Os Druidas. Os Deuses Celtas com Formas de Animais | D’arbois de Jubainville
Escritos entre os anos de 1904 e 1905 quando uma doença prendia-o ao leito e mais tarde se constituiu do material por ele usado em suas aulas, Jubainville oferece ao leitor/estudioso brasileiro uma rica fonte de estudos acerca da religião celta.
Jubainville com um texto simples e preciso faz um percurso histórico acerca da classe sacerdotal dos Druidas, apontando a suas funções dentro da sociedade celta, sua importância para o aprendizado tanto da alta magia como também da arte da composição e da narrativa e da história do povo celta e o próprio aprendizado druídico. Esse conhecimento era transmitido oralmente o que obrigava tantos os “alunos” como os “professores” a exercitarem constantemente sua memória. Ao descrever o ensinamento tanto dos druidas como dos bardos, que freqüentavam por mais de vinte anos as escolas mantidas pelos Druidas, Jubainville nos mostra como estas funcionavam e a importância da manutenção da oralidade:
Os Judeus e os Cristãos têm um livro, a Bíblia; os Maometanos têm um livro, o Alcorão; os Druidas também tinham um livro, mas ele não estava escrito. Era uma compilação de versos e essa compilação era tão desenvolvida que, para conseguir sabe-la bem, ou mesmo para compreende-la mais ou menos, foram necessários vinte anos de estudos a um certo número de alunos. (JUBAINVILLE, 2003: 57).
Mas, infelizmente toda essa “estrutura” das “colégios” mantidos pelos druidas e todo o conhecimento oriundo da oralidade com a conquista romana foi quase que totalmente extinto. Alguns pequenos focos de resistência foram mantidos e poucos druidas tanto na Gália como nas Ilhas Britânicas mantiveram seus alunos e desta forma, conseguiram preservar um pouco do seu conhecimento e história mantidos pela oralidade.
As conquistas romanas empreendidas nas povoações celtas da Gália e das Ilhas Britanicas não foram capazes de destruir completamente todo o poder que dos druidas. Durante a romanização dos celtas os druidas perderam muito de seus alunos que, por imposição, recebiam uma educação romana, aprendendo o latim e os costumes do conquistador, numa tentativa desses de exercer maior influência sobre os conquistados mas, havia aqueles que se recusaram a isso e deixavam seus filhos sob a guarda dos antigos sábios:
A grande epopéia que conta a criação das vacas de Cooley mostra-nos o Druida Cathu rodeado de alunos aos quais dá suas lições. Na redação mais antiga, os alunos são em número de cem. O escriba cristão ao qual devemos esse texto teve trabalho para constatar esse número: são, escreveu, “cem estouvados que estudam perto de Cathu a ciência druídica” (JUBAINVILLE, 2003: 80-81).
Todos os registros que sobreviveram – e os utilizados por Jubainville – são relatos dos conquistadores entre eles, De Bello Gallico, escrito por Julio César e Anais, de Tácito. Essas fontes apresentam uma visão do conquistador já impingindo certos juízos de valores às práticas sociais do povo conquistado. Jubainville, ao utilizar as fontes romanas para as suas pesquisas vai nos apresentando outros aspectos da sociedade celta que ficaram encobertos sob o véu da conquista.
A segunda parte do livro traz um estudo sobre os deuses celtas e as suas formas de animais. Analisando o mais famoso épico irlandês A razia das vacas de Cooley (Tain Bô Cualngé) e o percurso do herói Cûchulainn a serviço da rainha Medb, o autor vai nos apresentando o panteão celta e as formas de animais que os deuses tomavam fosse para proteger e guiar o herói ou para punir alguém que infringia alguma lei ou tabu.
A deusa da guerra Morrigan aparece para Cûchulainn em vários momentos da narrativa para provocá-lo. Ela aparece ora, como uma loba cinzenta, ora como uma vaca branca de orelhas vermelhas ou um corvo. Este último é o arauto das batalhas mais sangrentas e da morte. Analisando as formas de animais assumidas pelos deuses Jubainville nos mostra as metamorfoses sofridas pelos deuses para poderem exercer seu poder e, medirem forças com os mortais que, como Cûchulainn, ao longo da epopéia assemelha-se aos deuses. Ao analisar as formas de animais o autor mostra a profunda ligação dos celtas com a natureza e a sua obediência aos ciclos sazonais aos quais estava ligada a sua sobrevivência:
“Os pagãos, a princípio, adoraram a natureza tal qual ela se apresentava a eles: em primeiro lugar, o céu de onde vêm o dia, o calor e a tempestade; em segundo lugar, O mar, tão propício e freqüentemente tão perigoso para os navegantes; e em terceiro lugar a terra que habitamos”. (JUBAINVIILE, 2003: 107).
Esta análise realizada por Jubainvelle dos druidas e das formas animais dos deuses oriundas do seu material didático foi e ainda é de grande importância para o entendimento do funcionamento da sociedade celta e da sua religião. Esta obra vem preencher uma lacuna nas traduções dos estudos acadêmicos a respeito dos celtas no Brasil. Uma pesquisa de grande importância juntamente com as suas outras obras que, ainda carecem de tradução e, apesar de já contarem com mais de um século de existência ainda são fundamentais.
Luciana de Campos – Doutoranda em Letras/Unesp Docente da FAFI-UV. E-mail: fadacelta@yahoo.com.br
JUBAINVILLE, H. D’arbois de. Os Druidas. Os Deuses Celtas com Formas de Animais. São Paulo: Madras, 2003. Resenha de: CAMPOS, Luciana de. Sacerdotes e divindades Celtas. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.4, n.1, p. 96-97, 2004. Acessar publicação original [DR]