muito das representações anteriores empregadas por antigas histórias do Brasil; e que esse estilo pode ter mesmo sido adotado por Freyre em resposta direta a Os sertões.
Para justificar sua tese sobre representações, Nicolazzi adota o método de leitura atenta (close reading) dos textos para chegar a conclusões sobre o estilo, as estratégias literárias e os modos de persuasão tanto de Euclides da Cunha quanto de Gilberto Freyre. Seus sete ensaios-capítulos são organizados em três seções. A primeira se inicia com um relato da recepção de Casa-grande no Brasil (em outras palavras, representações de uma representação), e daí se volta para os dez prefácios do autor, nos quais ele se defendia contra más representações de sua obra, ou deturpações, e conversava, por assim dizer, com seus resenhistas. A segunda seção, que compreende mais dois ensaios, deixa Freyre de lado para se concentrar em Euclides da Cunha. A terceira seção retorna a Freyre, com três capítulos dedicados respectivamente a viajantes, memórias e ao próprio gênero do ensaio. Nicolazzi considera Freyre um viajante que privilegiava o testemunho de outros viajantes e oferecia aos seus leitores a sensação de estarem viajando ou no espaço ou no tempo. Também enfatiza a importância das memórias em Casa-grande: as do próprio autor, as de sua família e as dos indivíduos que entrevistou, o mais famoso dos quais foi o ex-escravo Luiz Mulatinho. O livro termina com um ensaio sobre o ensaio, refletindo sobre ensaios históricos e sobre a tradição brasileira do ensaísmo, a fim de buscar a singularidade da contribuição de Freyre para essa tradição.
Um estilo de História é fruto de uma leitura vasta e variada, que inclui não somente a historiografia, de Heródoto a Hayden White, mas também filosofia, literatura, psicologia, sociologia e antropologia, os campos nos quais o próprio Freyre estava muito à vontade. Nas páginas de Nicolazzi, Paul Ricoeur está ao lado de Wolf Lepenies, Roland Barthes ao lado de Clifford Geertz, Oliver Sacks de Quentin Skinner, François Hartog de Walter Benjamin, Jean Starobinski de Frank Ankersmit, Michael Baxandall de Gérard Genette, além de outros. Enfim, tantos nomes, tantas luzes a iluminar um texto.
Assim como a justaposição do livro de Euclides com o de Sarmiento, Civilização e barbárie, se tornou um tópos, o mesmo aconteceu com a comparação e o contraste entre Os sertões e Casa-grande, que novamente coloca a representação do “outro” versus a representação de “nós” em pauta. No entanto, Nicolazzi desenvolve esse contraste de modo interessante e valioso, focalizando pontos de vista. Segundo ele, o contraste essencial entre Freyre e Euclides – cujo trabalho Freyre estudou cuidadosamente e sobre o qual escreveu mais de uma vez – é que Euclides exemplifica o que Claude Lévi-Strauss chamou de “olhar distante”, observando e representando outra cultura como se estivesse pairando alto no ar; uma cultura que ele via como oposta à sua própria, ou seja, uma representando a civilização, e a outra, a barbárie. Sua estratégia literária era a do naturalista, registrando detalhes com o espírito de um cientista, uma espécie de Émile Zola do sertão. Em contraste, Freyre, como um antropólogo no campo, tentava chegar perto dos escravos e ainda mais perto dos senhores (e das senhoras) de engenho sobre os quais escreveu. Como Michelet – e diferentemente de Euclides – Freyre tentava evocar o passado, suprimir a distância e identificar-se com os mortos e com tudo o que já se foi. Ele pode até ser criticado – e o foi por Ricardo Benzaquen – por estar “correndo o risco de uma proximidade excessiva”.
Há muito a ser dito em favor desse contraste. Afinal de contas, Freyre disse em certa ocasião que “o passado nunca foi, o passado continua”. Sua “história íntima” e sua “história sensorial” tentavam exatamente tornar os leitores capazes de ver, ouvir, cheirar, sentir o gosto e até mesmo tocar o passado. O elemento autobiográfico em Casa-grande, enfatizado ainda mais em 1937 em seu Nordeste, é efetivamente central, e a confusão entre a vida do autor, de sua família e de sua região natal (ilustrada pelo uso frequente que Freyre faz da primeira pessoa do plural) é, na verdade, reminiscente de Michelet.
No entanto, a oposição entre distância e proximidade precisa ser qualificada, se não mesmo questionada – do mesmo modo como o próprio Freyre gostava de primeiro estabelecer, para depois solapar as categorias opostas de sobrados e mocambos, ordem e progresso, e assim por diante. Pois Freyre não era adepto de polaridades rígidas – que não davam conta dos paradoxos, contradições e complexidades da realidade humana – e se apelava para oposições binárias, sua estratégia era sempre enfraquecê-las por meio de mediações entre opostos, para o que o uso de termos recorrentes como quase-, para-, semi- se adaptava muito bem.
Assim, no que diz respeito à proximidade que Freyre pretenderia ter de seu objeto de estudo, deve-se acrescentar que ele também era capaz de ver seu próprio país com olhos estrangeiros. Seu emprego recorrente de textos escritos por viajantes como evidência não somente dá aos leitores a sensação de “estarem lá”, como Nicolazzi sugere, mas também os provê com distanciamento, já que os viajantes são frequentemente estrangeiros que podem ver mais facilmente o que nativos não veem. De qualquer modo, em algumas de suas passagens menos memoráveis, Freyre escorrega de seu estilo usualmente vívido e subjetivo e cai, por assim dizer, numa linguagem acadêmica, objetiva, escrevendo no capítulo 1, por exemplo, que “por mais que Gregory insista em negar ao clima tropical a tendência para produzir per se sobre o europeu do Norte efeitos de degeneração … grande é a massa de evidências que parecem favorecer o ponto de vista contrário”. Aqui, como em outros pontos da obra, a proximidade e a subjetividade do estudo da sociedade patriarcal dão lugar ao distanciamento e à objetividade. Pode-se, pois, descrever Casa-grande muito apropriadamente como um livro híbrido, não somente no sentido de combinar técnicas científicas e de ficção, como Nicolazzi aponta, mas também por se mover entre o fora e o dentro, entre distância e proximidade.
Como uma boa tese de doutorado, Um estilo de História é extremamente minuciosa e, em certos aspectos, ainda “cheira” a uma tese no sentido de que o autor não parece saber bem quando parar, repetindo argumentos e mesmo citações (uma delas três vezes) a fim de fortalecer seu argumento. Os leitores, ou ao menos alguns deles, podem ter às vezes a sensação de que Nicolazzi está usando uma marreta para abrir uma noz. Como muitas teses brasileiras, Um estilo de História está também sobrecarregada de reflexões sobre método e teoria, assim como apoiada em grande bagagem intelectual, desconsiderando, às vezes, o princípio conhecido como “o rifle de Chekhov”. Chekhov certa vez aconselhou os escritores a “removerem tudo que não tem relevância para a estória. Se você diz no capítulo primeiro que tem um rifle pendurado na parede, no segundo ou no terceiro esse rifle tem necessariamente de ser usado para atirar em alguma coisa. Se não for para ser disparado, então o rifle não deveria estar pendurado lá”. Do mesmo modo, se a Metahistory de Hayden White é discutida na introdução, como foi o caso, os leitores seguramente têm o direito de esperar que o livro de White seja usado mais tarde, discutindo, por exemplo, se Casa-grande & senzala foi “encenada” como uma comédia ou romance. Essas expectativas, no entanto, são frustradas.
Outra questão que importa levantar diz respeito ao uso acrítico que Nicolazzi fez, algumas vezes, dos escritos autobiográficos de Freyre, especialmente de seu “diário da juventude”. Esse texto ocupa lugar importante no livro para reforçar seu argumento sobre a legitimidade que as experiências vividas por Freyre dão ao estilo de história que escolheu escrever. Há evidências de que esse diário “da juventude”, publicado em 1975, não foi efetivamente redigido entre 1915 e 1930, tal como o Freyre maduro – tão envolvido em self-fashioning – quis fazer crer. Ele era, na verdade, exímio na arte da autoapresentação, produzindo com esmero a imagem que os leitores deveriam ter dele. Nicolazzi reconhece isso logo na primeira parte de seu livro. No entanto, várias vezes utilizará esse “diário”, ou ensaio-memória, como se ele representasse fielmente o que o autor fizera ou pensara quando ainda estava para escrever Casa-grande. É de se crer que esses deslizes se devam ao fato de o livro incluir textos escritos em momentos diversos, e que falhas ou descuidos como esses compreensivelmente escaparam na revisão.
Não obstante esses pequenos senões, Um estilo de História é livro inovador e perspicaz que elucida, inspira e instiga a curiosidade do leitor. É também valioso por tratar de ideias de proximidade e distância nos moldes de alguns estudos recentes e refinados sobre “distância histórica”, em especial os desenvolvidos por Mark Phillips e alguns de seus colegas. Particularmente interessante é a diferenciação que Phillips faz entre distância e distanciamento, o primeiro uma postura espontânea entre os historiadores, o segundo uma estratégia proposital usada por alguns deles para trazer o passado para perto do leitor, como num close-up, quando assim acham importante, ou distanciar o passado para obter outros efeitos. Enfim, a retórica da proximidade e da distância como uma ferramenta que alguns historiadores usam conscientemente, como um romancista, para causar determinados efeitos em seus leitores, é uma linha de estudos fecunda à qual o livro de Nicolazzi pode ser associado. E, nesse sentido, Um estilo de História tem o grande mérito de potencialmente acenar para um novo e promissor fio a ser seguido pelos estudiosos de historiografia e de Gilberto Freyre.
Maria Lúcia Garcia Pallares-Burke – Research Associate, Centre of Latin American Studies, University of Cambridge. Cambridge, UK. E-mail: mlp20@cam.ac.uk.
Provas de liberdade: uma odisseia atlântica na era da emancipação – SCOTT; HÉBRARD (RBH)
SCOTT, Rebecca J. Hébrard, Jean M. Provas de liberdade: uma odisseia atlântica na era da emancipação. Campinas: Ed. Unicamp, 2014. 296p. Tradução de Vera Joscelyne. Resenha de: MAMIGONIAN, Beatriz Gallotti. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, no.72, MAI./AGO. 2016.
Doze milhões de pessoas foram transportadas involuntariamente do continente africano para as Américas entre os séculos XV e XIX para serem vendidas como escravas. Em Provas de liberdade, Rebecca Scott e Jean Hébrard reconstituíram a trajetória de uma delas, Rosalie, de nação Poulard, e seguiram seus descendentes por cinco gerações historiando grandes temas da era contemporânea como a abolição da escravidão de africanos, a cidadania e as lutas contra o racismo.
Rebecca Scott, professora de História da América Latina e de Direito da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, é conhecida do público brasileiro por seu livro Emancipação escrava em Cuba, cuja abordagem da desintegração da escravidão na colônia espanhola deu poder explicativo para a mobilização de escravos e libertos e teve um impacto significativo na historiografia brasileira da escravidão. Jean Hébrard é um dos diretores do Centre de Recherches sur le Brésil Colonial et Contemporain da École des Hautes Études en Sciences Sociales, na França, e professor visitante de História da América Latina e Caribe na Universidade de Michigan. O livro, publicado em inglês em 2012, rendeu aos autores dois prêmios da American Historical Association concedidos a livros sobre a História das Américas e sobre História Atlântica, em 2012, e um da Sociedade Americana de Estudos Franceses e do Instituto Francês de Washington para livros sobre temas comuns à França e às Américas, em 2013. Como Papeles de libertad, foi publicado em Cuba pelas Ediciones Unión e na Colômbia pelo Instituto Colombiano de Antropologia e História (ICANH). A edição brasileira, da Editora da Unicamp, contou com tradução de Vera Joscelyne e revisão técnica por equipe coordenada pelos autores e incluiu ilustrações, um mapa e um índice apenas onomástico – quando a edição original tinha índice remissivo onomástico e temático.
Provas de liberdade, como todo bom livro, tem diferentes camadas de entendimento e apreciação. Historiadores de qualquer área vão reconhecer a extensão da pesquisa e a originalidade da proposta metodológica; os especialistas na área de escravidão vão observar as contribuições historiográficas, e o público não especialista terá uma leitura prazerosa, emocionante e surpreendente.
Como relatam os autores, a pesquisa começou com a descoberta de uma carta no Arquivo Nacional de Cuba enviada da Bélgica por Edouard Tinchant ao general cubano Máximo Gomez no fim do século XIX. Nela, Tinchant declarava simpatia pela causa da independência de Cuba e associava a sua trajetória e a de sua família às lutas por cidadania e contra o racismo. Scott e Hébrard partiram, então, a verificar e reconstituir a história dessas pessoas que “personifica[vam] uma conexão entre três das maiores lutas antirracistas do ‘longo século XIX’: a Revolução Haitiana, a Guerra Civil e a Reconstrução nos Estados Unidos, e a Guerra Cubana pela independência” (p.17). O método, que os autores batizaram de “micro-história em movimento”, consistiu em seguir o rastro documental da família de Edouard Tinchant, duas gerações para trás e duas para a frente, por meio de documentos públicos e privados de todo tipo, garimpados em arquivos de oito países em três continentes e, na falta deles, preencher os vazios com dados que se associavam às trajetórias seguidas tanto por proximidade quanto por probabilidade. Sabendo, por exemplo, pela certidão de nascimento da mãe de Edouard, Elisabeth, que a mãe dela era Marie Françoise, conhecida por Rosalie, negra de nação Poulard, Scott e Hébrard puderam situar seu local de origem, a colônia francesa do Senegal, e o período aproximado de sua venda para o tráfico atlântico entre a Senegâmbia e Santo Domingo, o final da década de 1780. A falta de registros pessoais da primeira fase da vida da mulher que mais tarde se chamaria Rosalie foi então contornada pelos autores com o recurso a relatos contemporâneos de europeus, a documentos sobre a escravidão na colônia francesa do Senegal e à literatura secundária sobre a África Ocidental, o Islã na África e o tráfico atlântico do final do século XVIII.
No início da década de 1980, quando a área de estudos de escravidão começava a ganhar contornos e os especialistas ainda cabiam em um auditório, esboçava-se uma transição entre abordagens: de um lado, a do sistema de organização do trabalho e exploração dos trabalhadores, que dialogava com as teorias econômicas, e de outro, a das relações entre sujeitos históricos com autodeterminação, que abria o leque de influências disciplinares para incluir a sociologia, a antropologia e a linguística. Nessa fase, os historiadores passaram a observar mais de perto os mecanismos de reprodução do sistema, seus “segredos internos”, e com isso o comportamento dos grupos sociais, seus interesses e conflitos. O reconhecimento do protagonismo dos sujeitos históricos das camadas subalternas abriu espaço para que se multiplicassem as pesquisas em que a escala de análise dos diversos temas – trabalho, família, resistência, identidade étnica, práticas mágicas e religiosidade, entre outros – fosse a do indivíduo.
Depois de três décadas de grande florescimento e efervescência, a abordagem centrada nas pessoas escravizadas se vê às voltas com críticas acerca da representatividade dos sujeitos escolhidos e também da relevância dos seus achados para o entendimento dos grandes processos da História. Por isso, Provas de liberdade é ao mesmo tempo um libelo em defesa do jogo de escalas e uma demonstração de como proceder para incorporar o protagonismo dos sujeitos em uma análise dos processos históricos.
Os autores não trataram seus personagens como típicos ou excepcionais. A cada momento, na geração de Rosalie, de sua filha Elisabeth, de seu neto Edouard Tichant ou dos sobrinhos e sobrinhos-netos dele, Scott e Hébrard buscaram retratar momentos difíceis de tomada de decisão, de escolhas entre diferentes caminhos possíveis. Cada capítulo acaba com alguém embarcando rumo a uma nova fase na vida, sempre sob pressão ou ameaça. Foi assim quando Rosalie, já liberta, mas sem documento oficializado de sua liberdade, teve que fugir de Saint Domingue para Cuba com a filha Elisabeth em 1803, ou ainda quando a africana embarcou Elisabeth com sua madrinha para New Orleans, na Louisiana, em 1809 e voltou para o Haiti, agora independente. Foi ainda o caso da escolha feita por Elisabeth e seu marido, Jacques Tinchant, ele também filho de emigrantes haitianos de origem africana, de partir com quatro filhos para a França, país onde teriam direitos civis que não eram reconhecidos às pessoas livres de cor na Louisiana escravista da década de 1840. Foi igualmente a escolha de Edouard, nascido na França em 1841, de se juntar a dois de seus irmãos que trabalhavam em manufaturas de charutos em New Orleans. Na Louisiana, Edouard se engajou num batalhão de pessoas de cor durante a Guerra Civil, do lado da União, e depois entrou para a política, sendo eleito deputado da Assembleia Constituinte da Louisiana durante a Reconstrução, quando defendeu a igualdade de direitos civis, políticos e públicos para todos os cidadãos. Em cada trajetória e em cada momento vemos sujeitos fazendo escolhas em condições adversas, reagindo às limitações impostas pela conjuntura, protagonizando eventos e processos históricos como as transformações da escravidão e sua abolição, o pós-emancipação, ou mesmo a resistência ao nazismo na Segunda Guerra Mundial, história que antes víamos apenas de longe.
O diferencial metodológico do livro está na aproximação com o campo do Direito. Em primeiro lugar, os autores lançaram um novo olhar para os registros individuais. Sob a lupa do historiador cuidadoso, os documentos revelaram histórias complexas da aquisição e exercício de direitos (à propriedade, à liberdade, à nacionalidade, à cidadania), desnaturalizando-os e inscrevendo-os num campo de disputas. Assim, o direito à propriedade sobre escravos pode vir de uma apropriação ilegítima, posteriormente formalizada, como a que aconteceu entre milhares de ex-escravos de Saint Domingue que migraram para Cuba e depois para a Louisiana, onde a escravidão persistia: acabaram reescravizados. Em segundo lugar, Scott e Hébrard convidam os leitores a perceber como os protagonistas conferiam importância aos documentos escritos, mesmo que às vezes não pudessem ler. Essa consciência levou Rosalie a fazer questão de uma carta de alforria mesmo já sendo emancipada, pois nos territórios para onde iria ainda havia escravidão e ela sabia que precisaria provar sua condição. Nisso, percebemos que o entendimento sobre o significado e mesmo o conteúdo dos documentos sempre esteve em disputa entre as diversas forças sociais (incluindo as autoridades), e que as pessoas frequentemente se moviam na incerteza; não havia garantia plena de que uma pessoa livre de cor não fosse reescravizada, pois a fronteira entre escravidão e liberdade era bem mais porosa e cinzenta do que antes imaginávamos. Por último, é preciso ressaltar novamente a importância da abordagem simultânea em diferentes escalas, pois, ao narrar a história pelo fio condutor dos embates dessa família pelo reconhecimento de direitos – à liberdade, à respeitabilidade, à dignidade e igualdade perante a lei – os autores fizeram uma história social centrada na luta por direitos, sobretudo direitos humanos, no período entre a Revolução Francesa e o fim da Segunda Guerra Mundial, quando o protagonismo dos negros, mulheres e povos submetidos à colonização forçou sua ressignificação e ampliação até serem reconhecidos como universais.
Em suma, Provas de liberdade é uma obra acadêmica rigorosa e inovadora que os leitores terão o prazer de ler como um romance.
MAMIGONIAN, Beatriz Gallotti. – Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil. beatriz.mamigonian@ufsc.br.
Perspectivas recentes da História Medieval no Brasil / Revista Brasileira de História / 2016
Muito embora os estudos medievais no Brasil não possuam longa tradição, uma observação mais atenta mostra que seu desenvolvimento acompanhou de perto a institucionalização dos estudos históricos no país. Exemplo significativo disso é que a reunião que deu origem à Anpuh – a Associação Nacional dos Professores Universitários de História (atual Associação Nacional de História) -, acontecida em 1961 na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Marília, foi um momento decisivo também para os estudos medievais. Eurípedes Simões de Paula, professor da Universidade de São Paulo e autor da primeira Tese de Doutorado em História defendida no Brasil, um trabalho na área de História Medieval, coordenou a discussão, cujo resultado foi a veemente e unânime defesa da especialização como condição necessária à interação efetiva entre ensino e pesquisa. Entendia-se que formar medievalistas, inclusive incentivando estágios em centros de excelência no exterior, significava sustentar a importância do próprio conhecimento histórico no país.
As moções aprovadas em Marília por representantes das principais instituições de ensino e pesquisa histórica brasileiras dependiam, para se efetivar, de repercussão na política nacional de ciência e tecnologia. Essa repercussão foi conquistada, mas levou tempo até sua efetivação. A separação entre a História Antiga e a História Medieval permaneceu algo raro nas universidades públicas ou privadas até o final dos anos 1970 – como também era raro encontrar especialistas dessas áreas ministrando as respectivas disciplinas. Foi somente a partir dos anos 1990 que o Brasil passou a contar com um número considerável de centros de formação de Mestres e de Doutores; foi também a partir desse período que as instituições de fomento puderam acompanhar de forma mais efetiva as demandas decorrentes do crescimento da Pós-Graduação.
Desde então, assistimos à ampliação considerável dos grupos de pesquisa, à diversificação das temáticas abordadas e a um aumento sem precedentes do número de pesquisadores na área de História Medieval. Os setenta programas de Pós-Graduação atualmente existentes na área de História – cerca de metade deles estabelecida nos últimos 10 anos – permitiram que se criasse um ambiente cada vez mais favorável à pesquisa em História Medieval e à formação de medievalistas. Essa expansão dos estudos medievais explica o aparecimento recente de uma série de balanços sobre a área. Artigos, e mesmo um livro, procuraram refletir sobre os estudos medievais no Brasil, contrapondo passado e futuro das pesquisas e do ensino e estabelecendo perspectivas para sua inserção social.[1]
Nossa intenção com este dossiê é bastante distinta. Não se trata de olhar para o que já foi feito, mas de oferecer ao leitor um panorama da pesquisa recente na área de História Medieval no Brasil. É claro que não se trata de um panorama completo, o que exigiria – felizmente, diga-se de passagem – um espaço bem maior do que o de um dossiê. Trata-se aqui de apresentar, efetivamente, alguns resultados desse futuro presumido pelos balanços realizados. Os textos aqui reunidos mostram a pujança temática da área, a atualidade de seu diálogo com as ciências sociais e a persistência de sua autocrítica.
“A Cronaca di Partenope e o Reino de Nápoles: contribuições de e para a historiografia brasileira no século XXI”, artigo de Igor Teixeira, propõe um estudo do Ms. Italien 301 Cronaca di Partenope, levando em conta o acesso digital aos manuscritos e as habilidades necessárias para a análise, procurando responder à questão: “Em que este estudo pode contribuir para os estudos medievais no Brasil?”.
Em seu artigo, intitulado “Algumas experiências, perspectivas e desafios da Medievalística no Brasil frente às demandas atuais”, Aline Dias da Silveira discute alguns dilemas das pesquisas brasileiras na área de História Medieval, bem como a originalidade de seu olhar sobre a historiografia europeia.
Em “Uma calamidade insaciável: espaço urbano e hegemonia política em uma história dos incêndios (880-1080)”, Leandro Rust dedica sua atenção aos incêndios que devastaram os espaços urbanos do Regnum Italicum nesse período de 200 anos. O autor questiona as interpretações tradicionais que ou naturalizam essas ocorrências como fatalidades ou acidentes, ou buscam explicá-las como epifenômenos de uma suposta desordem feudal. Para Leandro Rust, o aparecimento documental dos incêndios teria raízes políticas.
Maria Filomena Coelho, em seu artigo “Cartas políticas da Dinastia de Avis: a arte de ditar o bem comum (século XV)”, pretende analisar algumas cartas escritas no século XV por personagens-chave da dinastia de Avis, a partir da noção de “cultura política”. Essa noção permite que a análise vá além da retórica, tal como era tradicionalmente entendida a epistolografia, permitindo ao historiador compreender uma trama discursiva complexa, que, embora pareça seguir fórmulas, não deixa de atender às circunstâncias e aos casuísmos da política, mas, sobretudo, que propõe e evoca valores políticos, como o do bem comum.
Esperamos, com este dossiê, apresentar algumas pesquisas que são, em última instância, o resultado da especialização e da institucionalização dos estudos medievais no Brasil. E, assim, divulgá-las não apenas a colegas e a estudantes que desejam aproximação com a área, mas também àqueles que, confiantes em que a pujança dos estudos humanos e sociais repousa no diálogo e no entendimento mútuo, estão interessados em estabelecer novas interlocuções.
Nota
1. ALMEIDA, 2008; 2012; BASTOS; RUST, 2009; COELHO, 2006; FRAZÃO, 2013; MACEDO, 2003; RIBEIRO, 2001.
Referências
ALMEIDA, Néri de B. La formation des médiévistes dans le Brésil contemporain: bilans et perspectives (1985-2007). Études et Travaux. Bulletin du Centre d’Études Médiévales d’Auxerre (BUCEMA), v.12, p.145-159, 2008. Disponível em: http: / / cem.revues.org / 6652. [ Links ]
______. L’histoire médiévale au Brésil: du parcours solitaire à l’inclusion dans le champ des sciences humaines, In: ALMEIDA, Néri; CÂNDIDO DA SILVA, Marcelo; MEHU, Didier. Pourquoi étudier le Moyen Âge? Les médiévistes face aux usages sociaux du passé. Paris: Publications de la Sorbonne, 2012. p.125-143. [ Links ]
BASTOS, Mario J.; RUST, Leandro. “Translatio Studii”. A História Medieval no Brasil. Signum, n.10, p.163-188, 2009. [ Links ]
COELHO, Maria Filomena. Breves reflexões acerca da História Medieval no Brasil. In: SILVA, Leila Rodrigues (Dir.) Atas da VI Semana de Estudos Medievais do Programa de Estudos Medievais da UFRJ. Rio de Janeiro: PEM, 2006. p.29-33. [ Links ]
FRAZÃO, Andreia. Os estudos medievais no Brasil e o diálogo interdisciplinar. Medievalis, v.1, n.2, p.1-15, 2013. [ Links ]
MACEDO, José Rivair. Os estudos medievais no Brasil: catálogo de teses e dissertações. Porto Alegre: UFRGS, 2003. [ Links ]
RIBEIRO, Maria Eurydice B. Os estudos medievais no Distrito Federal. In: MALEVAL, Maria do Amparo T. (Dir.) Atas do III Encontro Internacional de Estudos Medievais. Rio de Janeiro: ágora, 2001. p.155-158. [ Links ]
Marcelo Cândido da Silva – Universidade de São Paulo (USP), Laboratório de Estudos Medievais (LEME). São Paulo, SP, Brasil. Professor de História Medieval da USP, Coordenador do Laboratório de Estudos Medievais (LEME) e Pesquisador do CNPq E-mail: candido@usp.br
Néri de Barros Almeida – Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Núcleo Unicamp do Laboratório de Estudos Medievais (LEME). Campinas, SP, Brasil. Professora de História Medieval da Unicamp, Coordenadora do Núcleo Unicamp do Laboratório de Estudos Medievais (LEME). E-mail: neridebarros@gmail.com
SILVA, Marcelo Cândido da; ALMEIDA, Néri de Barros. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.36, n.72, mai. / ago., 2016. Acessar publicação original [DR]
A cosmologia construída de fora: a relação com o outro como forma de produção social entre os grupos chaquenhos no século XVIII – FELIPPE (RBH)
FELIPPE, Guilherme Galhegos. A cosmologia construída de fora: a relação com o outro como forma de produção social entre os grupos chaquenhos no século XVIII. Jundiaí, SP: Paco Editorial, 2014. 376p. Resenha de: BASQUES JÚNIOR, Messias Moreira. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36,, n.71, jan./abr. 2016.
O livro A cosmologia construída de fora foi originalmente escrito como tese de doutorado e recebeu o Prêmio Capes na área de História em 2014. Trata-se de uma importante contribuição à história e à etnologia indígena das Terras Baixas da América do Sul, pois se baseia em uma aproximação bem-sucedida entre pesquisas antropológicas e um extenso corpo documental referente às práticas e concepções de povos chaquenhos e às suas relações com o outro no século XVIII: afins e inimigos, missionários e invasores europeus. O livro tem o mérito de abordar uma região pouco estudada pela antropologia brasileira: o Grande Chaco, uma das principais regiões geográficas da América do Sul e que constitui zona de transição entre a planície da bacia amazônica, a planície argentina e a zona subandina.2 A análise de registros produzidos por observadores civis e religiosos ao longo do século XVIII evidencia o contraste entre o discurso europeu, centrado na denúncia da barbárie e da inconstância que caracterizariam os nativos, e o modo propriamente indígena de responder ao avanço colonial. Felippe examina três aspectos da cosmologia chaquenha: a guerra, a reciprocidade, e o regime de produção e consumo alimentar. O fio condutor da análise é a mitologia desses povos, aqui entendida como fonte de conhecimento sobre o pensamento ameríndio.
Desde o título até suas páginas finais, o livro demonstra a fertilidade da proposição levistraussiana a respeito da importância da “abertura ao outro” no pensamento ameríndio e nos modos pelos quais esses povos costumam se situar diante da alteridade. Segundo Anne-Christine (Taylor, 2011), essa característica foi desde cedo detectada por Claude Lévi-Strauss, como mostram os dois artigos por ele publicados no ano de 1943 e que estabeleciam “o aspecto sociologicamente produtivo da guerra vista como forma de vínculo … e a primazia da afinidade no universo social dos índios, a primazia da relação com o não-idêntico sobre as ligações de consanguinidade ou, mais exatamente, de identidade” (Taylor, 2011, p.83). O tema da “abertura ao outro” inspirou profundamente os autores mobilizados por Felippe em seu diálogo com a antropologia e, sobretudo, com a etnologia amazonista. Inserindo-se nessa tradição, Felippe apresenta uma descrição histórica e etnográfica que corrobora uma tendência recente da antropologia chaquenha de acentuar as ressonâncias entre os povos da região e aqueles da Amazônia. Retomando o clássico artigo de (Seeger et al., 1979), alguns autores têm defendido a existência de um “pacote amazônico” (Londoño Sulkin, 2012, p.10) cujos componentes também estariam presentes no Grande Chaco e dentre os quais se destacam: o foco no corpo humano e seus elementos como matriz primária de significado social e a existência de um cosmos perspectivista que se encontraria mediado por relações com alteridades perigosas e potencialmente fecundas (Echeverri, 2013, p.41).
O primeiro capítulo trata dos mitos indígenas como construção da realidade, partindo de uma reflexão teórica acerca das diferenças entre o conhecimento objetivo e subjetivo, bem como das concepções de natureza e cultura que fundamentavam o cotidiano e os conhecimentos dos povos chaquenhos no século XVIII. Apesar da grande variedade de versões registradas nas fontes documentais, pode-se notar que, quando tomadas em conjunto, as narrativas míticas refletem problemas similares, como o tema da origem da humanidade e dos animais a partir de uma mesma constituição ontológica, de um fundo comum marcado pela comunicação interespecífica e pela partilha de subjetividade e da capacidade de agência. Felippe descreve como a absorção de ele- mentos exógenos era o eixo do pensamento indígena e, nesse sentido, as transformações criativas que se podem observar na mitologia desses povos revelariam a sua forma de refletir e de responder aos “brancos”, ora incorporando, ora recusando elementos do cristianismo, bem como os objetos, animais, atividades e tecnologias trazidos pelos europeus.
No segundo capítulo, a guerra aparece como meio por excelência para a internalização do outro e como produtora de relações entre diferentes sociedades e no interior de cada uma delas. Nas palavras do autor, a guerra chaquenha era diametralmente oposta à guerra praticada pelos europeus, pois “não se fundamentava na extinção do inimigo, nem na busca pela paz. Era, em realidade, o método mais eficaz de estabelecer relações e, consequentemente, movimentar o meio social” (Felippe, 2014, p.121). O modelo utilizado na análise da guerra chaquenha é “amazônico” e se apoia nas teorias da “economia simbólica da alteridade” (Viveiros de Castro, 1993) e da “predação familiarizante” (Fausto, 1997). A hipótese, em suma, é a de que em ambas as regiões encontraríamos “economias que predam e se apropriam de algo fora dos limites do grupo para produzir pessoas dentro dele” (Fausto, 1999, p.266-267).
Esse capítulo oferece um sólido contraponto às teses que defendem a ocorrência de escravidão – e o uso desse conceito na análise das práticas de apresamento – entre os ameríndios (cf. Santos-Granero, 2009), pois Felippe demonstra que “ao grupo vencedor interessava capturar pessoas e levá-las à sua aldeia como cativos de guerra, porém sem a intenção de mantê-los prisioneiros ou fazer deles escravos” (2014, p.175). Isto é, os cativos de guerra não eram con- vertidos em mercadorias e não viviam sob a lógica de uma objetificação de caráter utilitário: “se havia algum acúmulo era de relações sociais, e não de bens” (p.213). O mesmo pode ser dito acerca dos frequentes roubos e assaltos entre os povos da região e, sobretudo, contra reduções jesuíticas, cidades e vilarejos, práticas estas que lhes permitiam a obtenção de montaria, de armas e de bebidas alcoólicas, e que serviriam para intensificar uma lógica preexistente de captura do outro. Em suma, as reduções e as rotas de comércio “proporcionaram aos índios vantagens materiais e estratégicas que acrescentavam elementos à dinâmica relacional nativa – ao invés de substituí-la” (p.141).
A economia indígena é o tema da última parte do livro. No terceiro capítulo, retrata-se o avanço colonial por meio da implantação de relações comerciais e da integração dos povos nativos ao sistema mercantil. Sem menosprezar a violência e as suas consequências, o autor argumenta que os chaquenhos não foram meramente integrados ao mercantilismo, já que são abundantes os relatos acerca do protagonismo indígena no que concerne à potencialização das relações de reciprocidade com outros povos por intermédio de sua participação no comércio e na circulação de mercadorias não indígenas. Não obstante os esforços dos jesuítas para incutir entre os indígenas o sentido da falta e o desejo pela produção de excedentes, Felippe nos mostra que os missionários repetidamente testemunharam o fracasso dessa “conversão” para uma economia de acumulação. Segundo o autor, os Jesuítas não mediram esforços para “introduzir nos índios a insegurança que os modernos tinham em relação ao futuro” (Felippe, 2014, p.305-306). No entanto, se a inconstância era a resposta indígena diante da obrigatoriedade da crença, a prodigalidade parece ter sido a sua contrapartida às ideias de contrato e previdência.
O quarto capítulo apresenta as razões de outra recusa: a não incorporação de métodos e técnicas do sistema econômico moderno, em especial, da agricultura como forma de produção de excedente e da domesticação de animais para reprodução. Inspirando-se em (Sahlins, 1994, p.163), Felippe procura de- monstrar que as razões dessa recusa não se resumiam a uma divergência de percepções ou aos limites do entendimento dos povos nativos, conforme alegavam os missionários e agentes burocráticos ou coloniais, pois “o problema não era empírico, nem tampouco prático: era cosmológico”. Daí os índios que optaram por ou foram cooptados a viver nos povoados missioneiros não terem se dedicado à domesticação de animais, tampouco demonstrado interesse pela manutenção do “stock de subsistência” oferecido nas haciendas. A recusa à domesticação seria, desse modo, o “efeito de uma impossibilidade”, pois “tudo se passa como se entre o amansamento dos animais autóctones passíveis de ser caçados e sua domesticação verdadeira havia um passo que os ameríndios sempre se recusaram a dar” (Descola, 2002, p.103, 107). A resiliência indígena frustrava os missionários, que denunciavam o fato de consumirem “com desordem o rebanho destinado a sua manutenção” (Fernández, 1779 apud Felippe, 2014, p.315) e de sua economia de produção alimentar se limitar ao consumo imediato, mesmo nos casos de povos horticultores.
A invasão europeia no Chaco e o avanço da empresa colonizadora provocaram grande movimentação de povos indígenas, bem como o seu decréscimo populacional e o extermínio de tribos marginais à área chaquenha. Diante das transformações por que passaram, não podemos negligenciar a distância que se impõe entre os modos de vida indígena pré e pós-conquista. Entretanto, há um inegável “ar de familiaridade” (Fausto, 1992, p.381) entre os relatos sobre os chaquenhos dos Setecentos analisados por Guilherme Galhegos Felippe e os povos que hoje se encontram nessa região, o que torna o seu livro leitura obrigatória para antropólogos e historiadores interessados no Grande Chaco e em suas ressonâncias com a história e a cultura dos povos indígenas das Terras Baixas da América do Sul.
Referências
DESCOLA, Philippe. Genealogia dos objetos e antropologia da objetivação. Horizontes Antropológicos, v.8, n.18, p.93-112, 2002. [ Links ]
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FAUSTO, Carlos. A dialética da predação e da familiarização entre os Parakanã da Amazônia oriental: por uma teoria da guerra ameríndia. Tese (Doutorado) – PPGAS-Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Rio de Janeiro, 1997. [ Links ]
FAUSTO, Carlos. Fragmentos de História e Cultura Tupinambá: da etnologia como instrumento crítico de conhecimento etno-histórico. In: CUNHA, Manuela Carneiro da (Org.) História dos Índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p.381-396. [ Links ]
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SAHLINS, Marshall. Ilhas de História. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. [ Links ]
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Notas
2A palavra “chaco” deriva do Quechua e significa “grande território de caça” (MITCHELL, 2015, p.15).
Messias Moreira Basques Júnior – Doutorando em Antropologia Social, PPGAS/Museu Nacional/UFRJ. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: messias.basques@gmail.com.
[IF]Lealdades negociadas: povos indígenas e a expansão dos impérios ibéricos nas regiões centrais da América do Sul (segunda metade do século XVIII) – CARVALHO (RBH)
CARVALHO, Francismar Alex Lopes de. Lealdades negociadas: povos indígenas e a expansão dos impérios ibéricos nas regiões centrais da América do Sul (segunda metade do século XVIII). São Paulo: Alameda, 2014. 596p. Resenha de: MAIA, Lígio de Oliveira. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, n.71, jan./abr. 2016.
Índios missioneiros, infieles, “administrados”, “apóstatas”, cabildantes e índios comuns, usados como canoeiros, ferreiros, carpinteiros, “presidiários”, escravos e força militar; aqueles não integrados à política indigenista eram os índios “independentes”, os “bárbaros”: conhecida imagem política e/ou jurídica a justificar ora a guerra ofensiva ora a guerra defensiva. Entre uns e outros e os diferentes sistemas de integração dos povos indígenas em áreas de fronteira em disputa entre Portugal e Castela, nas regiões centrais da América do Sul, os caciques, figuras coloniais que terão novas atribuições com a secularização das missões religiosas a partir da segunda metade do século XVIII, constituíam outras personagens imprescindíveis na formulação das políticas ibéricas. Mas não só. Juntem-se a esse cadeirão cultural nas “raias dos impérios” – como afirma o autor mais de uma vez ao longo da obra – quilombolas, “renegados”, vadios, negros escravos e forros, colonos pobres livres e toda forma arbitrária de identificação de marginalizados, e ter-se-á o elenco da experiência humana daquelas fronteiras setecentistas apresentado em Lealdades negociadas, livro de Francismar Lopes de Carvalho.
Quanto ao cenário, trata-se de espaço fronteiriço entre a capitania de Mato Grosso e as províncias espanholas de Mojos, Chiquitos e Paraguai, no âmbito das indefinições do Tratado de Madri de 1750, impelindo a política de expansão dos impérios ibéricos à promoção de atração de populações indígenas e colonos a partir do princípio da uti possidetis. Nessa perspectiva, missões religiosas, vilas e fortes militares eram planejados e construídos não somente como marcadores de domínio, mas como centros de atração de lealdades em disputa, vassalos de todo tipo que, em maior ou menor grau, tiveram a oportunidade de negociar suas lealdades a um ou ao outro monarca.
Lealdades negociadas deve ser apontada como uma contribuição original a devassar mais uma de nossas “fronteiras” – histórica e historiográfica, vale dizer – pela densa compreensão da configuração espaço-territorial daqueles espaços liminares. Não se trata, contudo, de mera análise comparativa de viés “nacional” bastante conhecida entre nós, historiadores brasileiros, com raras exceções, quando os temas abordados são os limites setentrionais ou meridionais da América portuguesa no âmbito das disputas diplomáticas entre portugueses e outros europeus.2 Caudatário de uma perspectiva mais fluida e dinâmica do conceito de fronteira, em boa medida advinda da historiografia norte-americana, o autor reflete sobre diferentes tipos de instituições coloniais de ambos os impérios, por exemplo, a política indigenista, o recrutamento militar, os sistemas de trabalho e abastecimento, o funcionamento da administração local, a gestão espacial das missões e dos pueblos, as formas típicas de ascensão social etc., naquilo que ele denomina “abordagem relacional da situação de fronteira” (p.35). Graças a esse deslocamento, a política indígena dos “índios submetidos” – por meio de seus caciques nos pueblos e cabildos, no lado de Castela, bem como dos índios principais e câmaras municipais, nas vilas pombalinas -, mas também dos “índios independentes” – ainda não integrados à vassalagem de suas Majestades Católica ou Fidelíssima -, a ação consciente (agency) dessas personagens históricas pode ser mais bem dimensionada em sua extensão mais ampla (p.34).
Quanto a esse último aspecto, basta mencionar que a política indigenista de atração pacífica de povos não integrados dependia da situação política da área em disputa. Contribuição inovadora, ao enfatizar as noções de “fronteira externa” e “fronteira interna” – respectivamente de áreas mais claramente disputadas entre os impérios ibéricos e aquelas já pacificadas -, o autor demonstra que, nessas áreas, governadores ilustrados reformistas e elites locais, em ambos os domínios, tinham pouco ou nenhum interesse na manutenção dessa forma pacífica de aliança com os povos indígenas. Logo, da “fronteira externa à interna, a passagem era também da força do simbólico ao simbolismo da força” (p.183).
Conscientes de que tinham sua lealdade em disputa, os índios Guaykuru, por exemplo, no final do século XVIII, não se fizeram de rogados. Para aceitarem os dispositivos do diretório, no lado português, exigiram de seus interlocutores, autoridades locais, que se lhes fossem dados escravos para iniciarem as plantações de milho e feijão, “porque eles não eram captivos”; quanto à construção das casas na nova vila ou povoação a que seriam transferidos, os mesmos índios diziam “que as madeiras para ellas [casas] eram muito duras, e molestavam os hombros que todos as queriam, mas que lh’as fossem fazer os portugueses”; ainda no âmbito do diretório quanto à promoção dos casamentos mistos, “disseram todos queriam mulher portuguesa; mas com a condição de as não poderem largar até a morte, lhes pareceu inadmissível” (p.311). Esse parecer do comandante Ricardo Franco Serra, em 1803, apontava que a mo- bilidade, a guerra e a aversão dos Guaykuru aos costumes ocidentais eram elementos impeditivos de um aldeamento permanente entre eles.
Altivos, guerreiros equestres e nunca plenamente integrados à vassalagem na forma de quaisquer das políticas indigenistas de ambos os impérios, os índios da família linguística Guaykuru – os Mbayá, na documentação espanhola (p.38, nota 64) – eram exemplos modais quanto às indefinições de fronteira de domínio e de seu próprio efeito na experiência do colonialismo. Da parte dos domínios castelhanos, uma das soluções efetivas foi introduzir 25 famílias Guarani na redução de Belén, em 1760, de modo a garantir o abastecimento agrícola e servir de exemplo a aqueles “índios cavaleiros”, pois sabia-se no Paraguai e nas missões jesuíticas que os Guaykuru “desprezavam o trabalho agrícola” (p.312-313).
Entretanto, nem sempre a política de pacificação precisava culminar numa missão ou redução, pois a integração desses povos numa rede de comércio e mesmo de contrabando não era elemento menos importante em ambas as políticas.
Em Borbón, um dos 27 presídios que existiam no Paraguai no final do século XVIII e um dos dois em que os soldados venciam soldos, por inoperância deliberada da Real Hacienda era bastante comum o uso dos índios como fornecedores de provisões. O mesmo valia para o forte Coimbra, estratégica possessão portuguesa também no vale do rio Paraguai. Assim, a boa relação com os Guaykuru, então “índios amigos”, resultava em fornecimento de gado aos dois lados em disputa; da parte dos índios agricultores Guaná, recebiam porções de milho, mandioca, moranga, batatas, pescado e galinhas. Aos índios eram dados tecidos de algodão, redes e apetrechos de todo tipo, como tesouras, facões, machados etc. (p.435).
Essa dependência dos militares em relação aos índios e aos colonos moradores nas proximidades dos fortes e presídios advinha do precário tipo de “abastecimento das guarnições” (p.457). Aos governadores espanhóis e portugueses, a política de suas monarquias era a mesma: reduzir custos – da Real Hacienda e da Fazenda Real – e impelir seus soldados e oficiais a cuidarem de buscar o próprio sustento (p.471). De maneira mais abrangente, o estabelecimento dos vassalos nos territórios contestados passava pelo uso de dispositivos simbólicos de lealdades e pela transferência de gastos aos colonos (p.486). O autor nos ajuda então a compreender dois outros aspectos a partir dessas dependências: as construções tipicamente militares – fortes e presídios – adquiriram outra função para além da defesa e de postos avançados, pois eram também pontos de atração a colonos e índios não integrados; o segundo as- pecto diz respeito àquilo que o autor denomina “negociação assimétrica de lealdades” (p.30). Ora, mesmo sob condição precária, o serviço militar nunca deixara de ser um mecanismo importante de ascensão social, mesmo nas fímbrias daquela sociedade de Antigo Regime, impelindo quase todas as camadas sociais a, de alguma forma, dela participar. Entretanto, a remuneração real desses serviços tocava de maneira distinta as elites locais e os colonos pobres, homens de cor, mestiços livres e índios: “a Coroa assinalava a certos setores proprietários que não pretendia destruir suas propriedades”, pois, como assinala o autor, o pacto entre as elites locais e o poder central era a própria base da monarquia “de que estavam excluídos os despossuídos” e sobre quem recaía o recrutamento, especialmente aos “vadios” (p.345-346).
Outro ponto dos mais instigantes em Lealdadas negociadas diz respeito à política deliberada – ainda que secreta – de autoridades portuguesas em promover um sistemático circuito de contrabando no império rival. Assim, em 1761, dirigindo-se ao governador do Pará, o secretário de Estado Francisco Xavier de Mendonça Furtado referia-se ao “político uso do commercio” desde que feito “cautelozamente com os padres castelhanos”; ao governador do Mato Grosso, a mesma dissimulação barroca – como se refere o autor – ganha maior dimensão diplomática: “por que assim He conveniente ao Serviço de S. Mag.e; conservando esta ideya no mais inviolável segredo” (citado na p.512).
Vale dizer que desse contrabando, um sucesso da parte da política portuguesa, resultou a construção do monumental Forte Príncipe da Beira, iniciada em 1776 e finalizada na década de 1780, garantindo a presença portuguesa no vale do rio Guaporé à custa de ninguém menos que os próprios vassalos da monarquia rival, uma vez que curas, mercadores, missionários, militares e até governadores colaboravam com esse circuito a ligar as regiões de Santa Cruz de la Sierra, Cochabamba e La Plata, drenando de quebra a produção dos povos indígenas das missões de Mojos e Chiquitos. Logo, a política espanhola de monopólio da produção das missões pós-jesuítas – os religiosos foram expulsos em 1761 -, acabou por estimular sobremaneira a fuga de recursos e produtos do fiscalismo da Real Hacienda.
Ao que parece, a lealdade de vassalos tão distantes de seus monarcas, especialmente em áreas de contestação, passava pelo crivo da experiência histórica de seus inúmeros atores: “as lealdades imperiais em nada se assemelhavam a quaisquer sentimentos ‘nacionalistas’; eram antes noções instáveis de pertencimento resultantes de dispositivos materiais e simbólicos do colonialismo” (p.522).
Diante da exiguidade de espaço, nem de longe foram apontados aqui todos os temas e questões relevantes do livro. A presença dos jesuítas e a história militar da capitania de Mato Grosso – “antemural da colônia” e “chave” do domínio português nas bacias do Amazonas e do Paraguai e Paraná, como constava em uma consulta ao conselho ultramarino, em 1748 (p.45) – são histórias ainda a ser sistematizadas; de maneira mais dirigida, o mesmo vale para as duas expedições espanholas, em 1763 e 1766, destinadas a desalojar os portugueses do Mato Grosso, assunto pouco discutido na historiografia brasileira (p.387, 444-445).
Resultado de 6 anos de pesquisa entre doutorado e pós-doutoramento, Lealdades negociadas recebeu o Prêmio Científico da América Latina/ Santander Totta (Portugal), edição 2014, na categoria de melhor Tese em Ciências Sociais. Abrangendo diferentes tipos documentais em arquivos e bibliotecas em Espanha, Portugal, Brasil, Paraguai e Argentina, além de um denso diálogo bibliográfico com a literatura histórica de língua inglesa e espanhola, essa edição parece ressentir-se apenas de traduções para o português das inúmeras citações presentes no livro. A julgar por nossos alunos brasileiros, quase todos monolíngues, esse aspecto da obra não é nada irrelevante.
Referências
FARAGE, Nádia. As muralhas dos sertões: povos indígenas no Rio Branco e a colonização. Rio de Janeiro: Paz e Terra; Anpocs, 1991. [ Links ]
GARCIA, Elisa F. As diversas formas de ser índio: políticas indígenas e políticas indigenistas no extremo sul da América portuguesa. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2009. [ Links ]
Notas
2 Nesse sentido, o trabalho do autor soma-se a outras pertinentes exceções. Cf. GARCIA, 2009; FARAGE, 1991.
Lígio de Oliveira Maia
[IF]
Trabalhadores e política no Brasil: do aprendizado do Império aos sucessos da Primeira República – CASTELLUCCI (RBH)
CASTELLUCCI, Aldrin A. S. Trabalhadores e política no Brasil: do aprendizado do Império aos sucessos da Primeira República. Salvador: Eduneb, 2015. 251p. Resenha de: VISCARDI, Cláudia. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, n.71, jan./abr. 2016.
O discurso historiográfico – muito por sua relação interdisciplinar com a sociologia histórica – se constrói a partir de alguns paradigmas que, embora contribuam para a apresentação dos resultados de pesquisa e confiram certo grau de objetividade ao campo, podem gerar distorções em seus resultados. Refiro-me especialmente aos conceitos e às categorias. Seu uso pode interferir sobre a pesquisa, distorcendo a análise ou funcionando como verdadeiros diques a controlar os resultados. Para ser mais específica e ir diretamente à reflexão que pretendo fazer acerca do livro de Castellucci, dois conceitos que permeiam a sua obra são postos em relação, opondo-se às abordagens anteriores que sempre os trataram como mutuamente excludentes: os conceitos de cidadania e de oligarquia. Basta recorrermos a qualquer manual da sociologia política, do mais simples ao mais sofisticado, para encontrarmos esse par de conceitos como antitéticos, na medida em que a ausência do primeiro é a essência do segundo.
A historiografia brasileira levou essa disparidade (no sentido literal de pares opostos) ao senso comum, relegando a participação política, as lutas pela cidadania, e sobretudo suas conquistas, a um período posterior à plena consolidação do capitalismo entre nós. Por essa razão, os períodos anteriores a 1930 são categorizados como oligárquicos e, por assim o serem, nenhum historiador a eles deve se dirigir na expectativa de encontrar sujeitos em luta e em exercício da cidadania política. Vistos como massas de manobra da classe senhorial, submetidos ao paternalismo, às redes clientelares ou à violência, seus atores tonaram-se destituídos de identidade e autonomia, inseridos nas categorias escravos, povo, massa, classes dominadas, pobres, desvalidos, assistidos e marginais, entre outras tantas.
Claro que muito se ganha com o uso de tais categorias. Facilitam análises, sobretudo as de caráter comparativo. Unificam o discurso, permitindo o diálogo transdisciplinar. Nos ajudam a perceber rupturas e mudanças. Mas muito se perde também, principalmente os historiadores, cujo olhar sobre o passado deve prevenir qualquer tipo de anacronismo, compreendendo os indivíduos imersos em seu tempo, sem que o seu horizonte de expectativa contamine a análise do passado. Categorias unificadoras criam sérios riscos para a análise do passado. Conceitos que hoje compartilhamos podem não fazer sentido entre os contemporâneos sobre os quais lançamos nosso olhar, como há muito nos advertiram não só os historiadores collingwoodianos, mas também os alemães liderados por Koselleck. Perde-se não só a possibilidade de nos surpreendermos com as fontes, mas também, à semelhança dos ansiosos, corre-se o risco de olhar o passado em busca do futuro, perdendo a chance de usufruir daquilo que o passado pode efetivamente nos proporcionar.
Felizmente, nos últimos anos acompanhamos tentativas bem-sucedidas de revisionismo historiográfico, feitas com o fim de romper com a camisa de força das categorias e dos conceitos e abrindo o olhar do historiador para as experiências de luta e conquista de cidadania, em passados bastante remotos. No período compreendido entre os anos finais do Império e a Primeira República, novos estudos têm revelado uma presença mais ativa dos indivíduos e grupos nos campos político e cultural. Entre eles, destaco o encontro que tive com o livro de Aldrin Castellucci e falarei das agradáveis surpresas que sua leitura me proporcionou.
Com fôlego de um nadador em águas profundas, Castellucci apresenta ao leitor um conjunto muito amplo de questões. Ao se impor tantos desafios, vê-se obrigado a encontrar suas respostas num mar de fontes. Deriva daí a primeira surpresa. Nós, pesquisadores do campo da história social e da história política, temos por fontes preferenciais a imprensa, os anais parlamentares, os documentos das associações organizadas, as estatísticas, as memórias, as correspondências e a documentação oficial. Castellucci se vale de todo esse conjunto a um só tempo, ao passo que igualmente recorre a inventários post-mortem, almanaques e testamentos. O volume é muito grande, o que confere à tese e ao leitor, a um só tempo, um porto seguro e a certeza da propriedade de seus resultados.
O livro é uma versão modificada de sua tese de doutorado defendida em 2008 na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Tem como foco principal a análise da relação entre trabalhadores e Estado a partir do acompanhamento de uma agremiação que apresentou três facetas em diferentes momentos. O Centro Operário da Bahia, originado do Partido Operário de 1890 e que teve uma dissidência em seu primeiro ano de existência, a União Operária Baiana. Nessa relação o autor privilegiou a participação do Centro nos diferentes processos eleitorais.
O livro é dividido em cinco capítulos. O primeiro (“As Regras do Jogo”) aborda os marcos jurídicos que delimitavam a prática eleitoral brasileira nos anos finais do Império e ao longo da Primeira República. Trata-se de uma boa síntese que ajuda o leitor a acompanhar a participação eleitoral da agremiação diante das mudanças nas regras do jogo político brasileiro. Considero como ponto alto desse capítulo a análise dos indicadores de participação eleitoral de outros países no mesmo período, contribuição valiosa que insere o Brasil, comparativamente, no circuito de direitos políticos usufruídos pela população em diversos lugares do mundo. Tal análise permite ao leitor perceber que a exclusão de parcela significativa da população da cidadania política não foi uma originalidade tupiniquim, mas encontrava correspondência em várias democracias liberais contemporâneas. Destaca-se também nesse capítulo uma análise minuciosa da Constituição do estado da Bahia, objeto em geral relegado a segundo plano no debate sobre eleições e partidos no Brasil.
O capítulo 2, intitulado “A Montagem de uma Máquina Política Operária”, aborda o processo de formação do Partido Operário da Bahia levando em consideração sua trajetória de cisões e rearticulações, entre elas, o surgimento da União Operária Baiana e do Centro Operário. Trata-se de um capítulo onde Aldrin apresenta para o leitor seus principais atores e o modo como foram construídos e reconstruídos ao longo do tempo. O ponto alto desse capítulo, no meu entendimento, é a demonstração dos esforços do Centro Operário em intervir no jogo político com o fim de ampliar direitos, sobretudo os sociais. Como estratégia, vinculou-se às elites locais numa tentativa de ampliar suas bases, que se tornaram, por conseguinte, policlassistas.
“Os Trabalhadores e o seu Mundo” é o título dado ao terceiro capítulo do livro, que enfrenta uma tarefa difícil, mas na qual Aldrin obteve êxito: o de traçar um perfil sócio-ocupacional e étnico-nacional dos membros do Centro Operário. O uso das fontes notariais lhe permitiu concluir que mais de 74% dos associados ao Centro eram artesãos, ou seja, trabalhadores mais qualificados. Revela com esse perfil a presença, entre os associados do Centro Operário, de uma elite trabalhadora – dona de oficinas e dos instrumentos de trabalho – e de uma elite política e econômica, como industriais, comerciantes e políticos, entre outros. Para que o capítulo não se resumisse a levantamentos estatísticos, Aldrin trouxe para o texto a análise de algumas biografias, de modo que o leitor ampliasse sua visão sobre o perfil dos membros da agremiação. Na análise da composição racial de seu grupo, concluiu que o percentual de brancos era inferior a 23%, sendo os demais pretos, pardos e mestiços. O que mais chama atenção é que a agremiação era menos branca que a própria Bahia (75,9% contra 68%). Aldrin mostra ao leitor o que já se esperava – mas é sempre importante ver comprovado -, que os poucos brancos existentes pertenciam à elite política e econômica dos associados. Mostra igualmente as relações do Centro Operário com as mutuais e as irmandades, com o fim de identificar a formação das diferentes redes que compunham a sociedade civil baiana no período e de mostrar que muitos membros do Centro eram também sócios das mutuais e membros das irmandades a um só tempo. Certamente é esse o melhor capítulo do livro, o que nos mostra como o Centro Operário se compunha e de que forma interagia com diferentes setores da sociedade civil para que seus fins fossem atingidos.
Os capítulos 4 e 5 tratam do ideário político e social dos membros (“O Sonho com a República Social”) e da atuação político-eleitoral da agremiação (“Os Eleitos da Classe Operária”), respectivamente. O quarto capítulo, em minha opinião, contrasta com os demais em razão das dificuldades enfrentadas pelo autor no acesso ao imaginário político dos sujeitos – tarefa muito desafiadora tendo em vista a falta de fontes e as complexidades próprias ao tema. Ressalta a diversidade de culturas políticas (o autor prefere falar em “ideário político”) compartilhadas pelos associados, revelando uma heterodoxia que reunia a um só tempo o marxismo, o cristianismo, o republicanismo, o positivismo, o abolicionismo e o liberalismo. Identificou em meio a essa diversidade dois valores recorrentes: o de ajuda mútua e o do cooperativismo. Tal heterodoxia refletir-se-ia na prática política de seus membros, que lutavam pela ampliação dos direitos dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, assumiam, na visão do autor, o papel de “reformistas sociais”, sem questionarem, em nenhum momento, a ordem estabelecida. Essa participação política resultou em conquistas para os trabalhadores, mas também gerou facções internas. Não obstante, o autor destaca a eficiente intervenção do grupo sobre a política local ao conseguir eleger trabalhadores para vários cargos, tornando-se uma engre- nagem eleitoral a contribuir com o pleno funcionamento da máquina política republicana.
A análise de Castellucci desmistifica uma série de afirmações recorrentemente encontradas na literatura sobre o mundo do trabalho no Brasil, principalmente as de viés marxista. A ausência de uma “consciência de classe” a inspirar as ações do Centro Operário é atestada não só pela composição por demais heterogênea da agremiação, mas também pelas suas hierarquias internas, que submetiam trabalhadores menos qualificados às lideranças, em relações que acabavam por repetir as de clientelismo e patronagem, comuns na época. Tal ausência impediu também que o Centro Operário se mobilizasse em torno de mudanças mais estruturantes e objetivasse apenas ganhos mais imediatos para a categoria, a exemplo da expansão dos direitos sociais. Nesse momento, em minha visão, Castellucci “escorrega” em sua avaliação, na medida em que deposita no Centro uma expectativa que seus membros poderiam não compartilhar. Talvez, em sua heterogeneidade, desejassem apenas ter uma ação efetiva na política com o fim de obter ganhos sociais, o que não era pouco, sem imprimir mudança mais radical no ordenamento político e econômico no qual estavam inseridos. Retira assim do grupo a autonomia antes concedida, ao afirmar que a burguesia os usava como eleitores, o que poderia ter interferido negativamente para a formação de uma “consciência de classe” (p.111). Ora, a leitura do texto não faz ver ao leitor que o Centro era objeto de manipulação e muito menos que pudesse ou quisesse desenvolver uma consciência de classe específica. Ao contrário, o livro mostra uma organização autônoma, que se valia das relações com as elites para obtenção de ganhos para a categoria e que reproduzia em seu interior a cultura paternalista contra a qual não se colocava, até por estar nela inserido. Por diversas vezes o autor afirma que os associados não viam contradições em suas relações com o poder público, com as elites e nem mesmo com a polícia, desde que seus ganhos fossem viabilizados, numa demonstração clara do pragmatismo político.
Outra importante contribuição de Aldrin Castellucci refere-se à manifesta ligação dos trabalhadores do Centro com o republicanismo. Tal abordagem reforça a ideia de que a república não foi exclusivamente uma construção da elite, à revelia do povo, que dela pouco tinha conhecimento. O autor revela que o novo regime foi recebido com otimismo pelos trabalhadores, pois viam nele a possibilidade de ampliação de seus direitos, o que de fato ocorreu, segundo suas análises. Outra importante contribuição é a constatação de que muitos libertos se tornaram trabalhadores na Bahia e não foram relegados à marginalidade social. Além disso, o Centro se tornou um importante espaço de interação social por parte dos negros recém-saídos do cativeiro.
Por fim, o trabalho de Aldrin se reveste da maior importância por tratar de uma região fora do eixo Sul-Sudeste, o que expressa o vigor da historiografia brasileira após a expansão da pós-graduação. Dessa forma, ganhamos todos com a possibilidade de compreensão das diversidades nacionais e evita-se a generalização que pouco tem nos ajudado a compreender nossa sociedade multicultural.
Iniciamos esta resenha a falar sobre os prejuízos que o uso de conceitos e categorias rígidas pode causar sobre os resultados da pesquisa histórica. A maior contribuição do livro de Castellucci foi ter evitado essa armadilha, ao relacionar a cultura paternalista e oligárquica aos anseios e lutas por cidadania de pretos, pardos e mestiços e ao comprovar sua efetiva participação na construção e consolidação do projeto republicano. Só por essa razão, a leitura de Trabalhadores e Política no Brasil já valeria a pena.
Cláudia Viscardi – Departamento de História e Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Pesquisadora do CNPq. Juiz de Fora, MG, Brasil. E-mail: claudiaviscardi.ufjf@gmail.com
[IF]Guerra fria e política editorial: a trajetória das Edições GRD e a campanha anticomunista dos Estados Unidos no Brasil (1956-1968) – OLIVEIRAR (RBH)
OLIVEIRA, Laura de. Guerra fria e política editorial: a trajetória das Edições GRD e a campanha anticomunista dos Estados Unidos no Brasil (1956-1968). Maringá: Eduem, 2015. 274p. Resenha de: GRINBERG, Lucia. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, n.71, jan./abr. 2016.
Era comum em resenhas bibliográficas relacionadas à história política do Brasil republicano a constatação de que historiadores e cientistas sociais se dedicavam especialmente ao estudo das esquerdas, negligenciando as direitas. O panorama mudou. Nos anos 2000 houve um crescimento significativo na produção de teses e dissertações dedicadas a intelectuais, movimentos e partidos políticos de direita nos programas de pós-graduação em história no país. No campo específico dos estudos sobre o movimento integralista, as pesquisas avançaram para além dos anos 1930, buscando mostrar a presença de integralistas na vida política institucional no período da experiência democrática instaurada em 1945, a vitalidade de intelectuais e periódicos integralistas, assim como a diversidade de trajetórias individuais e de memórias de militantes. Guerra fria e política editorial é expressão da ampliação e do amadurecimento da área. Elaborado originalmente como tese de doutorado, defendida em 2013 no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Goiás (UFG), obteve menção honrosa no Prêmio Capes de Teses (2014) e ganhou o Prêmio Anpuh de Teses (2015).
Com base no estudo de caso sobre o editor Gumercindo Rocha Dorea e de suas Edições GRD, a historiadora Laura de Oliveira desenvolve uma reflexão relevante e atual sobre o campo das direitas políticas ao mostrar as possibilidades de alianças apesar da diversidade de inspirações doutrinárias. No caso, ela aborda como um militante integralista, admirador de Plínio Salgado, pôde contar com o financiamento do governo norte-americano para promover o anticomunismo em nome da democracia. Na primeira parte do livro, “a experiência”, Laura de Oliveira apresenta as articulações entre as Edições GRD, o movimento integralista e a United States Information Agency (USIA). Na segunda parte, “a palavra”, desenvolve um estudo propriamente da “obra editorial”. Para investigar os integralistas e seus aliados no Brasil, Oliveira consultou acervos considerados estratégicos por especialistas, como o Fundo Plínio Salgado (Arquivo Público Histórico de Rio Claro) e o Fundo IPÊS (Arquivo Nacional). Nos Estados Unidos, pesquisou documentação relativa à USIA no National Archives and Records Administration (NARA), e ao Franklin Book Programs, na Mudd Manuscript Library da Princeton University.
Na primeira parte do livro, “a experiência”, em narrativa bem estruturada, a historiadora analisa os contextos variados que combinados permitem compreender a trajetória política e empresarial de Gumercindo Rocha Dorea: as tradições e a estrutura das organizações integralistas, a política externa norte-americana de intercâmbio cultural e a parceria com o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPÊS). Em 1956, quando o jovem baiano Gumercindo Rocha Dorea criou as Edições GRD, era filiado ao Partido de Representação Popular (PRP), liderado por Plínio Salgado, e participava ativamente de iniciativas integralistas no campo da cultura. Dorea foi editor do jornal integralista A Marcha (1952-1955), diretor da Livraria Clássica Brasileira (1956-1957) e presidente da Confederação Nacional dos Centros Culturais da Juventude (1952-1953 e 1957-1958). A autora dialoga com obras recentes sobre a Ação Integralista Brasileira (AIB) e o PRP, indicando ao leitor contribuições relevantes na área.
As Edições GRD também foram beneficiadas pelas iniciativas da “cultural war”, a política norte-americana de intercâmbio cultural implementada nos anos da guerra fria. Desde os anos 1950 a editora obteve recursos por meio da política de financiamento de traduções do Book Development Program, desenvolvido pela USIA, entidade diplomática que vigorou entre 1953 e 1999.
De acordo com as fontes pesquisadas, a USIA promoveu cerca de 1.340 traduções de originais de língua inglesa lançados no mercado editorial brasileiro.
A GRD teve 48 traduções patrocinadas pela agência. Muitas editoras brasileiras receberam subsídios por meio do programa que incentivava a publicação de obras que veiculavam do elogio ao american way of life ao anticomunismo.
Dorea se destacou pela seleção de obras marcadamente anticomunistas.
Na conjuntura anterior ao golpe de 1964, as Edições GRD se associaram ao IPÊS, como outros estudos já apontaram. No entanto, Laura de Oliveira mostra que a associação era um desdobramento de parceria anterior às conspirações para depor o presidente João Goulart – havia uma sintonia entre os objetivos políticos da USIA, do IPÊS e da GRD, todos desejavam combater as esquerdas e desestabilizar o governo federal. Apesar de a campanha ipesiana se caracterizar por penhorar o destino brasileiro às instituições liberais, Dorea participou ativamente. Em contraste com os “camisas verdes” dos anos 1930, a partir de 1945, os militantes do integralismo, então denominados “águias brancas”, construíram uma nova identidade política. Não se isolaram na doutrina original, apropriaram-se das regras da democracia representativa instaurada e continuaram operando por intermédio do PRP e de iniciativas culturais, como as Edições GRD, mesmo estando longe de compartilhar ideais liberal-democráticos.
Na segunda parte do livro, “a palavra”, na perspectiva de Raymond Williams, Laura de Oliveira investiga as conexões entre experiência social e literatura, combinando história política, história do mercado editorial e estudos literários. De acordo com a autora, ao analisar o conjunto da obra das Edições GRD, de 1956 a 1968, é possível identificar um sentido comum: a divulgação do comunismo como distopia contemporânea, como tragédia iminente que ameaçava o Brasil e a América Latina. As Edições GRD tiveram duas coleções importantes, a “Coleção Política Contemporânea”, traduções financiadas pela USIA principalmente, e “Clássicos Modernos da Ficção Científica” (posteriormente intitulada “Ficção Científica GRD”). O anticomunismo estava presente em ambas.
De 1958 a 1971, as Edições GRD publicaram cerca de trinta livros do gênero ficção científica, traduções e originais de autores brasileiros, sendo considerada responsável pela consolidação do gênero no país nos anos 1960. Em diálogo com estudos sobre ficção científica, Oliveira mostra como o gênero lida com alegorias utópicas e seu par coexistente, a distopia, ao narrar mundos alternativos, outros planetas, territórios longínquos ou paraísos perdidos. Durante a guerra fria, nos clássicos da literatura de ficção científica de língua inglesa, Aldous Huxley, George Orwell e Ray Bradbury contrapõem sociedades baseadas nos ideais de liberdade e individualidade a Estados totalitários. Nas publicações de ficção científica da GRD, Oliveira identifica “uma permanente associação entre a consagração dos projetos totalitários (marcadamente, do comunismo soviético) em ambiente internacional, o esforço da União Soviética de colonização dos países democráticos, sua ação na América, confirmada pela então recente revolução em Cuba, e seu conjecturado avanço sobre o Brasil” (p.195).
No mesmo sentido, durante o governo João Goulart, a “Coleção Política Contemporânea” editou títulos como Anatomia do comunismo (1963) e Cuba, nação independente ou satélite (1963). Oliveira apresenta os enredos, os paratextos e reproduções de capas das publicações, introduzindo o leitor em um universo trágico comum às obras de ficção científica e de política contemporânea. Na orelha de Anatomia do comunismo (1963), Dorea inscreveu a sua mensagem: pretendia levar “aos homens públicos responsáveis pela manutenção do sistema democrático na vida política brasileira, a lição que nos vem dos que têm sofrido, na própria pele, a ameaça diuturna das hostes bélicas que, a qualquer momento, poderão descer do leste europeu” (grifos do autor, p.202).
Na historiografia relativa a partidos políticos no Brasil republicano, desde os anos 1990, há teses que desafiam as interpretações tradicionais que enfatizam a distância entre as organizações partidárias e a sociedade, assim como as que destacam as descontinuidades das legendas, desconsiderando as intervenções sucessivas de ditaduras no sistema partidário. No presente caso, as intervenções extinguindo os partidos políticos por decreto atingiram a AIB, no Estado Novo, e, posteriormente, o PRP, em 1965, com o Ato Institucional no 2. Guerra Fria e política editorial é uma bela contribuição para o debate. Partindo do caso de Gumercindo Rocha Dorea, baiano de Ilhéus, a autora mostra a possibilidade de, diminuindo a escala de análise, investigar trajetórias individuais tendo em vista o estudo de atores coletivos, como partidos políticos. Ao se dedicar ao estudo das Edições GRD, Oliveira investiga as relações entre atividade editorial e militância político-partidária, considerando as especificidades dos dois campos: as características de negócio e a necessidade de financiamento, a marca da afinidade ideológica e a existência de uma rede de sociabilidade de intelectuais, antigos membros da AIB, filiados e simpatizantes do PRP, reunidos em torno da editora. Afinal, apresenta os integralistas, entusiastas de um movimento de extrema direita, inseridos na sociedade, e mostra que os militantes se articularam em novas organizações, não permaneceram isolados.
O interessante em Guerra Fria e política editorial é justamente a percepção das dinâmicas, continuidades e descontinuidades do movimento integralista, e da possibilidade de articulação com o próprio governo norte-americano, antes combatido pelo nacionalismo exacerbado, o anticosmopolitismo e o antilibe- ralismo, próprios do integralismo. Em 1967, as iniciativas da USIA foram denunciadas nos Estados Unidos como tentativa de manipular a opinião pública por intermédio de editoras da iniciativa privada. Em pouco tempo, com o fim do convênio, as Edições GRD voltaram a reeditar autores integralistas e Dorea passou a comandar igualmente a “Voz do Oeste”, editora fundada por Plínio Salgado. Guerra Fria e política editorial mostra, portanto, a parceria entre liberais norte-americanos e integralistas brasileiros, assim como o enraizamento das tradições integralistas e a capacidade organizacional de seus quadros.
Lucia Grinberg – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: luciagrinberg@gmail.com.
Hajari, as fúrias da meia-noite de Nisid: o legado mortal da partição da Índia | Oliver Stuenkel
A partição, a divisão do subcontinente indiano em dois países em 1947, sempre será lembrada como uma das maiores tragédias do século XX, envolvendo uma das maiores migrações humanas forçadas da história, deslocando mais de 10 milhões de pessoas. Isso levou a mais de um milhão de mortes no contexto da saída da Grã-Bretanha do subcontinente e da independência da Índia e do Paquistão. Finalmente, foi o capítulo de abertura de uma das rivalidades mais complexas e não resolvidas do mundo, produzindo um hot spot nuclear que muitos consideram o mais perigoso do mundo. Nisid Hajari escreveu um livro muito legível sobre a política da Partição, detalhando as negociações e dinâmica de energia na véspera de 15 de agosto de 1947.
Com habilidade jornalística, o autor fornece retratos íntimos dos personagens principais do livro, Jawaharlal Nehru e Mohammed Ali Jinnah. Gandhi, Vallabhbhai Patel (Sardar) e Lord Louis Mountbatten também aparecem com frequência, mas Hajari descreve essencialmente o drama da Partition como um show de dois homens.
Enquanto Hajari se destaca em transformar um evento complexo e pesado em um virador de páginas, sua conta é centrada na Índia e, no final das contas, muito tendenciosa às visões de Nehru para fornecer uma conta equilibrada. O primeiro primeiro-ministro da Índia, o leitor é informado nas primeiras páginas do livro, era “arrojado”, “famoso por algumas das mãos”, tinha “maçãs do rosto aristocráticas e olhos altos que eram piscinas profundas – irresistíveis para suas muitas admiradoras”. “Apesar de desdenhoso das superficialidades, ele cuidou muito da aparência”, maravilha-se o autor. Ao longo do livro, Hajari descreve as qualidades supostamente sobre-humanas de Nehru, por exemplo, quando ele oferece o risco de sua vida para proteger os muçulmanos em Old Delhi. Jinnah, por outro lado, é amplamente descrito como um bandido sedento de poder que carecia de princípios “irascível” e ”
Nehru, o autor admite, também tinha falhas. Como escreve Hajari, Nehru se recusou a aceitar a Liga Muçulmana como parceiro da coalizão em 1937, exceto em termos humilhantes que incluíam a fusão incondicional dos partidos parlamentares da Liga Muçulmana no Congresso. O comportamento arrogante e distante de Nehru era precisamente o que Jinnah precisava para fortalecer as ansiedades que os muçulmanos tinham em relação à Índia dominada pela maioria hindu. E, no entanto, o livro deixa poucas dúvidas sobre quem é o vilão da história.
O que talvez seja mais problemático com esse relato é que a idéia de criar o Paquistão é descrita como pouco mais do que uma manobra usada por Jinnah para retomar sua carreira política após o retorno de Gandhi da África do Sul e a ascensão do povo hindu. O congresso o empurrou para a margem. Depois que sua jovem esposa se suicida, Jinnah se muda para uma casa sombria com sua irmã do mal, Fátima. Enquanto Nehru é movido por altos ideais, sugere o livro, Jinnah é movido pela amargura e pelo desejo de vingança.
No entanto, a idéia do Paquistão era muito mais do que um mero argumento de barganha proposto por Jinnah. Hajari permanece calado sobre figuras-chave como Muhammad Iqbal, uma das figuras mais importantes da literatura urdu e o filósofo que inspirou o Movimento Paquistanês. O autor parece sugerir que seria necessário apenas um representante mais moderado da Liga Muçulmana para evitar a Partição.
Contudo, esse argumento ignora que as eleições supervisionadas pelos britânicos em 1937 e 1946, que o Congresso dominado pelos hindus venceu com facilidade, apenas endureceram a identidade muçulmana e tornaram inevitável a divisão. A política britânica de definir comunidades com base na identidade religiosa, que alterou fundamentalmente a autopercepção indiana, requer muito mais atenção para explicar a dinâmica que levou à Partição. Churchill, em particular, viu consolidar uma identidade muçulmana na Índia e alimentar tensões sectárias como essenciais para prolongar o domínio britânico no subcontinente (ele apoiou ativamente a causa de Jinnah nos anos anteriores a 1947).
Hajari reconhece que a decisão de Mountbatten de antecipar a retirada da Grã-Bretanha e deixar um cartógrafo despreparado traçar as fronteiras dentro de 40 dias (sem visitar as regiões afetadas, como o autor nota corretamente) tornou todo o projeto muito mais mortal do que poderia ter sido em outras circunstâncias . Jinnah dificilmente poderia ter antecipado tal comportamento irresponsável pelos britânicos.
Como escreve Pankaj ( Mishra, 2007 ), ninguém havia se preparado para uma transferência massiva de população. Mesmo quando milícias armadas vagavam pelo campo, procurando pessoas para sequestrar, estuprar e matar, casas para saquear e trens para descarrilar e queimar, a única força capaz de restaurar a ordem, o Exército Indiano Britânico, estava sendo dividida em linhas religiosas – soldados muçulmanos no Paquistão, hindus na Índia. Em breve, muitos dos soldados comunalizados se uniriam a seus co-religiosos na matança de facções, dando à violência a partição de seu elenco genocida … Os soldados britânicos confinados em seus quartéis, ordenados por Montana para salvar apenas vidas britânicas, podem provar ser a imagem mais duradoura do retiro imperial.
As Fúrias da meia-noite não descobrem muitas fontes novas e os especialistas não encontrarão nada que mude de opinião, mas o livro é bem pesquisado. Uma exceção um tanto estranha é a Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS), uma organização hindu de direita, que Hajari abrevia erroneamente como RSSS ao longo do livro.
Apesar de seu viés, o livro aponta para a importância de um ponto de virada histórico crucial que continua a moldar os atuais debates geopolíticos. Como a disciplina de Relações Internacionais, em particular, continua se concentrando demais no que aconteceu na Europa após a Segunda Guerra Mundial, são necessários muitos outros livros sobre as consequências da guerra na Ásia e em outras partes do mundo.
Referências
Mishra, Pankaj. Feridas de saída: o legado da partição indiana. 13 de agosto de 2007. Disponível em: http://www.newyorker.com/magazine/2007/08/13/exit-wounds ; Acesso em: 12 jan. 2016. [ Links ]
Oliver Stuenkel – Professor Assistente de Relações Internacionais, Faculdade de Ciências Sociais, Fundação Getulio Vargas (FGV). São Paulo, SP, Brasil. E-mail: oliver.stuenkel@fgv.br.
STUENKEL, Oliver. Hajari, as fúrias da meia-noite de Nisid: o legado mortal da partição da Índia. Massachusetts: Houghton Mifflin Harcourt, 2015. 328p. Resenha de: STUENKEL, Oliver. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.36, n.71 São Paulo, jan./abr. 2016.
Imprensa italiana no Brasil, séculos XIX-XX – TRENTO (RBH)
TRENTO, Angelo. Imprensa italiana no Brasil, séculos XIX-XX. São Carlos: Ed. UFScar, 2013. Zaidan, Roberto. 276p. Resenha de: BIONDI, Luigi. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.70, jul./dez. 2015.
Décadas de pesquisa sobre o tema da imigração italiana, que renderam algumas das obras mais referenciais nesse âmbito historiográfico, levaram Angelo Trento, da Universidade de Nápoles “Istituto Orientale”, a aprofundar um dos aspectos centrais para a compreensão do mundo dos imigrantes no Brasil no livro Imprensa Italiana no Brasil, séculos XIX-XX, tradução para o português da edição italiana La costruzione di un’identità collettiva. Storia del giornalismo in lingua italiana in Brasile (Viterbo: Archivio Storico dell’Emigrazione Italiana, 2011).
Na sua obra La dov’è la raccolta del caffè, publicada no Brasil com o título Do outro lado do Atlântico (São Paulo: Studio Nobel, 1989), ainda hoje a obra mais completa sobre a história dos italianos no Brasil, na qual a imprensa produzida por eles tomava um espaço temático próprio em alguns capítulos embora atravessasse o livro inteiro como fonte principal, Trento inseriu um apêndice com mais de quatrocentos periódicos italianos publicados no país. Esses foram o ponto de partida para pesquisas sucessivas que levaram Trento, nos últimos anos, a centrar a análise sobre a história dos impressos periódicos em língua italiana no Brasil, durante o século XIX e até a década de 1960. Aquela antiga lista se enriqueceu de mais títulos, encontrados nos arquivos do Brasil, Itália, Holanda e França, e se tornou o corpus documental que fundamenta agora, no seu livro Imprensa italiana no Brasil, uma história exaustiva da expressão escrita, em jornais, pelos imigrantes italianos.
Trento não se limita a tratar essa imprensa como formadora de representações de uma coletividade de imigrantes, indaga sobre os fundamentos sociais dos impressos periódicos e de seus grupos editores e sobre a relação destes com as redes de assinantes, os leitores e a comunidade italiana imigrada em geral. O jornal, além de ser o veículo intencional de transmissão de informações, configura-se como porta-voz e ao mesmo tempo articulador de grupos específicos, utilizando e forjando redes de imigrantes, polo agregador de sua intervenção na nova sociedade. A imprensa étnica como mediadora da transnacionalidade, na qual Trento enfatiza, na melhor tradição historiográfica italiana, suas dinâmicas políticas.
Essa imprensa é estudada também como construtora e expressão de identidades: a nacional – a italianidade – e as regionais, políticas e de classe, todas em suas diferentes e muitas vezes conflitantes versões, todas passando pela via da comum origem num Estado-nação de recente formação. O ser e sentir-se italiano numa experiência de migração por meio da imprensa, declinado em uma miríade de identificações complementares, parece ser o fio condutor de uma trajetória que o autor concentra entre o período da “grande imigração” (1885-1915 aproximadamente) e meados dos anos 1960, quando o longo processo de integração e os fluxos migratórios dos italianos terminam.
Trento dedica mais de metade da obra ao período entre 1880 e a Primeira Guerra Mundial, com dois capítulos iniciais: o primeiro para a imprensa como um todo e o segundo para a imprensa operária. É nessa época que o periódico impresso se configura não somente como órgão de informação, mas também como polo agregador dos próprios imigrantes italianos que chegam em massa ao Brasil. É o período do protagonismo político, comercial e industrial do Brasil urbano, quando o diário em língua italiana Fanfulla, a “joia da coroa” da então colônia ítalo-paulista, narra as vicissitudes da experiência migratória de cerca de um milhão de italianos – e não somente os de São Paulo, pois esse diário, assim como outros periódicos étnicos, era lido para além das fronteiras estaduais. Trento não se limita a estudar o fenômeno migratório nas suas amplas dimensões paulistas, também lança um olhar para as coletividades nos outros estados, para a imprensa italiana desde o Pará até os centros gaúchos e sulinos em geral, nestes bastante difusa.
Nesses dois capítulos, Trento explica a difusão extraordinária de alguns jornais, como os diários Fanfulla e La Tribuna Italiana, e das publicações explicitamente políticas como La Battaglia (anarquista) e Avanti! (socialista), e ao mesmo tempo analisa os vários periódicos que tiveram uma vida difícil, mas que, tomados em conjunto, tornam a expressão escrita da imprensa dos ítalo-brasileiros nesse período importante e significativa, a par de outras como as da Argentina ou dos Estados Unidos.
A separação dessa fase da “grande imigração” em duas esferas temáticas, ao longo de dois capítulos, pretende destacar o papel político da imprensa. No capítulo 1, a grande imprensa e os periódicos culturais, de notícias e multitemáticos, são analisados não somente nos seus aspectos gerais estruturais e representativos, supostamente neutros, mas também nas suas atenções ao mundo da grande massa dos imigrantes, incluindo o surgimento de um jornalismo investigativo étnico, que indaga sobre as condições materiais da coletividade, seus anseios e suas expressões políticas. O subcapítulo final introduz uma pesquisa pioneira sobre a imprensa de língua italiana durante a Primeira Guerra Mundial, num momento em que o nacionalismo italiano e a construção da identidade nacional no exterior vivenciam, por causa da guerra, uma intensificação extraordinária, enquanto os imigrantes experimentam novas tensões derivadas da radicalização das lutas operárias.
A “Outra Itália” de esquerda é o tema do capítulo 2, onde o foco é completamente voltado para entender a vida da imprensa em língua italiana que foi expressão de tendências e grupos políticos específicos, ligados ao mundo do trabalho urbano. Sobretudo em São Paulo, mas não somente ali, essa imprensa conseguiu frequentemente se tornar o polo agregador de anarquistas, socialistas, republicanos, radicais e sindicalistas, bem como de trabalhadores em geral. Um protagonismo conhecido na historiografia da história social e política dos trabalhadores no Brasil, que Trento, pela primeira vez após muitos anos, analisa num único capítulo de forma conjunta, coerente e renovada, incorporando as novas pesquisas suas e de outros colegas sobre o tema.
Temos um olhar completo para essa história, sem privilegiar a análise de uma ou de outra tendência, mas as conexões entre elas e o panorama dessa trajetória em sua complexidade, desde as origens, passando pelo auge dos anos 1900-1917, até o declínio no período posterior à Primeira Guerra Mundial, quando a imprensa reflete a diluição dos elementos étnicos da classe operária. Por isso, o autor dedica parte importante desse capítulo ao debate “identidade étnica versus identidade de classe” na imprensa política de língua italiana, tema ainda central nos estudos migratórios e da formação da classe trabalhadora nas Américas.
Na segunda parte do livro, o autor enfrenta a questão da penetração do fascismo na imprensa italiana, sua gradual conquista das redações, sua eliminação em outras, o surgimento e declínio, nas décadas de 1920 e 1930, da imprensa antifascista que viu no Brasil o episódio interessante e multipartidário do jornal La Difesa, enquanto o diário Fanfulla se dobrava aos interesses do governo italiano e ao mesmo tempo continuava se propondo como o porta-voz da italianidade no país. Trento se dedica ao exame de uma imprensa étnica ainda consistente, mas cada vez menor, não comparável em número, qualidade e variedade com a dos primeiros 30 anos republicanos. Uma imprensa que progressivamente se fecha em torno das questões ligadas à colônia, mediadora cultural de uma Itália cada vez mais distante e menos frequentada.
A imprensa é estudada para entender a capacidade de adaptação à nova situação brasileira, o equilíbrio entre as influências do fascismo italiano e as tensões derivadas desse posicionamento frente à política nacionalista do Estado Novo e à guerra.
A nova fase que se abre com o pós-guerra se ressente dessa história, de um passado não falado que Angelo Trento analisa no último capítulo, no contexto migratório mais recente, da segunda metade do século XX.
Entre a retomada no Brasil de posições políticas proibidas na nova Itália republicana (o neofascismo no exílio) e a narração da experiência migratória dos anos 1950 e 1960 (até 1965, quando o Fanfulla encerra sua publicação diária), o autor examina o conjunto muito menor de uma imprensa étnica testemunha de uma coletividade italiana imigrada, renovada sim pelos fluxos migratórios do pós-guerra, mas excepcionalmente reduzida.
Trento interpreta a função histórica da imprensa italiana no exterior como expressão viva do mundo dos imigrantes. Ao desaparecer a condição de migrantes, ao sumir gradualmente a operatividade das relações, das redes e das circularidades transnacionais, também essa imprensa deixa de existir. Apesar das dificuldades objetivas na prática da leitura de uma massa imigrante mediamente iletrada, o trabalho de Angelo Trento destaca que foi no período áureo da “grande imigração” que a imprensa étnica italiana mais se desenvolveu, âncora de uma transnacionalidade em ação.
Finalmente, é importante sinalizar que, além do valor da obra como o mais recente e mais aprofundado estudo sobre a história da imprensa italiana no Brasil, o livro se constitui como um recurso de pesquisa fundamental, terminando com um inventário cronológico completo e classificado por estado de mais de oitocentos periódicos em língua italiana publicados no país, onde se indica também a colocação arquivística de cada jornal.
Luigi Biondi – Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (EFLCH), Departamento de História. Guarulhos, SP, Brasil. E-mail: luigi.biondi@uol.com.br
[IF]
Cavando direitos: as leis trabalhistas e os conflitos entre os mineiros de carvão e seus patrões no Rio Grande do Sul (1940-1954) – SPERANZA (RBH)
SPERANZA, Clarice Gontarski. Cavando direitos: as leis trabalhistas e os conflitos entre os mineiros de carvão e seus patrões no Rio Grande do Sul (1940-1954). Porto Alegre: Anpuh, Oikos, 2014. 295p. Resenha de: LONER, Beatriz Ana. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.70, jul./dez. 2015.
Recentemente veio a público, como obra da Coleção Anpuh-RS, o livro de Clarice Gontarski Speranza sobre as lutas dos mineiros de carvão de Arroio dos Ratos e Butiá, no Rio Grande do Sul, em meados do século XX. O significativo, nesse livro, é que faz uma bem-sucedida aproximação entre o movimento operário dos trabalhadores do carvão e as demandas desses mesmos trabalhadores à Justiça do Trabalho, permitindo, nesse intercâmbio entre as duas dimensões, visualizar a forma como as leis trabalhistas eram percebidas e qual seu papel na luta coletiva e individual da categoria.
O livro é representativo de uma nova série de pesquisas acadêmicas, que, inspiradas no historiador inglês E. P. Thompson, procuram estudar as relações dos trabalhadores com as leis do trabalho promulgadas no período varguista e as formas como esses sujeitos tentaram se utilizar dos instrumentos legais em suas reivindicações.
Trata-se de um tema inovador, em termos do conhecimento histórico, inicialmente pelo tipo de trabalhador, pois o estudo dos mineiros no Rio Grande do Sul tem comparecido mais em pesquisas de cunho antropológico. Acrescenta-se que a união da análise do movimento reivindicatório tradicional de uma categoria, incluindo suas campanhas salariais, greves e mobilizações, com suas demandas frente à Justiça do Trabalho é tema ainda mais incomum, não só pela relativa novidade do uso desta última fonte, mas também porque os pesquisadores costumam estudar apenas um nível dessas reivindicações, ou as demandas trabalhistas ou aquelas baseadas na força autônoma dos trabalhadores.
Ao proceder diferentemente, Clarice descortina um amplo conjunto de relações entre os dois lados da luta dos mineiros, como o fato de que muitos acontecimentos e incidentes ocorridos durante as mobilizações eram, posteriormente, alvos de demandas à justiça pelos trabalhadores, os quais vinham buscar o que julgavam seus direitos não respeitados pelas empresas. Ou seja, ganhando ou perdendo no confronto, o próprio embate poderia gerar situações que implicavam descumprimento de outros direitos estabelecidos.
A autora faz o levantamento completo dos processos trabalhistas e das demandas na Justiça do Trabalho dessa categoria durante períodos extremamente importantes, como o Estado Novo e os anos de 1945 a 1964. Além de um levantamento quantitativo, há também o uso qualitativo de alguns processos, num demonstrativo abrangente das formas de utilização dessas fontes no trabalho de pesquisa.
Com respeito aos processos no interior da própria justiça, a autora avalia a importância, para a vitória ou derrota da ação trabalhista, do cumprimento do ritual processual, ou seja, da necessidade de cumprir todas as etapas do processo, por parte de reclamados e reclamantes. Segundo Clarice, a própria empresa perdeu ações, em alguns momentos, porque descuidou-se do encaminhamento do processo. Isso trouxe um aprendizado mútuo dos querelantes, com respeito a como apresentar as ações e como utilizar a Justiça do Trabalho, com ganhos de causa significativos em alguns momentos (para ambos os lados), graças ao manejo adequado das reivindicações e exposições dos motivos das queixas, justificativas ou recursos.
Ainda com respeito às relações entre uma forma e outra de luta, a autora se interroga sobre a diferenciação de sentenças de acordo com as peculiaridades de cada juiz, vislumbrando a existência de certo ethos comportamental, ou melhor, de um comportamento desejado, por parte de alguns juízes, em relação às greves e outras manifestações operárias.
Bem escrito e com estilo, o livro se constitui numa leitura agradável e um bom exemplo de uma nova safra de pesquisadores que tentam, a partir da visão sobre a relação entre justiça e trabalhadores apresentada por Thompson, estudar as relações desse setor do aparato legal do Estado com os atores sociais envolvidos, especialmente nos inícios da instituição da justiça trabalhista, ou seja, quando o próprio papel da justiça e seu impacto sobre os conflitos empregado-patrão ainda estavam sendo estabelecidos.
Clarice destaca que o Direito, para Thompson, seria “uma arena, onde se digladiam, permanentemente forças contraditórias; a possibilidade de vitória pontual das classes dominadas, a legitimação e o fortalecimento da dominação pela lei e a limitação do arbítrio dos dominantes” (p.38). Para a autora, “o direito evidencia-se assim, como um campo complexo onde se travam batalhas com repercussões importantíssimas em outros âmbitos sociais e não deve ser entendido numa perspectiva reducionista, que não ilumine as diversas possibilidades dadas pelas variadas esferas da lei, em especial sua constituição formal e sua aplicação prática” (p.38).
Justamente esse aspecto ambíguo de sua regulação e domínio pelo Estado, com influência do empresariado, embora seja também instrumento passível de utilização pelos trabalhadores na sua busca por direitos, é um dos aspectos mais fascinantes do uso desses acervos trabalhistas. Vencendo a complexa e aborrecida forma ritual desses instrumentos legais e adicionando a eles boa dose de conhecimento extraprocessual do contexto, Clarice consegue ler nas entrelinhas e captar dados que servem também para buscar indícios da solidariedade (ou não) entre os operários, de suas relações com os patrões e, principalmente, capatazes, e do que esperavam da justiça. Elucida, também, as estratégias e táticas utilizadas pelos patrões, as quais, frequentemente, lhes permitiam vantagens, mesmo nas reivindicações em que o direito do empregado era certo, como a prática de fazer acordos informais. Com a desistência do processo, o empregado recebia rapidamente, mas valor monetário menor do que lhe caberia por direito.
A pesquisa de Clarice Speranza consegue também visualizar outros temas, como a importância das mulheres dos mineiros no contexto das lutas dessa categoria, ao descrever sua participação nas iniciativas dos maridos ou companheiros. Afinal, seu emprego era a garantia de sustentação do próprio projeto de família operária e de sua permanência na cidade, a qual poucas oportunidades oferecia fora da empresa. A garantia do emprego e o nível de remuneração salarial eram, aí, um problema mais familiar e comunitário do que em outras regiões.
Não deixa a autora de assinalar o poder de pressão da empresa sobre seus trabalhadores e a própria justiça, especialmente durante o período de maior controle representado pela entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, sob a ideia de que o trabalhador mineiro não podia faltar ao serviço, pois era considerado como um “soldado” na “batalha da produção”.
Com respeito à autonomia e ao significado da justiça e das sentenças, pode-se entrever que, se houve juízes que conseguiram manter certa coerência em seus julgamentos e sentenças, por outro lado houve aqueles que buscaram intervir no ambiente de trabalho e condicionar os trabalhadores ao uso de formas apenas moderadas de reivindicações, especialmente durante a análise dos processos que foram impetrados para julgar comportamentos ocorridos durante a greve. Ou seja, havia um ethos jurídico social ao qual juízes e advogados queriam condicionar os trabalhadores. Estes, por sua vez, não queriam abrir mão de seus instrumentos tradicionais – os quais a própria autora demonstra serem mais eficazes que a justiça – em suas lutas.
Dessa forma, se o aprendizado é inerente ao contexto, é constante também a dialeticidade das relações entre os vários agentes que vivem do – e ao redor do – trabalho nas minas. Apesar das novas possibilidades abertas com o apelo à Justiça do Trabalho, transparece o fato de que as maiores vitórias da categoria ocorreram fora, por meio de greve e de ações ativas a favor de suas reivindicações, deixando para a justiça determinar os dados secundários dessas ações, ou seja, as sequelas que aparecem em função da realização da greve e da forma como esta mexe com os ânimos tanto de empregados, quanto de seus superiores, em termos de direitos e deveres respeitados ou não.
Se as formas de comportamento das partes envolvidas frente ao aparato legal da justiça trabalhista foram tão detalhadas nesse livro, o sentido foi o de trazer a público formas normalmente insuspeitadas, mas possíveis, de tratar com esses materiais jurídicos e que podem, portanto, servir de estímulo para futuras pesquisas. Mas o livro não se limita a esses acervos, pois também utiliza entrevistas com os trabalhadores e consultas à documentação da empresa, o que permite apresentar um panorama razoável do que seria a vida nas comunidades mineiras gaúchas e sua dependência intrínseca das empresas e do trabalho minerador.
Enfim, o livro de Clarice deve ser lido por todo pesquisador do trabalho que procure se basear nos métodos thompsonianos de análise, como prova de um trabalho cuidadoso, perspicaz e valioso, na perspectiva tanto de demonstração da utilidade da pesquisa nessas fontes, quanto da compreensão das lutas desse setor da classe operária brasileira, os mineiros de carvão.
Beatriz Ana Loner – Universidade Federal de Pelotas (UFP). Pelotas, RS, Brasil. E-mail: bialoner@yahoo.com.br.
[IF]The Country of Football: Politics, Popular Culture, and the Beautiful Game in Brazil – FONTES; HOLLANDA (RBH)
FONTES, Paulo; HOLLANDA, Bernardo Buarque de. The Country of Football: Politics, Popular Culture, and the Beautiful Game in Brazil. London: Hurst & Company, 2014. 274p. Resenha de: CORNELSEN, Elcio Loureiro. Revista Brasileira de História. São Paulo, v.35, n.70 jul./dez. 2015.
O “país do futebol” – muito se escreveu e se alimentou esse mito nas últimas quatro décadas, dentro e fora do Brasil. Nesse sentido, The Country of Football oferece ao leitor um percurso pela história do futebol brasileiro, de seus primórdios aos dias atuais, percurso esse pavimentado por contribuições de vários pesquisadores brasileiros e estrangeiros.
Na introdução intitulada “The Beautiful Game in the ‘Country of Football'” (p.1-16), os historiadores Paulo Fontes e Bernardo Buarque de Hollanda, organizadores da obra, ressaltam que o Brasil continua a ocupar uma posição de destaque no cenário internacional, quando o assunto é futebol. Pela trajetória vitoriosa, coroada pela conquista de cinco títulos mundiais, a expressão “Country of Football” teria se tornado “nossa própria metáfora de Brasil” (p.2).1
O primeiro capítulo do livro, intitulado “The Early Days of Football in Brazil: British Influence and Factory Clubs in São Paulo” (p.17-40), da socióloga Fátima Martin Rodrigues Ferreira Antunes, versa sobre os primórdios do futebol brasileiro. De início, a autora chama a atenção para o fato de que o football já era praticado como atividade física na década de 1880 em escolas religiosas do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro e de São Paulo. Essa nova modalidade adotada pela elite logo despertaria o interesse também de membros das classes operárias, o que culminaria com a formação dos chamados “clubes de várzea” e, sobretudo, de clubes de fábricas, num primeiro passo rumo à popularização.
No capítulo seguinte, intitulado “‘Malandros’, ‘Honourable Workers’ and the Professionalisation of Brazilian Football, 1930-1950” (p.41-66), o historiador norte-americano Gregory E. Jackson enfoca o período de profissionalização do futebol brasileiro a partir de 1933. De acordo com esse autor, sob o jugo autoritário, o futebol representou “uma ferramenta pedagógica para construir cidadãos eugenicamente aptos e culturalmente ortodoxos” (p.43). No contexto da Era Vargas, “o jogo e a cultura do futebol apresentaram um tropo para as críticas da suposta democracia racial do Brasil” (p.61), e encontraram no sociólogo Gilberto Freyre e no jornalista Mário Filho dois pensadores fundamentais na construção do discurso em torno do “mulatismo” como traço de um suposto estilo brasileiro de jogar.
O terceiro capítulo, “Football in the Rio Grande Do Sul Coal Mines” (p.67-85), da antropóloga Marta Cioccari, dedica-se ao estudo de um caso específico: investigar “a importância social e o simbolismo da classe trabalhadora como expressos na vida de mineiros e ex-mineiros de carvão no município de Minas do Leão, no Rio Grande do Sul” (p.67). Trata-se de uma pesquisa etnográfica realizada pela autora, que residiu no período de setembro de 2006 a fevereiro de 2007 em Minas do Leão, uma pequena localidade com cerca de 8 mil habitantes, cuja fonte de renda principal é a mineração. Segundo a autora, o futebol desempenha papel importante no cotidiano do município, onde os primeiros clubes criados por trabalhadores das minas foram fundados nas décadas de 1940 e 1950 (p.69).
No quarto capítulo, “‘Futebol De Várzea’ and the Working Class: Amateur Football Clubs in São Paulo, 1940s-1960s” (p.87-101), o historiador Paulo Fontes destaca a relevância do futebol de várzea como forma de lazer, especialmente em bairros operários das grandes cidades brasileiras. Segundo o autor, “para muitos, o fervor dos torcedores e o sentimento de apego entre os clubes locais e suas comunidades fazem do futebol amador, do futebol ‘real’, herdeiro do que há de melhor nas tradições do futebol brasileiro” (p.88). Tais clubes eram autênticos centros de lazer que integravam diversas atividades para além do futebol, atraindo, assim, amplos segmentos da comunidade em que se localizavam.
O quinto capítulo, “The ‘People’s Joy’ Vanishes: Meditations on the Death of Garrincha” (p.103-127), do antropólogo José Sergio Leite Lopes, apresenta uma “etnografia do funeral” (p.103) de Manuel Francisco dos Santos, mundialmente conhecido como Garrincha. “Uma canção de gesta medieval” (p.108): assim define o antropólogo a intenção de cronistas esportivos, em jornais publicados logo após a morte do ex-jogador, em atribuir sentido épico à carreira de Garrincha, marcada por triunfo e fama no esporte, graças à extrema habilidade em driblar os adversários que o tornou uma figura legendária, não obstante a fase de decadência e a morte trágica, praticamente esquecido, vítima do alcoolismo, em Bangu, no subúrbio do Rio.
No sexto capítulo, “Football as a Profession: Origins, Social Mobility and the World of Work of Brazilian Footballers, 1950s-1980s” (p.129-146), o historiador francês Clément Astruc investiga o testemunho de 43 ex-jogadores que atuaram na seleção brasileira entre 1954 e 1978, no intuito de refletir sobre a real capacidade do futebol como meio de ascensão social da classe trabalhadora. Vários entrevistados foram taxativos ao afirmar que a sociedade, em geral, não via com bons olhos o jogador de futebol, por não considerar sua prática uma profissão. Ao invés disso, termos depreciativos lhes eram atribuídos, como, por exemplo, “vagabundo”, “malandro” ou “safado” (p.133).
No sétimo capítulo, “Dictatorship, Re-Democratisation and Brazilian Football in the 1970s and 1980s” (p.147-166), o antropólogo José Paulo Florenzano enfoca o impacto da ditadura civil-militar (1964-1985) sobre o âmbito do futebol brasileiro e estabelece “um contraponto entre a ‘utopia autoritária’, forjada no contexto de militarização, e a República de Futebol, fundada no contexto da redemocratização” (p.148). A militarização do esporte com fins de propaganda teve várias facetas. Mas, como bem aponta o antropólogo, não faltaram vozes no âmbito do futebol para se rebelar contra esse status quo, em busca de uma democratização de seu meio profissional e, igualmente, da sociedade como um todo.
O oitavo capítulo, “Public Power, the Nation and Stadium Policy in Brazil: The Construction and Reconstruction of the Maracanã Stadium for the World Cups of 1950 and 2014” (p.167-185), do historiador Bernardo Buarque de Hollanda, versa sobre a construção do Estádio do Maracanã para a Copa de 1950 e estabelece uma comparação com a sua reconstrução no contexto da organização da Copa de 2014. Nesses dois momentos, houve uma mudança sensível em relação ao público torcedor: enquanto em 1950 havia uma política inclusiva, até mesmo por se tratar de uma época em que a televisão ainda estava ausente das transmissões, nos anos 2000, com as diretrizes da FIFA e uma maior midiatização, passa a vigorar uma política de exclusão, no espaço dos estádios, de segmentos populares da sociedade, impossibilitados de arcar com os altos preços dos ingressos.
Por fim, o nono capítulo, “A World Cup for Whom? The Impact of the 2014 World Cup on Brazilian Football Stadiums and Cultures” (p.187-206), do geógrafo norte-americano Christopher Gaffney, propõe uma reflexão sobre o impacto da Copa de 2014 para os estádios e para a cultura no Brasil, examinando o desenvolvimento de projetos de construção de estádios e demais infraestruturas relacionadas ao esporte. Com extrema lucidez, o geógrafo conclui suas reflexões com um quadro nada otimista: “Esses processos têm o potencial de alterar, permanentemente, um elemento essencial da identidade cultural brasileira. Ironicamente, é o peso cultural do futebol como criado e sustentado pelo ‘povo’ que tornou possível sua potencialidade de venda no mercado global” (p.206). Afinal, não devemos nos esquecer de que, feito uma Medusa, o capital petrifica tudo aquilo que toca.
Nota
1 As traduções de trechos citados são de nossa autoria.
Elcio Loureiro Cornelsen – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários. Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: cornelsen@letras.ufmg.br
[IF]
História Agrária / Revista Brasileira de História / 2015
O conjunto de textos que compõem o dossiê temático “História Agrária” da presente edição da Revista Brasileira de História expressa as várias interfaces que essa área temática adquiriu nas últimas décadas no Brasil. Aqui não se fazem presentes os temas clássicos das estruturas agrárias, da construção das paisagens e das relações de trabalho no campo, que tantas contribuições trouxeram para a compreensão da sociedade brasileira do passado. As colaborações reunidas apontam para novos e renovados campos da produção histórica como a História Indígena, a História do Direito e uma História Social atenta às concepções e interpretações que os diferentes grupos sociais faziam de sua relação com a terra e seus direitos de acesso a ela.
Do período colonial à contemporaneidade, o leitor encontrará artigos em que se analisa o protagonismo indígena, as distintas concepções acerca do direito de propriedade da terra que manejam diversos grupos sociais e indivíduos, e a instituição, execução e resultados de políticas agrárias e fundiárias em variados contextos.
Vânia Maria Losada Moreira, em “Territorialidade, casamentos mistos e política entre índios e portugueses” aborda a ação indígena no contexto de aplicação do Diretório Pombalino, em vilas de índios do Espírito Santo. Contra as arremetidas dos brancos que arrendavam suas terras, a autora demonstra como os indígenas inverteram a lógica do projeto político assimilacionista, segundo costumes e interesses próprios, “mobilizando os casamentos entre mulheres indígenas e consortes portugueses ‘pardos’ e ‘brancos’ com vistas a manter o controle sobre suas terras e o modus vivendi local”.
Carmen Margarida Oliveira Alveal, em seu artigo “De senhorio colonial a território de mando: os acossamentos de Antônio Vieira de Melo no Sertão do Ararobá (Pernambuco, século XVIII)”, baseia-se nas noções de “senhorio colonial” e “território de mando” para analisar a atuação do sesmeiro de uma grande área e o domínio que exercia sobre a população local com a ajuda de uma milícia indígena, provocando denúncias e reações da Coroa.
Em “O Engenho da Rainha: feixes de direitos e conflitos nas terras de Carlota (1819-1824)”, Márcia Maria Menendes Motta perscruta diferentes concepções do direito de propriedade vigentes a partir de um litígio de terras entre membros da elite local do Rio de Janeiro e Carlota Joaquina, na conjuntura política específica da independência do Brasil e da promulgação de novos diplomas jurídicos como a Constituição portuguesa de 1822 e a brasileira de 1824.
Em “Lei de Terras de 1850: lições sobre os efeitos e os resultados de não se condenar ‘uma quinta parte da atual população agrícola'”, Marcio Antônio Both da Silva discute as interpretações de que a lei teria sido “letra morta” e defende que, em uma mirada mais ampla temporalmente, ela surtiu efeitos duradouros quanto à instituição da concepção de propriedade absoluta no Brasil.
Já Almir Antonio de Souza em seu artigo “A Lei de Terras no Brasil Império e os índios do Planalto Meridional: a luta política e diplomática do Kaingang Vitorino Condá (1845-1870)” desvela a eficiente atuação política de uma importante liderança Kaingang do sul do Brasil na defesa de terras indígenas, ao mesmo tempo em que aborda as ações do governo imperial no avanço da ocupação do território oeste das províncias do Paraná e Santa Catarina, e sua política com relação aos índios da região.
No outro extremo do país, Edson Holanda Lima Barboza com seu texto “Retirantes cearenses na província do Amazonas: colonização, trabalho e conflitos (1877-1879)” estuda a destinação dada aos migrantes cearenses, produto da grande seca desses anos: colônias agrícolas, construção da ferrovia Madeira-Mamoré e os seringais. De iniciativa do governo provincial, as diversas colônias chegaram a congregar quase cinco mil trabalhadores, mas rapidamente fracassaram em seu objetivo de abastecimento da capital amazonense.
Por fim, “A ‘reforma agrária assistida pelo mercado’ do Banco Mundial na Colômbia e no Brasil (1994-2002)”, de autoria de João Márcio Mendes Pereira e Darío Fajardo, coloca em confronto duas experiências de reforma agrária de países com elevados índices de concentração fundiária. A colombiana foi a primeira a ser implementada a partir das formulações do Banco Mundial nos anos 1990, logo seguida por várias na Ásia, África e Américas. Os autores apontam os limites e “contradições insolúveis” da aplicação da proposta, fundada no “neoinstitucionalismo neoclássico”.
Helen Osório – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS – Brasil. E-mail: hosorio@via-rs.net
OSÓRIO, Helen. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.70, jul. / dez., 2015. Acessar publicação original [DR]
Revista Brasileira de História | São Paulo, v.31, n.61, 2011 / v.35, n.70, 2015.
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.35 no.70 São Paulo jul./dez. 2015
Editorial
- EDITORIAL | Negro, Antonio Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: História Agrária
- APRESENTAÇÃO | Osório, Helen | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Territorialidade, casamentos mistos e política entre índios e portugueses | Moreira, Vânia Maria Losada | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- De senhorio colonial a território de mando: os acossamentos de Antônio Vieira de Melo no Sertão do Ararobá (Pernambuco, século XVIII) | Alveal, Carmen Margarida Oliveira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O Engenho da Rainha: feixes de direitos e conflitos nas terras de Carlota (1819-1824) | Motta, Márcia Maria Menendes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Lei de Terras de 1850: lições sobre os efeitos e os resultados de não se condenar “uma quinta parte da atual população agrícola” | Silva, Marcio Antônio Both da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A Lei de Terras no Brasil Império e os índios do Planalto Meridional: a luta política e diplomática do Kaingang Vitorino Condá (1845-1870) | Souza, Almir Antonio de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Retirantes cearenses na província do Amazonas: colonização, trabalho e conflitos (1877-1879) | Barboza, Edson Holanda Lima | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A “reforma agrária assistida pelo mercado” do Banco Mundial na Colômbia e no Brasil (1994-2002) | Pereira, João Márcio Mendes; Fajardo, Darío | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- “Se viveres como louco, sabes que hás de morrer sem juízo”: as orientações para o bem morrer na literatura cristã portuguesa do século XVIII | Fleck, Eliane Cristina Deckmann; Dillmann, Mauro | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O século XIX paulista: lembranças do “Grito do Ipiranga” | Cavenaghi, Airton José | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Origens do pensamento radical na América Latina: um estudo comparativo entre José Martí, Juan B. Justo e Ricardo Flores Magón | Santos, Fabio Luis Barbosa dos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Saudades: sensibilidades no epistolário de e/imigrantes portugueses (Portugal-Brasil 1890-1930) | Truzzi, Oswaldo; Matos, Maria Izilda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Entrevista
- Entrevista: François Hartog | Romero, Mariza | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Trento, Angelo Imprensa italiana no Brasil, séculos XIX-XX | Biondi, Luigi | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Speranza, Clarice Gontarski Cavando direitos: as leis trabalhistas e os conflitos entre os mineiros de carvão e seus patrões no Rio Grande do Sul (1940-1954) | Loner, Beatriz Ana | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Fontes, Paulo; Hollanda, Bernardo Buarque de (Org.) The Country of Football: Politics, Popular Culture, and the Beautiful Game in Brazil | Cornelsen, Elcio Loureiro | · texto em Português | · Português ( pdf )
Erratum
- Erratum | | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.35 no.69 São Paulo jan./jun. 2015
Apresentação
- APRESENTAÇÃO | Fortes, Alexandre; Mattos, Hebe | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Dossiê: Pós- abolição no Mundo Atlântico
- No ritmo do Vagalume: culturas negras, associativismo dançante e nacionalidade na produção de Francisco Guimarães (1904-1933) | Pereira, Leonardo Affonso de Miranda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Revisitando “Família e Transição”: família, terra e mobilidade social no pós-abolição: Rio de Janeiro (1888-1940) | Costa, Carlos Eduardo Coutinho da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Sr. Sidão Manoel Inácio e a conquista da cidadania: o campesinato negro do Morro Alto e a República que foi | Weimer, Rodrigo de Azevedo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Teodoro Sampaio e Rui Barbosa no tabuleiro da política: estratégias e alianças de homens de cor (1880-1919) | Albuquerque, Wlamyra | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Campos do pós-abolição: identidades laborais e experiência “negra” entre os trabalhadores do café no Rio de Janeiro (1931-1964) | Cicalo, André | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- As heranças do Rosário: associativismo operário e o silêncio da identidade étnico-racial no pós-abolição, Laguna (SC) | Sayão, Thiago Juliano | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os perigos dos Negros Brancos: cultura mulata, classe e beleza eugênica no pós-emancipação (EUA, 1900-1920) | Nascimento, Giovana Xavier da Conceição | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O legado das canções escravas nos Estados Unidos e no Brasil: diálogos musicais no pós-abolição | Abreu, Martha | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- Relações Igreja-Estado em uma cidade operária durante a ditadura militar | Estevez, Alejandra Luisa Magalhães | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Uma greve que pôs em risco a segurança nacional: o caso do açúcar e a luta dos trabalhadores por melhores condições de vida | Ribeiro, Felipe Augusto dos Santos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os ativos intelectuais católicos no Brasil dos anos 1930 | Mueller, Helena Isabel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A revista A Ordem e o “flagelo comunista”: na fronteira entre as esferas política, intelectual e religiosa | Pereira, Marco Antônio Machado Lima | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “Vivemos identificados com a civilização, dentro da civilização”: autoimagens urbanas nos sertões da Bahia | Oliveira, Valter Gomes Santos de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A emancipação negociada: os debates sobre a criação da província do Paraná e o sistema representativo imperial, 1843 | Gregório, Vitor Marcos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Entrevista
- Eric Foner. Columbia University, Nova York, 28 de março de 2014 | Mattos, Hebe; Abreu, Martha | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Trabalho, história ambiental e cana-de-açúcar em Cuba e no Brasil | Chomsky, Aviva | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Assis, Arthur Alfaix. What is History for? Johann Gustav Droysen and the functions of historiography | Silva, Walkiria Oliveira | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Reis Filho, Daniel Aarão. Luís Carlos Prestes: um revolucionário entre dois mundos | Sales, Jean Rodrigues | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.34 no.68 São Paulo jul./dez. 2014
Apresentação | Fortes, Alexandre | · texto em Português | · Português ( pdf )
Dossiê: O Brasil na História Global
- “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a transformar a Amazônia em uma arena política global | Acker, Antoine | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Reconsiderando a política de colonização no Brasil Imperial: os anos da Regência e o mundo externo | Pérez Meléndez, José Juan | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Viajantes de saias: escritoras e ideias antiescravistas numa perspectiva transnacional (Brasil, século XIX) | Maia, Ludmila de Souza | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Histórias conectadas, histórias integradas: Brasil e Argentina em busca de um terceiro no século XIX | Secreto, Maria Verónica | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- “Como abelhas polinizando flores”: gerência e racionalização do trabalho no complexo coureiro-calçadista de Franca, SP, no século XX | Rezende, Vinícius de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A(s) história(s) contada(s) no livro didático hoje: entre o nacional e o mundial | Rocha, Helenice Ap.; Caimi, Flavia Eloisa | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Descontruindo mapas, revelando espacializações: reflexões sobre o uso da cartografia em estudos sobre o Brasil colonial | Oliveira, Tiago Kramer de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O esporte na política colonial portuguesa: as iniciativas de Sarmento Rodrigues na Guiné (1945-1949) | Melo, Victor Andrade de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- A inglória ilha de Gloriana: Elizabeth I, responsabilidade e honra na Guerra dos Nove Anos na Irlanda | O’Neill, Eoin | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O Código Filipino, as Normas Camarárias e o comércio: mecanismo de vigilância e regulamentação comercial na Capitania do Rio Grande do Norte | Dias, Thiago Alves | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Greve como luta por direitos: as paralisações dos cocheiros e carroceiros no Rio de Janeiro (1870-1906) | Terra, Paulo Cruz | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- O ensino público como projeto de nação: a “Memória” de Martim Francisco (1816-1823) | Bontempi Jr., Bruno; Boto, Carlota | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Informação, política e fé: o jornal Mensageiro da Paz no contexto de redemocratização do Brasil (1980-1990) | Fonseca, André Dioney | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Entrevista
- Patrick Manning | Fortes, Alexandre | · texto em Português | · Português ( pdf )
Resenhas
- Gomes, Ângela de Castro; Silva, Fernando Teixeira da (Org.). A Justiça do Trabalho e sua história | Limoncic, Flávio | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Jesus, Nauk Maria de. O governo local na fronteira Oeste: a rivalidade entre Cuiabá e Vila Bela no século XVIII | Moura, Denise A. Soares de | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Darnton, Robert Poetry and the Police: Communication Networks in Eighteenth-Century Paris | Sobral, Luís Felipe | · texto em Português | · Português ( pdf )
- Rust, Leandro Duarte A Reforma Papal (1050-1150): trajetórias e críticas de uma história | Duarte, Magda Rita Ribeiro de Almeida | · texto em Português | · Português ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.34 no.67 São Paulo jan./jun. 2014
Apresentação | Fortes, Alexandre | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Dossiê: Golpes e Ditaduras
- Os “inimigos da pátria”: repressão e luta dos trabalhadores do Sindicato dos Químicos de São Paulo (1964-1979) | Corrêa, Larissa Rosa | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “O sangue da mocidade está correndo”: a classe política e seus filhos enfrentam os militares em 1968 | Pitts, Bryan | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Pela “pacificação da família brasileira”: uma breve comparação entre as anistias de 1945 e de 1979 | Rodeghero, Carla Simone | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os usos do civismo em tempos autoritários: as comemorações e ações do Conselho Federal de Cultura (1966-1975) | Maia, Tatyana de Amaral | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O calendário e o golpe de 1964: temporalidade, escrita da história e hagiografia | Ramos, Francisco Régis Lopes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- PO-EX: a poética como acontecimento sob a noite que o fascismo salazarista impôs a Portugal | Castelo Branco, Edwar de Alencar | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- Evolucionismo darwinista? Contribuições de Alfred Russel Wallace à teoria da evolução | Papavero, Nelson; Santos, Christian Fausto Moraes dos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Diplomacia e ciência no contexto da Segunda Guerra Mundial: a viagem de Arthur Compton ao Brasil em 1941 | Freire Junior, Olival; Silva, Indianara | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “Pelo que é nosso!”: a diplomacia cultural brasileira no século XX | Dumont, Juliette; Fléchet, Anaïs | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Ocupando espaços, construindo identidades: a importância do movimento de pobladores para a história política e social do Chile (1950-1970) | Cury, Márcia C. O. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cidadania por um fio: o associativismo negro no Rio de Janeiro (1888-1930) | Domingues, Petrônio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Procuram-se braços para a lavoura: imigrantes e retirantes na economia cafeeira paulista no final do Oitocentos | Gonçalves, Paulo Cesar | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Imprensa e educação feminina em zona pioneira: o caso do Noroeste Paulista (1920-1940) | Campos, Raquel Discini de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Memória
- Conhecimento histórico e diálogo social | Schmidt, Benito Bisso | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Pinto, António Costa; Martinho, Francisco Carlos Palomanes (Org.). O Passado que não passa: a sombra das ditaduras na Europa do Sul e na América Latina | Wasserman, Claudia | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- van der Linden, Marcel. Trabalhadores do mundo: ensaios para uma história global do trabalho | Silva, Fernando Teixeira da | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Hawthorne, Walter. From Africa to Brazil: Culture, Identity, and an Atlantic Slave Trade, 1600-1830 | Machado, Maria Helena P. T. | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Garfield, Seth. In Search of the Amazon: Brazil, the United States, and the Nature of a Region | Duarte, Regina Horta | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.33 no.66 São Paulo jul./dez. 2013
Apresentação
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Dossiê: Inclusões e Exclusões
- Os pangermanistas na África: inclusão e exclusão dos nativos nos planos expansionistas do império, 1896-1914 | Brepohl, Marion | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O conceito político de povo no período da Independência: história e tempo no debate político (1820-1823) | Pereira, Luisa Rauter | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Uma pena de ouro para a Abolição: a lei do 13 de maio e a participação popular | Moraes, Renata Figueiredo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Trabalhadores e associativismo urbano no governo Jânio Quadros em São Paulo (1953-1954) | Fontes, Paulo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os ciganos e os processos de exclusão | Andrade Júnior, Lourival | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O Partido Comunista Brasileiro e o governo João Goulart | Ferreira, Jorge | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Adeus à classe trabalhadora? | Eley, Geoff; Nield, Keith | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | · Português ( pdf )
Artigos
- Carreira e trajetória social na monarquia e no império ultramarino português, governadores gerais do Estado do Brasil (1640-1702) | Cosentino, Francisco Carlos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Um espelho possível de santidade na Bahia colonial: madre Vitória da Encarnação (1661-1715) | Martins, William de Souza | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- As Câmaras e o ensino régio na América portuguesa | Fonseca, Thais Nivia de Lima e | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Escrever, contar, guardar: o diário de Santander no exílio europeu (1829-1832) | Bittencourt, Libertad Borges | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O pensamento corporativo em Miguel Reale: leituras do fascismo italiano no integralismo brasileiro | Bertonha, João Fábio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cruzada pela democracia: militantes católicos no Brasil republicano | Koch, Ana Maria | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os petistas e a crise do socialismo real: os desafios da renovação e as heranças das esquerdas tradicionais | Costa, Izabel Cristina Gomes da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- A Poverty of Rights: citizenship and Inequality in Twentieth-Century Rio de Janeiro | Oliveira, Samuel Silva Rodrigues de | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cash for your trash: scrap recycling in America | Bosi, Antonio de Pádua | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O pequeno x: da biografia à história | Arienti, Douglas Pavoni | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A História como ofício: a constituição de um campo disciplinar | Rodrigues, Lidiane S. | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.33 no.65 São Paulo 2013
Apresentação
- Apresentação | Ferreira, Marieta de Moraes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Dossiê: História e Demandas Sociais
- Uma teoria do abuso da História | Baets, Antoon De | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Tráfico de pessoas: uma história do conceito | Venson, Anamaria Marcon; Pedro, Joana Maria | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Memória e representações: a fotografia e o movimento estudantil de 1968 no México | Troncoso, Alberto del Castillo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Intelectuais, democratização e combate à pobreza no Brasil contemporâneo | Freire, Américo Oscar Guichard | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cultura política e políticas para o ensino de história em Santa Catarina no início do século XX | Silva, Cristiani Bereta da; Zamboni, Ernesta | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os lugares da produção do saber histórico escolar no Brasil: compêndios de história e narrativas conciliadoras no Paraná (1876-1905) | Toledo, Maria Aparecida Leopoldino Tursi | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Acervos da Justiça do Trabalho como fonte de pesquisa | Veiga, Alexandre | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- A luta de brasileiros contra o miguelismo em Portugal (1828-1834): o caso do homem preto Luciano Augusto | Gonçalves, Andréa Lisly | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Um mundo novo no Atlântico: marinheiros e ritos de passagem na linha do equador, séculos XV-XX | Rodrigues, Jaime | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Comemorar Camões e repensar a nação: o discurso de Joaquim Nabuco na festa do tricentenário de morte de Camões no Rio de Janeiro (1880) | Venâncio, Giselle Martins | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O chamado às armas: o abolicionismo radical de Nabuco em 1885-1886 | Needell, Jeffrey D. | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A produção de materiais didáticos pelo MEC: da campanha nacional de material de ensino à fundação nacional de material escolar | Filgueiras, Juliana Miranda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Formação do jornalista contemporâneo: a história de um trabalhador sem diploma | Bernardo, Cristiane Hengler Corrêa; Leão, Inara Barbosa | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O Banco Mundial e a construção política dos programas de ajustamento estrutural nos anos 1980 | Pereira, João Márcio Mendes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Memória
- Conferência – Ritual de Aurora e de Crepúsculo: a comemoração como a experiência de um tempo fronteiriço e multiplicado ou as antinomias da memória | Albuquerque Júnior, Durval Muniz de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- John Manuel Monteiro (1956-2013): um legado inestimável para a Historiografia | Almeida, Maria Regina Celestino de | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Entrevistas
- Jean-François Sirinelli | Ferreira, Marieta de Moraes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Eugenia Meyer | Ferreira, Marieta de Moraes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Viñas, Ángel (Ed.) En el combate por la historia: la República, la guerra civil, el franquismo | Mansan, Jaime Valim | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Fields, Karen E.; Fields, Barbara J. Racecraft: the soul of inequality in American Life | Chaves, Wanderson da Silva | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Chartier, Roger O que é um autor? Revisão de uma genealogia | Moraes, Kleiton de Sousa | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Gonçalves, Marcia de A.; Rocha, Helenice Ap. de B.; Resnik, Luís; Monteiro, Ana M. F. da C. (Org.) Qual o valor da história hoje? | Penna, Fernando de Araujo | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.32 no.64 São Paulo dez. 2012
Apresentação
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Dossiê: Trabalho e Trabalhadores
- A grande fuga: como um campo sobreviveu a tempos difíceis | Fink, Leon | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Espaços industriais e comunidades operárias: o caso de estudo português e a tradição historiográfica europeia | Pereira, Joana Vidal de Azevedo Dias | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Sobre cadeias e coerção: experiências de trabalho no Centro-Sul do Brasil do século XIX | Mendonça, Joseli Maria Nunes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os prisioneiros do Benevente | Geraldo, Endrica | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Agripino Nazareth e o movimento operário da Primeira República | Castellucci, Aldrin Armstrong Silva | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “Não trabalhou porque não quis”: greve de trabalhadores têxteis na Justiça do Trabalho (Bahia, 1948) | Negro, Antonio Luigi | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os mineiros de carvão, seus patrões e as leis sobre trabalho: conflitos e estratégias durante a Segunda Guerra Mundial | Speranza, Clarice Gontarski | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os retornados: reflexões sobre condições sociais e sobrevivência de trabalhadores rurais migrantes escravizados no tempo presente | Rocha, Cristiana Costa da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Repressão e mudanças no trabalho análogo a de escravo no Brasil: tempo presente e usos do passado | Gomes, Ângela Maria de Castro | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- Teoria da História, Didática da História e narrativa: diálogos com Paul Ricoeur | Anhorn, Carmen Teresa Gabriel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A construção da perspectiva africana: uma história do projeto História Geral da África (Unesco) | Barbosa, Muryatan Santana | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Território em disputa: a escola na luta entre o republicanismo e a Igreja em Portugal (séculos XIX e XX) | Hansen, Patricia Santos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Manoel Ferreira de Araújo Guimarães, a Academia Real Militar do Rio de Janeiro e a definição de um gênero científico no Brasil em inícios do século XIX | Carolino, Luís Miguel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os soldados de Deus: religião e política na Faculdade de Direito de Porto Alegre na primeira metade do século XX | Grijó, Luiz Alberto | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- De perfumes aos pós: a publicidade como objeto histórico | Sant’Anna, Mara Rúbia | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Entrevista
- Christian Delacroix | Ferreira, Marieta de Moraes; Riom, Charlotte; Franco, Renato Júnio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- François Dosse | Ferreira, Marieta de Moraes | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Boletim Vida Escolar: uma fonte e múltiplas leituras sobre a educação no início do século XX | Leon, Adriana Duarte | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Viagem ao cinema silencioso do Brasil | Schiavinatto, Iara Lis Franco | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Colunas de São Pedro: a política papal na Idade Média central | Coelho, Maria Filomena Pinto da Costa | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- História e documentário | Malafaia, Wolney Vianna | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.32 no.63 São Paulo 2012
Apresentação
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Dossiê: Igreja e Estado
- Cidade de São Sebastião: o Rio de Janeiro e a comemoração de seu santo patrono nos escritos e ritos jesuíticos, c.1585 | Cardoso, Vinicius Miranda | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cruz e Coroa: Igreja, Estado e conflito de jurisdições no Maranhão colonial | Muniz, Pollyanna Gouveia Mendonça | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Na arena do sagrado: poder político e vida religiosa nas minas de Goiás | Lemes, Fernando Lobo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “A Vossa graça nos nossos sentimentos”: a devoção à Virgem como garantia da salvação das almas em um manual de devoção do século XVIII | Fleck, Eliane Cristina Deckmann; Dillmann, Mauro | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Padres políticos e suas redes de solidariedade: uma análise da atuação sacerdotal no sertão de Minas Gerais (1822 e 1831) | Silva, Ana Rosa Cloclet da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Modernidade republicana e diocesanização do catolicismo no Brasil: as relações entre Estado e Igreja na Primeira República (1889-1930) | Aquino, Maurício de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Gustavo Corção: apóstolo da ‘linha-dura’ | Paula, Christiane Jalles de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Igrejas e Estado | Abel, Olivier | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O tempo da santidade: reflexões sobre um conceito | Teixeira, Igor Salomão | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O rei e o reino sob o olhar do pregador: Vicente de Beauvais e a realeza no século XIII | Miatello, André Luis Pereira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- A Correspondência Luso-Brasileira: narrativa de um trânsito intercultural | Santos, Clara Maria Laranjeira Sarmento e | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Formação profissional e formação política na Escola Militar do Realengo | Svartman, Eduardo Munhoz | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Um projeto de Diplomacia Cultural para a República: a Revista Americana e a construção de uma nova visão continental | Castro, Fernando Vale | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Civismo, República e manuais escolares | Vieira, Cleber Santos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os hotéis na cidade de São Paulo na primeira década do século XX: diversidade no tamanho, na localização e nos serviços | Siqueira, Lucília | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Quando o dragão assume o lugar do cavalo: um caráter pós-colonialista na obra criolla de Xul Solar | Flores, Maria Bernardete Ramos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Festa e espaço urbano: meios de sonorização e bailes dançantes na Belém dos anos 1950 | Costa, Antonio Maurício Dias da | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “Um, dois, três MFA…”: o Movimento das Forças Armadas na Revolução dos Cravos – do prestígio à crise | Varela, Raquel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- João Goulart: uma biografia | Motta, Rodrigo Patto Sá | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Leituras, projetos e (Re)vista(s) do Brasil (1916-1944) | Neves, Livia Lopes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cláudio Manuel da Costa: o letrado dividido | Ferreira, Cristina | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Présent, nation, mémoire | Boeira, Luciana Fernandes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.30 no.60 São Paulo 2010
Apresentação
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Dossiê: História, educação e interdisciplinaridade
- Ensino de História hoje: errâncias, conquistas e perdas | Silva, Marcos Antônio da; Fonseca, Selva Guimarães | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A extensão na formação de profissionais de história | Costa, Aryana Lima | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- História, memória e tradição na educação escolar indígena: o caso de uma escola Kaingang | Bergamaschi, Maria Aparecida; Medeiros, Juliana Schneider | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A indústria cultural e a política educacional do regime militar: o caso da revista Escola | Toledo, Maria Rita de Almeida; Revah, Daniel | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O ensino de História encontra seu passado: memórias da atuação docente durante a ditadura civil-militar | Lourenço, Elaine | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A escrita como condição para o ensino e a aprendizagem de história | Rocha, Helenice Aparecida Bastos | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Educação, memória e patrimônio: ações educativas em museu e o ensino de história | Pacheco, Ricardo de Aguiar | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- Um intelectual viajante: Floriano de Lemos no sertão paulista (1926-1930) | Campos, Raquel Discini de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Libro de Mano: “Novela Política e Sentimental”, um pasquim manuscrito | Azevedo, Francisca L. Nogueira de; Gonçalves, Roberta Teixeira | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Nos caminhos da pena de um romancista do século XIX: o Rio de Janeiro de Diva, Lucíola e Senhora | Soares, Ana Carolina Eiras Coelho | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Crisis in the meat shop of colonial Buenos Aires: from monopoly to free competition | Dupuy, Andrea | · resumo em Espanhol | Inglês | · texto em Espanhol | Inglês | · Inglês ( pdf ) | Espanhol ( pdf )
- Uma República na Constituinte (1985-1988) | Versiani, Maria Helena | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Um nordeste em São Paulo: trabalhadores migrantes em São Miguel Paulista, 1945/1966 | Duarte, Adriano Luiz | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Subsistência e poder: a política do abastecimento alimentar nas Minas setecentistas | Basso, Rafaela | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Cultura escrita: séculos XV a XVIII | Duran, Maria Renata da Cruz | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A história nos filmes, os filmes na história | Santiago Júnior, Francisco das Chagas Fernandes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Sumário | Rev. Bras. Hist. vol.31 no.61 São Paulo 2011
Apresentação
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Dossiê: Comemorações
- Alferes Gamboa e a Sociedade Comemorativa da Independência do Império, 1869-1889 | Kraay, Hendrik | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Um lugar de memória e de esquecimento: Santa Librada, padroeira da Independência da Colômbia | Almeida, Jaime de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Do marinheiro João Cândido ao Almirante Negro: conflitos memoriais na construção do herói de uma revolta centenária | Almeida, Silvia Capanema P. de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- História, memória e comemorações: em torno do genocídio e do passado colonial no sudoeste africano | Correa, Sílvio Marcus de Souza | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Luto e culto cívico dos mortos: as tensões da memória pública da Revolução Constitucionalista de 1932 (São Paulo, 1932-1937) | Abreu, Marcelo Santos de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Os funerais como liturgias cívicas: notas sobre um campo de pesquisas | Marcelino, Douglas Attila | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Rapsódia verde: as comemorações do jubileu de prata integralista e a manutenção de seu passado/presente (1957-1958) | Christofoletti, Rodrigo | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- “Você me prende vivo, eu escapo morto”: a comemoração da morte de estudantes na resistência contra o regime militar | Müller, Angélica | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O espaço funerário: comemorações privadas e exposição pública das mulheres em Atenas (séculos VI-IV a.C.) | Andrade, Marta Mega de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Artigos
- Mídia e memória: apresentação e ‘uso’ de testemunhos em som e imagem | Plato, Alexander von | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- As exposições universais e o cinema: história e cultura | Morettin, Eduardo Victorio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Do ‘terror suicida’ ao ‘bárbaro’: mídia e exclusão na política externa brasileira – o 11 de setembro segundo O Globo e a Folha de S. Paulo | Jesus, Diego Santos Vieira de; Fernandes, Verônica Daminelli | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A produção do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) em acervos norte-americanos: estudo de caso | Luca, Tania Regina de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A dupla dimensão do movimento latino-americano de história das ideias | Carvalho, Eugênio Rezende de | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- A conquista do Maranhão e as disputas atlânticas na geopolítica da União Ibérica (1596-1626) | Cardoso, Alírio | · resumo em Português | Inglês | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Resenhas
- Memórias e narrativas (auto) biográficas | Silva, Weder Ferreira da | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O alufá Rufino: tráfico, escravidão e liberdade no Atlântico negro (1822-1853) | Roiz, Diogo da Silva | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- O Café de Portinari na Exposição do Mundo Português: modernidade e tradição na imagem do Estado Novo brasileiro | Piazza, Maria de Fátima Fontes | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
- Dosse, François Pierre Nora – homo historicus | Silva, Helenice Rodrigues da | · texto em Português | Inglês | · Português ( pdf ) | Inglês ( pdf )
Luís Carlos Prestes: um revolucionário entre dois mundos – REIS FILHO (RBH)
REIS FILHO, Daniel Aarão. Luís Carlos Prestes: um revolucionário entre dois mundos. São Paulo: Companhia das Letras, 2014. Resenha de: SALES, Jean Rodrigues. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.69, jan./jun. 2015.
Luís Carlos Prestes nasceu em janeiro de 1898 e morreu em março de 1990. Em sua longa vida, participou de momentos marcantes da história do país e das esquerdas em particular. Nos anos 1920, foi um dos líderes do movimento que percorreu o Brasil em oposição ao governo Artur Bernardes e à forma de organização do regime republicano. Nos anos 1930, passou longo período na União Soviética, onde aderiu definitivamente ao comunismo e pavimentou sua entrada no Partido Comunista Brasileiro (PCB). Após retornar ao Brasil, participou da chamada Intentona Comunista, em 1935. Derrotado o movimento, esteve preso por vários anos, até emergir na segunda metade dos anos 1940, liderando um revigorado PCB após o final da guerra.
Com o governo Dutra, enfrentou nova fase de perseguições a partir da cassação do registro do PCB e nova imersão na clandestinidade. Do final dos anos 1950 até o golpe de 1964 viveu, com o PCB, os anos intensos da conjuntura dos governos Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros, a renúncia deste e a conturbada posse de João Goulart. Entre 1961 e 1964, esteve presente nos debates sobre as Reformas de Base e outros projetos de desenvolvimento do país. Após o golpe, viveu novo e longo exílio na União Soviética, de onde acompanhou e foi protagonista da crise orgânica do PCB. De volta ao Brasil, em 1979, até a sua morte, participou, direta ou indiretamente, dos grandes eventos da redemocratização. Em linha geral, teve um posicionamento crítico ao PCB, aos partidos de esquerda e à chamada Nova República.
Pela dimensão da participação de Prestes nos eventos aqui sumariamente arrolados, poderíamos nos perguntar sobre a viabilidade de se escrever uma biografia completa sobre sua trajetória pessoal e política nesse quase um século de existência. As dificuldades colocadas para um empreendimento dessa natureza podem explicar o fato de o livro Luís Carlos Prestes: um revolucionário entre dois mundos ser o primeiro a assumir essa tarefa.1
Para dar conta da complexidade do longo período estudado, Daniel Aarão Reis dividiu a trajetória de Prestes em três grandes conjunturas, demarcadas por eventos políticos mais amplos e pela história de Prestes no interior do PCB: a primeira seria de 1898 a 1935; a segunda, de 1936 a 1964, e a terceira, de 1964 a 1990.
Além do próprio mérito de biografar uma figura representativa da história da esquerda brasileira no século XX, o livro tem seu ponto mais forte na utilização de ampla gama de fontes: entrevistas com militantes e ex-militantes que conviveram com Prestes, tanto dos que continuaram próximos ou admiradores do legado do líder comunista, quanto de críticos e desafetos históricos, permitindo uma análise da trajetória do biografado no interior da máquina partidária; entrevistas realizadas com familiares, que possibilitaram vislumbrar os aspectos pessoas dessa trajetória; fontes do regime soviético e da Internacional Comunista pesquisadas em Moscou e, por fim, mas muito relevantes, gravações em áudio de reuniões do Comitê Central do PCB realizadas no exílio. O acesso às gravações, até então inéditas, permitiu a análise das percepções de parte dos dirigentes do PCB em relação a situação do partido na conjuntura que antecede a volta do exílio, em 1979, e, com isso, o próprio posicionamento de Prestes naquele momento. Os debates realizados pelo Comitê Central no exterior, que aparecem nas gravações, ajudam também a entender o afastamento de Prestes do PCB no decorrer da década de 1980.
Em um livro dessa natureza, sempre haverá quem aponte a falta de certos temas, a necessidade de aprofundamento desse ou daquele aspecto da trajetória de Prestes, bem como das abordagens implícitas da história do país ou do comunismo. São os casos, por exemplo, das relações do PCB e do próprio Prestes com os trabalhadores no decorrer do século XX. Do mesmo modo, pode-se discordar de uma interpretação, que permeia o livro, sugerindo que as opções de Luís Carlos Prestes teriam sido apostas em um sonho impossível: a realização de uma revolução socialista no Brasil. Caberia talvez expandir a análise e lembrar que no decorrer do século XX revoluções ocorreram em países nos quais não eram esperadas, além da vitória de lutas de vários povos do Terceiro Mundo a partir do pós-guerra.
Há ainda quem tenha apontado alguns equívocos factuais na narrativa, mas que, a meu ver, não causam danos importantes no texto, ainda que envolvam questões relevantes da vida pessoal do biografado. Porém, a opção do autor e da editora por uma forma de citação através da qual, em alguns momentos, não se consegue localizar completamente as fontes utilizadas para amparar as análises do livro, tem gerado desconforto, principalmente entre historiadores.2 Se, por um lado, a opção editorial tem como aspecto positivo permitir uma narrativa fluida, necessária em um livro de mais de quinhentas páginas, observa-se, em contrapartida, a imprecisão das citações. Essa característica do trabalho, que seria controversa em qualquer livro de história, agiganta-se ao se tratar de um tema por si só polêmico como é a vida e legado de Luís Carlos Prestes, tornando-se quase inevitáveis as críticas e divergências.
Como se vê, o livro apresenta aspectos superlativos e complexos, o que retrata a própria vida de Prestes. As divergências em torno do seu resultado denotam a complexidade do trabalho realizado. Assim, concordando ou discordando das análises de Daniel Aarão Reis, trata-se de leitura incontornável para os que querem conhecer a história de Prestes e do comunismo no século XX.
Jean Rodrigues Sales – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Nova Iguaçu, RJ,Brasil. E-mail: jeanrodrigues5@yahoo.com.br.
[IF]What is History for? Johann Gustav Droysen and the functions of historiography | Arthur Alfaix Assis
A publicação de What is History for? Johann Gustav Droysen and the functions of historiography, de Arthur Assis, apresenta uma proveitosa discussão sobre a historiografia de Johann Gustav Droysen (1808-1884), importante historiador alemão do século XIX. Com base na análise da historiografia de Droysen, o autor oferece ao leitor um amplo panorama da historiografia alemã durante o século XIX, centrando-se nos debates sobre o historicismo, paradigma dominante no conhecimento histórico alemão oitocentista, e na reformulação do valor pragmático para a historiografia. Nesse sentido, a obra de Arthur Assis não se dirige somente aos especialistas e pesquisadores do pensamento de Droysen, mas a todos os estudiosos de historiografia alemã e geral, história intelectual e mesmo historiografia política, uma vez que destaca as influências políticas do pensamento daquele autor. Leia Mais
Pós-abolição no Mundo Atlântico / Revista Brasileira de História / 2015
O reconhecimento de escravos e libertos como sujeitos históricos acabou por influenciar os estudos sobre o destino dos escravizados e seus descendentes em antigas sociedades escravistas após a abolição legal da escravidão. No Brasil, se a década de 1980 representou um marco para a historiografia da escravidão, podemos pensar que os anos 2000 foram decisivos para a historiografia sobre as formas, condições e concepções de liberdade no pós-abolição. A produção de livros e documentários, a realização de eventos nacionais e internacionais e a formação de grupos de pesquisa adjetivados pelos termos “pós-emancipação” e “pós-abolição”, de norte a sul do país, atestam a emergência de um destacado campo de investigação, comprometido em reconstituir trajetórias, processos e experiências de liberdade da população negra no Brasil e nas Américas após a proibição legal da escravidão.
Em vistas da amplitude do campo, surgem muitas questões. O que significa pensar o pós-abolição como problema histórico? Quais os significados e limites da revogação legal da escravidão nas antigas sociedades escravistas do Atlântico? É possível construir definições precisas sobre o que seria esse pós-abolição? Quais os significados da abolição formal da escravidão? Pós-abolição e pós-emancipação são sinônimos ou representam formas distintas de enxergar e pesquisar as experiências de liberdade e os significados legais da abolição da escravidão? Quando começa e quando termina o pós-abolição? Qual o lugar das experiências de tornar-se livre e do abolicionismo do século XIX? Como a politização da memória da escravidão e o estudo do tempo presente contribuem para delimitação dos seus limites cronológicos? De que formas o trabalho com diversas concepções, fontes e metodologias do campo questiona a tese clássica de que os negros teriam ficados “abandonados à própria sorte”, trazendo para o centro da discussão debates relacionados aos direitos de cidadania, mundos do trabalho livre, racialização, racismo, mobilidade social, migrações, relações de gênero, gerações, acesso à terra, educação e movimentos sociais negros e indígenas em abordagens locais, transnacionais ou comparativas?
Essas são algumas das indagações sobre as quais se debruçaram autoras e autores dos trabalhos publicados no dossiê temático “Pós-abolição no Mundo Atlântico”, que integra a presente edição da Revista Brasileira de História.
O dossiê se abre com “No ritmo do Vagalume: culturas negras, associativismo dançante e nacionalidade da produção de Francisco Guimarães (1904-1933)”, de Leonardo Affonso de Miranda Pereira. A trajetória e a obra do personagem analisado são utilizadas como fio condutor para uma imersão no universo da cultura popular do período. O autor destaca a valorização da agência negra nas crônicas de Guimarães, o Vagalume, sobre a vida musical e recreativa do Rio de Janeiro. Pereira situa a produção do popular cronista e dramaturgo carioca como parte de um processo de disputa sobre a identidade brasileira que tem entre os seus resultados o estabelecimento do samba como “ritmo capaz de representar a nacionalidade”.
Dois dos artigos revisitam o tema clássico do campesinato negro no pós-abolição nas regiões Sudeste e Sul do Brasil. Em “Revisitando ‘Família e transição’: família, terra e mobilidade social no pós-abolição. Rio de Janeiro (1888-1940)”, Carlos Eduardo Coutinho da Costa analisa mais de seis décadas de registros civis do município de Nova Iguaçu, identificando os impactos econômicos e demográficos da citricultura sobre as famílias negras rurais da província fluminense e suas estratégias de mobilidade social. Em “Sr. Sidão Manoel Inácio e a conquista da cidadania: o campesinato negro do Morro Alto e a República que foi”, Rodrigo de Azevedo Weimer aborda a agência política do campesinato negro do litoral norte do Rio Grande do Sul na luta por direitos cidadãos durante a Primeira República.
Deslocando o foco para a Bahia, Wlamyra Albuquerque também aborda as conexões entre pós-abolição e cidadania em “Teodoro Sampaio e Rui Barbosa no tabuleiro da política: estratégias e alianças de homens de cor (1880-1919)”. Colocando o foco na experiência escrava da família de Teodoro Sampaio, a autora demonstra as conexões, aproximações e distanciamentos das trajetórias contemporâneas de dois destacados atores políticos baianos atuantes no final do Império e no início da República. Oferece ao leitor, desse modo, um olhar inovador sobre o contexto de atuação política de negros e brancos nas décadas que se seguiram à Abolição.
Dois outros artigos retomam o debate historiográfico sobre continuidades e rupturas entre a experiência escrava e o movimento operário. André Cicalo, em “Campos do pós-abolição: identidades laborais e experiência ‘negra’ entre os trabalhadores do café no Rio de Janeiro (1931-1964)” revisita o tema no setor portuário carioca, trazendo uma contribuição inovadora no que diz respeito ao estudo da racialização da estrutura ocupacional no cais. O tema da racialização reaparece em “As heranças do Rosário: associativismo operário e o silêncio da identidade étnico-racial no pós-abolição, Laguna (SC)”, de Thiago Juliano Sayão, que analisa o ocultamento da raça ou cor na Sociedade Recreativa União Operária (1903), fundada por afrodescendentes vinculados à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos na cidade de Laguna, em Santa Catarina.
A perspectiva comparativa entre as experiências das duas maiores nações que passaram pelo processo emancipacionista no século XIX está presente em dois trabalhos do nosso dossiê: “Os perigos dos Negros Brancos: cultura mulata, classe e beleza eugênica no pós-emancipação (EUA, 1900-1920)”, de Giovana Xavier da Conceição Nascimento, e “O legado das canções escravas nos Estados Unidos e no Brasil: diálogos musicais no pós-abolição”, de Martha Abreu. Nascimento analisa, por meio de textos e imagens publicados em revistas norte-americanas, a emergência, nas primeiras décadas do século XX, de uma “pigmentocracia” decorrente do sistema de segregação intrarracial com base na tonalidade da pele. Já Abreu parte dos trabalhos de Du Bois e Coelho Netto para refletir sobre as similaridades dos legados da canção escrava – ou “som do cativeiro” – nos Estados Unidos e no Brasil.
Uma entrevista inédita realizada por Hebe Mattos e Martha Abreu com Eric Foner, historiador pioneiro no estudo do pós-emancipação nos Estados Unidos complementa o dossiê temático desta edição.
O presente volume traz seis trabalhos avulsos. Dois deles apresentam resultados inéditos de pesquisas sobre o movimento operário brasileiro entre as décadas de 1960 e 1980: “Relações Igreja-Estado em uma cidade operária durante a ditadura militar”, de Alejandra Luisa Magalhães Estevez, e “Uma greve que pôs em risco a Segurança Nacional: o caso do açúcar e a luta dos trabalhadores por melhores condições de vida”, de Felipe Augusto dos Santos Ribeiro. A atuação social e política de intelectuais, religiosos e organizações católicas constitui o campo temático comum de “Os ativos intelectuais católicos no Brasil dos anos 1930”, de Helena Isabel Mueller, e “A Revista A Ordem e o ‘flagelo comunista’: na fronteira entre as esferas política, intelectual e religiosa”, de Marco Antônio Machado Lima Pereira. Em “‘Vivemos identificados com a civilização, dentro da civilização’: autoimagens urbanas nos sertões da Bahia”, Valter Gomes Santos de Oliveira analisa textos memorialísticos, matérias jornalísticas e fotografias produzidos pela pequena intelectualidade sertaneja na Bahia do início do século XX. Já Vitor Marcos Gregório, em “A emancipação negociada: os debates sobre a criação da província do Paraná e o sistema representativo imperial, 1843”, analisa a relação entre a criação de novas unidades administrativas e as alterações no funcionamento do sistema político do país.
O volume se conclui com três resenhas. Em “Trabalho, história ambiental e cana-de-açúcar em Cuba e no Brasil”, originalmente publicada em inglês na revista Social History, a professora Aviva Chomsky analisa quatro livros recentes sobre temáticas similares, dois deles tratando do Brasil (The Deepest Wounds: A Labor and Environmental History of Sugar in Northeast Brazil, de Thomas Rogers, e This Land Is Ours: Social Mobilization and the Meanings of Land in Brazil, de Wendy Wolford), os outros dois sobre Cuba (Blazing Cane: Sugar Communities, Class, and State Formation in Cuba, 1868-1959, de Gillian McGillivray, e From Rainforest to Cane Field in Cuba: An Environmental History since 1492, de Reinaldo Funes Monzote). Por fim, Walkiria Oliveira Silva apresenta ao leitor What is History for? Johann Gustav Droysen and the functions of historiography, de Arthur Alfaix Assis, e Jean Rodrigues Sales comenta a muito aguardada biografia Luís Carlos Prestes: um revolucionário entre dois mundos, de Daniel Aarão Reis Filho.
Alexandre Fortes – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Instituto Multidisciplinar. Nova Iguaçu, RJ, Brasil. E-mail: alexfortes@globo.com
Hebe Mattos – Universidade Federal Fluminense (UFF), Centro de Estudos Gerais, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia. Niterói, RJ, Brasil. E-mail: hebe.mattos@gmail.com
FORTES, Alexandre; MATTOS, Hebe. Apresentação. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.35, n.69, jan. / jun., 2015. Acessar publicação original [DR]