Acervos digitais e preservação da memória / Revista do Arquivo Público Mineiro / 2010

Os desafios da revolução digital

O presente Dossiê é o resultado das reflexões de historiadores e arquivistas elaboradas a partir de suas experiências de pesquisa e / ou do trato com técnicas, procedimentos e planejamento que envolvem a concepção e execução de projetos e programas de digitalização de acervos arquivísticos. Estão aqui reunidos textos de seis autores que ilustram, com seus trabalhos, o “novo mundo” de acesso à informação, sem fronteiras, criado pela revolução provocada pela informática e seus contínuos avanços tecnológicos. Esses trabalhos são orientados pela ótica de seus impactos na pesquisa histórica e na revisão dos conceitos aplicados à documentação prevalecentes no campo da arquivologia.

Hoje, a disponibilização de acervos documentais de arquivos permanentes em meio digital já se tornou uma exigência para as instituições arquivísticas, sejam elas públicas ou privadas. Isso se constata tanto pelo impacto do acesso irrestrito a um número imenso de fundos patrimoniais – processo que se desdobra em plano mundial – quanto pelo que representa para a segurança e preservação dos documentos originais, em seus diversos suportes. Esse fato, porém, não significa que as preocupações e os debates em torno da preservação de acervos documentais e sua disponibilização on-line estejam razoavelmente equacionados. Pelo contrário, à luz das experiências, são múltiplos os problemas a serem enfrentados. No Dossiê que ora se apresenta, Ivan de Andrade Vellasco, da Universidade Federal de São João del-Rei, com sua experiência na execução do Projeto Fórum Documenta – acervo judicial entregue pelo fórum da Comarca de São João del-Rei ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) –, discute a importância de se criar uma rede de compartilhamento de informações, visando alcançar um nível razoável de padronização operacional, e aborda a complexa relação com os especialistas em informática em torno das dificuldades de se encontrarem soluções computacionais adequadas para os objetivos pretendidos.

André Figueiredo Rodrigues, com seu estudo sobre As múltiplas faces da Devassa, nos apresenta, por meio dos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira (ADIM), publicado na Plataforma Hélio Gravatá do SIA-APM, uma análise minuciosa da situação das fontes da Inconfidência dispersas entre o Arquivo Nacional, a Biblioteca Nacional, o Museu da Inconfidência e o Arquivo Público Mineiro. Situação que levou – afirma Figueiredo – Lúcio José dos Santos a proclamar que “os documentos da Inconfidência, como o cadáver do herói a que se referem, foram esquartejados”.

Maria Marta Araújo examina a coleção do jornal O Universal, periódico mineiro do século XIX, a partir da reformulação conceitual da história política, nas suas vertentes francesa e inglesa, que dão particular atenção às formulações vulgares dos temas políticos – o pensamento automático dos órgãos de opinião, a circulação dos mitos e dos estereótipos –, considerando o impacto revolucionário gerado pelo surgimento da imprensa periódica.

Disseminação da cultura em meio digital, texto de Paulo Miguel Moreira da Fonseca e Vinícius Pontes Martins, tem como proposta descrever a experiência de trabalho que a Fundação Biblioteca Nacional desenvolve na área de digitalização e acesso de documentos. Trata-se de um estudo que nos propicia conhecer normas do processo de digitalização que a experiência dita como necessárias para a garantia da preservação de acervo, bem como das estratégias de aparelhamento para implementar uma política sistemática de digitalização de acervos. Na riqueza de dados com que nos descrevem a grande cadeia de etapas do processo de digitalização de documentos na Biblioteca Nacional, os autores destacam as soluções encontradas para unir a base de dados aos quadros temáticos e aos textos introdutórios, possibilitando uma nova forma de aproximação com o leitor.

Anabela Borges Teles Ribeiro, chefe de divisão da Direcção Geral de Arquivos (DGARQ), serviço central da administração direta do Estado lusitano, integrado ao Ministério da Cultura de Portugal, traça um histórico do processo de digitalização sistemática levado a efeito pelo órgão e aborda, de forma específica, sua experiência na execução do Projeto Inquisição de Lisboa, acervo pertencente ao Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Começando pelos processos de conservação utilizados para possibilitar o processo de captura das imagens com qualidade de arquivo, a autora destaca a necessidade de análise e caracterização da documentação, pois da sua natureza e da própria condição do sistema dependem as especificações técnicas recomendadas e o produto final pretendido. Inserida em um sistema de troca de informações em redes de conhecimento sem fronteira, num documento pautado pelas medidas da Agenda Europeia para a Cultura, é ainda da mesma autora a observação de que a limitação para soluções de preservação digital em longo prazo é simplesmente de natureza orçamentária, e não por falta de tecnologia.

Para finalizar, por sua relação direta com este Dossiê, chamo a atenção para os textos da sessão Arquivística, toda ela dedicada aos trabalhos desenvolvidos no Arquivo Público Mineiro para construção do Sistema Integrado de Acesso (SIA-APM). São eles o texto Acesso livre à informação pública, de autoria de Emerson Nogueira Santana, e Uma plataforma de pesquisa amplamente disponível, de Flávio Augusto Rocha Bertholdo.

Maria Efigênia Lage de Resende


RESENDE, Maria Efigênia Lage de. Apresentação. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, v.46, n.1, jan. / jun.,2010. Acessar publicação original [DR]

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