François Duprat, l’homme qui inventa le Front National | Nicolas Lebourg e Joseph Beauregard

O livro François Duprat, L’homme qui inventa le Front National [2] é parte de um ambicioso projeto desenvolvido por dois autores franceses, o historiador Nicolas Lebourg e o cinegrafista e documentarista Joseph Beauregard. Essa parceria teve como objetivo reconstruir os passos e a história do político francês François Duprat. Em abril de 2011, os autores realizaram, em parceria com o jornal Le Monde, o Institut National de l’audiovisuel (INA) e a 1+1 Production, a produção de um documentário que tentou explicar a trajetória política de Duprat e o papel essencial que ele desempenhou nos grupos de extrema direita. Após a realização do documentário, foi concretizada a elaboração deste livro, escrito apenas por Nicolas Lebourg, que, porém, deu créditos a Beauregard também. A obra foi lançada pela editora francesa Denoel em 2012.

Nicolas Lebourg é um historiador da Universidade de Perpignan, na França. Um dos seus principais campos de pesquisa é sobre a extrema direita europeia, principalmente o partido francês Frente Nacional. Conhecido e estimado pela qualidade do seu trabalho e por outros pesquisadores na História de facções políticas. Lebourg também é conhecido por seu blog Fragments sur les Temps Présents [3] (Fragmentos do Tempo Presente) e por seus artigos em revistas e periódicos especializados. Ele também é autor do livro Le monde vu de la plus extrême droite: Du fascisme au nationalisme-révolutionnaire [4] (O mundo visto da mais extrema direita: Do fascismo ao nacionalismo revolucionário).

No início do livro, a fim de legitimar a importância da pesquisa, os autores fazem uma ressalva demonstrando o porquê de se estudar à “Nova Direita’ e a influência e o papel primordial de Duprat nos movimentos, ressaltando a importância da obra. Personagem misterioso e fundamental da extrema direita francesa, ele atravessou um quarto de século da política francesa e internacional. Sua morte misteriosa antes do primeiro turno das eleições legislativas em 1978, deixou uma imagem de mártir da “causa nacional” nos grupos de extrema direita. Ele foi assassinado aos trinta e oito anos de idade, em um atentado a bomba, que explodiu seu carro em uma pequena estrada na Normandia em março de 1978. Este obscuro militante da extrema direita francesa, segundo os autores, aparece hoje esquecido pela Frente Nacional e por outros grupos radicais que ele ajudou a fundar.

A obra é importante nesse aspecto: Lebourg e Beauregard o tiram do esquecimento e do ostracismo, pois estudar o Nacionalismo Revolucionário desenvolvido por Duprat, pode nos auxiliar a compreender a formação ideológica dos partidos de extrema direita em ascensão hoje na Europa, pois além dele ter sido fundamental no desenvolvimento dessas organizações, os grupos utilizam conceitos desenvolvidos por ele. O livro, que à primeira vista parece, em seu formato, uma biografia do político, elimina essa dúvida em suas primeiras páginas, pois ultrapassa esse conceito, fazendo um importante balanço historiográfico da extrema direita na França, durante a V República (1955 – ).

François Duprat provinha de uma família de classe média do interior. Sua família tradicionalmente possuía vínculo com partidos de esquerda. Em sua adolescência ele se considerava trotskista, porém logo romperia com a esquerda e passaria a militar nos grupos conservadores. Em 1958 Duprat se filiou a um grupo nacionalista, a Jeune Nation (Jovem Nação), e posteriormente sua participação seria crucial na fundação do partido Frente Nacional. Os autores apresentam, como tese central do livro, a ideia de que François Duprat correspondeu ao principal ideólogo da FN, a partir de uma rigorosa pesquisa, baseada em centenas de entrevistas e também de numerosos cruzamentos de fontes e documentos de arquivos públicos e privados. Os autores tiveram uma árdua tarefa de reconstruir o itinerário político e pessoal de Duprat, que contém muitos detalhes e análises políticas. Encontraram todas as testemunhas chaves, como a família de Duprat, seus companheiros, seus adversários, seus inimigos. Toda a informação é verificada, cruzada. Uma obra de investigação que credita o importante papel de François Duprat. Mesmo esquecido pelos companheiros de partido, o livro demonstra como ele teve um papel fundamental no nascimento e na ascensão da Frente Nacional. A obra apresenta detalhadamente todo o contexto do surgimento da FN, a maioria dos fatos são investigados.

Entre os anos de 1958 e1978, Duprat aderiu e militou ativamente em todos os movimentos de extrema direita que se formaram durante a V República, inclusive os de ideologias neonazistas. O primeiro em que ele se alistou foi o já mencionado Jeune Nation, um grupo de extrema direita, conhecido por sua violência, fundado por Pierre Sidos, durante a guerra da Argélia. Por causa do seu enorme interesse e militância, Duprat se envolveu em diversas organizações; Europa Jovem (Jeune Europe), A Organização Luta do Povo (L’Organisation lutte du peuple), Os Grupos Nacionalistas Revolucionários de Base (Les Groupes nationalistes-révolutionnaires de base), o Movimento Nacionalista Revolucionário (Le Mouvement Nationaliste Révolutionnaire), Terceira Via (Troisième Voie), Nova Resistência e Unidade Radical (Nouvelle Résistance et Unité Radicale) e o grupo de ação politica internacional denominado de A Frente Europeia de Libertação (Le Front Européen de Libération).Em cada organização ele procurou imprimir a sua influência teórica, para se tornar o principal intelectual da extrema direita.

Além do extenso conhecimento acerca dos movimentos de extrema direita das décadas de 60 e 70, a obra não se limita a apenas esclarecer a participação de Duprat nesses movimentos. Os autores investigam detalhes sobre a vida privada do personagem, sua dedicação com a militância política, suas relações familiares e as suas amizades com políticos de outros partidos, ainda que tais pontos não constituam o enfoque principal do livro.

François Duprat foi professor de História no Ensino Médio e também aparecia como um intelectual da extrema direita, colaborando com várias revistas e cadernos políticos. Ele foi o primeiro a publicar livros negacionistas na França e a revitalizar o antissemitismo e a negação do Holocausto, combinando negacionismo e antissionismo. Entre suas obras podemos citar: “A História da SS na França”, “História dos fascismos”, “Os fascismos do mundo”, “Manifesto nacionalista revolucionário”, “A Ascensão do MSI (Movimento Socialista italiano)”, “A cruzada Antibolchevique: A Defesa do Ocidente” e entre outros. Foi ele quem conceituou a noção de “nacionalismo revolucionário”, como uma atualização do “movimento fascista”.

Intelectual e militante, Duprat era conhecido por gostar de participar de manifestações violentas; mesmo sua deficiência visual, pois possuía uma forte miopia, não o desencorajavam a fugir de conflitos com a polícia ou partidos de esquerda. Como pesquisador do nacionalismo europeu, ele viajou pelo continente para conhecer outros organismos de extrema direita e criar alianças, devido a esse interesse por grupos nacionalistas. Fascinado pelos serviços de inteligência, foi pessoalmente encarregado pela Central de Inteligência da França, onde informou seu agente sobre as vicissitudes da extrema direita. Foi também para a Nigéria e Congo, em plena descolonização, para ajudar o campo anticomunista.

No decorrer das páginas, se descobre um ecletismo ideológico da extrema direita francesa. Ambos os autores deixam nas entrelinhas a perspectiva de que Duprat evoca um personagem que fascina as pessoas, em um meio político pouco intelectualizado e organizado. Além de detalhar a mentalidade singular do personagem, os autores procuram descrever e desmistificar rumores que rondam sua história de vida, tais como as possíveis relações de Duprat com a espionagem e serviços secretos, com a imprensa, com órgãos do Estado e as fontes de financiamento das suas unidades radicais. Existiam mitos de ele ser policial infiltrado dentro dos grupos da extrema direita. De participar das agências de inteligência da KGB, da CIA e da Mossad.

No início da FN, os grupos de Duprat representavam a ala mais radical do partido. Suas células nacionalistas revolucionários influenciaram fortemente a linha de discurso do partido. O legado de Duprat para a FN compreenderia o antiamericanismo, o antissemitismo, o anticomunismo, o combate à imigração, o discurso contra o multiculturalismo e a globalização. Podemos perceber grande influência da ideologia nacionalista revolucionária no novo discurso da Frente Nacional, hoje presidida por Marine Le Pen. Podemos dizer que o bordão criado por Duprat na década de 70 caberia perfeitamente nos discursos da extrema direita hoje: “um milhão de desempregados, é um milhão de imigrantes também”.

No fim do livro, o assassinato de Duprat é metodicamente estudado, como poderíamos esperar. Um pouco como uma investigação policial, os autores descrevem com força de detalhes as circunstâncias da morte de Duprat. Eles analisam todas as hipóteses sobre seu assassinato, dando a entender, que ela pode estar relacionada a uma disputa interna da extrema direita francesa. Como até hoje não foram encontrados os responsáveis pela sua morte, o livro deixa em aberto a possibilidade de uma nova investigação, de um futuro livro. Considerado como uma personalidade explosiva, os autores fecham o livro dizendo que sua morte reflete sua vida.

Notas

2. “François Duprat o Homem que inventa a Frente Nacional”.

3. http://tempspresents.wordpress.com

Referências

LEBOURG, N. Le monde vu de la plus extrême droite: Du fascisme au nationalisme-révolutionnaire. PU PERPIGNAN edition, France, 2010. Resenha de: FRANCO DE ANDRADE, G. O Mundo visto da mais extrema-direita, do fascismo ao nacionalismo revolucionário. Cadernos do Tempo Presente, v.12, n.1, p.1-3, 2013.

LEBOURG, N. Le monde vu de la plus extrême droite: Du fascisme au nationalisme-révolutionnaire. PU PERPIGNAN edition, France, 2010.

LEBOURG, N; BEAUREGARD, J. François Duprat, l’homme qui inventa le Front National. DENOEL edition, France. 2012.

Guilherme Ignácio Franco de Andrade1 – Mestrando no Programa de Pós-Graduação em História, Poder e Práticas Sociais da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste. Sob orientação do Prof. Dr. Gilberto Grassi Calil.


LEBOURG, N; BEAUREGARD, J. François Duprat, l’homme qui inventa le Front National. France: Denoel edition, 2012. ANDRADE, Guilherme Ignácio Franco de. Aedos. Porto Alegre, v.5, n.13, p.290-293, ago./dez., 2013. Acessar publicação original [DR]

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