Urbana. Campinas, v.11 n. 3, 2019.

set./dez. [23] – Dossiê: ArteCidade

Nesta edição, convidamos o artista gráfico João Costa para criar uma fanzine utilizando-se de recortes de textos e imagens dos próprios artigos que compõem o dossiê ArteCidade. A fanzine pode ser acessada através da página do CIEC [www.ifch.unicamp.br/ciec/].

EDITORIAL

DOSSIÊ

PUBLICADO: 2020-05-08

Fronteiras – Revista de História. Durados, v.22, n.39, 2020.

DOSSIÊ 17: GÊNERO, INTERSECCIONALIDADES E ENSINO DE HISTÓRIA

EXPEDIENTE

  • ·                 Expediente
  • Leandro Baller, Fabiano Coelho
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  • APRESENTAÇÃO
  • ·                 Apresentação
  • Cláudia Regina Nichnig, Dulceli de Lourdes Tonet Estacheski, Cristina Scheibe Wolff
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DOSSIÊ 17: GÊNERO, INTERSECCIONALIDADES E ENSINO DE HISTÓRIA

ARTIGOS LIVRES

RESENHAS

ENTREVISTA

PUBLICADO: 06/04/2020

Modos. Campinas, v.4, n.2, 2020.

EDITORIAL

ARTIGOS – COLABORAÇÕES

DOSSIÊ – A ARTE ANTIGA NO TEMPO PRESENTE

EX-POSIÇÕES / RESENHAS

PUBLICADO: 2020-05-04

Anos 90. Porto Alegre, v. 27, 2020.

Editorial | Alessander Mario Kerber |

Artigos

Apresentação

Dossiê: A Organização Internacional do Trabalho e as Américas: conexões e influências 

Dossiê: A historiografia sobre as Missões Jesuíticas: a escrita e o tempo 

Dossiê: (IN) Justiças no Mundo do Trabalho: Questões Emergentes e Desafios Permanentes

Resenhas

Publicado em 02 abr. 2020

(IN) Justiças no Mundo do Trabalho: Questões Emergentes e Desafios Permanentes | Anos 90 | 2020

No contexto mundial que vivemos de mudanças drásticas em diversas escalas, os conceitos de justiça e injustiça tomam centralidade e tornam-se fundamentais para pensar uma sociedade democrática e comprometida com os direitos humanos e a dignidade humana. No campo dos conflitos trabalhistas, envolvendo assalariados urbanos e rurais, o próprio reconhecimento do Estado desta condição (direitos) tardou e demora ainda para os trabalhadores e trabalhadoras do campo, mais do que em relação aos seus colegas urbanos e industriais. No Brasil, este atraso foi de exatos vinte anos, entre a promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho, em maio de 1943, e aquela do Estatuto do Trabalhador Rural, finalmente aprovado em março de 1963, entrando em vigor meses depois.

A tradição do desprezo pelo rural, no mundo ocidental, é histórica na cultura dominante. Portanto, não é surpreendente constatar tamanha diferença de tratamento por parte de autoridades que definiam também o salário mínimo rural (e portanto a aposentadoria) como a metade daquele regional reconhecido para os empregados urbanos e industriais. A conquista de direitos inéditos pelos trabalhadores rurais – a simples medição do esforço consentido pelo canavieiro, por exemplo, com a Tabela de Tarefas (BARROS, 2014), o repouso remunerado, o décimo terceiro salário etc. – foi acompanhada da instalação de tribunais especializados que supostamente visavam a mediar e resolver os conflitos. Por isso, a denominação de Juntas de Conciliação e Julgamento, o Estado atuando na tradição Varguista como pacificador dos conflitos. Leia Mais

Der Begriff des Politischen. Synoptische Darstellung der Texte | Carl Schmitt

Autor e livro dispensam apresentações. O impacto suscitado por esse ensaio de 1927 pode ser medido por uma pequena lista dos seus resenhistas de primeira hora, que inclui nomes como Delio Cantimori, Karl Löwith, Eugenio Imaz, Herbert Marcuse, Sérgio Buarque de Holanda e Leo Strauss. A história de sua recepção é fascinante. Um mestre da suspeita como Habermas (2007, p. 80) advertiu que seria um grave erro tentar suprimir as notórias deficiências da teoria política marxista recorrendo à “crítica fascista de Carl Schmitt à democracia”. O tabu habermasiano jamais entusiasmou muita gente, pela simples razão de que Schmitt é um daqueles poucos autores a quem podemos chamar de “bons para pensar”. A esse respeito, uma pequena anedota: Jacob Taubes conta que, quando foi fellow na Universidade de Jerusalém, apenas quatro anos após o fim da Segunda Guerra, teve grande dificuldade para acessar a Teoria da constituição de Schmitt porque o exemplar da biblioteca fora requisitado pelo ministro da justiça, então ocupado com a formulação de um esboço da Constituição para o Estado de Israel (TAUBES, 1987, p. 19). Nos últimos anos, Chantal Mouffe tem apostado suas fichas num híbrido gramsciano-schmittiano que, acredita ela, seria capaz de recarregar as baterias da esquerda num mundo “pós-político”. Tal como o Koselleck de Crítica e crise, que via na moralização uma deturpação do político – uma conhecida tese schmittiana –, Mouffe reclama a mesma neutralização ética do político, além do abandono do racionalismo liberal que permita “[…] mobilizar as paixões para fins democráticos” (MOUFFE, 2007, p. 13-14). Para quem já teve oportunidade de ler Francisco Campos, o déjà vu é inevitável.

O festival de sinais trocados não é menor no campo liberal. Enquanto Johan Huizinga viu nas teses de Schmitt um inequívoco sintoma da “enfermidade espiritual” da Europa do Entreguerras, um influente historiador e teórico do direito como Ernst-Wolfgang Böckenförde assumiu publicamente sua dívida intelectual para com Schmitt e uma inabalada admiração por O conceito do político. E se Mark Lilla rejeita explicitamente toda “política do desespero teológico”, ele é honesto o bastante para admitir, não sem ironia, que o teorema amigo/inimigo, o antiliberalismo e o decisionismo schmittianos são uma espécie de ponto de fuga intelectual em que buscam refúgio e justificação muitos dos que se colocam nos extremos do espectro político. “Não surpreende, assim, que jovens revolucionários que um dia haviam cortado cana em Cuba tomassem o trem para Plettenberg, compartilhando as cabines com seus adversários conservadores” (LILLA, 2017, p. 63). Reinhart Koselleck, Giorgio Agamben e Sérgio Buarque são apenas três entre os muitos que, de fato ou imaginariamente, compraram seus bilhetes para o lugarejo onde se refugiara “o apocalíptico da contrarrevolução” (a expressão é de Taubes). Leia Mais

Vilanova Artigas. Casas paulistas 1967-1981 | Marcio Cotrim

Quanto faças, supremamente faze.
Mais vale, se a memoria é quanto temos,
Lembrar muito que pouco,
E se o muito no pouco te é possível,
Mais ampla liberdade de lembrança
Te tornará teu dono
Fernando Pessoa, Odes de Ricardo Reis (1)

Existe um difundido gênero da história da arquitetura moderna cuja obsessão fundamental consiste em esforçar-se em descobrir as dívidas, as filiações, as heranças, enfim, tudo o quanto há na obra de seus protagonistas daqueles que viveram antes. Quem participa dele se pergunta quanto há de classicismo em Le Corbusier ou Mies, quanto de neoclassicismo nas arquiteturas modernas latino-americanas, quanto de Gunnar Asplund em Alvar Aalto, quanto de Louis Sullivan em Frank Lloyd Wright, quanto de Wright no primeiro Vilanova Artigas, quanto de Le Corbusier no segundo, e assim sucessivamente. Geralmente, essa estratégia não decepciona seus autores: permite ancorar personagens e objetos em uma história de aparência sólida, satisfazendo estes historiadores, que desfrutam felizes do resultado. Nessa maneira de fazer história, mais próxima da comprovação superficial do que da verdadeira genealogia e recordação respeitosa, os personagens não parecem ser arremessados, como o Angelus Novus de Walter Benjamin, em direção a um futuro incerto, voltando seus olhares para a catástrofe da qual fogem, mas nos são apresentados como lentos caminhantes, incapazes de perder de vista esse passado. Tal modo implacável de ver o que alguma vez foi novo ou inovador como projeção de alguma epopeia pretérita nos furta a outra importante metade, a que nos permite perguntarmos quanto ha via de porvir nessas propostas que a alguns incomodava e a outros preenchia de vertiginoso prazer. Leia Mais

A modernidade na arquitetura hospitalar | Ana M. G. albano Amora e Renato Gama-Rosa Costa

A modernidade na arquitetura hospitalar, livro organizado por Ana M.G. Albano Amora e Renato Gama-Rosa Costa, oferece ao leitor uma introdução consistente à história da arquitetura dos equipamentos de saúde, permitindo entender suas transformações junto com as da medicina.

Dois momentos se destacam. O primeiro quando foi aplicada a tipologia de pavilhões horizontais afastados entre si e distantes das cidades para atender a estratégia médica de isolamento dos doentes. Com o surgimento de novos medicamentos foi possível a inserção dos hospitais em áreas urbanizadas. A arquitetura desenvolveu novos parâmetros de projeto, já alinhados aos princípios das vanguardas modernas. Assim, o segundo momento foi quando surgiram as construções verticalizadas para melhor localização, o controle dos fluxos para evitar contaminação, os novos dispositivos de conforto ambiental para controle do calor e renovação do ar, os ambientes adequados aos equipamentos e psicologicamente acolhedores aos pacientes. Os hospitais modernos tornaram-se exemplares do papel do arquiteto como coordenador de diferentes disciplinas do conhecimento, conforme destacado por Amora ao citar Rino Levi em seu capítulo. Leia Mais

Ganhadores: a greve negra de 1857 na Bahia | João José Reis

Vinte e seis anos depois da publicação de um artigo no dossiê na Revista USP intitulado “A greve negra de 1857 na Bahia”, o historiador baiano João José Reis lançou resultados mais amplos desta ambiciosa pesquisa em “Ganhadores”, livro de subtítulo homônimo ao texto do dossiê. No próprio artigo da década de 1990 foi pontuado que aquele era só parte de “um estudo mais amplo” (REIS, 1993, p.8) que ele estava realizando. Portanto, o livro é o produto deste esforço quase trintenário do historiador, que revela o aprimoramento da análise das fontes ao longo deste intervalo, além do enriquecimento da perspectiva acerca do seu objeto, seja pelas outras contribuições historiográficas que acompanharam o processo desta pesquisa até a conclusão da obra, seja pela adição de novas fontes ao trabalho iniciado anteriormente.

O exercício do ganho entre os escravizados e libertos era comum desde o século XVIII e em outras áreas além da Bahia. Ele consistia na prática de venda, por parte do proprietário ou do próprio liberto ou livre, do seu serviço para variadas atividades na cidade, como carregamentos, transportes de palanquins, venda de alimentos, entre outras atividades. Nesta lógica, mesmo o escravizado receberia uma remuneração pela função de ganho desempenhada. João José Reis outras especificidades desta dinâmica laboral fronteiriça entre a escravidão e a liberdade no espaço de Salvador oitocentista, onde há a particularidade dos “cantos de trabalho”. Eles consistiam em agrupamentos de trabalhadores, além de constituir também mais um espaço associativo negro. Inicialmente, se compunham exclusivamente de africanos que se reuniam em locais definidos onde ofereceriam seus serviços. Tal organização seguia critérios de gênero, etnicidade, normas internas e públicas, definidas por posturas. Leia Mais

Kant on the Rationality of Morality – GUYER (M)

GUYER, Paul. Kant on the Rationality of Morality. Cambridge University Press, 2019. 73pp. Resenha de: CARVALHO, Vinicius. Manuscrito, Campinas, v.43 n.2 Apr./June 2020.

In his contribution to the Cambridge Elements: The Philosophy of Immanuel Kant series, Paul Guyer contends that Kant derives the fundamental principle of morality (in this case, the formulas of the categorical imperative) and the object of morality (the highest good) from the application of the most fundamental principles of reason: the principle of noncontradiction, of sufficient reason, and, to a lesser extent, the principle of excluded middle. The fundamental fact that ought not to be denied by any rational agent – on pain of self-contradiction – is that oneself and others have a free will, in other words, that they have the capacity to freely set and pursue their own ends. Guyer argues that Kant grounds his whole moral theory upon this fact, and that the application of the fundamental principles of reason to it gives us the principle and the object of morality. In what follows, I will summarize each of the book’s chapters, discussing some of its claims when I see fit.

In the second chapter – Reasons, Reasoning and Reason as Such, the first chapter being the introduction  Guyer discusses past approaches about the relation between the fundamental principles of morality and reason for Kant. For instance, philosophers such as Christine Korsgaard and Allen Wood emphasize that rational actions are actions based on reasons, and that genuine reasons are universally valid norms, valid for everyone, everywhere. Kant would have gotten the requirement to act on universally valid reasons from the observation that this is what characterizes rational action. Onora O’Neill also emphasizes the same requirement for universalizability, though she supports her reading not by appealing to the notion of a reason in particular, but to the notion of reasoning in general, in her well-known account of Kant’s conception of reason in the Canon of Pure Reason from the first Critique2. In my view, Guyer correctly criticizes an aspect of O’Neill’s reading on this point: it is not the case that we “invent and construct standards for reasoned thinking and acting”3all the way downPace O’Neill, Guyer argues that it is certainly the case that Kant did not believe that the application of the principles of rationality were sufficient to arrive at substantive metaphysical conclusions: this is one of the features of dogmatism he so fiercely denounced. But he certainly regarded some formal principles of reason as “necessary conditions of reasoning because they are the fundamental principles of reason” (p. 9). So, even though Guyer agrees with these interpreters about the importance of the requirement of universality when it comes to morality, his argument will be that this requirement is the result of the application of some even more fundamental principles, beginning with that of noncontradiction.

The third chapter – From Noncontradiction to Universalizability – shows exactly how that is so. First, Guyer shows that Kant followed the philosophical tradition of his time in accepting the principle of noncontradiction as the first principle of reason (and the principle of sufficient reason as the second). Indeed, Kant is quite clear on this matter in his lectures on Logic (especially in the Jäsche Logik) and at some points in the first Critique4. But to which concepts and pairs of judgment need we apply this principle to derive the principle of morality? In the preface to the Groundwork, Kant says that for any moral law, its “ground of obligation” must be sought “a priori simply in concepts of pure reason” (GMS, AA 04: 389), and in the second section of the work he clarifies that this a priori concept is the concept of a rational being (GMS, AA 04: 412). More precisely even, it is the concept of a rational agent, which is a rational being with the capacity to act according to the representation of certain laws, for the sake of certain ends (GMS, AA 04: 426-7). According to Guyer:

Kant’s argument will then be that the fundamental principle of morality can be derived from the application of the principle of noncontradiction to the concept of a rational agent as one capable of setting its own ends. This capacity must be affirmed of any rational agent and cannot be denied without contradiction. (p. 17)

Guyer’s point is that a maxim is immoral whenever its proposed action entails some belief that contradicts the fact that agents have free will. Take the lying promise situation – in which an agent makes a promise with no intention of keeping it – as an example. Kant says that in such a world, in which everyone makes lying promises whenever it suits their interests, no one would accept promises at all. The practice of making promises in general would cease to exist because one of its necessary conditions (i.e., that the promisee trusts the promisor) is gone. Thus, in making a false promise an agent virtually robs the possibility of everyone else making any promises. It undermines their freedom by making it impossible for them to take part in a social practice in which they have chosen to participate5. It treats other people as if they were not fully free agents. According to Guyer, this shows that “the necessity of avoiding contradiction between a proposed maxim and its universalization is a consequence of the necessity of avoiding contradicting the nature of rational beings as persons with free will” (p. 24). Although Kant does not explicitly say this in the Groundwork, Guyer takes as textual evidence (a) the fact that Kant says of immoral maxims that when universalized they either contradict themselves, or that they entail practices that are inconsistent with some fundamental characteristic of rational agents (see GMS, AA 04: 423-4), and (b) Kant’s treatment of the duties not to commit suicide, to help others in need, and to develop one’s talents in the Metaphysics of Morals (see MS, AA 06: 451; 453).

Since Kant’s treatment of duties in that latter work relies more heavily on the Formula of Humanity (FH) rather than the Formula of Universal Law (FUL), because the nature of rational agents as free agents (ends-in-themselves) is explicit in the former formula, Guyer says: “Thus Kant’s requirement of universalizability follows from the formula of humanity and is ultimately grounded in the law of noncontradiction because the latter is.” (p. 23). I believe this deserved a bit more clarification by the author, though, for the question “how could the requirement of universalizability expressed by FUL follow from FH if the latter is presented after and as a ‘development’ of the first formula?” comes straight to the reader’s mind. A possible answer would be that the derivation of FUL already relies upon the premise that rational agents are free agents, who express their freedom in their adoption of maxims. The evidence for this is Kant’s distinction, already at the beginning of the derivation, between imperfect and perfect wills (GMS, AA 04: 412). It is precisely because rational agents with imperfect wills are free to adopt whatever maxims they propose to themselves that the principle of morality – to choose only maxims apt for universal legislation – is presented as an imperative. In any case, I believe this point should have been more fully developed by the author. The chapter ends with a brief treatment of Kant’s deduction of the freedom of the will at the third section of the Groundwork, where Kant argues that we cannot but regard ourselves as beings with free will when we apply the distinction (argued for in the first Critique) between world of sense and intellectual world. The fact that we know that we are free agents (from the practical point of view) is what produces a self-contradiction whenever we adopt a maxim that entails some belief or other that is inconsistent with this knowledge.

The fourth chapter – The Principle of Sufficient Reason and the Idea of the Highest Good – shows how Kant got his conception of the highest good through the application of the second fundamental principle of reason, that is, the principle of sufficient reason, according to which there is an adequate explanation for every fact. Guyer first discusses how Kant refuses the traditional use of this principle as it was employed by the rationalists, for the application of this principle is warranted only within the limits of possible experience. But, according to Guyer, he accepted the use of this principle when it came to matters of morality. More precisely, Kant claimed that the application of this principle lets us theorize about the “unconditional”, which, in this case, means that we can apply this principle to think about the complete and systematic consequences of morality. For Kant, this means that we are drawn to the idea of the highest good, a condition in which “universal happiness [is] combined with and in conformity with the purest morality throughout the world.” (TP, AA 08: 279).

Throughout the chapter, Guyer defends his interpretation on how to read Kant’s conception of the highest good and his argument for it. He shows that Kant applies this principle in two ways: first, to show that morality is a condition on the pursuit of happiness. Kant does not ground moral worth in possible or actual good consequences of actions. Some action might bring a great deal of happiness (whatever we understand ‘happiness’ to mean), but its accomplishment is constrained by moral considerations, such as if it respects the nature of those involved as ends-in-themselves. In the second case, happiness is conceived as the complete object of morality: since happiness is the satisfaction of all possible ends (GMS, AA 04: 418; KpV, AA 05: 25) and the nature of rational agents is that they set themselves their ends, then “the moral command to preserve and promote the capacity to set ends is in fact equivalent to a moral command to promote happiness … [happiness is] what morality commands in the first instance, but not, as it turns out, all that it commands” (p. 37). This is why, in Kant’s words, “pure practical reason … seeks the unconditioned totality of the object of pure practical reason, under the name of the highest good” (KpV, AA 05: 108). It is important to keep in mind here that happiness commanded by morality under the concept of the highest good is not happiness simpliciter, that is, the mere satisfaction of contingent ends, but that it is limited by moral considerations. This conception of the highest good as the object of morality also leads Kant to develop what he thinks to be the necessary conditions for the attainment of this object. The three ideas of pure reason that were discussed in the Dialectic of the first Critique now receive the status of postulates of practical reason: the immortality of the soul, freedom of the will and the existence of God are propositions that, for Kant, cannot be theoretically proven, but which we must accept because they are necessary conditions to the realization of morality’s object, the highest good. The end of the chapter is devoted to show how Kant eventually shifted position regarding the role of the postulates, especially in his latter writings from the 1790’s.

In the fifth chapter – Rationality and the System of Duties -, Guyer argues that Kant’s treatment of duties show that he also took the ideal of systematicity to be part of his conception of reason and rationality. That this ideal is essential to Kant’s philosophy is clear from the Appendix to the Transcendental Dialectic (see KrV A 642/B 670), and in his practical philosophy we can see this ideal at work in many occasions. First, there is the requirement that an agent adopts not only one maxim apt for universal legislation, but that all his maxims satisfy this requirement (GMS, AA 04: 432). Second, there is the requirement that all ends of all agents be compatible, as well as that each agent be treated as an end-in-itself, as expressed in the Formula of the Realm of Ends (GMS, AA 04: 433). And third, there is the suggestion that the supreme principle of morality must be able to offer a complete division and characterization of the generally recognized classes of duties6, that is, into (a) perfect and imperfect duties (GMS, AA 04: 423-4), and (b) both duties of virtue (noncoercively enforceable) as well as duties of right (coercively enforceable). Granted, Kant seems to use in general two different principles to derive these duties, focusing on FUL in the Groundwork and on FH in the Metaphysics of Morals. But, as Guyer argues, these principles are supposed to be interchangeable and at least coextensive when it comes to the duties they entail. The most important point of the chapter, however, is the explanation of why we might need a system of duties. Showing that Kant followed in important aspects George F. Meier’s treatment of duties, Guyer argues that the systematic classification of duties, combined with the application of the principles of noncontradiction and excluded middle – the principle that ought implies can as well, but this one is not usually explicitly stated by Kant – are what allows Kant to deny the possibility of conflict of duties, in other words, genuine moral dilemmas. Thus, Guyer says:

Here is where Kant might have brought in the principle of the excluded middle as well as that of noncontradiction: whereas the latter principle tells us that two contrary duties, that is, duties to perform two incompatible acts at the same time, cannot both be duties (on the ground that we cannot have an obligation to perform the impossible), the former would tell us that we have to perform one of these duties. (p. 47)

This chapter ends with a discussion of Kant’s ideal of systematicity both in the theoretical and in the practical uses of reason as presented mainly in the third Critique.

The sixth chapter – Reason as Motivation – explains how, for Kant, pure reason can motivate action. Guyer shows that Kant’s disagreement with Hume about the role of reason in action, though substantial, is not complete. Whereas Hume thought that reason was motivationally inert and could not lead us to action – only sentiments and “passions” could -, Kant thought that pure reason could be practical. Indeed, this is necessary for any action to have moral worth: “What is essential to any moral worth of actions is that the moral law determine the will immediately” (KpV, AA 05: 71). But this does not mean that reason motivates us to action without any feelings being involved, for Kant also says that “every determination of choice proceeds from the representation of a possible action to the deed through the feeling of pleasure and displeasure, taking an interest in the action or its effect” (MS, AA 06: 399). Guyer explains this apparent inconsistency by arguing that we must place Kant’s theory of motivation within his transcendental idealism, specifically the distinction between noumenal and phenomenal selves. The moral law does determine the will immediately because this happens when we choose to adopt the moral law as our “fundamental maxim” (RGV, AA 06: 36) and when we are conscious of it “whenever we draw up maxims of the will for ourselves” (KpV, AA 05: 29). But when it comes to choosing particular maxims, this happens through the intermediation of the feeling of respect, which is a self-wrought feeling, caused by reason, that acts as a counterweight in favor of the moral law against the motivational pull of inclinations (GMS, AA 04: 401). Thus, Guyer says that “reason produces action – this is Kant’s disagreement with Hume – but it does so through the production or modification of feeling – here is Kant’s agreement with Hume” (p. 53). In the rest of the chapter, Guyer discusses Kant’s fuller theory of motivation as presented in the Metaphysics of Morals, which involves the exercise and cultivation of a class of feelings that are sensible to the determination for action through the concept of duty, namely: moral feeling, conscience, love of others or sympathy, and self-respect or self-esteem. Thus, Guyer joins others who have consistently pointed out that any interpretation that represents Kant’s ethics as devoid of any place for feelings and emotions is seriously flawed.

In the seventh chapter – Kantian Constructivism -, Guyer discusses the metaethical implications of his interpretation, especially in the realism versus antirealism debate concerning Kant’s moral theory. Appropriately, the author first makes sure to distinguish semantic realism from ontological realism. This fundamental distinction is unfortunately not always drawn in discussions of Kant’s metaethics, causing many unnecessary disagreements. Guyer claims that Kant is clearly a semantic realist: for him, judgments about right and wrong, good or bad, are not indeterminate in their truth-value, and they can be correctly inferred from previous moral judgments and principles. In other words, there are correct and incorrect answers to moral questions, i.e., questions of permissibility, worthiness, etc. The real hornet’s nest is when it comes to the following problem: in virtue of what are some moral judgments true? Is it due to some metaphysical fact independent of us, or is it the result of the application of some constructive procedure?

The latter position was famously defended by John Rawls, who labeled the method employed in his political philosophy Kantian Constructivism. Defenders of a constructivist reading of Kant’s metaethics claim that he derived the principles of morality from a mere conception of practical reason or reason in general. On the other hand, those who prefer the (ontological) realist view say that what ultimately grounds morality and from which Kant derives its principles is the fact that rational agents are ends in themselves, “or that human freedom is intrinsically valuable” (p. 64). As Guyer points out, and I am in very much agreement with him on this point, the method by which Kant derives particular moral duties constitutes a form of constructivism: we infer particular duties by applying the different formulas of the moral law to our specific circumstances7. Therefore, we can say that Kant is a normative constructivist.8 But it is not so clear whether he is a metaethical constructivist. Some argue that what grounds the moral law is the fact that rational agents are free, which gives them an irreducible value, outside the purview of construction, upon which morality is grounded9. For Guyer, Kant’s position regarding the nature of the fundamental principle of morality should be seen as a realist position: this fundamental principle is ultimately derived from the application of the principle of noncontradiction to the fact that rational agents have free wills, a fact that obtains independently of any procedure of construction. But he claims that this does not fit well with what we contemporarily regard as moral realism, for this fact is not a specific moral one, nor is it Kant’s position that there is something of value in the world independent of evaluative attitudes. About this, Guyer says:

This is a fact, in Kant’s own words a “fact of reason”, but it is not a mysterious moral fact, or a value that somehow exists in the universe independently of our act of valuing it. It is simply a fact that cannot be denied on pain of self-contradiction, since, Kant assumes, in some way we always recognize it even when by our actions we would deny it. Whether Kant succeeded in demonstrating this fact is a question; but there is no question that he regards our possessions of wills as a fact from which moral theory must begin. Thus we can say that as regards its fundamental principle, Kant’s moral philosophy is a form of realism, though not specifically moral realism. (p. 64)

As the author points out both in this last chapter and in the second, it is one thing for Kant to show how the principles and the final object of morality are derived from the fact that we are free agents combined with the requirement to respect the fundamental principles of reason; it is quite another thing for him to demonstrate that we are, indeed, free agents. That would be the subject of a much longer and detailed study, which falls out of the scope of the book, let alone of this review. Kant on the Rationality of Morality is a short but insightful book. Its discussions bridge Kant’s theoretical and practical philosophies, and they offer an original argument for one of the most important interpretative problems of the Groundwork, the derivation of the principles of morality. I recommend it especially to those who prefer to read Kant’s ethics as not so dependent on the significant metaphysical and epistemological theses of his transcendental idealism; as well, of course, to those interested in moral theory in general.

References

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Wood, A. Kantian Ethics. Cambridge: Cambridge University Press , 2008. [ Links ]

Notas

1This work was supported by grant 2019/21992-8, São Paulo Research Foundation (FAPESP).

2 O’Neill, 1989.

3 O’Neill, 2004, p. 187.

4Log, AA 9: 51 and KrV, A 150/B 189; A 151-2/B 191. References to Kant’s texts follow the standard: abbreviation of the work, followed by their number in the Akademie volumes and their corresponding pagination. Except for the Critique of Pure Reason, quoted with reference to the pagination of its first (A) and second (B) editions. All quotations of Kant are taken from the Cambridge editions.

5 Barbara Herman (1993, p. 215) gives a similar explanation: “A condition of choice that could not be accepted by all rational agents would be: doing x where the possibility of x-ing depends on other rational agents similarly situated not doing x. This is the condition standardly found to be the ground of choice of the deceitful-promise maxim”.

6Right after stating FUL, Kant says: “Now, if from this one imperative all imperatives of duty can be derived as from their principle, then, even though we leave it unsettled whether what is called duty is not such an empty concept, we shall at least be able to indicate what we think by it and what the concept means” (GMS, AA 04: 421). For an argument that FUL cannot adequately provide a general classification of duties, see Timmons (2004).

7“ … moral philosophy … gives him [the human being], as a rational being, laws a priori; which of course still require a power of judgment sharpened by experience <durch Erfahrung geschärfte Urtheilskraft>, partly to distinguish in what cases they are applicable, partly to obtain for them access to the will of a human being and momentum for performance …” (GMS, AA 04: 389). See also MS, AA 06: 217.

8I am borrowing this notion from Street (2008).

9For such a realist reading of Kant, see Schönecker and Schmidt (2018).

Vinicius Carvalho – University of Campinas Department of Philosophy Campinas – S.P. Brazil carvalho.viniciusp@gmail.com

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España en mapas: Una sínteses geográfica – SANCHO COMÍNS (I-DCSGH)

SANCHO COMÍNS, J. (dir). España en mapas: Una sínteses geográfica. Madrid: Centro Nacional de Información Geográfica, 2018. Resenha de: LÓPEZ, Maria Sebastián. Íber – Didáctica de las Ciencias Sociales, Geografía e Historia, v.99, p.85-86, abr./jun., 2020.

En el contexto actual de cambio metodológico y revolución digital en el que está sumida nuestra educación, resulta interesante, y a la vez necesario, recuperar la esencia de los métodos y las técnicas que se vienen aplicando para la enseñanza y el aprendizaje de la geografía. En este sentido, la obra que nos ocupa –publicada por el Instituto Geográfico Nacional (IGN) y perteneciente a la serie Compendios del Atlas Nacional de España– es un magnífico recurso para enseñar la geografía de España, pues no solo reúne en sus páginas todos los métodos y técnicas de esta disciplina, sino que además proporciona un discurso coherente, sistémico y actualizado de nuestra realidad.

El nuevo Atlas Nacional de España del siglo xxi muestra a través de la cartografía temática, la estadística y otro tipo de documentación gráfica la realidad cambiante y compleja de España. La obra ha sido llevada a cabo por un amplio equipo interdisciplinar compuesto por geógrafos, cartógrafos, historiadores, sociólogos y economistas que han dado forma y conexión a sus más de seiscientas páginas, poniendo énfasis sobre problemáticas territoriales actuales, pero sin olvidar los hechos y las consecuencias históricas. El recorrido por sus veinticuatro capítulos ayuda a la adquisición de la competencia espacial a través de la localización de los fenómenos territoriales, el análisis de las fuentes geográficas, la interconexión de factores múltiples y la identificación de procesos ambientales, culturales y sociales.

Su cantidad de recursos geográficos (alrededor de 1250 recursos gráficos, de los cuales más de 800 son mapas) hace que este atlas pueda ser utilizado para el desarrollo del pensamiento crítico y el compromiso cívico en todos los niveles educativos.

La secuencia expositiva de los contenidos puede calificarse de clásica: después de algunos ejemplos de cartografía histórica y una breve alusión a las funciones del IGN, se presenta el medio natural con los tres clásicos apartados dedicados a la estructura terrestre (geofísica, geología y geomorfología), el clima y las aguas y la biogeografía; las referencias históricas ofrecen seguidamente las claves fundamentales para entender la evolución y el desarrollo de la sociedad en ese territorio; continúa con la población, el poblamiento y los rasgos esenciales de la sociedad; las cuatro secciones siguientes están dedicadas a las actividades humanas (agrarias, industriales, turísticas y comerciales) y los servicios, equipamientos e infraestructuras asociadas; prosigue con el análisis de características más globales, como el paisaje, el medio ambiente, las estructuras socioeconómicas y territoriales…; y termina con una novedosa aportación que contextualiza la personalidad geográfica de España en el marco planetario y la presencia de nuestro país en el contexto geopolítico actual.

España en mapas: Una síntesis geográfica (en su versión impresa o digital) aporta, pues, grandes recursos para abordar el paradigma actual de cambio global y desarrollo sostenible, siendo una excelente herramienta de conocimiento sobre la sociedad y el territorio en todos los niveles educativos; profesorado y alumnado sabrán encon trar los modos de interlocución y aprehender su rico contenido.

La obra completa en formato PDF se puede descargar gratuitamente en el apartado «Libros digitales»: www.ign.es/web/publicaciones-boletines- y-libros-digitales Los capítulos completos y los contenidos gráficos se pueden visualizar y descargar en formato PDF a través del portal web España en mapas: www.ign.es/web/ign/portal/ espana-en-mapas Cada mapa, con sus datos, metadatos y ficheros gráficos georreferenciados asociados, se puede descargar en el producto Mapas temáticos del ANE del Centro de Descargas del CNIG: https://bit.ly/2RKw8cx

María Sebastián López – E-mail: msebas@unizar.es Acessar publicação original

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Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

SUMÁRIO | ESTADÃO, USP E OS INTELECTUAIS FRANCESES: A COMEMORAÇÃO DO CINQUENTENÁRIO DA UNIVERSIDADE E LEMBRANÇA INTELECTUAL PAULISTA DE FERNAND BRAUDEL NO SUPLEMENTO ‘CULTURA’ | Alicy de Oliveira Simas | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

O presente artigo objetiva analisar a articulação entre imprensa, universidade e intelectuais por meio de publicações do suplemento Cultura do jornal Estadão. O Cultura foi editado pelo jornal entre 1980 e 1991 e tinha como objetivo central a circulação de ideias entre intelectuais e a divulgação científica universitária, sobretudo dos intelectuais da Universidade de São Paulo (USP), no campo das Ciências Humanas e das Ciências Sociais. É possível afirmar que essa articulação entre o meio acadêmico da USP e o jornal remonte a década de 1930, quando os dirigentes do jornal foram os principais articuladores da criação da universidade e de sua Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, a convidar intelectuais estrangeiros, em especial franceses, para formar seus quadros acadêmicos. Logo, busca-se evidenciar que no suplemento Cultura pretendeu-se reafirmar a construção de uma memória e de uma identidade acerca do “tripé” de sociabilidades e circulações de ideias, sendo constituintes disso, a Universidade de São Paulo, o jornal Estadão, e os intelectuais franceses. Para tanto, privilegia-se para análise publicações referentes ao cinquentenário da USP e, por conseguinte, ao intelectual e historiador francês, Fernand Braudel.Palavras-chave: Estadão; USP; Intelectuais franceses

FLORIANÓPOLIS E OS IMPACTOS DO “MILAGRE ECÔNOMICO” NAS PÁGINAS DE “O ESTADO” (1970-1980) | Daniel Henrique França Lunardelli | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

O presente artigo se propõe a analisar como o jornal “O Estado” apresentava as notícias sobre as transformações urbanas ocorridas em Florianópolis durante a década de 1970. A partir da análise dos discursos veiculados através de editorias, crônicas, cartas de leitores, charges, fotos e reportagens, busca-se demonstrar o crescimento vertiginoso da capital catarinense na esteira do “milagre brasileiro”, no qual combinava grandes investimentos em obras públicas e a expansão da construção civil. Por meio das fontes impressas busca-se também demonstrar o impacto do acelerado processo de urbanização que a cidade experimentou, alterando de forma significativa o seu ritmo, conferindo-lhe uma feição de um aglomerado urbano populoso, cosmopolita e impessoal.Palavras-chave: Florianópolis. Cidade. Urbanização.

SOBRE A COMPETÊNCIA HISTÓRIA NA BNCC E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA: CONSIDERAÇÕES |vJéssica Pereira Couto | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Os últimos trinta anos foram de grande importância no que compete às políticas públicas e as disciplinas relacionadas ao negro no Brasil e ao ensino de História da África. Entre os acontecimentos, o reconhecimento e criminalização do racismo na Constituição Federal (1988); a mudança nos livros didáticos, que passaram a retratar o negro para além da escravidão (1990); os PCNS (1997) para o ensino fundamental e médio (2000); a promulgação da Lei 10.639 (2003), que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura africana e afro-brasileira; e a BNCC, primeira (2015), segunda (2016) e terceira (2018), versões. A terceira e última versão- objeto de nossa análise, está prevista para entrar em vigor no vigente ano de 2020, padronizando o ensino em território nacional. Sabendo que a Base Nacional Comum Curricular objetiva normatizar o ensino, buscaremos compreender qual o tratamento dispensado ao ensino de história africana e afro-brasileira no documento, em específico, na competência História. Neste trabalho analisaremos o resultado dos processos que antecederam a base e seu resultado, na última versão, para a tônica africana e afro-brasileira.Palavras-chave
BNCC; Ensino de História; África; Afro-brasileiros.

OS BENZIMENTOS COMO OFÍCIO DE FAMÍLIA: ENTRE PERMANÊNCIAS, RUPTURAS E A BUSCA POR UMA PRÁTICA “TEMPORAL” | Juliani Borchardt da Silva | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Como prática cultural tradicional na localidade de São Miguel das Missões/RS, o ofício de benzer se coloca como elemento marcante da identidade e da cultura local. Neste ensejo, este artigo propõe a discutir aspectos relacionados à narrativa exposta por alguns de seus praticantes no tocante às suas relações familiares, se utilizando para isso de uma metodologia qualitativa, qual seja, a de entrevistas orais realizadas junto a benzedores da comunidade, sendo este material coletado, transcrito e analisado. Discursos estes, sejam pela palavra ou silêncio, onde se é possível identificar memórias que remetem a rupturas e permanências do ofício junto às relações familiares estabelecidas tradicionalmente entre os seus praticantes. Elementos memoriais evocados e elaborados na atualidade constituem os significados que se constituem e compartilham por meio da prática exercida, a qual se torna atemporal diante do seu processo de ressignificação e transmissão ao longo das gerações.Palavras-chave: Benzimentos. São Miguel das Missões/RS. Narrativas. Memória. Família.

HISTÓRIA DAS MULHERES E NOVOS PROTAGONISMOS: A EMANCIPAÇÃO FEMININA EM “PIGMALEÃO” (1913) E “TOTALMENTE DEMAIS” (2015/2016) | Marcos de Araújo Oliveira | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Com o surgimento do movimento feminista e posteriormente do campo acadêmico da História das Mulheres, novas pautas referentes aos debates de gênero foram abordadas. Desse modo, o estudo da submissão feminina ao longo da história, permitiu a reflexão também acerca da luta pela quebra do modelo da mulher idealizada entre a obediência e subordinação ao homem, mas que muitas vezes é rompido diante das novas posturas mais rebeldes na busca feminina pela sua independência. Tais aspectos são evidenciados em discursos não só históricos, mas também literários como na peça “Pigmaleão” publicada em 1913 por Bernard George Shaw, ou até em obras da mídia global como na telenovela “Totalmente Demais” (2015/2016). Esses produtos culturais funcionam assim como narrativas cujo potencial de análise historiográfica contribuem para a reflexão acerca das transformações da condição feminina na história, meios carregados de novos discursos que dão visibilidade a esse debate sobre a emancipação do gênero feminino.
Palavras-chave: História das Mulheres, Emancipação, Gênero.
INVENÇÃO DO SEXO/GÊNERO E A CRÍTICA DO SUJEITO DO FEMINISMO | Maria Cristina Kirach e Rosemeri Moreira | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020. | Este artigo é uma reflexão sobre a construção social do corpo no mundo ocidental, como também os usos políticos da categoria gênero e da intersecção (gênero, raça, etnia e geração), além de refletirmos sobre a crítica do sujeito do feminismo relacionada com os estudos decoloniais. A discussão se dá a partir do debate dos Estudos Culturais da História do Corpo (principalmente pelo viés de David Le Breton, Thomas Laqueur, Judith Butler) e da perspectiva decolonial (Maria Lugones e Oyèrónké Oyéqùmí).
Palavras-chave: Corpo; Gênero; Mulheres.

O PERCURSO DAS PESQUISAS NO BRASIL SOBRE OS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA | Mariana de Sá Gaspar e Maria Paula Costa | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Este texto consiste na tentativa de traçar o percurso das pesquisas, especialmente no caso do Brasil, que tiveram como objeto de estudo, os livros didáticos. Para isso, realizamos a análise de algumas obras e textos relacionados à temática, publicados a partir da década de 1970 (voltados inicialmente à área da Educação e, posteriormente, a partir dos estudos sobre o ensino de História, a esta área em específico). Assim, destacamos como em cada período e abordagem, os livros didáticos foram concebidos de formas diferentes pela academia, devido às interpretações teórico-metodológicas e aos contextos políticos que nortearam cada pesquisa. Levando em consideração os estudos sobre os livros didáticos para o ensino de História, refletimos a importância do entendimento da constituição destes materiais como objetos de estudo.
Palavras-chave: História; Livros Didáticos; Levantamento Bibliográfico; Pesquisas.

INDUSTRIOSOS EM PIRATARIA: OS GREGOS DO MUNDO ANTIGO | Nelson Rocha Neto | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

O presente texto consiste numa breve apresentação a respeito da pirataria na Grécia Antiga como prática histórica determinante na formação da política, economia e sociedade. Portanto, compreenderemos a pirataria grega através da mitologia, da produção literária e dramática, analisando a ambiguidade do restrito conceito que oferecia ascensão social pela promessa de riqueza que a rapina marítima proporcionava. As constantes guerras impuseram as cidades-Estado alicerçarem a pirataria como instrumento de controle dos limites territoriais, financiarem tecnologias e romperem com as ideias pré-concebidas. Logo, a troca de experiências entre os povos mediterrânicos, intermediados pelo madeirame das embarcações, resultou na fundação das pólis, na organização do comércio, nas inquietações do pensamento historiográfico, na coletividade e na instrumentalização estatal da pirataria tornando-se um fenômeno social amplamente difundido. Portanto, a industriosidade da pirataria grega articulou nos detentores do poder aparatos repressores que sufocaram os “párias”, carregando a empresa talassocrática para além das ingerências do conto argonáutico.
Palavras-chave: História Antiga. Pirataria. Sociedade.

“A ÁFRICA TEM BEM MAIS HISTÓRIAS DO QUE A GENTE PENSA”: UMA PERSPECTIVA DE ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DO DIÁLOGO COM OS PRÓPRIOS SUJEITOS | Willian Felipe Martins Costa | Sobre Ontens. Paranavaí-Rio de Janeiro, v.2, abr./jun. 2020.

Este artigo tem por objetivo trazer reflexões acerca das experiências ocorridas durante a realização do Estágio Supervisionado III, dentro do curso de História/Licenciatura da UDESC, com uma turma de oitavo ano em um colégio estadual na cidade de Florianópolis. Tais reflexões dizem respeito ao ensino de História das Áfricas a partir de uma perspectiva de trabalho com narrativas produzidas pelos próprios sujeitos africanos. Com base em uma perspectiva decolonial buscou-se, durante o estagio, um descentramento de noções eurocêntricas acerca da História das Áfricas. A partir desse ponto, a ideia de tais reflexões contidas nesse artigo é de observar e discutir as possibilidades de trabalho nessas perspectivas visando a construção de um conhecimento das temáticas presentes na Lei 11.645/2008, trazendo assim possíveis contribuições para o ensino de História dentro de uma perspectiva do campo dos Estudos Africanos comprometido com uma luta antiracista e anticolonial.
Palavras chaves: Ensino de História; História da África; Narrativas dos próprios sujeitos.

Philosophy, dialogue, and education – GUILHERME; MORGAN (B-RED)

GUILHERME Alexandre Anselmo Guilherme ucsclay ucr br Dialogue
Alexandre Anselmo Guilherme. ucsclay.ucr.br

GUILHERME e MORGAN Philosophy dialogue and education DialogueGUILHERME, Alexandre Anselmo; MORGAN, W. John. Philosophy, dialogue, and education. Nine Modern European Philosophers [Filosofia, diálogo e educação: nove filósofos europeus modernos]. London: Routledge, 2018. 190 p. Resenha de: CHERON, Cibele. Bakhtiniana – Revista de Estudos do Discurso, v.15 n.2 São Paulo Apr./June 2020.

O que é o diálogo, na compreensão de nove dos mais importantes filósofos modernos europeus? Quais são as implicações dessa compreensão do diálogo para o campo da Educação? É desse duplo questionamento que Alexandre Anselmo Guilherme e W. John Morgan partem para, ao longo de Philosophy, Dialogue, and Education, discutir as ideias de Martin Buber, Mikhail Bakhtin, Lev Vygotsky, Hannah Arendt, Emmanuel Levinas, Maurice Merleau-Ponty, Simone Weil, Michael Oakeshott e Jürgen Habermas.

A intersecção entre o diálogo e o campo educacional se faz presente na trajetória dos autores, ambos expoentes da Filosofia da Educação. W. John Morgan é professor emérito da School of Education [Faculdade de Educação] da University of Nottingham, onde presidiu a Cátedra UNESCO de Economia Política da Educação. Ele também é professor honorário da School of Social Sciences [Faculdade de Ciência Sociais] e do Wales Institute of Social and Economic Research, Data, and Methods [Instituto Wales de Pesquisa, Dados e Métodos Sociais e Econômicos] na Cardiff University, e bolsista emérito do Leverhulme Trust, realizando estudos sobre economia política comparativa da educação (especialmente Rússia e China), sociedade civil e antropologia do conhecimento, bem como educação para a paz. Alexandre Anselmo Guilherme é professor adjunto da Escola de Humanidades, Departamento de Educação, e coordenador do Grupo de Pesquisa Educação e Violência – GruPEV da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil, atuando principalmente nos temas educação e violência, educação e diálogo, imigrantes e refugiados, e Psicologia da Educação.

Guilherme e Morgan indicam a relevância dos questionamentos que embasam Philosophy, Dialogue, and Education: o diálogo é comumente entendido como conversação, intercâmbio de perguntas e respostas entre dois ou mais sujeitos, e, simultaneamente, tem sido objeto privilegiado nas pesquisas em Filosofia da Educação. Todavia, a maioria das investigações nessa área costuma concentrar-se em apenas verificar a ocorrência de intercâmbio comunicativo, resultando em “modos simplistas e reducionistas de compreender o diálogo, os quais não consideram as relações envolvidas no diálogo” (GUILHERME; MORGAN, 2018, p.3)1. Em oposição ao reducionismo rejeitado pelos autores, é destacada a “gama de complexidades, dinâmicas e efeitos resultantes e causados pelo diálogo, que a simples percepção de um processo de perguntas e respostas não captura com êxito” (GUILHERME; MORGAN, 2018, p.4)2.

A escolha dos filósofos abordados enfatiza o caráter polissêmico, multifacetado e complexo do diálogo. Philosophy, Dialogue, and Education reflete sobre as complexidades inerentes ao diálogo, situando as perspectivas sociopolíticas dos pensadores na tradição europeia da filosofia dialógica. Cada filósofo é tratado num capítulo específico, cujo título sintetiza o conceito de diálogo desenvolvido. Após uma breve apresentação, seguida dos principais eventos da vida e carreira, o leitor é conduzido a um panorama consistente e detalhado sobre como o diálogo é conceituado e relacionado à educação.

No primeiro capítulo, Martin Buber: dialogue as the inclusion of the other [Martin Buber: diálogo como a inclusão do outro], o diálogo é referido como uma relação simétrica, inclusiva do outro, despida de preconceitos e expectativas, na qual simplesmente se aceita o outro como ele é. A relação dialógica assume a forma ‘Eu-Tu’ e está, assim, em contraste com as relações ‘Eu-Isso’, baseadas na objetificação do outro e na ausência de diálogo. ‘Eu-Tu’ e ‘Eu-Isso’ são as ‘palavras básicas’ indicativas da qualidade da experiência contida na relação que elas descrevem. À leitura filosófica da obra de Buber (cf. Buber, 2007 e 2001, entre outros) é acrescida uma apreciação teológica, fundada em suas raízes judaicas hassídicas. Essa apreciação ilustra a atenção às conexões entre o pensamento, as experiências, o pertencimento e a subjetividade dos filósofos observados, elementares em Philosophy, Dialogue, and Education. Em Buber, o hassidismo é o mote para ressaltar a convergência de todas as relações genuínas para o eterno, a partir da qual os seres humanos se relacionam com Deus. No campo da Filosofia da Educação, a teoria de Buber é enfocada para defender a importância das relações vivas, horizontais e inclusivas entre professores e alunos, fundadas em diálogo genuíno, de forma a impactar positivamente a motivação e a capacidade de colaboração.

A interpretação de Guilherme e Morgan sobre as ideias de Buber, no Capítulo Um, articula-se ao Capítulo Cinco, Emmanuel Levinas  dialogue as an ethical demand of the other [Emmanuel Levinas: diálogo como uma exigência ética do outro] Para Levinas (cf. Levinas, 1988a1988b2005, entre outros), em contraposição a Buber, a noção ética de diálogo compreende uma relação assimétrica e preconcebida, estabelecida para satisfazer as demandas do outro. O encontro com o outro, nominado por Levinas como “rosto”, implica uma exigência ética, instando o sujeito, de cima para baixo, a responder ao outro. Todavia, essa assimetria não deve ser depreendida como uma hierarquia das relações humanas, uma vez que é recíproca: o sujeito é instado a responder ao mesmo tempo em que demanda uma resposta ética do outro. A assimetria bilateral do encontro com o “rosto” caracteriza-se, ainda, pela presença de uma “terceira parte”, na medida em que toda a humanidade encara o sujeito através dos olhos do outro. Assim, enquanto para Buber o diálogo se dá desde o reconhecimento do outro como um par, por conta da igualdade com o sujeito, para Levinas, o diálogo existe porque o sujeito reconhece a alteridade absoluta do outro. A influência de Levinas para a Educação também se ancora na alteridade, no reconhecimento ético do encontro com um outro que é diferente do sujeito, causando-lhe inquietude, questionamento e inovação.

O outro também é central no Capítulo Seis, Maurice Merleau-Ponty – dialogue as being present to the other [Maurice Merleau-Ponty – diálogo como estar presente para o outro]. O capítulo discute a compreensão existencialista e fenomenológica de Merleau-Ponty (cf. Merleau-Ponty, 19962006, entre outros), para quem o diálogo configura um ‘estar presente’ para o outro. Ainda que guarde algumas afinidades com o pensamento de Buber e de Levinas, Merleau-Ponty apoia-se em premissas distintas. O diálogo necessita do encontro com um outro corporificado, presente numa relação em que o sujeito também está presente. No diálogo, as demandas e intenções desse outro tornam-se compreensíveis para o sujeito, como se este o “habitasse”. Por essa perspectiva, subjetividade e objetividade se encontram no corpo. Também por meio dessa “teoria da incorporação” o fenômeno do aprendizado é explicado como um hábito adquirido pelo corpo, e a aquisição de um hábito corresponde à apreensão de um significado. Trata-se de um processo que envolve os movimentos espontâneos e intencionais em interconexão com as experiências que solidificam os hábitos.

No segundo e no terceiro capítulo, Guilherme e Morgan tratam de dois pensadores russos influenciados pelo marxismo. Mikhail Bakhtin é referido ao longo do Capítulo Dois, Mikhail Bakhtin – the dialogic imagination [Mikhail Bakhtin – a imaginação dialógica]. Os autores aludem à noção de “imaginação dialógica”3 para desvendar uma filosofia na qual se notam inspirações em Kant, marcada pela insistência na relação, necessária e reciprocamente enriquecedora, entre o pensamento e a ação, e em Nietzsche, visível no conceito de discurso que espelha a ideia de diálogo. O capítulo leva em conta as ambiguidades percebidas em Bakhtin, especialmente sobre a arquitetura do mundo real, a estética como ação ou processo, a ética da política e, finalmente, a ética da religião. Essas ambiguidades suscitam uma reflexão crítica, na qual o filósofo do ato (cf. Bakhtin, 2010), da dialogia (cf. Volóchinov, 2017Bakhtin, 20082016, entre outros) e do plurilinguismo, vindica “o diálogo e a participação polifônica de vozes diferentes no intercâmbio de ideias por meio da linguagem e da literatura” (GUILHERME; MORGAN, 2018, p. 24)4 ao mesmo tempo em que propõe Bakhtin como um pensador ético. A “imaginação dialógica” de Bakhtin sublinha que a linguagem só adquire significado no diálogo, obrigatoriamente no contexto social e cultural do qual faz parte. O entendimento do self é construído nesse diapasão, num diálogo conformado pelas mútuas e contínuas interpretações do outro. Essa perspectiva contribui grandemente para a Filosofia e para a Educação, uma vez que Bakhtin incentiva os sujeitos ao protagonismo na busca pelo conhecimento, não aceitando as coisas como dadas.

Isso pode ser cotejado à compreensão de Lev Vygotsky, objeto do Capítulo Três, Lev S. Vygotsky – dialogue as mediation and inner speech [Lev Vygotsky – diálogo como mediação e discurso interior]. Como mediação (cf. Vygostsky, 1999 1998, entre outros), o diálogo diz respeito à relação entre indivíduo e sociedade, intermediada por objetos, sinais e linguagem, ferramentas proporcionadas pela cultura. Também diz respeito à interação de cunho mais psicológico do indivíduo consigo mesmo, crucial para o desenvolvimento cognitivo humano, que Guilherme e Morgan afirmam ser “uma alternativa poderosa tanto ao behaviorismo pavloviano como para a ênfase piagetiana à maturação biológica cognitiva” (GUILHERME; MORGAN, 2018, p.39)5. O impacto do pensamento de Vygotsky para a Educação é captado desde as interpretações que privilegiam a análise social, até as que buscam entender o surgimento da consciência, relegando as relações sociais ao pano de fundo.

O prisma político do diálogo é examinado no Capítulo Quatro, Hannah Arendt – dialogue as a public space [Hannah Arendt – diálogo como espaço público]. Guilherme e Morgan acentuam a defesa de Arendt da expressão autêntica da democracia, possível quando os cidadãos se reúnem num espaço público de deliberação e decisão acerca dos interesses coletivos (cf. Arendt, 20072012, entre outros). A separação entre as dimensões do “labor”, do “trabalho” e da “ação” precede a exigência do espaço público, contexto no qual as pessoas defrontam-se umas com as outras, na qualidade de membros de uma comunidade, e desvelam seus pontos de vista em discursos e ações, concordâncias e discordâncias. Essa relação com os outros é pré-condicionada por outro tipo de diálogo, fundante da capacidade de pensar, interno, através do qual o indivíduo confronta a si próprio. Nesse marco, a educação objetiva propiciar um ambiente seguro às crianças, preparando-as para participarem da esfera pública. Entretanto, Guilherme e Morgan cogitam que escolas e universidades não venham conectando o público ao privado, tal qual divisado por Arendt. Isso é tributado a obstáculos enfrentados, como os processos de mercantilização, que transformam os cidadãos em consumidores, e o espaço público em mercado.

Igualmente, no Capítulo Sete, Simone Weil – dialogue as an instrument of power [Simone Weil – diálogo como instrumento de poder], o espaço público tem notada relevância. O diálogo é pensado por Weil em relações de poder dimensionadas, no espaço público, pela linguagem e pelas palavras (cf. Weil, 19912001a2001b, entre outros). O dinamismo da realidade é a fonte dos conflitos potenciais, porquanto os sujeitos leem o mundo utilizando uma linguagem imperfeita, não obstante expressiva de atitudes e práticas. O diálogo configura uma relação de poder que se presta à crueldade, mas também à justiça e à bondade. Esse instrumento é crucial para a Educação, assim como a atenção (a vontade de receber) e o silêncio (a reflexão sem recebimentos do mundo externo), pois o processo de conhecimento só pode ser atingido num percurso crítico que envolve desejo de saber, comprometimento, esforço e amadurecimento. Assim, é imperativo que a Educação propicie ao indivíduo o discernimento das ideias, o poder da escrita e do discurso, e seu uso não para a conquista e aniquilação do outro, mas para a justiça, particularmente para a justiça social.

O posicionamento de Weil pode ser comparado ao de Michael Oaekshott, sobre o qual Guilherme e Morgan discorrem no Capítulo Oito, Michael Oakeshott – dialogue as conversation [Michael Oakeshott – diálogo como conversação]. O diálogo é, aqui, visto como uma forma de conversa, imprescindível para o desenvolvimento da civilização (cf. Oakeshott, 1989, entre outros). Os valores civilizados estão radicados na capacidade das pessoas, pela conversa, adentrarem o diálogo, o que é fomentado por uma educação liberal. É indispensável que a experiência humana seja vivida, compreendida e refletida na forma de uma conversa do sujeito com seus pares, seres humanos. As vozes que tomam parte dessa conversa são as diferentes formas da experiência, de ver o mundo, históricas e práticas. Oakeshott considera a conversa como um diálogo aberto e polifônico, um intercâmbio entre as diversas funções e condições em que a humanidade se desenvolve – e aí reside sua importância para a Educação. O indivíduo aprende a ser humano enquanto participa dessa conversa, assimilando os múltiplos significados e propósitos que também a integram.

O nono e último capítulo, Jürgen Habermas – dialogue as communicative rationality [Jürgen Habermas – diálogo como racionalidade comunicativa] dedica-se ao conceito de diálogo como racionalidade comunicativa, depreendido da extensa obra do filósofo alemão (cf. Habermas, 19841987, entre outros). Guilherme e Morgan sublinham a crítica habermasiana ao cientificismo e às decorrentes abordagens positivistas, burocráticas e autoritárias predominantes nos estudos sobre as questões da esfera pública, o que resulta na “marginalização do diálogo público e do debate” (GUILHERME; MORGAN, 2018, p.141)6. O déficit democrático consequente é enfrentado, segundo Habermas, por duas formas distintas e interdependentes de ação: (i) instrumental, mensurada quantitativamente e percebida no trabalho e na construção material; (ii) comunicativa, aferida qualitativamente e percebida por meio da interação e do diálogo sociais. A racionalidade comunicativa é a chave para a ação, e o ato da comunicação, em si, já inicia um diálogo entre pares, parceiros abertos às possibilidades de acordo e ação social. A contribuição de Habermas para a Educação é defendida no que Guilherme e Morgan detectam como alinhamento à Pedagogia Crítica, segundo a qual o despertar de consciência dos sujeitos, dialeticamente, leva à ação social democrática e emancipatória. A responsabilidade dos educadores é criar condições para que essa ação ocorra, circunstanciando o ensino e o aprendizado como atos políticos e, no mesmo sentido, a não neutralidade do conhecimento.

Philosophy, Dialogue, and Education é uma obra densa, na qual os autores promovem uma reflexão teoricamente consistente e sofisticada, sem, contudo, sacrificar a leitura e a inteligibilidade. As concepções de diálogo são discutidas de forma articulada entre os pensadores, concatenadas aos aportes de outros teóricos e de comentadores, o que fornece um horizonte interpretativo rico e fundamentado.

Nesse contexto complexo, Guilherme e Morgan trabalham o diálogo permeado por relações de poder, pela história e pela cultura, por valores normativos e pela necessidade de um espaço comum. Os potenciais e os dilemas do diálogo, especialmente na Educação, são temas de renovado interesse, ainda maior quando os recentes eventos e as dinâmicas sociais colocam em xeque a capacidade de dialogar. Como apontam (2018, p.4), “o diálogo não é simples de obter; pelo contrário, depende da disposição e da situação e é frequentemente difícil de iniciar, ainda mais de sustentar”7. Cultivar essa disposição é, portanto, o desafio ético do tempo presente, ao qual a Filosofia da Educação não se furta.

1Traduzido livremente do original: “simplistic and reductionist ways of understanding dialogue which do not consider the relations involved in the dialogue”.

2Traduzido livremente do original: “range of complexities, dynamics, and effects implied and caused by dialogue that the simple notice of a process of questioning and answering does not capture successfully”.

3A expressão é claramente uma referência à coletânea de ensaios de Mikhail Bakhtin publicada em inglês com o título The Dialogic Imagination (BAKHTIN, 1981). Dela constam os ensaios (i) Epic and Novel: toward a Methodology for the Study of the Novel, traduzida em português como Epos e o romance (sobre a metodologia do estudo do romance) (1993, p.397-428) ou O romance como gênero literário (2019, p.65-111); (ii) From the Prehistory of Novelistic Discourse – em português, Da pré-história do discurso romanesco (1993, p.363-396) ou Sobre a pré-história do discurso romanesco (2019, p.11-63); (iii) Forms of Time and of the Chronotope in the Novel: Notes toward a Historical Poetics – em português Formas de tempo e de cronotopo no romance (Ensaios de poética histórica) (1993, p.211-362) ou As formas do tempo e do cronotopo no romance (2018, p.11-237); (iv) Discourse in the Novel – O discurso no romance (1993, p.71-210; 2015, p.19-242).

4Traduzido livremente do original: “dialogue and the polyphonic participation of different voices in the exchange of ideas through language and literature”.

5Traduzido livremente do original “provided a powerful alternative to both Pavlovian behaviourism and the Piagetian focus on cognitive biological maturation”.

6Traduzido livremente do original “marginalization of public dialogue and debate”.

7Traduzido livremente do original “dialogue is not simple to achieve; rather, it is dependent on disposition and on situation and is often difficult to initiate, let alone sustain”.

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Glória Carneio do AMARAL, Navette Literária França-Brasil – A crítica de Roger Bastide, São Paulo, EDUSP, Maria Luiza Guarnieri Atik, Bakhtiniana – Revista de Estudos do Discurso

Teoria do romance III: o romance como gênero literário – BAKHTIN (B-RED)

BAKHTIN, M. Teoria do romance III: o romance como gênero literário. Tradução, posfácio e notas Paulo Bezerra; organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2019. 144p. Resenha de: MELO JÚNIOR, Orison Marden Bandeira de. Bakhtiniana, Revista de Estudos do Discurso, v.15 n.2, São Paulo, Apr./June 2020.

Como já é notório a todos os leitores que acompanham as publicações de textos do Círculo pela Editora 34, a sequência dos textos Teoria do romance ITeoria do romance II e, agora, Teoria do romance III tem, como base, o tomo 3 da coletânea Obras reunidas em sete tomos [Sobránie sotchiniênii v siémi tomakh] de Mikhail Bakhtin, organizada por Vadim Valeriánovitch Kójinov (1930-2001) e Serguei Geórguievitch Botcharóv (1929), que, segundo Grillo (2009), são os detentores dos espólios bibliográficos de Bakhtin. Ainda segundo Grillo (2009), após a morte de Kójinov, ficou Botcharóv o responsável pela coordenação do projeto, dando, dessa forma, conforme a Nota à edição brasileira encontrada na Teoria do romance I (BAKHTIN, 2015), o consentimento para que Paulo Bezerra e a editora o dividissem em três volumes.

Com a finalização da publicação da Teoria do romance com esse terceiro volume, é possível ter uma visão privilegiada em relação ao conjunto dos textos que compõem o Tomo 3. Desse modo, é mais fácil perceber, agora, que o número de ensaios que os três volumes apresentam não corresponde totalmente aos ensaios encontrados na coletânea Questões de literatura e de estética: a teoria do romance (doravante, QLE) (BAKHTIN, 2002). QLE se inicia com o ensaio O problema do conteúdo, do material e da forma na criação literária. No entanto, esse ensaio não está publicado na trilogia. Segundo Bezerra (2015), ele foi suprimido da Teoria do romance pelos organizadores russos por ser um texto mais genérico sobre a teoria da literatura, com foco na contraposição aos formalistas russos. Grillo (2009) informa que ele aparece no Tomo 1 das Obras reunidas em sete tomos, juntamente com os textos Arte e responsabilidade, Para uma filosofia do ato e O autor e o herói na atividade estética.

O segundo ensaio O discurso no romance é publicado pela Editora 34 no primeiro volume da trilogia: Teoria do romance I: A estilística (BAKHTIN, 2015). Formas de tempo e de cronotopo no romance (ensaios da poética histórica), terceiro ensaio da QLE, é publicado em Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo (BAKHTIN, 2018). É interessante notar que, na tradução de Paulo Bezerra, o ensaio passa por uma pequena modificação no seu título: As formas do tempo e do cronotopo no romance: um ensaio de poética histórica. Vale destacar que ambas as obras (Teoria do romance I e Teoria do romance II) foram resenhadas logo após a sua publicação e suas resenhas foram publicadas na revista Bakhtiniana. A resenha de Adriana P. P. Silva do primeiro volume foi publicada no primeiro número de 2016 (SILVA, 2016) e a resenha de Maria Elizabeth S. Queijo do segundo volume, no segundo número de 2019 (QUEIJO, 2019).

A coletânea QLE finaliza com três curtos ensaios: Da pré-história do discurso romanesco, Epos e o romance (sobre a metodologia do estudo do romance) e Rabelais e Gógol (arte do discurso e cultura cômica popular). Desses três, dois deles aparecem no volume Teoria do romance III: o romance como gênero literário (BAKHTIN, 2019), a saber: Da pré-história do discurso romanesco e Epos e o romance (sobre a metodologia do estudo do romance), mas com modificações em seus títulos. O texto Rabelais e Gógol aparece no Tomo 4 das Obras reunidas que, segundo Grillo (2009), é dedicado aos textos de Bakhtin sobre Rabelais, o que inclui, obviamente, a obra sobre François Rabelais e a cultura popular na Idade Média e no Renascimento, publicada pela editora Hucitec no Brasil sob o título A cultura popular na idade média e no renascimento: o contexto de François Rabelais (BAKHTIN, 2010).

Em relação aos ensaios que compõem o terceiro volume da Teoria do romance, em um primeiro momento o leitor consegue identificar apenas um, Sobre a pré-história do discurso romanesco, cujo título se assemelha ao anterior. No entanto, pode causar alguma estranheza o título do segundo ensaio que, inclusive, aparece como subtítulo do volume: O romance como gênero literário. Bezerra (2019), no seu posfácio intitulado O fechamento de um grande ciclo teórico, conta que esse era o título original do texto, publicado de forma fragmentada sob o título Epos e o romance. Esse mesmo título é encontrado nas versões em inglês, espanhol, francês e italiano: Epic and novel: toward a methodology for the study of the novel (BAKHTIN, 1981); Épica y novela: (acerca de la metodología del análisis novelístico) (BAJTÍN, 1989); Récit épique et roman: (méthodologie de l’analyse du roman) (BAKHTINE, 1978); Epos e romanzo: sulla metodologia dello studio del romanzo (BACHTIN, 2001). Bezerra (2019) explica que o título do ensaio foi restaurado pelos organizadores das Obras reunidas com o objetivo de corresponder, de forma integral, ao projeto de Bakhtin de versar sobre “o romance como gênero literário específico”, mostrando, dessa forma, “os encontros e os desencontros dos dois gêneros” (p. 120), ou seja, da epopeia e do romance. Essa estranheza, no entanto, é facilmente dissipada pela compreensão do seu sentido, restando aos leitores e estudiosos do romance à luz bakhtiniana se adequar aos novos termos e títulos, sabendo que são resultados de estudos e pesquisas de scholars especialistas nas obras do Círculo. Ademais, o leitor da tradução de Paulo Bezerra deve se sentir privilegiado por essa informação, trazida no terceiro volume da Teoria do romance, tendo em vista que em nenhuma versão da obra no inglês, espanhol, francês e italiano essa explicação é dada ao leitor.

Antes de adentrar nas considerações mais específicas sobre o terceiro volume da teoria do romance, novamente devido a essa visão privilegiada da totalidade dos textos que compõem a Teoria do romance de Bakhtin, é necessário observar a macroestrutura dos três volumes. Como já foi ressaltado por Silva (2016) e Queijo (2019), essas obras trazem um enriquecimento aos estudos do romance não somente por serem textos cuja tradução “se aproxima da voz de seu autor” (SILVA, 2016, p.269), mas por todos os paratextos encontrados nelas, o que inclui o posfácio do tradutor que, segundo Queijo (2019, p.155) “emoldura o texto que as [páginas do posfácio] precedem”. Brait (2019) afirma que compreender uma obra como enunciado concreto, conforme o Círculo, implica entender que todos os textos dessa obra fazem parte do seu todo arquitetônico, o que inclui os paratextos, ou seja, “textos que se avizinham do texto principal, caso do título, subtítulos, dedicatórias, epígrafes, prefácio, posfácio, etc. e que […] abrem caminho para o leitor adentrar os meandros do texto principal” (p.251). Na Teoria do romance I, além do prefácio por Paulo Bezerra, o tradutor também apresenta um glossário de alguns conceitos-chave. Além desses paratextos, ainda há uma nota à edição brasileira, um nota de informação sobre Bakhtin e outra sobre Bezerra. No segundo volume, é adicionado, ao texto principal, alguns rascunhos que Bakhtin fez para o último capítulo que ele adicionou posteriormente. Esse rascunho foi intitulado de Folhas esparsas. Além desse rascunho, há o posfácio de Bezerra, que ele intitula de Uma teoria antropológica da literatura, além das notas recorrentes nos três volumes (nota dos editores, nota sobre Bakhtin e nota sobre o tradutor). O terceiro volume segue o formato do segundo, com um posfácio por Paulo Bezerra e as três notas. O posfácio de Bezerra é intitulado O fechamento de um grande ciclo teórico, que dá, como se percebe, o tom de completude a esse grande enunciado Teoria do romance. É interessante notar que apenas o primeiro volume traz um glossário, com notas explicativas do tradutor. Isso possivelmente se deve ao fato de que o tradutor assumiu novos termos para aqueles que já estavam consolidados na academia. Um exemplo é o termo “heterodiscurso”, que veio substituir “o já consagrado termo plurilinguismo nos trabalhos dos pesquisadores brasileiros que se debruçam sobre o pensamento bakhtiniano” (SILVA, 2016, p. 268).

Em relação ao conteúdo de Teoria do romance III (BAKHTIN, 2019), não me aterei ao resumo de cada ensaio, já que eles já têm sido apresentados por vários estudiosos das obras de Bakhtin sobre o romance, em específico, e sobre a literatura, em geral. Um exemplo disso é o capítulo de Maria Inês B. Campos (2009) na coletânea Bakhtin: dialogismo e polifonia (BRAIT, 2009), que apresenta todos os ensaios da coletânea Questões de literatura e de estética (BAKHTIN, 2002). Para a apresentação do ensaio Dá pré-história do discurso romanesco/Sobre a pré-história do discurso romanesco, escreveu o texto intitulado O importante papel do riso e do plurilinguismo (CAMPOS, 2009, p.137-139) e para a do ensaio Epos e o romance (sobre a metodologia do estudo do romance)/O romance como gênero literário, escreveu Sobre a metodologia do estudo do romance (CAMPOS, 2009, p.139-142). Diante disso, é necessário explicar ao leitor que os ensaios foram enriquecidos substancialmente não só pelo fato, já apontado, de eles terem sido restaurados quanto aos títulos originais, mas também por incorporarem as próprias correções de Bakhtin, restituírem trechos anteriormente cortados e preservarem as anotações que Bakhtin fez nas margens dos textos datilografados. Segundo a Nota à edição brasileira (2019), além dessas notas do próprio Bakhtin, o leitor encontrará esses trechos restaurados (indicados por asterisco) e as notas do tradutor.

Essas inserções e modificações no texto podem ser vistas, em primeiro lugar, pelas escolhas tradutórias de Bezerra que, em alguns momentos, diferem das escolhas dos tradutores de QLEBezerra (2015, p.10) explica que “[t]raduzir Bakhtin, além de ser um desafio extremamente difícil, é também arriscado”. Para ele, isso se dá pelo fato de que o tradutor está diante de “conceitos que abrangem todo um sistema de reflexões embasado em algo que talvez se possa chamar de filosofia estética” (BEZERRA, 2015, p.10). Nesse sentido, é possível destacar dois exemplos de diferenças tradutórias entre Bezerra e os tradutores de QLE. Em primeiro lugar, pensando nas categorias bakhtinianas, Bezerra ilumina muitos trechos dos ensaios com a utilização de termos teoricamente mais específicos. Como exemplo, encontramos a seguinte oração no ensaio Dá pré-história do discurso romanesco: “Pode-se notar cinco tipos de abordagens para o discurso romanesco” (BAKHTIN, 2002, p.364); na tradução de Bezerra, em Sobre a pré-história do discurso romanesco, lê-se: “observam-se cinco tipos de enfoque estilístico do discurso romanesco” (BAKHTIN, 2019, p.13). Observa-se que Bezerra utiliza termos específicos (“enfoque estilístico”) em vez de termos mais genéricos (“abordagem”). Em segundo lugar, é pertinente destacar a escolha tradutória de Bezerra diante de termos multissêmicos da língua russa, como a palavra slovo. Segundo Grillo e Américo (2017, p.364), o termo “tem um significado amplo, que compreende desde a unidade lexical até a ‘a linguagem verbal em uso’ ou o enunciado e o discurso”. Diante disso, o tradutor necessita fazer escolhas, levando em consideração as possibilidades tradutórias e o contexto teórico do termo no texto de partida. Por exemplo, no ensaio A palavra na vida e a palavra na poesia de Volóchinov (2019), Grillo e Américo explicam, na Nota do Tradutor 1, que a tradução de slovo como “palavra” se deu pelo fato de o ensaio estabelecer um diálogo mais direto com o manifesto dos futuristas russos intitulado Slóvo kak takovóie [A palavra como tal]. No entanto, esclarecem que a tradução como “discurso” seria favorecida pelo fato de que “a linguagem é considerada na relação com o seu meio social, com o criador e o contemplador, com a sua esfera de circulação etc.” (2019, p.109). Nessa esteira, ainda no primeiro ensaio de Teoria do romance III, verifica-se que a escolha de Bezerra também difere da escolha dos tradutores de QLE (BAKHTIN, 2002). Em Dá pré-história do discurso romanesco, lê-se: “Entretanto, nas condições do romance, a palavra tem uma existência inteiramente particular […]” (BAKHTIN, 2002, p.364). Já em Sobre a pré-história do discurso romanesco, percebe-se que Bezerra escolhe o termo “discurso”: “Entretanto, nas condições do romance o discurso vive uma vida totalmente específica […]” (BAKHTIN, 2029, p.14).

Além dessas diferenças tradutórias, é necessário que o leitor esteja ciente para o fato de que os ensaios que formam Teoria do romance III possuem trechos novos. Como já mencionado anteriormente, essa nova versão dos ensaios recupera trechos anteriormente cortados. Um exemplo disso é o primeiro parágrafo do ensaio O romance como gênero literário (BAKHTIN, 2019, p.65). Esse parágrafo traz uma explicação necessária da razão pela qual o autor teve de dedicar um espaço do ensaio que trata da teoria do gênero romanesco para uma discussão sobre a filosofia dos gêneros. Esse parágrafo não existe na tradução de 2002. De fato, o primeiro parágrafo da tradução de 2002 se inicia com a oração: “O estudo do romance enquanto gênero caracteriza-se por dificuldades particulares” (BAKHTIN, 2002, p.397). Esse é o segundo parágrafo da tradução de 2019, que se inicia com a oração: “A teoria do romance enquanto gênero distingue-se por dificuldades peculiares […]” (BAKHTIN, 2019, p.65).

Com essas breves notas, já é possível perceber a singularidade da nova tradução ao português brasileiro desses ensaios. Como mencionado anteriormente, além de uma tradução teoricamente mais específica e das incorporações textuais feitas, Teoria do romance III ainda recebe um ensaio de Paulo Bezerra em que não só explica a origem dos ensaios de Bakhtin, ou seja, as “duas conferências proferidas por Bakhtin nas reuniões do grupo de teoria da literatura organizado pelo professor Leonid Timofêiev no Instituto de Literatura Mundial Maskim Górki de Moscou” (BEZERRA, 2019, p.113), como também tece detalhes sobre os dois ensaios separadamente. Dessa forma, destaca, em Sobre a pré-histórica do discurso romanesco, o riso e a paródia, e o objetivo central do ensaio, e demonstra como O romance como gênero literário “[…] quebrou os paradigmas tradicionais nos estudos e enfoques da história e da teoria do romance” (BEZERRA, 2019, p.122).

Teoria do romance III, portanto, é uma obra de excelência, que deve ser lida por todos aqueles que estudam o romance pelas lentes bakhtinianas. Esse convite não é feito somente para aqueles que ainda não tiveram a oportunidade de ler os ensaios, mas também para aqueles que já os leram, discutiram, estudaram em QLE, pois poderão perceber o enriquecimento ao texto proporcionado por Paulo Bezerra, que, mais uma vez, utilizando-se dos seus conhecimentos linguísticos, literários, tradutórios e teóricos (em especial, da teoria dialógica), traz ao leitor um texto que é mais completo em si mesmo – com a inserção de todas as notas de Bakhtin suprimidas anteriormente e as notas e observações tão ricas do tradutor -, completando a Teoria do romance proposta por Bakhtin.

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Orison Marden Bandeira de Melo Júnior – Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Departamento de Línguas e Literaturas Estrangeiras Modernas, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil; junori36@uol.com.br.

Historia Crítica. Bogotá, Núm. 76 (2020)

Research Article

Publicado abril 1, 2020

Ensaios de filosofia da ciência | Pierre Duhem

La presente traducción portuguesa de una colección de textos del físico, filósofo e historiador de la ciencia Pierre Duhem se compone de ocho textos dispuestos en orden cronológico, de los cuales los cinco primeros corresponden a textos publicados en la Revue des questions scientifiques entre 1892 y 1896, mientras que los restantes aparecieron originalmente en Annales de philosophie chrétienne (1905), la Revue générale des sciences pures et appliquées (1908) y la Revue des deux mondes (1915). Cuenta, además, con un prefacio, un amplio y bien documentado estudio introductorio, una cronología, una bibliografía y sus respectivos índices de nombres y materias.

Si bien Duhem ha sido considerado un filósofo fundamental para la reflexión sobre las ciencias, a pesar de que él consideraba que sus contribuciones solo competían al ámbito de la física teórica, el conocimiento de su obra se limita por lo general a su libro La théorie physique, son objet et sa structure (1906). Sin embargo, esta obra capital fue traducida tardíamente en nuestro idioma (Duhem, 2003) mientras que la versión portuguesa apareció once años más tarde (Duhem, 2014); solo la versión castellana, además, se hizo a partir de la segunda edición de 1914, que añade como apéndice dos ensayos (“Physique du croyant” y “La valeur de la théorie physique: A propos de la publication d’un libre récent”) producto de su respuesta a los estudios de Abel Rey sobre su filosofía de la ciencia y sobre el rumbo de la física teórica a inicios del siglo XX (Rey, 1907). Por esta razón, la presente edición representa una aportación importante para adentrarse en el conocimiento de la obra del pensador francés entre el público de habla portuguesa y castellana. Leia Mais

¿Cómo pensaron el campo los argentinos? Y cómo pensarlo hoy, cuando ese campo ya no existe | Roy Hora

Este último libro de Roy Hora analiza la percepción del latifundio como problema social o económico a lo largo de casi dos siglos de reflexión intelectual y los efectos de esa persistente prédica, largamente compartida por las élites letradas urbanas argentinas de todos los signos ideológicos. La importancia y actividad de las mismas es también una marca distintiva del país: sólo para mencionar algunos de sus miembros: Pedro Andrés García, Domingo F. Sarmiento, Nicolás Avellaneda, Miguel A. Cárcano, Juan B. Justo, Emilio Coni, Eduardo Laurencena, Horacio Giberti. Aun a fines del siglo XX, esa tradición era sorprendentemente vital, en un énfasis de inspiración romántica. Es de destacar que ese diagnóstico fue durante mucho tiempo hegemónico, al punto que las tímidas voces disidentes nunca lograron hacerse oír. Un ejemplo es Saturnino Zemborain, cuyo La verdad sobre la propiedad de la tierra en la Argentina (Buenos Aires: Sociedad Rural, 1973), apenas trascendió. Con la ayuda de hemerografía relevante y fuentes gubernamentales y privadas, el libro de Roy Hora sitúa esas visiones en línea con la evolución de la estructura agraria y del mundo social y económico rural, así como con la política nacional. Es, por tanto, muy bienvenido, no sólo por la maestría con que trata una temática compleja, sino por la falta de suficientes análisis informados y las muchas ignorancias y estereotipos que persisten al respecto. Así, debe notarse que la anterior iniciativa comparable data de hace casi treinta años: el libro de Osvaldo Barsky, Marcelo Posada y Andrés Barsky, El pensamiento agrario argentino (Buenos Aires, Centro Editor de América Latina, 1992). Leia Mais

Agrarian Crossings: Reformers and the Remaking of the US and Mexican Countryside | Tore C. Olsson

In Agrarian Crossings: Reformers and the Remaking of the US and Mexican Countryside, Tore C. Olsson adeptly traces the ways that Mexican and US actors developed parallel and mutually influenced projects aimed to restructure the countryside during the 1930s and 1940s. In a fascinating account of individuals committed to transforming their societies, Olsson makes a powerful and convincing case that agrarian reforms, though situated in a specific geographic place, were not isolated occurrences but rather formed within a cauldron of exchange not bound to national borders. Moreover, this entangled history underscores how political decisions eroded small-scale agriculture in favor of large-scale production, a shift with continued profound environmental and social effects into the present. Leia Mais

Colonización y protesta campesina en Colombia (1850-1950) | Catherine Legrand

La segunda edición en español del ya clásico libro de Catherine LeGrand nos hace reflexionar nuevamente acerca de las razones históricas del conflicto agrario en Colombia. ¿Por qué y contra quién pelean los campesinos? ¿Qué es lo que quiere el campesinado? Estas son las preguntas que plantea LeGrand para intentar esclarecer las raíces del conflicto rural. Por ello, no es coincidencia que la reedición de Colonización y protesta campesina en Colombia se hiciera en 2016, en el contexto de la firma de los acuerdos de paz entre el gobierno de Juan Manuel Santos y la guerrilla de las FARC-EP; el primer punto del acuerdo se refiere justamente a la Reforma Rural Integral, ya que, una de las causas fundamentales del conflicto armado en Colombia han sido los problemas derivados de la colonización de las tierras públicas, dinámica que en este libro se analiza minuciosamente. Leia Mais

La revolución de los arrendires. Una historia personal de la reforma agraria | Rolando Rojas Rojas

A medio siglo de la Reforma Agraria promovida por el gobierno de Juan Velasco Alvarado (1968-1975), quedan muchas historias que contar y volver a contar. Más que conmemorar, la variedad de producciones culturales y publicaciones académicas que nos dejó el 2019 sirvió al Perú para interrogar el contestado legado de la reforma. El presente libro La revolución de los arrendires se destaca por su estilo testimonial. El historiador Rolando Rojas logra narrar una crónica en que confluye una historia personal -siendo nieto de uno de los protagonistas- y un análisis académico acerca de la agitación rural en años previos al decreto de 1969.

Lo que guía al autor son los íntimos recuerdos de familias campesinas del valle de La Convención, Cusco, sobre un evento dramático en 1956. En aquel año, un grupo de convencianos -entre ellos Tomás Rojas Pillco, abuelo del propio autor- conspiró para atentar contra la vida de Alberto Duque Larrea. Los primeros eran “arrendires” de Duque, un hacendado poderoso, no sólo en tierras, sino también en influencia política y jurídica en el valle. Para ellos, Duque era la personificación de un régimen profundamente desigual e injusto con el que decidieron acabar. El término “arrendires” dio el título al libro y llama inmediatamente la atención de las y los historiadores agrarios. El “arrendire” surgió en la región del Cuzco para referir a los jornaleros a quienes el hacendado cedió el usufructo de una porción de tierra de su propiedad a cambio de una serie de obligaciones. El libro no analiza en detalle la evolución de esta figura y los cambios concomitantes en el acceso a la tierra, pero examina el papel de estos actores en dinamizar el contexto rural pre-reforma. Ante su inminente expulsión dos arrendires encontraron un aliado en Tomás Rojas y complotaron para asesinar al hacendado. El atentado quedó registrado en la prensa regional como “la conspiración de los arrendires”. Leia Mais

Dust Bowls of Empire: Imperialism/ Environmental Politics/ and the Injustice of “Green” Capitalism

El Dust Bowl que asoló varios estados del sur de Estados Unidos (Texas, Nuevo México, Colorado, Oklahoma y Texas) ha tenido diversas lecturas a lo largo de la historia y ha sido utilizado para justificar políticas sociales como el New Deal. En 1992, el historiador William Cronon analizó dos publicaciones de 1979 sobre el Dust Bowl, una de Donald Worster y otra de Paul Bonnifield, que partiendo del mismo tema y estando de acuerdo en los mismos hechos llegaban a conclusiones diferentes, demostrando que un conjunto de hechos podía dar lugar a varias narrativas. Este trabajo se hizo sin embargo desde una óptica regional sin considerar los antecedentes, y al igual que el de Lockeretz (1978), ignoró la violenta confrontación de los colonos, el estado estadounidense y las organizaciones privadas con las naciones indígenas. Holleman, en cambio, parte de un enfoque interdisciplinar, que vincula este desastre natural de raíces antrópicas con el proceso actual de Cambio Climático. Por esto, resulta interesante para profesionales de diversas áreas como historiadores, sociólogos, ambientalistas y politólogos. Leia Mais

Watering the Revolution: An Environmental and Technological History of Agrarian Reform in Mexico | Mikael Wolfe

El agua suele ser una capa material poco abordada en el estudio del mundo agrario, tanto en América Latina como en el mundo. De hecho, se puede argumentar que analizar el campo como un espacio hídrico –configurado por vertientes, cuencas, canales, ríos, lagos, lagunas, reservas y, acaso más importante, derechos de agua– resulta un ejercicio mucho más complejo y posiblemente más fructífero que cuando se le ve como un “simple” espacio terrestre. Aunque la lucha por los derechos de la tierra ha dominado las narrativas históricas de las comunidades agrarias y los sujetos rurales de esta parte del mundo, existe otra historia por contar en clave hidrológica que da cuenta de los conflictos desatados por el elusivo control y la explotación del agua. Watering the Revolution es el estudio pionero de Mikael Wolfe que ofrece una primera mirada tecnomedioambiental sobre la reforma agraria post-revolucionaria en México. El libro es el resultado de un prolijo estudio de la región nor-central de la Comarca Lagunera, un espacio irrigado por los ríos Nazas y Aguavanal. La topografía de esta región produce una excentricidad medioambiental dado que ninguno de estos ríos desemboca en el océano, sino que producen una serie de lagunas cuyas cuencas sostienen regímenes de agricultura intensiva. En 1936, la riqueza hídrica de la Comarca Lagunera condujo a Lázaro Cárdenas a construir la primera represa del México post-revolucionario. Wolfe documenta el proceso de transformación de los regímenes hídricos producto de la construcción de esta represa, el papel de los técnicos agrarios en diseñar infraestructura y políticas públicas para un nuevo gobierno del campo y el desigual acceso al agua que subyació al reparto de tierras, entendido comúnmente como el aparente gran triunfo de la Revolución Mexicana. Leia Mais

Soberanías fronterizas: Estados y capital en la colonización de Patagonia (Argentina y Chile, 1830-1922)

State colonization is an ongoing and lively academic topic that challenges standard histories of nineteenth-century nation-building in Latin America. Soberanías Fronterizas: Estados y Capital en la colonización de Patagonia by Alberto Harambour falls within that historiographical heritage, demonstrating that a transnational history guided by postcolonial theory can offer a fresh interpretation of archival documents and historical events. Soberanías Fronterizas is a trans-Andean history that uses a global framework, examining the process of state colonization by the republican governments of Chile and Argentina in the southernmost Patagonia territories of Magallanes and Santa Cruz (and Tierra del Fuego), respectively, from 1830 to 1922. The book is organized into four thematic chapters; the first two explore the judicial constructions that were used by the dominant forces to colonize the territory and the second two analyze the development and institutionalization of the new economic and political powers. Leia Mais

Costa Rica después del café. La era cooperativa en la historia y la memoria | Lowell Gudmundson

Es importante indicar que el trabajo que aquí se comenta guarda relación con otro publicado en 1990 por el mismo autor bajo el título Costa Rica antes del café. Sociedad y economía en vísperas del boom exportador. En esa primera obra analizó las desigualdades que caracterizaban a la sociedad precafetalera, mientras que en esta se centra en las particularidades de la segunda mitad del siglo XX, la que el autor reconoce como la “era del cooperativismo costarricense” vinculado al sector cafetalero.

Desde el punto de vista metodológico es un libro de síntesis, ya que reúne las experiencias y las pesquisas de más de tres décadas, lo cual la convierte en una obra sin par en la historiografía cafetalera de Costa Rica. En este proceso se trabajó en la digitalización y análisis de censos, así como en el Archivo Nacional con alrededor de mil expedientes de mortuales (proceso sucesorio) que se cruzaron con los datos de censos para reconstruir un perfil del cafetalero costarricense de la segunda mitad del siglo XX. Este trabajo de indagación fue acompañado por una extensa cantidad de entrevistas con productores de café desde la década de 1980. Finalmente, y no menos importante, el autor realizó un análisis detenido de las investigaciones que sobre el tema se fueron publicando hasta el presente. Leia Mais

Historia rural de Chile central. Tomo I. La construcción del Valle Central de Chile | José Bengoa

Aunque el autor declara que ha llevado a cabo “la completa reescritura de este trabajo, llegando ser el presente un libro totalmente original” (p.18), en realidad este no es un libro nuevo ni original, sino una reedición de El poder y la subordinación (1988), uno de los dos textos que publicó con el subtítulo Historia social de la agricultura. En efecto, sólo el primer capítulo de esta reedición es un texto nuevo, aunque tampoco resulta original, pues, como todo el libro, está basado en una literatura muy desigual en términos de calidad y actualidad. Así, entonces, el propio autor precisa que “Los capítulos que siguen son versiones corregidas de anteriores publicaciones que, con fuertes cambios de perspectiva, mantienen cierta continuidad” (p. 16). Sin embargo, en esta reedición no hay “versiones corregidas” ni nucho menos “cambios de perspectiva”. Se trata del mismo texto de 1988, el cual el autor ha modificado incorporando un número importante de notas de pie de página al texto principal, cambiando las oraciones iniciales de algunos párrafos, agregando frases breves al comienzo de otros, absorbiendo citas a trabajos de otros autores como propias, cambiando algunos títulos de secciones y, sobre todo, alterando la secuencia de secciones y párrafos de distintos capítulos, de manera de componer capítulos que parecieran ser nuevos, pero no lo son. Leia Mais

Historia Agraria de América Latina. Santiago do Chile, v. 1, n.01, april, 2020.

Presentación

Artículos

Reseñas

The death of nature: women, ecology, and the Scientific Revolution | Carolyn Merchant

Lançado em 1980, The death of nature completa, em 2020, 40 anos de publicação e ainda carecia de uma resenha em português. Apesar do tempo passado desde o lançamento, o livro de Carolyn Merchant apresenta algumas reflexões e contribuições ainda atuais.

Merchant é professora emérita da University of California, Berkeley, e possui publicações nas áreas de epistemologia feminista, história ambiental e história das ciências. É uma das referências do ecofeminismo, movimento que associa ecologismo e feminismo, identificando relações entre a exploração da natureza e das mulheres. Contudo, ainda hoje a autora tem pouca inserção nos cursos e programas de história ambiental e das ciências no Brasil, sobretudo quando a comparamos com outras autoras feministas, como Evelyn Fox Keller e Donna Haraway. Entretanto, isso não é exclusividade brasileira. Apesar do interesse do campo ambiental e feminista, o livro foi marginalizado por historiadores anglófonos e filósofos da ciência moderna, além de ter encontrado um “clima frio” para sua recepção dentro da historiografia da ciência ( Park, 2006 ). Leia Mais

Hospitais e saúde no Oitocentos: diálogos entre Brasil e Portugal | Cybelle Salvador Miranda

Por um vasto oceano uniram-se dois continentes, com uma língua e um passado partilhados. Entre as viagens, sobreveio um profícuo e interessante linguajar oitocentista entre vários actores e instituições portugueses e brasileiros. Essas “conversas”, influenciadas por uma Europa de referência elitista, por um maior poder económico e um rápido incremento de estatuto social, foram cruciais para a apropriação e a utilização de conceitos na arquitetura da época. Cybelle Salvador Miranda e Renato da Gama-Rosa Costa, no livro Hospitais e saúde no Oitocentos: diálogos entre Brasil e Portugal , publicado em 2018, pela Editora Fiocruz, organizam relatos históricos de uma viagem icónica entre esses dois mundos que, aparentemente diferentes, beberam da mesma fonte.

Os diversos poderes imperiais e não imperiais que, nesse arco cronológico, sofreram metamorfoses são, também, agentes produtores de registos cruciais, pois, em última análise, a decisão é um poder executivo. Nessa obra, não são apenas os detalhes históricos centrados em sistemas governativos, mas também as visões dos doentes para com os seus decisores, invertendo a narrativa para ilustrar a importância da doença e do tratamento – o relato pelas elites resulta, normalmente, numa linha histórica rapidamente solúvel. As diversas peças do puzzle são extensivamente analisadas nos textos, entre as quais a questão da mudança da direcção médica das instituições, a consolidação científica, a título de exemplo. A arquitetura é um “espelho de Alice” que, além de refletir imagens da sua realidade, revela, por detrás, um mundo desconhecido de premissas e locuções – as mesmas que, também, o livro desvenda. Leia Mais

Mandarin Brazil: race, representation, and memory. | Ana Paulina Lee

A obra Mandarin Brazil , premiada como melhor livro em humanidades na seção Brasil pela Latin American Studies Association, é uma leitura importante para a compreensão das representações dos chineses na cultura popular brasileira. O livro remonta a construção e ressignificação dos estereótipos raciais associados ao imigrante chinês na literatura, na música e no teatro nos séculos XIX e XX. A obra extrapola o enfoque da historiografia nacional sobre os debates e as construções raciais em torno da imigração chinesa entre 1850 e 1890. Ana Paulina Lee (2018) priorizou a elaboração, reprodução e apropriação da chinesness , expressões culturais que elaboram conceitos e estigmas raciais referentes à China e aos seus habitantes. Essas imagens foram concebidas e apropriadas em meio a um intenso diálogo global fortalecido após a abolição do tráfico negreiro. Tais representações circulam dentro de uma memória circum-oceânica, um processo criativo por meio do qual a cultura da modernidade se inventa ao transmitir um passado que pode ser esquecido, recriado ou transformado em uma memória coletiva. Leia Mais

El trabajo clínico psiquiátrico en el Buenos Aires del siglo XX | Alejandra Golcman

El libro de Alejandra Golcman El trabajo clínico psiquiátrico en el Buenos Aires del Siglo XX es el resultado de una tesis de doctorado en ciencias sociales, producto de una investigación de 5 años de duración. El texto explica principalmente cómo las prácticas de los médicos del hospital psiquiátrico de mujeres J.A. Esteves, de Buenos Aires, Argentina, fueron influenciadas, atravesadas e, incluso, modificadas por el contexto social y cultural, durante el período 1908-1971. Este trabajo se aleja de la histoedria tradicional, con foco en las grandes figuras o corrientes teóricas, y se inscribe dentro de una perspectiva de historia cultural de la psiquiatría.

Los principales aportes del libro residen, en primer lugar, en la estrategia metodológica utilizada a lo largo del texto. El planteo cuantitativo y cualitativo le ha permitido a la autora analizar, tanto la población hospitalaria en general como los casos particulares del hospital. En segundo lugar, es destacable el trabajo realizado con historias clínicas. Golcman adhiere a un enfoque donde cobra relevancia la pregunta por la cotidianeidad del trabajo clínico de los profesionales y la vida de los pacientes dentro de las instituciones psiquiátricas. La centralidad de estos aspectos en el libro resulta, entonces, su contribución fundamental. Cabe aclarar que Golcman inscribe su investigación en perspectivas que ya vienen siendo trabajadas, hace por lo menos 10 años, fundamentalmente por equipos de investigación de España y México ( Huertas, 2012 ; Ríos Molina, 2017 ) en el marco de la Red Iberoamericana de Historia de la Psiquiatría. De esta manera, en lo que se refiere específicamente al contenido del libro, la autora comienza su texto brindando una mirada sobre los diagnósticos de demencia precoz y esquizofrenia en el plano teórico, como los cuadros clínicos emblemáticos de la época, y también como los cuadros más representativos dentro de los casos clínicos analizados por la autora. Golcman realiza un abordaje de las ideas de los psiquiatras argentinos de aquel momento por medio de un análisis de artículos en revistas médicas, libros y tesis doctorales. Así, en el primer capítulo, la investigadora desarrolla el trabajo de esos autores, teniendo en cuenta las apropiaciones que ellos realizaron en el contexto local y mostrando que esas nociones también fueron redefiniéndose y reconstruyéndose con el correr de los años, en ese país. Leia Mais

O pêndulo de Epicuro: Ensaio sobre o sujeito e a lógica de uma história sem finalidade – Kant, Freud e Darwin – BOCCA; PEREZ (RFMC)

BOCCA, Francisco Verardi; PEREZ, Daniel Omar. O pêndulo de Epicuro: Ensaio sobre o sujeito e a lógica de uma história sem finalidade – Kant, Freud e Darwin. Curitiba: CRV,2019. Resenha de: ARMILIATO, Vinícius. Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.8, p. 449-455, n.1, abr, 2020.

Nos confins da história da noção de história

O Pêndulo de Epicuro trata-se de mais uma publicação da parceria entre Francisco Verardi Bocca e Daniel Omar Perez. Se em publicação anterior, Ontologia sem espelhos (PEREZ;BOCCA;BOCCHI, 2014), que contou também com a parceria de Josiane Bocchi e no último ano ganhou uma tradução para o francês1, os autores fazem uma história da noção de realidade desde Descartes até Freud, na obra presente fazem a história da ideia de história que figura de modo subjacente às elaborações de Kant, FreudeDarwin. E analisando detalhadamente cada autor, apresentam como visualizam na história um rumo, um percurso ou mesmo uma tendência, de modo que ora se aproxima do legado de Epicuro, ora se afasta desta. Perguntam-se: Seria curso da história ascendente, regressivo, assintótico, cíclico ou mesmo, sem qualquer rumo? Caso não houvessem rumos possíveis, se os acontecimentos ao longo na história nada mais fossem do que o resultado da pura aleatoriedade dos acontecimentos humanos, poderíamos dizer que seu curso nada mais seria do que o efeito da seleção de acontecimentos dada pelo viés teórico do autor que diz algo sobre a história? Ainda, é possível conceber um modelo de análise da história que ofereça visualidade para a contingência e aleatoriedade dos acontecimentos da vida? São essas as questões que figuram como objeto central de O pêndulo de Epicuro. Trata-se de um trabalho minucioso e necessário. Minucioso, pela precisão e verticalidade com que abordam os autores. Nesse caso, textos marginais são evocados em paralelo aos mais célebres, além de revelarem movimentos internos e pendulares a cada autor (por exemplo, os diferentes pesos que Darwin confere à variação e à seleção ao longo de suas publicações). Necessário, enquanto trabalho que permite encarar os modos como a história é concebida e, consequentemente, observar os efeitos de tais visadas. Assim, seja uma história que marcha para um futuro promissor, seja uma história que declina ou mesmo uma história que não tem rumo, em cada uma dessas posições tem-se o fundamento ou a justificativa para a forma como a sociedade se relaciona com seu presente: devemos voltar ao passado? é no futuro que encontramos tempos melhores? O presente é o passado corrompido, degenerado? O presente é um futuro inacabado que deve ver no porvir um modelo a se alcançar? Tais questões, também abordadas na obra, não deixam de ser importantes para o mais contemporâneo dos debates sobre os rumos da civilização, da governança e da ética.

O livro conta com uma apresentação assinada por Eládio C. P. Craia, a qual leva às últimas consequências os argumentos da obra. O pêndulo de Epicuro propõe três principais capítulos, ou ensaios, dedicados a Kant, Freud e Darwin. Além disso, em sua Introdução, apresenta uma revisão objetiva e cuidadosa das leituras que visualizaram tendências na história das civilizações, como o fez Herbert Butterfield, Michel Meyer, Arnold Toynbee e Oswald Spengler, e também autores contemporâneos, tais como François Hartog.

Já nas primeiras linhas da apresentação do livro, intitulada A irrupção dos acontecimentos, encontramos o anúncio da falência na busca por uma ordem finalista da história: “Todos reconhecem que a natureza, assim como as sociedades humanas, nos seus devires, manifestam a cada instante emergências que julgávamos impossível. Sempre nos desconcertam, contudo, não desistimos de buscar suas lógicas, seu sentido histórico” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 23). Nesse sentido, a reflexão filosófica encontrou entendimentos da organização do tempo que só com Darwin é que se pôde enfraquecer “uma perspectiva de história universal e finalista, indissociável do futuro e do progresso” (BOCCA; PEREZ,2019,p. 23). Darwin teria retomado o modelo epicurista onde o presente, a aleatoriedade e a contingência seriam justamente os fatores que organizam a vida e seu percurso. O interesse por esse fato, da ausência de finalidade presente em Epicuro resgatada pela biologia evolutiva da segunda metade do século XIX” permite compreender os fatos naturais e históricos prescindindo, entre outras coisas, do futurismo assim como do passadismo, mas sobretudo, das ilusões da modernidade” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 24). Por conta disso é que no primeiro capítulo Kant é explorado, dado que tal autor procurou, conforme a o trabalho de Bocca e Perez mostra, desqualificar a perspectiva epicurista. Toda a ocorrência, todo o acontecimento, sedaria enquanto efeito de uma tendência mecânica causal. Em Kant “os elementos não são determinados contingentemente, mas recebem, por uma mecânica cega, determinação segundo leis gerais concebidas por uma sabedoria suprema” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 58). Kant viria então a substituir a contingência e o acaso por um programa de leis e tendências que orientaria o desenvolvimento da natureza. As predisposições para o progresso aparecem em vários trabalhos de Kant, como por exemplo em Ideia de uma história de um ponto de vista cosmopolita (1784), quando o autor apresenta o fio condutor da história humana que “ordena o desenvolvimento das disposições naturais do ser humano para o que chamou de cosmopolitismo” (BOCCA;PEREZ,2019,p. 62). Os autores mostram tais acepções em trabalhos posteriores, até em 1798 em O conflito das faculdades onde, novamente, a partir da Revolução Francesa, Kant apresenta “um tipo de acontecimento exemplar na experiência da humanidade que indica a aptidão humana para o progresso” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 86). Nesse sentido, articulando o passado, o presente e o futuro a partir dos acontecimentos em solo francês, vê-se o filósofo autorizar-se a “um tipo de predição acerca do futuro das sociedades humanas, de modo a fazer da ideia de República algo mais que uma quimera” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 87). Trata-se então, de uma tendência de aprimoramento da espécie reconhecida nos seres humanos, mesmo que seja, como ressaltam os autores, em uma curva assintótica em relação aos seus objetivos.

A ideia de uma curva assintótica que tende a alcançar o progresso de uma sociedade é bastante importante na comparação com o que seria uma filosofia da história em Freud, apresentada no segundo capítulo. Enquanto a tendência ao progresso é visualizada por Kant, a tendência à regressão é patente nas construções freudianas. Freud tratar-se-ia de um autor “declinista”. Tal leitura se ampara na análise de que Freud visualizou nas leis da termodinâmica que a tendência crescente de entropia nos fenômenos da matéria leva a seu desgaste total, à sua morte. Ao afirmar esta tendência ao aniquilamento como nodal na psicanálise freudiana de modo bastante original, os autores, evitando um contra-argumento de um Freud não-declinista, indicam que em sua obra há sim dois movimentos: um emancipatório e ascendente – visto na clínica – e um propriamente declinista – notado na metapsicologia. E é esta última que irão explorar no segundo ensaio, ambicionando entender qual seria a filosofia da história que através desta se decalca da psicanálise. Para eles, a metapsicologia “apresenta um determinismo naturalista composto de um certo ponto de vista evolucionista da Biologia a um ponto de vista entrópico da Física” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 89). Assim, se a clínica porta um papel emancipatório às amarrações psíquicas do paciente, o “jogo” entre o Princípio de Prazer e o Instinto de Morte leva à vitória deste último e, apesar do trabalho clínico e de desenvolvimento psíquico poder postergá-lo, jamais aniquilará seu próprio fim. Nesse âmbito, a especulação metapsicológica freudiana com o material empírico obtido em sua clínica “põe em jogo, o otimismo do esclarecimento e da autonomia do paciente ao finalismo declinista das forças entrópicas que o habitam”(BOCCA; PEREZ, 2019, p. 90). É essa aparente contradição que é investigada ao longo do capítulo e que permite notar a particularidade da ideia de história desde a perspectiva freudiana, cuja vida, a civilização e sua história, se situariam “Entre a abertura para o futuro e o declínio inexorável” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 90). Como lembra Freud em Além do princípio do prazer (1920), a finalidade da vida é atingir a morte. Aqui é preciso ressaltar que os autores resgatam em textos de Freud anteriores a este que acabamos de citar, a mesma perspectiva, declinista, embora ainda não tão explícita. Desse modo, evitam ler as tendências à regressão indicadas na década de 1920 por Freud como uma ruptura com o corpus anterior de sua obra.

Antes disso, estaria coerentemente em continuidade com trabalhos anteriores. Por exemplo, em Moral sexual civilizada e doença nervosa moderna (1908), Freud já havia ressaltado que o processo civilizatório atenta contra si mesmo: a doença nervosa é o dano da civilização. Fazendo analogias com máquinas a vapor, Freud considerou que a sublimação não é capaz de redirecionar toda a força instintual “da mesma forma que em nossas máquinas não é possível todo o calor em energia mecânica” (FREUD, 1908, apud BOCCA; PEREZ, 2019, p. 103). Nas palavras dos autores, nesta obra “Freud articulou o ponto de vista biológico evolucionista a um ponto de vista físico entrópico, atribuindo à natureza, ao homem e à civilização, uma evolução cuja finalidade seria a exaustão e o declínio”(BOCCA;PEREZ,2019, p. 104).

Ora, se uma curva é assintótica em relação ao progresso (Kant) e a outra em algum momento após certa ascensão regride para o estado anterior de repouso (Freud), haveria ainda uma terceira via (Darwin), que não comportaria nenhum direcionamento. No último capítulo, Darwin é aborda do como alternativa que mais se aproxima de Epicuro, ou seja, com o pêndulo retornando a uma perspectiva que permite visualizar uma história sem finalidade.

É então no último capítulo que irão indicar uma leitura alternativa a qual subscrevem na conclusão do livro, como veremos adiante, para um entendimento próprio da história. Para tanto, exploram como a ideia de variação ressaltada por Darwin torna-se fundamental para a compreensão de um curso da história sem finalidade, haja vista o reconhecimento pelo evolucionismo darwiniano de que é a produção aleatória de pequenas variações a cada descendência que, em interação com o meio (o qual também não é estável), conduz modificações à história da espécie (trata-se nada mais que o mecanismo da seleção natural). Quanto à descendência das espécies “Darwin retoma e reafirma o ponto de vista de Epicuro, ao concebê-la como não teleológica, como imprevisível” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 130). As objeções possíveis a tal asserção são debatidas através de comentadores mais recentes (tais como Thierry Hoquet, André Pichot, Vittorio Hosle e Dieter Wandschneider), especialmente quando se viu teleologia em concepções darwinianas, como nas ideias de struggle for life, complexificação e progresso. Quanto a este último, os autores afirmam: “[…] o que quer que tenhamos em mente quanto ao progresso e ao aperfeiçoamento, só pode ser referido, não a uma meta, mas contingencialmente a partir da relação que cada criatura de uma espécie mantém com as condições de sua existência” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 137). Algo que se reforça em trabalhos posteriores a Darwin, como na genética mendeliana redescoberta em 1900 por Hugo de Vries e na síntese moderna (Ernst Mayr e Julian Huxley). Trata-se de um conjunto de trabalhos que trouxeram para o debate “temas e conceitos como mecanismo, evolução cega, acaso, contingência, aleatoriedade, probabilidade, entre outros” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 138). Ainda, o papel da variação para a diversidade da vida segue sendo considerado no cenário pós-Darwin, notadamente a partir da biologia molecular. Os autores utilizam sobretudo os trabalhos de vulgarização dos biólogos ganhadores do Nobel de Medicina de 1965, Jacques Monod, François Jacob e André Lwoff. Tais autores consideram que “a variação por mutação, que impulsiona a evolução, não seria de modo algum um fenômeno de exceção, mas ao contrário, quem sabe, a regra. Residiria no seio da natureza. Monod reafirma o ponto de vista de que a própria conservação da vida seria dependente da novidade” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 150).

Ao final da leitura dos três ensaios principais do livro, torna-se evidente como os autores se posicionam favoravelmente ao entendimento da história enquanto algo que porta um fluxo descontínuo e aberto à singularidade. Mas quando chegamos às considerações finais, vemos o que poderíamos chamar de “quarto ensaio” cujo autor seria Georges Canguilhem.

A conclusão de O pêndulo de Epicuro parece prenunciar o que seria a continuidade do trabalho ora desenvolvido. Isso porque em seu capítulo conclusivo exploram, ainda que sumariamente, mas com bastante precisão, a mirada de Canguilhem sobre o tema, especialmente quanto ao modo como este se apropria da leitura darwinista junto aos desdobramentos da biologia evolutiva da primeira metade do século XX. Referimo-nos à ideia de progresso e de finalidade, atreladas às noções de cópia e de erro utilizadas nos estudos de genética analisados em diferentes textos de Canguilhem. Para tanto, situam a crítica que este faz a leituras da biologia da década de 1960 quanto ao uso que fazem da ideia de erro (erro na cópia, na transcrição gênica), notadamente nos trabalhos dos ganhadores do PrêmioNobelde1965. Canguilhem entende que tais usos são “consequências da ilusão moderna de progresso e finalidade” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 164). Isso porque a variação, elemento fundamental para a produção de novas formas vivas, acaba se tornando um equívoco da natureza quando são entendidas enquanto “erros”: “munido da noção de erro, o geneticista alimenta a expectativa de que a natureza reproduz o padrão que ele próprio julga ter reconhecido nela” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 169). No entanto, a vida pode ser entendida como produção incessante de variação, de diferença e singularidade, e assim, não passível de ser reduzida a um tipo ideal, não havendo possibilidade de entender a diferença enquanto equívoco ou malogro. Tudo dependerá de suas relações com o meio. Tais leituras da biologia “não consideram suficientemente que o que chamam erro seria a própria condição da evolução” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 169). Anunciam então nas últimas páginas do livro que, ao se manter essas categorias não só se abre para o retorno do pêndulo a noções de progresso e de finalidade, mas também para a eugenia, para a “expectativa de correção de seu erro”. Em suma, a sobrevivência de noções como cópia e erro dificulta o abandono da ideia de progresso e finalidade ontológica da natureza e, segundo Bocca e Perez, só o abandono destas “abriria em definitivo as portas para a emergência do possível, onde ser vivo e ambiente seriam partes de um meio biológico sempre a se constituir” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 171). Em suas últimas palavras, são bastante precisos ao lembrar que a crítica de Canguilhem, a qual apresentam na sequência aos três ensaios de história da noção de história propostos ao longo de O pêndulo de Epicuro, sabe a que veio, pois “denuncia a fragilidade da iniciativa histórica de classificação dos seres vivos, especialmente a que sugere e sustenta a presença de um fio condutor de continuidade evolutiva, um poderoso instrumento de apoio para teses e ações racistas e eugênicas que merecem combate por toda parte” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 177). Lembram, por exemplo, a reintrodução do criacionismo via design inteligente, movimento presente na biologia contemporânea. Trata-se, portanto, de se estabelecer um combate contratais leituras cuja estratégia é sugerida nas últimas palavras do livro: “Que não se perca Epicuro de vista” (BOCCA; PEREZ, 2019, p. 177).

Entendemos que O pêndulo de Epicuro é uma ferramenta teórica densa para amparar a defesa da diversidade e singularidade das formas vivas, dado que a leitura do trabalho de Francisco Bocca e Daniel Perez subjaz um ideal, o de que os indivíduos não sejam lidos como mais ou menos próximos a uma finalidade arbitraria, artificial e historicamente constituída.

Em um momento no qual os apelos à finalidade, à refutação da diferença e à religião penetram a ciência e a filosofia, temos, nesta obra, uma reflexão filosófica condizente com nossas demandas atuais.

Nota

1 PEREZ, Daniel; BOCCA, Francisco Verardi; BOCCHI, Josiane Cristina. Ontologie sans mirroirs, essai sur la réalité – Borges, Descartes, Locke, Berkeley, Kant, Freud. Tradução de Isabelle Alcaraz. Paris: L’Harmatan, 2019.

Vinícius Armiliato – Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Atualmente realiza pesquisa de pós-doutorado na mesma instituição, como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). E-mail: vinicius.arm@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2288-3820

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Patrimônio histórico / Revista do IHGRS / 2020

O espaço destinado ao estudo e divulgação de trabalhos desenvolvidos em prol da preservação do patrimônio pelo I Seminário Internacional Sobre Patrimônio Histórico se amplia e complementa nesta edição, dando oportunidade ao universo de leitores, interessados pela cultura de nosso país, de conhecer alguns dos trabalhos de referencia apresentado no Evento.

Em uma sociedade onde os bens culturais são pouco valorizados, edificações de valor histórico e arquitetônico não são preservadas e monumentos são pichados e vandalizados, há de se questionar que atitudes podem ser tomadas para reverter esse quadro.

O reconhecimento da sociedade quanto ao seu patrimônio cultural é o primeiro passo para a apropriação e posterior zelo e manutenção deste legado. E esta atitude passa pelo questionamento do quê é patrimônio cultural e pelo desafio de compreendê-lo, reconhecê-lo e conservá-lo, tornando-o economicamente sustentável, ou seja, passa pelo exercício da nossa cidadania.

A cidade é um organismo vivo sempre em mutação. Ela reflete os pensamentos e os sentimentos das gerações que a construíram. Sua paisagem urbana é o verbo que se concretiza e que nos denuncia. Ali estão materializados nossos valores, desejos, erros e acertos que ao se somarem deixam como legado a experiência vivida por àqueles que nos precederam. E como forma de herança cultural estas experiências se fazem registrar por bens materiais e imateriais que muitas vezes passam despercebidos por nós. Ao nos debruçarmos sobre seu conhecimento trabalhamos um presente mais rico e edificante. Proteger é salvaguardar estes ensinamentos.

Não se pode esperar apenas ações governamentais, muitas vezes tardias e ineficientes, é importante a conscientização dos cidadãos e atitudes concretas da comunidade que sirvam de exemplo para atingir o objetivo de proteção e preservação do Patrimônio.

Em setembro de 2019 a Associação Victorino Fabião Vieira-AVFV, entidade voltada para o resgate do nosso patrimônio histórico, promoveu o I Seminário Internacional sobre o tema, reunindo pessoas de várias cidades do Brasil e do mundo para uma abordagem interdisciplinar. A AVFV foi criada com o objetivo maior de preservação da história e patrimônio cultural, como fator essencial para a compreensão do presente e preparação do futuro de uma sociedade. Sua primeira conquista foi a criação de lei que permitiu o tombamento e restauração do histórico Castelo Simões Lopes, na cidade de Pelotas-RS. O passo seguinte foi a realização de Seminários sobre Preservação do Patrimônio que motivaram a participação da população em geral e de inúmeros estudantes e profissionais das mais diversas áreas do conhecimento.

Desde então a entidade promoveu seminários anuais temáticos, sendo a princípio regionais, passando a ser nacionais e culminando em 2019 com a realização do I Seminário Internacional Sobre Patrimônio Histórico. O evento internacional foi viabilizado com o apoio da Assembléia Legislativa do RS, ESAPERGS, UFRGS, IPHAN, Escola da AGU e CMS, com espaço para publicação de artigos selecionados nas revistas da ESDM-Escola Superior de Direito Municipal e do IHGRGS-Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul,

O evento trouxe profissionais das áreas da ciência da conservação, restauração, educação patrimonial, legislação e turismo cultural objetivando assim, abordar não só a temática da conservação, mas também trazer a reflexão sobre a sustentabilidade deste patrimônio através de estudos de caso realizados na América do Sul e Europa. Possibilitou ainda conhecer um pouco mais do que se está produzindo, a nível internacional, nessa área. A participação de profissionais de países da Europa e America Latina fortaleceu o diálogo nas áreas Educação e Legislação Patrimonial, Restauração e Preservação e Turismo Cultural, quatro eixos temáticos adotados para a seleção dos trabalhos e que atendem aos objetivos da AVFV.

As palestras e a apresentação dos inúmeros artigos estendeu a discussão interdisciplinar sobre esse tema ouvindo e conhecendo sobre as ações desenvolvidas na preservação do patrimônio histórico e cultural em vários estados do Brasil e exterior, em importante mobilização da sociedade em prol deste legado e do exercício da sua cidadania.

Não se pode negar a importância do legado deixado, como herança entre as gerações, pelos nossos antepassados. O significado de patrimônio cultural diz respeito a bens comuns compartilhados entre os cidadãos e que são característicos da identidade da coletividade, sendo parte indissociável da nossa história e de nossa cultura. A preservação do Patrimônio Histórico é indiscutível, é determinação constitucional e legal e deve ser levada a sério não apenas pelo Estado e pelos governantes, mas pela sociedade em geral e seus cidadãos

É necessário lutar, não apenas pela preservação, mas igualmente pela valorização e divulgação do que temos de valor, mantendo nosso patrimônio e também construindo para as gerações futuras. É história e referência da cultura que caracterizam a identidade de uma região. Assim se estará contribuindo com a memória e identidade urbana, fazendo de nossas cidades conscientes do valor do seu passado.

Os artigos que compõe esta edição fizeram parte dos inúmeros trabalhos desenvolvidos em várias cidades do país e apresentados no Seminário Internacional. Por certo dever servir como estímulo as ações dos que realmente defendem a causa da preservação do nosso Patrimônio. Boa leitura.

Porto Alegre, 13 de abril de 2020.

Miguel Frederico do Espírito Santo – Doutor. Presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul

Patrícia Trunfo – Mestre. Organizadores do Número Especial Dossiê Patrimônio Histórico.

Paulo Edi Rivero Martins – Doutor. Organizadores do Número Especial Dossiê Patrimônio Histórico

Verônica Di Benedetti – Mestre. Organizadores do Número Especial Dossiê Patrimônio Histórico.

Antônio Carlos Hohlfeldt – Doutor. Comissão da Revista.

Fábio Kühn – Doutor. Comissão da Revista.

Heinrich Hasenack – Mestre. Comissão da Revista.

Gustavo Castagna Machado – Doutor. Comissão Executiva.

Márcia Piva Radtke – Bacharelanda. Comissão Executiva.

Priscila Pereira Pinto – Bacharelanda. Comissão Executiva.

Thais Nunes Feijó – Mestra. Comissão Executiva.

Wagner Silveira Feloniuk – Doutor. Comissão Executiva.


ESPÍRITO SANTO, Miguel Frederico do; TRUNFO, Patrícia; MARTINS, Paulo Edi Rivero; BENEDETTI, Verônica Di; HOHLFELDT, Antônio Carlos; KÜHN, Fábio; HASENACK, Heinrich; MACHADO, Gustavo Castagna; RADTKE, Márcia Piva; PINTO, Priscila Pereira; FEIJÓ, Thais Nunes; FELONIUK, Wagner Silveira. Prefácio. Revista do IHGRS. Porto Alegre, n.157, 2020. Acessar publicação original [DR]

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Revista Brasileira de História. São Paulo, v.40, n.83, 2020.

Sumário

 Editorial

 Artigos

 Resenha

Datos/pruebas e ideas. Por qué los científicos sociales deberían tomárselos más en serio y aprender de sus errores | Howard Becker

¿Qué tienen en común la explosión del Challenger en el cielo de Cabo Cañaveral con una encuesta que arroja datos imprecisos sobre el vínculo entre el aislamiento y las nuevas tecnologías de la comunicación? En Datos, pruebas e ideas Howard Becker propone una respuesta simple, pero no por ello exenta de justificaciones, a esta pregunta: naturalizar el error a la hora de llevar adelante una investigación. Dicho de otro modo: saber que hay problemas e inexactitudes, pero como “todos” lo hacen de esta forma y “siempre” se hizo así, eludirlos y seguir adelante. Incluso a costa de arriesgar vidas humanas o sacrificar la precisión de los datos recolectados y la credibilidad del conocimiento obtenido. Leia Mais

Tristes por diseño. Las redes sociales como ideologia | Geert Lovink

Con un estilo narrativo que nos interpela como usuarios de redes y plataformas, en Tristes por diseño…, Geert Lovinkrealiza un llamado a la consolidación de los estudios sobre Internet que quiten el dominio disciplinar a las escuelas de negocios y geeks reproductores de los esquemas de Silicon Valley. El libro consiste en una exploración de posibles alternativas de organización ante los modelos de redes actuales, a partir de un osado diagnóstico en el cual la realidad social es comprendida como una hibridación entre medios portátiles y la estructura psíquica de los usuarios. ¿Cómo liberarnos del nihilismo de las plataformas y hacer que lo social tome el mando dentro de las redes sociales?, ¿cómo escapar de la identidad de consumidor?, ¿cómo construir una identidad colectiva en las redes?, son algunas de las preguntas que traman este trabajo. Leia Mais

Cooperação Sul-Sul/ Democracia e Decolonialidade: estudos sobre os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOPs) | AbeÁfrica – Revista da Associação Brasileira de Estudos Africanos | 2020

O presente Dossiê surgiu a partir do contato dos organizadores com a discussão sobre a realidade social, cultural, econômica e política dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, os PALOPs, no âmbito da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), que completou dez anos em 2020, e cujo projeto se relaciona à cooperação solidária para o desenvolvimento entre o Brasil países de África e Ásia através da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A pluralidade cultural e social destes países, suas trajetórias políticas de independência e transição democrática, somada aos laços históricos e políticos de cooperação cultural, educacional e econômica com a sociedade brasileira vem alimentando uma rede de estudos, de pesquisas e de mobilidade que consolidam o destaque destas sociedades na área de Estudos Africanos no Brasil.

Com base nesta experiência, pautamos a necessidade de congregar reflexões teóricas e estudos empíricos considerando dois aspectos: 1. as diversas disciplinas das Humanidades (Antropologia, Ciência Política, História, Relações Internacionais e Sociologia, Geografia, Filosofia), em uma perspectiva que relacione Cooperação Sul-Sul, Democracia e Decolonialidade, no sentido de um fazer acadêmico crítico e de qualidade, tendo em vista um desenvolvimento emancipatório; 2. a maior diversidade possível de nacionalidade, etnia/raça e gênero nas contribuições recebidas. Nesse sentido, embora não tenhamos conseguido contemplar todos os PALOPs, o presente número reúne reflexões e estudos de brasileiros(as) e africanos(as) de/sobre Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique, sem perder de vista possibilidades de comparações com o Brasil e visadas mais amplas sobre o conhecimento produzido sobre África. Leia Mais

A tecelã: uma jornada iniciática rumo a individuação feminina

INTRODUÇÃO

Esta é uma resenha do livro: “A tecelã: uma jornada iniciática rumo a individuação feminina”, de Barbara Black Koltuv, que faz uma análise psicológica junguiana de casos clínicos da atualidade, comparando à dinâmica psicológica dos mitos da antiguidade, relatos bíblicos e sonhos, em mulheres. Para a autora, a obra demonstra um sentimento de mistério, força e alegria que as mulheres encontram em sua jornada rumo à individuação; segundo Koltuv, uma jornada que não tem fim e que está sempre sendo reiniciada em um trabalho paciente e contínuo, como o de uma tecelã.

Barbara Black Koltuv é doutora em Psicologia Clínica pela Universidade Columbia (EUA) desde 1962. Recebeu seu diploma em Psicanálise no Programa de Pós-doutorado da Universidade de Nova York (EUA) em 1969 e, em 1980, o de analista junguiana, pelo Instituto C. G. Jung de Nova York. Estudou hebraico bíblico por várias décadas e ministrou cursos na Fundação C. G. Jung sobre psicologia feminina, Lilith, relacionamentos, criatividade e espiritualidade. Em 2003, foi uma das fundadoras da Associação Psicanalítica Junguiana, onde continua atuando como supervisora e analista sênior. Em seu quase meio século de prática, a Dra. Barbara Koltuv aprendeu que a cura e a saúde física e mental são resultado de uma profunda conexão espiritual com o Ser interior. Ela também é autora de O Livro de Lilith, que faz parte da coleção Biblioteca Psicologia e Mito da Editora Cultrix. Leia Mais

Dons e Carismas na Bíblia | Luiz Alexandre Solano Rossi e Valmor da Silva

Os organizadores desta obra coletiva e os autores dos artigos são professores doutores e pesquisadores da Sagrada Escritura que atuam em Faculdades no Brasil e na América Latina. O livro procura demonstrar a diversidade de formas como os dons e carismas são apresentados na Bíblia e sua importância na vida das pessoas que o receberam e na história do povo hebreu e cristão. Para isso fazem um resgate histórico de como o tema é tratado ao longo da história bíblica para compreender os apelos e os ensinamentos para a realidade das comunidades cristãs. Busca também ajudar os leitores a descobrir seus dons e colocá-los a serviços do outro e de um mundo melhor.

É composto por sete capítulos que, com ênfase no Novo Testamento, traçam um retrato da presença de pessoas carismáticas na sagrada escritura. Aborda conceitos fundamentais, uma breve cronologia, e enfoca a presença destas experiências espirituais nas obras proféticas e no novo testamento, especialmente nos evangelhos e na tradição paulina. Leia Mais

Polegarzinha – Uma nova forma de viver em harmonia, de pensar as instituições, de ser e de saber | Michel Serres

A leitura da obra Polegarzinha – Uma nova forma de viver em harmonia, pensar as instituições, de ser e de saber, de autoria de Michel Serres, pensador francês, trouxe-nos como possibilidades o exercício de pensar o papel da tecnologia na construção de novas sociabilidades e na atualização de interrogações que constituem a condição humana. A principal problemática abordada pelo autor trata de como os adolescentes enviam as mensagens SMS com os polegares e habitam o mundo virtual. Associado a dinâmica das mídias digitais no processo de formação dos adolescentes e jovens, Serres (2015, p.12) abre o livro com uma interrogação filosófica: “Antes de ensinar o que quer que seja a alguém, é preciso, no mínimo, conhecer esse alguém. Nos dias de hoje, quem se candidata à escola, ao ensino básico, à universidade?”

Essa pergunta implica alguns questionamentos, quem é esse novo aluno, que cria outros mundos por meio do virtual? Que literatura e que história eles estão construindo na imediaticidade do tempo, que corre veloz, esquecendo das tradições dos antigos? Serres propõe três horizontes temáticos para pensar o fenômeno que ele mesmo denominou de Polegarzinha: I – Polegarzinha; II – Escola; III – Sociedade. Esses horizontes propõem um modo de pensar a Educação, como um fenômeno complexo que abarca as aulas, a sala de aula, o digital, os professores, a avaliação desses pelos alunos, etc. Assim, a Educação é pensada pelo prisma da Polegarzinha como um desafio, sim um desafio que não se pode resolver a penas sendo otimista como o autor Michel Serres. Leia Mais

Revista Brasileira de Filosofia e História. Pombal, v.9, n.1, 2020.

Artigos

RESENHA DO LIVRO A POLEGARZINHA DE MICHEL SERRES

RESENHA DO LIVRO Dons e Carismas na Bíblia

Resenha do livro: “A tecelã: uma jornada iniciática rumo a individuação feminina”

Publicado: 2020-03-31

Revista de Ensino, Educação e Ciências Humanas. Londrina, v. 21, n. 1, 2020.

Artigos

Publicado: 2020-03-30

História e Gênero | Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade | 2019

Os artigos que compõem o Dossiê “História e Gênero” da Revista Cordis, n. 22 – publicação do Núcleo de Estudos de História Social da Cidade (NEHSC), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) – têm como temática a questão de gênero, com artigos concebidos a partir de pressupostos teórico-metodológicos de diversos matizes. Nesta perspectiva, este número propõe a discussão que gênero é um conceito que aborda os múltiplos femininos e masculinos, sem práticas etnocêntricas.

O primeiro artigo, o segundo artigo e o terceiro artigos do Dossiê História e Gênero abordam mulheres em estratégias de luta e preservação da vida. O primeiro artigo, denominado “Descolonizando Currículo: educação antirracista com Carolina Maria de Jesus”, de Veruschka de Sales Azevedo, discute os desafios e o desenvolvimento das principais leis responsáveis pela descolonização no currículo no Brasil; leis que foram se desenvolvendo ao longo dos anos oitenta do século XX e início do século XXI, que se referem aos direitos e desafios presentes no campo educacional, a partir da obrigatoriedade do ensino de História da África e das culturas afro-brasileiras na escola. O texto apresenta um relato de prática descolonizadora com o livro “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus, na escola pública de São Paulo. Leia Mais

Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade. São Paulo, v.1, n.22, 2019.

Cordis – Revista Eletrônica de História Social da Cidade. São Paulo, v.1, n.22, 2019.

Dossiê História e Gênero

Artigos do Dossiê História e Gênero

Apresentação: Marcelo Flório

1. ”Descolonizando Currículo: educação antirracista com Carolina Maria de Jesus”, de Veruschka de Sales Azevedo
2. “Quebradeiras de coco de babaçu: histórias, memórias, estratégias de produção e luta em prol da preservação dos babaçuais e da cultura local. 1990 a 2010”, de Maria Izilda Santos de Matos, Andrea Borelli e Rosana Schwartz
3. “Aspectos sobre as políticas públicas de reabilitação para mulheres negras no sistema penitenciário do Distrito Federal, de Walace Roza Pinel e Darliane Silva do Amaral
4. “O Fado de Amália Rodrigues (1920-1960)”, de Yvone Dias Avelino
5. “Couraça e liberdade: apontamentos sobre a questão de gênero em Clarice Lispector”, de Bruno Marco Cuer dos Santos e de Marcelo Flório
6. “’Aparelho excretor não reproduz’! Representações de mulheres sobre o sexo anal”, de Silvia Piedade de Moraes e José Roberto da Silva Brêtas
7. “As representações do conceito de sexualidade: subsídios para intervenção”, de Ana Maria Limeira de Godoi, José Roberto da Silva Brêtas e Silvia Piedade de Moraes
8. Trabalho de Pesquisa de Graduação: “Gênero e Sexualidade no ambiente escolar: sequência didática na formação docente”, de Bruno Pereira de Castro

Publicado: 2020-03-30

Paideia – Revista de Educación. Concepción, n. 62, 2018.

El número 62 de Paideia comienza con un artículo sobre la comprensión lectora y su implicancia en el aprendizaje. Este tema es de alta relevancia en el contexto educativo, dado que numerosos son los ejemplos de los problemas de comprensión lectora a los que se enfrentan los estudiantes.

Editorial

Publicado: 2020-03-25

Revista Brasileira de Filosofia e História. Pombal, v.8, n.2, 2019.

Edição Especial

Artigos

Revisão de Literatura

Publicado: 2020-03-25

Archivos de historia del movimiento obrero y la izquierda. Buenos Aires, v.8, n.16, marzo / agosto 2020.

Presentación

  • Comité Editor
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Dossier: El trabajo de las mujeres: feminismos, marxismos y reproducción social

Artículos libres

Reseñas

Influxos do Céu: uma história das previsões (sécs. XIII – XV) | Simone Ferreira Gomes de Almeida

Influxos do Céu: uma história das previsões (sécs. XIII – XV), de Simone de Almeida, foi fruto de uma pesquisa de doutorado produzida no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus Franca – com direito a um período sanduíche na Universidade de Múrcia, na Espanha. Inicialmente com o nome de Influxos do céu na existência dos homens. Os escritos astrológicos na Península Ibérica (séculos XIII, XIV e XV), o trabalho destinou-se a analisar os escritos astrológicos produzidos na Península Ibérica do período. Na publicação, a autora preferiu alterar o título (ou seus editores) para que este funcionasse melhor no mercado editorial. Segundo consta em seu currículo Lattes, Simone de Almeida no momento não leciona em nenhuma universidade, sua última produção consta como um pós-doutorado na Biblioteca Nacional, onde se dedicou a tradução do El sumario de las maravillosas y espantables cosas que en el mundo han acontescido, de Álvaro Gutiérrez de Torres (obra datada do século XVI), findo em 2017. A autora também é membra do grupo de pesquisa Escritos sobre os novos mundos, com sede no campus Franca da Unesp; também é de sua autoria o livro A figura do herói antigo nas crônicas medievais da península Ibérica (séculos XII e XIV), 2 fruto da sua tese de mestrado. Leia Mais

Identidade | Brasílio Sallum Junior, Lilia Moritz Schwarcz, Diana Vida e Afrânio Catani

Constructos sociais estabelecidos no âmbito das relações humanas, as identidades se constituem como elementos que proporcionam diversas percepções a respeito das diferentes maneiras de estar no mundo, viabilizando determinadas formas de reconhecimento e luta. Para além, tomada como pauta por diversos setores no tempo presente, a identidade se manifesta como tema fundamental no debate acadêmico – protagonizando, por vezes, uma miríade de investigações que se materializam por meio dos diversos trabalhos que endossam sua atualidade.

É nesse sentido, portanto, que o livro Identidades se corporifica. Concebida como resultado imediato de um seminário internacional homônimo – sediado, em 2012, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo e parte integrante de um projeto amplo titulado como Conferências USP –, a obra dispõe como organizadores os docentes Brasilio Sallum Jr. (FEUSP); Lilia Moritz Schwarcz (FFLCH-USP); Diana Vidal (FEUSP) e Afrânio Catani (FEUSP) e toma como objetivo apresentar as discussões promovidas nas mobilizações do conceito em questão – desvelando, de maneira minuciosa, uma revisão de seus múltiplos significados e usos. Leia Mais

Not all dead white men: classics and misogyny in the digital age | Donna Zuckerberg

A presença de referências ao mundo clássico em discussões realizadas nas redes sociais vem despertando a atenção de diversos estudiosos. Ainda que a tradição clássica tenha sido amplamente utilizada para justificar e legitimar posições ideológicas e regimes políticos ao longo da história, e, embora o estudo destas apropriações seja recorrente, a amplitude do universo on-line e a forma como esses discursos são criados e apropriados em plataformas virtuais trazem novas nuances para a situação, ou como é apontado por Donna Zuckerberg, as redes sociais amplificaram estes movimentos. A estudiosa, doutora em estudos clássicos pela Universidade de Princeton, é também fundadora e editora do site Eidolon, dedicado a apresentar os estudos clássicos para além dos meios acadêmicos tradicionais, considerando os aspectos políticos envolvidos e a partir de uma perspectiva feminista2.

Assim, em Not all dead white man, Zuckerberg se propõe a apresentar uma análise detalhada sobre como comunidades presentes na internet vêm se apropriando de símbolos, referências e personagens do mundo greco-romano com a finalidade de justificar posturas misóginas na contemporaneidade. Nesse sentido, dedicou-se ao mapeamento dos diferentes grupos que compartilham essas opiniões e apresenta um quadro minucioso dos mesmos, suas especificidades e diferenças, bem como de que forma eles se relacionam entre si. Leia Mais

A História (quase) secreta: sexualidade infanto-juvenil e crimes sexuais na cidade de Salvador (1940- 1970) | Andréa da Rocha Rodrigues Barbosa

Em que pese o recente crescimento de uma perseguição desenfreada aos estudos sobre mulheres, relações de gênero, sexualidade, etc., é com muito entusiasmo que nós historiadoras/res recebemos o livro A História (quase) secreta, fruto originalmente de uma tese de doutoramento junto ao programa em História Social da Universidade Federal da Bahia e que foi defendida há mais de uma década, em 2007. O livro que ora resenhamos foi apresentado pelo historiador Renato Venâncio (UFMG), especialista em história da infância. Além disso, teve o prefácio assinado pela antropóloga feminista Cecília Sardenberg (UFBA), uma das fundadoras do Neim – Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a mulher e gênero, da Bahia.

Atualmente, Andréa Barbosa é professora titular da Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia, dedicando-se, desde o início de sua carreira, aos estudos históricos sobre a infância pobre, mulheres, relações de gênero, corpo e sexualidade infanto-juvenil. É autora do já clássico A Infância Esquecida, Salvador, 1900-1940, 2 assim como, mais recentemente, organizou uma coletânea intitulada Revisitando Clio: estudos sobre mulheres e as relações de gênero na Bahia3 que, além de seu próprio trabalho, reuniu pesquisas feitas por outras historiadoras da área. Além disso, é coordenadora de um grupo de pesquisa e extensão, criado recentemente juntamente a um grupo de jovens historiadores, intitulado Nina Simone, com o objetivo de propiciar debates e pesquisas históricas e áreas afins sobre as relações de gênero, sexualidade etc. Leia Mais

Hydra. Guarulhos, v.4, n.7, 2019.

Dossiê: História vai ao público: universidade, sociedade e negacionismo

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Editorial

Dossiê

Artigos Livres

Notas de Pesquisa

Resenhas

Entrevista

Revista revista

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Publicado: 2020-03-16

Artes e instituições culturais: reflexões sobre branquitude e racismo | PerCursos  | 2019

É com satisfação que apresentamos o dossiê temático do presente número da REVISTA PERCURSOS, que versa sobre Artes e instituições culturais: reflexões sobre branquitude e racismo. O dossiê integra a última edição do ano de 2019 e foi organizado pelas professoras Carolina Ruoso (Universidade Federal de Minas Gerais), Joana D’Arc de Sousa Lima (Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira) e Marcele Regina Nogueira Pereira (Universidade Federal de Rondônia). A escolha da temática decorreu, em grande parte, inicialmente por sermos mulheres que nos profissionalizamos no chamado mundo do trabalho dos museus e instituições culturais1, daí nossa constatação que as instituições culturais, especialmente os museus, marcados na sua organização pela razão patrimonial, atuam a serviço do processo colonizador. Instrumentalizam, na modernidade, critérios e valores culturais que inventam os Outros: selvagens, exóticos, sem história, sem capacidade de produzir memórias, primitivos, entre outros adjetivos etnocêntricos. Desse modo, entendemos que este dossiê reúne um conjunto de análises e reflexões a respeito das instituições culturais, tanto no que diz respeito à montagem dos seus acervos e programas quanto à construção da relação com seus públicos, a partir de uma perspectiva decolonial. Leia Mais

Necropolítica

Achille Mbembe, ou Joseph-Achille Mbembe, é um pensador, professor e filósofo contemporâneo nascido no ano de 1957 em Centre, Camarões, que tem trazido grandes contribuições para o estudo do pós-colonialismo e, ao longo da produção aqui apresentada, tem a habilidade de relacionar diferentes realidades em uma mesma linha de raciocínio, com interpretações significativas e coerentes.

Necropolítica, em sua proposta inicial, foi publicado no Brasil pela primeira vez no ano de 2016, em forma de artigo, na revista Arte & Ensaio, vinculada ao Programa de PósGraduação em Artes Visuais da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Quanto ao livro, teve publicação em 2018 e, ao longo de poucas páginas, dividese em cinco tópicos que contam com discussões muito precisas, capazes de fazer conexões entre a contemporaneidade e as heranças históricas construídas a partir de práticas de dominação do Estado – que, através de discursos racistas e excludentes, fez emergir as mais variadas formas de violência e genocídio. Leia Mais

La biblia del proletariado: traductores y edictores de El capital en el mundo hispanohablante | Horacio Tarcus

“O Capital” segue sendo uma das grandes obras da Modernidade, porém, tão referenciada quanto pouco lida e pouco estudada. A magnitude e a complexidade de seu conteúdo certamente contribuem para isso: trata-se de vários tomos, alcançando, a depender da edição, até 700 páginas. O que faz da obra um clássico é o fato de, apesar de mais de 150 anos da sua primeira “aparição” e das evidentes mudanças que nos separam do século XIX, expressa um pensamento incontornável, do qual partem os que insistem em decifrar o mundo contemporâneo. Partindo da hipótese de que as diferentes expressões do capitalismo requeriam uma análise profunda, rigorosa e científica – como pretendeu seu autor–, Marx buscou, com esse empreendimento intelectual de notório fôlego, explicar as leis e dinâmicas próprias do âmago do capitalismo. Longe de ser uma obra acadêmica, o trabalho destinava-se a contribuir com o movimento socialista do qual Marx era um militante, a partir da ideia de que não seria possível vencer o verdadeiro inimigo dos trabalhadores (e da humanidade) sem que estes conhecessem profundamente os mecanismos essenciais de seu funcionamento. Como esse trabalho chegou às mãos de seus leitores e leitoras, como foi interpretado, quem o publicou, quais os formatos das primeiras edições, como circulou entre os meios socialistas e entre operários e operárias? As edições acessíveis, hoje, no mercado editorial, correspondem aos originais escritos a punho por Marx? Qual a contribuição de Engels nesse processo? Como e quando foram vertidos os diferentes livros para as línguas dos países da periferia do capitalismo? Leia Mais

Percursos. Florianópolis, v.20, n.44, 2019.

Artes e instituições culturais: reflexões sobre branquitude e racismo

Editorial

Publicado: 2020-03-13

Diálogos sobre a Modernidade. Vitória, n.3, 2020.

Artigos

Publicado: 2020-03-19


Manduarisawa. Manaus, v.3, n.02, 2019.

História, Conflitos e Experiências Agrárias

APRESENTAÇÃO

DOSSIÊ TEMÁTICO

ARTIGO LIVRE

Publicado: 2020-03-07

International, transcontinental and intrarregional human mobilities: biopower, migrant strategies, and representations (19th to 21st centuries)  | Diálogos | 2020  

This dossier emerges as an initiative of its coordinators and editors –Lai Sai Acón Chan and Ronald Soto-Quirós– who are interested in international migrations and collaborate jointly on a project to recover the historical memory of Chinese migrations in Costa Rica (PREMEHCHI for its acronym in Spanish). This project is led by an international multidisciplinary team of researchers from the University of Costa Rica, the UNED (Costa Rica), the multidisciplinary team on Latin America and the Iberian Peninsula of the Université Bordeaux Montaigne (Bordeaux, France) and the University of Minnesota Morris. PREMEHCHI is based at the University of Costa Rica (San José, Costa Rica)1.

The dossier of this issue of Diálogos, a journal of the Department of History and the Graduate Program in History of the State University of Maringá (UEM) is a first effort to publish bilingual versions of the same article (English and Spanish or Portuguese) in order to achieve greater internationalization and facilitate the dissemination of knowledge. In this particular case, the dossier focuses on the phenomenon of international migration –or international human mobility – addressed from the perspective of scholars specializing in a wide array of disciplines (history, sociology, political science, cultural studies, cinema, and others), from different geographical locations (Costa Rica, Honduras, United States, France and Spain) and in a wide chronological span (XIX-XXI centuries). Leia Mais

Diálogos. Maringá, v.24, n.1, 2020.

International, transcontinental and intrarregional human mobilities: biopower, migrant strategies, and representations (19th to 21st centuries)

Editorial

Dossiê

Artigos

Publicado: 2020-03-04

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade. Campinas, v.24, n.34, 2019 / v.23, n.32, 2018.

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade. Campinas, v.24, n.34, 2019.

Publicado: 2020-03-03

Iniciais

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade. Campinas, v.24, n.33, 2019.

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade

Publicado: 2019-09-24

Iniciais

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade. Campinas, v.23, n.32, 2018.

Revista de Estudos Filosóficos e Históricos da Antiguidade

Publicado: 2019-07-01

Iniciais

Pilquen. Buenos Aires, v.23, n.1, 2020.

Revista Pilquen. Sección Ciencias Sociales

  • Período enero-marzo 2020
  • Publicado: 30-03-2020

ARTÍCULOS

RESEÑAS

PUBLICADO: 2020-04-02

A impostura científica em dez lições | Michel de Pracontal

Tempos atrás, quando eu ainda era ouvido pela Editora Unesp, recomendei que se traduzisse e publicasse um livro instrutivo. Trata-se do volume escrito por Michel de Pracontal: A impostura científica em dez lições. A editora o publicou.

Muitos casos por ele recolhidos de charlatanismo continuam a ser praticados de modo impune. Um deles é saboroso: no debate sobre tema delicado de saúde pública a TV francesa reuniu vários cientistas e uma vidente ou algo assim. Terminado o programa, quem venceu no parecer dos telespectadores? A vidente, claro. Situações iguais são vividas tragicamente agora. Entre os médicos infectologistas e Olavo de Carvalho, quem é preferido pelo “governo”? O sabichão, claro. Leia Mais

Baku. Oil and urbanism | Eve Blau e Ivan Rupnik

Entre as grandes metrópoles energéticas contemporâneas marcadas por próspera economia e urbanização global, destaca-se a cidade de Baku, capital do Azerbaijão, nas margens do Mar Cáspio, eixo estratégico entre a Europa e a Ásia, cujo cenário arquitetural combina o antigo e o novo, ao contrário de Dubai a que é comparada. O país é rico em história, já fez parte do império persa, sofreu várias invasões (dos mongóis, entre elas), foi incorporado ao império russo em 1813, passando depois a pertencer à União Soviética, até declarar sua independência em 1991, quando essa dominação foi extinta. Baku conserva construções do século 7, muralhas da cidade fortificada do 12, mesquitas, palácios e minaretes que pontuam o centro antigo. Leia Mais

Ensino de História, Livro Didático, Formação de Professores | Escritas do Tempo | 2020

O ensino de história entre lutas, alegrias e esperanças

Em sua última obra publicada em vida, o educador Paulo Freire em Pedagogia da Autonomia sentencia que para ensinar é necessário que exista uma relação movida pela alegria e esperança. Trata-se da esperança — do verbo esperançar — como uma construção urdida nas relações sociais das lutas cotidianas que concorre como força mobilizadora para o agir no dia a dia. Para ele “a esperança é um condimento indispensável à experiência histórica” (FREIRE, 2019, p. 71), pois sem ela estaríamos limitados a viver o tempo sem problematizá-lo, como se não fosse o tempo uma construção humana de homens e mulheres em seus fazeres ordinários. Por extensão, sem a esperança prevaleceria uma concepção determinista da história onde tudo já estaria dado, definido e, portanto, nada poderia ser feito no presente para projetarmos nossas possibilidades de futuros.

Em nossa experiência de tempo presente, parece importante nos avizinhar das reflexões — tão combatidas — do pensador Paulo Freire. Esperançar-se com a atividade docente, com o ensino de História, continua sendo uma possibilidade potente na luta pela construção de uma sociedade menos desigual. Esperançar-se por um aprender inquietante, prenhe de questionamentos sobre o tempo; esperançar-se por uma aprendizagem que não aceite passados, presentes e futuros determinados, que esteja fecunda de problematizações, se torna necessário e vital nos dias atuais.

Esses sentimentos brotam também porque este dossiê (o segundo na sequência de publicação da Revista Escritas do Tempo que tematiza o Ensino de História) demonstra sinais do crescimento e do fortalecimento das pesquisas em Ensino de História, e não apenas daquelas sobre ensino de História, como defende Carmen Teresa Gabriel (2019). Assim, em alguma medida, este dossiê pode ser apreendido como um vestígio, um sinal da potencialidade que se vem constituindo o campo do Ensino de História.

Este dossiê fecha o ano de publicação de 2020; um ano marcado pelas experiências dolorosas que resultaram em mais de 180 mil vidas ceifadas pela pandemia causada pela Covid-19. Esses dados não levam em consideração as vidas perdidas que não entraram na contagem oficial, nem aquelas cuja causa da morte foi atribuída à síndrome respiratória aguda grave (SARS, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome). Portanto, já é motivo de alegria e esperança o fato de chegarmos ao fim do ano de 2020 vivos — mesmo com a lida relacionada às perdas pessoais e coletivas — e estarmos com saúde, produzindo reflexões sobre o Ensino de História.

Todavia, também experienciamos sentimentos de preocupação, sobretudo com o atual cenário político do Brasil, que mostra a crescente polarização e ascensão de posturas e práticas fascistas no País. As políticas públicas de Educação igualmente despertam preocupação, em especial a política direcionada à formação do professor. Uma formação que se fundamenta na Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 2, de 20 de dezembro de 2019, que estabelece as diretrizes para a formação docente.

Estaremos alertas e atentos para a disputa desses espaços promotores de projetos políticos, em especial daqueles direcionados à formação do professor, ao ensino de História e aos livros didáticos. Nessa luta, nossa arma é o conhecimento. Nosso combate ocorrerá por meio da reflexão, do debate e do uso ético do saber como um elemento de poder. Nesses termos, é fundamental ampliar e socializar o conhecimento especializado para instrumentalizar o profissional e garantir o bom combate. O campo do Ensino de História tem-se tornado fértil, potente e disputado. Sua fertilidade pode ser percebida com a quantidade e a qualidade das pesquisas e publicações que vêm a público em forma de monografias, dissertações, teses, livros, dossiês, seminários, artigos, palestras, lives, blogs e uma infinidade de outros formatos que oferecem diferentes narrativas sobre o ensino de História.

O campo tem ofertado uma ampla e diversificada produção e seria enfadonho elencar, aqui, uma lista. Basta reforçar que, como objeto de estudo, a pluralidade temática também é disputada por diferentes leituras, interpretações, percepções teóricometodológicas e, inclusive, por diferentes projetos políticos de governo, como bem destacou Christian Laville (1999) ao lançar mão do conceito “guerras de narrativas”.

O Ensino de História, enquanto campo de produção de conhecimento, não é caracterizado pela prática de consensos. Estamos atuando em um espaço marcado pelo dissenso. São distintas as concepções, abordagens, temáticas, aportes metodológicos, referenciais teóricos e epistêmicos que transitam pela História, Educação, Didática, Psicologia da aprendizagem, Linguagem, para mencionar apenas alguns. Mas talvez, possamos falar que exista algum consenso que a História — como lugar de produção de saber e espaço de formação docente —, precisa ressignificar as matrizes curriculares dos cursos de licenciatura. Esse entendimento não reside porque temos uma nova (e preocupante) resolução que determina a adequação dos projetos políticos pedagógicos dos cursos. Mas — e principalmente — porque há um certo entendimento entre professores que atuam na formação de outros professores de que o modelo de formação estruturado na configuração quadripartite europeia — que ainda prevalece como mostram as pesquisa de Mauro Coelho e Wilma Baia (2018), Flávia Caimi (2013 e 2015), Margarida de Oliveira e Itamar Freitas (2013) e Erinaldo Cavalcanti (2018, 2020a e 2020b) —, já não atende às demandas do chamado tempo presente no que tange à formação do profissional de História. Ou seja, a formação docente, em História, precisa ocupar os proscênios do centro de interesse dessa ciência. As questões que envolvem as diferentes narrativas que disputam a produção de sentido, no cotidiano de homens, mulheres, crianças e adolescentes (o potencial público a ser atendido pelo professor de História) precisam ser objeto de aprendizagem durante a formação inicial desse professor. Da mesma forma, debater e problematizar o universo de práticas constituidoras do livro didático — que ainda continua ocupando importante posição nas tarefas desempenhadas pelos professores da Educação Básica — é algo que precisa ser tematizado durante o período de formação inicial dessa licenciatura.

As reflexões que apresentamos, neste dossiê, se constituem em ricas possibilidades de ampliação do debate que envolve essas questões. Assim, esta publicação está composta por 14 artigos, dos quais, 10 compõem o referido dossiê, 4 fazem parte da sessão Artigos livres, além de contarmos com uma resenha.

Abrindo o dossiê, temos o artigo do professor Almir Félix Batista de Oliveira — Livros didáticos e formação de professores: questões para o ensino de história — no qual amplia-se a reflexão e apresenta-se uma importante problematização acerca do livro didático de História e da formação de docentes, tanto a do profissional de História, responsável pelo ensino da História aos alunos do Ensino Fundamental II e Médio, como a do chamado professor generalista, pontuando a necessidade de se tematizar o livro didático na formação inicial de professores.

À sequência, temos o artigo assinado pela professora Camila Corrêa e Silva de Freitas As representações da catequese jesuítica nos livros do PNLD: abordagens do passado colonial e possibilidades de aprendizagem histórica. Nele, a autora analisa algumas representações a partir de um conjunto de narrativas didáticas sobre o chamado “período colonial brasileiro”. O foco de atenção é direcionado para a atuação da Companhia de Jesus. São tematizados os livros de História dos sétimos anos de três coleções didáticas, a partir dos quais se analisa, também, como essas narrativas podem representar possibilidades de aprendizagem histórica.

No artigo seguinte, intitulado Da construção do estereótipo de selvagem à representação do indígena brasileiro no livro didático de História, a professora Roberta Fernandes Santos amplia a discussão sobre como se construiu o estereótipo de “selvagem”, atribuído aos indígenas. A autora, ainda, destaca a importância da Constituição de 1988 e, posteriormente, da Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008, ao ampliar as condições de maior inserção dos indígenas na História ensinada no Brasil, contribuindo para ressignificar o lugar por eles ocupado, ampliar sua cidadania e proteger seu direito à diversidade.

À continuação, no artigo intitulado A Revolução Cubana: representações generificadas em um livro didático de História, a professora Andréa Mazurok Schactae analisa as representações construídas em relação à Revolução Cubana em um livro didático de História do ensino médio, usado no Instituto Federal do Paraná (IFPR), Campus Telêmaco Borba, e publicado em edições de 2013 e 2016. A autora também analisa de que forma a categoria “gênero” constituiu-se como uma estratégia fecunda para entender e problematizar algumas das representações acerca da revolução cubana.

A formação do professor de História é o foco de análise do artigo seguinte. Assinado pela professora Renilda Vicenzi e pelo professor Bruno Antonio Picolli, o artigo Formação de professores de História: implicações a partir da BNCC e da DCNBNC tem o foco central da sua reflexão direcionado à ampliação do debate sobre as implicações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (DCNBNC) na formação de professores de História. Por meio da pesquisa e da análise realizadas, os autores chegam à conclusão de que as referidas reformas impactam com sérias implicações a formação profissional do professor de História.

A seguir, o professor Leandro Antonio de Almeida também focaliza a formação docente em História, no seu artigo, A formação docente em laboratórios universitários de ensino de história através da produção de materiais didáticos: a experiência do LEHRB-UFRB. Nele, o autor apresenta uma reflexão a partir de suas experiências desenvolvidas no laboratório da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). São tematizadas as atividades voltadas à formação docente inicial por meio de projetos desenvolvidos entre 2009 e 2017, em especial aqueles direcionados à produção de materiais didáticos. As ações relatadas e analisadas mostram a complexidade das experiências costuradas pela prática interdisciplinar, de modo a ampliar a construção dos saberes históricos e pedagógicos dos professores participantes dos projetos e em formação.

Na sequência, temos o artigo Um olhar sobre o ensino de História nos museus de ciência, assinado pelas professoras Déborah Roberta Santiago Chaves Vilela, Zenaide Gregório Alves e Rozeane Porto Diniz. As autoras centram sua atenção nos museus enquanto espaços culturalmente potentes para construir e ampliar suas relações com as práticas educativas. Em sintonia com documentos formais, como a Declaração do Rio de Janeiro de 1958 e outros decretos/leis, como a Lei nº 11.904, de 14 de janeiro de 2009, e as Diretrizes Curriculares Nacionais (Base Nacional Comum Curricular e Matriz do Exame Nacional do Ensino Médio), as autoras exploram as possibilidades de interação e construção de saberes, como práticas potencialmente ricas para o Ensino de História entre os museus de ciência, a chamada cultura científica e a relação sociedade-História.

O artigo seguinte, Didática da história, consciência e emancipação: uma reflexão sobre os limites materiais do ensino crítico da História, é assinado pelos professores Filipe Boechat e Fernando Viana Costa no qual os autores se propõem a ampliar o debate acerca das categorias “consciência”, “alienação” e “ideologia” situando a reflexão no âmbito do debate da Didática da História, em especial através da problematização de dois dos principais intelectuais alemães que tematizam a questão.

Em continuidade temos o artigo O irreconciliável nos editais do PNLD: eurocentrismo, cidadania e ensino de História. Assinado pela professora Taissa Cordeiro Bichara, o texto problematiza os sentidos atribuídos às categorias eurocentrismo, cidadania e ensino de História, encaminhados pelos editais de convocação para o processo de inscrição e avaliação de obras didáticas e literárias. Esses editais, publicados no Diário Oficial da União pelo Ministério da Educação (MEC), submetidos ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e destinados aos Anos Finais do Ensino Fundamental entre 1996 e 2018. Destaca-se, no artigo, que a construção histórica da civilização europeia continua como o principal referente, que representa outras civilizações como inferiores ou submissas à história ocidental branca e cristã.

Finalizando o dossiê, a professora Luiza Sarraff assina o artigo A narrativa didática sob a ótica da imputação causal singular, a autora estabelece uma reflexão entre história e narrativa em diálogo direto com Paul Ricoeur para problematizar a análise da narrativa de um livro didático, aprovado pelo Programa Nacional do Livro Didático, enfatizando o aspecto da imputação causal singular, na esteira do que defende o filósofo francês.

Temos, ainda, quatro importantes artigos que contribuem com valiosas discussões na sessão Artigos Livres. O primeiro é Panoramas recentes do feminismo na interseccionalidade, de autoria da professora do departamento de sociologia da Universidade de Montreal, Sirma Bilge. Originalmente, o artigo foi redigido em inglês, cujo título é Recent feminist outlooks on intersectionality, e tem como foco a ampliação da discussão, teorizando o conceito “interseccionalidade” a partir da operacionalização de gênero em estudos feministas.

À sequência, Marcos Antonio Batista da Silva assina o artigo Discursos étnicoraciais sobre o acesso e a permanência na Pós-graduação, em que analisa trajetórias de estudantes negros no ensino superior/pós-graduação na sociedade brasileira, oferecendo contribuições para as discussões sobre importantes temáticas, como relações étnicoraciais, políticas públicas, família e educação.

Entre datas, festas e compêndios: a História como pedagogia cívica na Amazônia no início do século XX, é o artigo seguinte assinado pelo professor Silvio Ferreira Rodrigues no qual ele analisa um conjunto de relações e estratégias políticas utilizadas por um grupo de intelectuais ligados ao Instituto Histórico e Geográfico do Pará, para refletir como História foi mobilizada como estratégia de construção e consolidação dos laços de pertença ao projeto político de pátria brasileira defendido por aqueles intelectuais.

Finalizando a sessão, está o artigo Biografia, gênero e carnaval: uma rainha nos festejos de momo na Porto Alegre do início do século XX, da professora Caroline Pereira Leal. Nele, a autora focaliza a trajetória da personagem Maria Elvira Werna Coelho Roxo, rainha da Sociedade Carnavalesca Os Venezianos, ampliando as discussões sobre as relações construídas pelas mulheres, que fazem compreender e potencializar a visibilidade sobre elas enquanto sujeitos históricos.

Por fim o professor Marcos Rodrigues assina a resenha A encruzilhada das ações afirmativas do livro Filosofia Africana: ancestralidade e encantamento como inspirações formativas para o ensino das africanidades de Adilbênia Freire Machado na qual o professor analisa as importantes contribuições presentes no livro no que tange à problematização das ações afirmativas.

Desejamos a todos uma boa leitura e aproveitamento do dossiê da revista Escritas do Tempo e suas propostas de reflexão. Que a esperança e a alegria façam muito sentido e promovam muitas inquietações em 2021, a partir do controle da Covid19 e que possamos vislumbrar um horizonte de possíveis mudanças em políticas ameaçadoras à educação, bem como à saúde e vida dos brasileiros e brasileiras.

Referências

CAVALCANTI, Erinaldo. A história encastelada e o ensino encurralado: reflexões sobre a formação docente dos professores de história. Revista Educar em Revista, v. 34, n. 72, 2018.

_______. La formación docente inicial del profesor de Historia en Brasil: temas, reflexiones y desafíos. Revista Ciencias Sociales y Educación, v. 9, n. 18, 2020a.

_______. O que deve aprender o professor de História? Reflexões sobre aprendizagem, ensino e formação docente inicial. Revista Roteiro, v. 45, e21829, 2020b.

CAIMI, Flávia. A licenciatura em História frente às atuais políticas públicas de formação de professores: um olhar sobre as definições curriculares. Revista Latinoamericana de História, v. 2, n. 6, p. 193-209, 2013.

_______. O que precisa saber um professor de história? Revista História & Ensino, v. 21, n. 2, p. 105-124, 2015.

COELHO, Mauro Cezar e COELHO, Wilma Baia de Nazaré. As licenciaturas em História e a Lei 10.639/03 – percursos de formação para o trato com a diferença? Educação em Revista, v. 34, e192224, 2018.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2019.

GABRIEL, Carmen Teresa. Pesquisa em Ensino de História: desafios contemporâneos de um campo de investigação. In: MONTEIRO, Ana Maria e RAJELO, Adriana (org.). Cartografias da pesquisa em Ensino de História, p. 143-161, Rio de Janeiro: Mauad X, 2019.

LAVILLE, Christian. A guerra das narrativas: debates e ilusões em torno do ensino de História. Revista Brasileira de História, v. 19, n. 38, p. 125-138, 1999.

OLIVEIRA, Margarida Dias de; FREITAS, Itamar. Desafios da formação inicial para a docência em história. Revista História Hoje, v. 2, n. 3, p. 131-147, 2013.

Erinaldo Vicente Cavalcanti – Professor Adjunto da Faculdade de História e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará [Unifesspa], coordenador do laboratório e grupo de pesquisa iTemnpo e editor da Revista Escritas do Tempo. E-mail: ericontadordehistorias@gmail.com

Helenice Aparecida Bastos Rocha – Professora Adjunta na Faculdade de Formação de Professores, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro [UERJ/FFP]. E-mail: helarocha@gmail.com

 

CAVALCANTI, Erinaldo Vicente; ROCHA, Helenice Aparecida Bastos. Apresentação. Escritas do Tempo, Pará, v.2, n.6, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

 

 

Ensino de História, Livro Didático, Formação Docente | Escritas do Tempo | 2020

Disputas pela história, pelo ensino e pela docência: desafios de uma luta permanente

A escrita, como prática cultural, contém em seu “DNA” as marcas do tempo em que é tecida. Toda escrita, ao grafar em palavras as experiências humanas, traz incrustadas as “digitais” do seu tempo; apresenta uma espécie de radiografia das disputas sociais, políticas e culturais tecidas no e pelo tempo. A escrita desse dossiê não foge à regra.

Escrever é um ato de tensão. Diferentes forças estão em diálogo quando desejamos grafar, pela escrita, as distintas experiências vivenciadas no tempo e no espaço. Toda forma de escrita é destinada a alguma prática de leitura, ou seja, a escrita é forjada para ser lida. Nesse sentido, as palavras encenam em um palco onde precisam criar laços de confiança com o leitor. A representação da escrita, portanto, precisa produzir efeitos de verdade para imprimir legitimidade à sua apresentação. Assim, escrita e leitura bailam juntas nas melodias que criam o mundo, mesmo desempenhando papéis distintos. Não se confundem, mas precisam unir-se no palco da representação, pois a escrita deseja imprimir à leitura o passo da confiabilidade.

Em nossa experiência de tempo presente, as práticas que envolveram a gestação da escrita para esse dossiê foram atravessadas pelo reordenamento da vida, provocado pela pandemia da Covid-19. Não obstante, ainda experienciamos o crescimento de posturas políticas anticiência, negacionista e/ou revisionista, com diferentes formas de ataques e tentativas de deslegitimar diversas áreas do conhecimento, em especial aquelas praticadas no campo das humanidades.

O dossiê v. 2, n. 5 da Revista Escritas do Tempo — Ensino de História, livros didáticos e formação docente — é gestado sob o solo de um campo de intensas disputas. Nos tempos atuais, fazer pesquisa é, antes de tudo, uma posição política de resistência. Fazer pesquisa em ciências humanas é uma decisão de luta contra um conjunto de forças, de caráter fascista, que se mobilizam e se fortalecem com o propósito de ameaçar e intimidar os (as) pesquisadores (as)/professores (as) que atuam nesse espaço de enfrentamento. O dossiê nasce, portanto, em um estado de tensão. Nos últimos anos, a História no Brasil — como espaço de produção de conhecimento — tornou-se um dos palcos onde se enfrentam inúmeros atores, incluindo soldados, generais e coronéis. Esses não aparecem aqui apenas como metáforas e, infelizmente, a educação também passou a ser por eles disputada como espaço de atuação.

A História acadêmica e escolar, como lócus de produção de saberes, espaço de socialização e de vivências humanas, virou cenário dos mais diversos tipos de disputas. Disputas não apenas acadêmicas, teóricas ou epistemológicas. A História tornou-se espaço de combate político; tornou-se arena de disputas partidárias, ambientadas em um clima de polarização. Diferentes atores — incluindo sujeitos sociais distintos daqueles que compõem a cultura acadêmica e escolar — passaram a se “autorizar” competentes para interferir nas relações praticadas dentro desse espaço.

As disputas se intensificaram, e precisamos lutar contra inúmeros projetos políticos que desejam determinar, de forma autoritária, o que devemos ensinar em nossas escolas. Essa é uma luta movida por diferentes sujeitos que pretendem definir quais conteúdos devem compor o currículo da Educação Básica, como ficou demonstrado nos embates envolvendo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Da mesma forma, querem determinar quais habilidades e competências (expressões que viraram jargões) devem configurar a formação do professor, de acordo com o estabelecido na Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 2, de 20 de dezembro de 2019, sobre as diretrizes para a formação docente. Por conseguinte, esses sujeitos ainda desejam determinar quais conteúdos devem estar presentes nos livros didáticos de História, como expressou, há menos de um ano, o então ministro de Estado da Educação. Uma batalha travada para definir quais conteúdos, vivências, saberes, aprendizados e experiências devem ser praticados na escola.

Esses atores políticos querem dizer como nós, professores e professoras, devemos relatar as lutas de homens e mulheres que nos antecederam. Mas, não nos enganemos. Essa luta não é pelo passado. Ela é travada no e pelo presente. Os indivíduos que estão disputando o espaço da História, da memória, dos livros didáticos e do ensino querem ampliar seu espaço de controle no presente. Eles entendem que — como sujeitos históricos que somos — agimos no presente, influenciados pelas distintas leituras que realizamos sobre o passado. Ou seja, a forma como nos portamos e vivemos, no presente, mantém íntima relação com a maneira como interpretamos nossas experiências passadas, as quais podem, por conseguinte, estabelecer e direcionar projetos de futuros. A guerra, portanto, é no presente.

Esses enfrentamentos incidem, pois, táticas de silenciamentos. Querem, assim, forjar as lentes pelas quais nossas crianças e jovens devem perceber e apreender o mundo. Desejam impor as lentes ofuscadas que fazem enxergar a vida, o ensino e a aprendizagem pela miopia da dualidade. À medida que pretendem determinar o que narrar, tentam silenciar um conjunto de relatos, memórias e narrativas, isto é, de histórias. Relatar, lembrar e narrar são atos políticos que potencializam permanentes disputas nos espaços referentes à História, ao ensino e à formação docente. Tais disputas se constituem em ferramentas políticas, pois a memória tem o poder de “presentificar” — ou não — certas representações do passado. Tornar presente o passado é algo que pode significar a constituição de um campo de força para os enfrentamentos nas relações cotidianas de poder.

Se, atualmente, presenciamos um crescimento dos ataques desferidos à educação, às escolas, aos professores e às professoras, isso ocorre, também, porque nossas ações têm provocado maior tensão nas relações de poder. Nossos questionamentos em sala de aula e nossas reflexões têm instigado nossos alunos e alunas a não aceitarem discursos simplistas ou revestidos por estratégias de dominação contra mulheres, negros, gays e tantos outros segmentos sociais. Os ataques à educação também sinalizam que a História tem contribuído, como força política, na luta em defesa dos princípios por uma sociedade mais justa e democrática.

Este dossiê, ao mesmo tempo em que contém as “digitais” dessa batalha, também (e paradoxalmente) se constitui uma ferramenta de luta e de enfrentamentos e apresenta um conjunto de artigos que abordam experiências de pesquisas sobre ensino de História, livros didáticos e formação docente. Assim, presentifica, por meio da escrita de seus autores e autoras, uma forma de combate às forças obscuras que tentam nos intimidar. Em cada reflexão presente nos artigos, há, também, um grito de resistência. Porque nós, intelectuais, professores e professoras, também fazemos parte da luta para que nossas interpretações sobre os objetos de estudo possam ser ouvidas, lidas, circuladas, debatidas e criticadas. Mas, fazemos isso por meio de uma operação intelectual fundamentada em princípios éticos e democráticos. Não somos criminosos agindo fora da lei. Nosso debate é travado no campo do argumento. Oferecemos nossas reflexões e apresentamos outros ângulos de percepção a partir da problematização de nossos objetos de pesquisa.

Este dossiê é composto por 11 artigos e uma entrevista que sinalizam o crescimento e a consolidação do ensino de História (e as questões que lhe são pertinentes) como objeto de estudo e debate nos segmentos mais amplos da sociedade. Ampliaram-se, sobremaneira, as pesquisas que têm como objeto de investigação o ensino de História. Seminários, congressos, encontros, grupos de pesquisa e publicações em periódicos sinalizam esse crescimento, que concorre como força para a conformação do ensino de História enquanto campo de pesquisa. Portanto, conforme apontam diversas pesquisas, mais do que um objeto de análise, tal conjunto de variáveis mostra a consolidação desse lugar de fronteiras. Esse campo fronteiriço se fortalece, também, pela diversidade temática de seus objetos de investigação. No âmbito da produção especializada do campo, “ensino de História”, “livro didático” e “formação docente” aparecem entre os principais temas abordados. Tais abordagens problematizam esses temas a partir de variadas questões.

O livro didático, conforme aponta a literatura especializada, é a principal ferramenta de trabalho de uma significativa parcela de professores e professoras que atua na Educação Básica. Por outro lado, as pesquisas também sinalizam que grande parte dos (as) docentes que atua no ensino fundamental e no médio não participa das discussões especializadas que envolvem o livro didático. Nessa dimensão, o presente dossiê convida a comunidade de professores (as)/pesquisadores (as) à reflexão a partir da leitura dos artigos que discutem aspectos sobre o ensino de História, o livro didático e a formação docente.

A abertura do dossiê fica por conta do artigo Passado, presente e futuro dos livros didáticos de história frente a uma BNCC sem futuro assinado por Sonia Regina Miranda e Fabiana Rodrigues de Almeida. No texto, problematizam as conexões entre a política para os livros didáticos de História e as proposições curriculares constituídas na esteira das formulações da BNCC, e argumentam que esses espaços são regidos por relações de disputas políticas e batalhas narrativas.

Na sequência, temos o texto Por que as narrativas nacionais permanecem? Revisão de literatura sobre novas perspectivas na pesquisa dos livros didáticos de história. No artigo, as autoras Maria Grever e Tina van der Vlies apresentam um rico panorama de um conjunto de pesquisas, em diversos países, que tematizam os livros didáticos, mostrando a permanência das narrativas nacionais e sua relação com a formação dos estados nacionais e o ensino de História. Além disso, destacam a potência investigativa dessas temáticas de estudo.

À continuação, temos o artigo Narrativas sobre o nazismo e o fascismo nas coleções didáticas de história: saber escolar e demandas do tempo presente, das professoras Maria Aparecida da Silva Cabral e Marilu de Freitas Faricelli. As autoras centram sua atenção nas articulações produzidas pelos autores dos materiais analisados (no que se refere às demandas do tempo presente), e dão foco à intercessão entre os saberes históricos escolares, os percursos construídos pelos autores dos livros didáticos, as prescrições curriculares e os projetos historiográficos.

O Ensino de História no Brasil e seus pesquisadores: breves notas sobre uma herança de tensões e proposições, é o texto seguinte assinado por Letícia Mistura e Flávia Caimi. Nele, as autoras apresentam uma reflexão sobre as heranças construídas no percurso processual do campo do ensino de História, percorrendo desde o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e o Colégio Pedro II até a apresentação de uma síntese sobre as temáticas investigativas que compõem o campo de pesquisa do ensino de História no Brasil. Na sequência, temos o texto Livros didáticos: autoria em questão, de Adriana Soares Ralejo e Ana Maria Monteiro. As autoras se debruçam na reflexão sobre o lugar de autoria nos livros didáticos, mostrando um conjunto diverso de relações que envolvem a produção dos livros didáticos e as condições e possibilidades que configuram esse lugar complexo ocupado pelo sujeito que recebe as credenciais de autor ou autora. O artigo seguinte é assinado por Andressa da Silva Gonçalves e Mauro Coelho tem por título As narrativas didáticas sobre o bandeirante: entre a mitologia bandeirante e a crítica histórica. Nesse texto, os autores analisam como História e memória adentram a literatura didática, focando sua análise nas “entradas e bandeiras” para mostrar a complexidade das relações entre o saber e a chamada memória histórica.

Em seguida, temos o artigo A abordagem da temática indígena e da história da África nos livros didáticos: exemplos de oficinas na formação docente, da professora Ingrid Silva de Oliveira Leite. O artigo centra a atenção na análise sobre as representações dessas temáticas em livros didáticos, tomando como pontos focais de problematização as oficinas e a elaboração de aulas em cursos de licenciatura em História no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.

O ensino de História e suas relações com o patrimônio é um tema que aparece na sequência, e é o foco do artigo assinado por Margarida Dias de Oliveira e Itamar Freitas, sob o título Patrimônio e ensino de história: cinco decisões do professor. Nesse texto, os autores apresentam importantes reflexões sobre as preocupações de peritos e professores de História em torno dos objetos que são considerados “patrimônio”. Por meio dessas análises, é possível refletir as relações entre “patrimônio e identidade” e “patrimônios nacionais e patrimônios da humanidade”, além de questões como “virtualidade”, “fisicalidade” e “preservação”. Qual história geral deve fomentar e se fazer presente no ensino de História na atualidade? A partir dessa indagação, Ivo Mattozzi apresenta seu artigo Uma nova história geral didática para compreender o mundo e agir como cidadãos globais. O autor defende a necessidade de alterar o modelo de história geral a ser ensinada, argumentando que a História, como disciplina escolar, corre o risco de se tornar irrelevante frente às mudanças que estamos presenciando como sujeitos ativos. De tal modo, defende que a História ensinada precisa ser redirecionada para um conhecimento diferente daquele transmitido, tradicionalmente, pelos sistemas escolares.

Victor Amado Salto e Alicia Graciela Funes, no texto Materiais didáticos para o ensino da história na formação de professores, focam a análise na problematização que envolve a construção dos materiais didáticos para o ensino de História na relação com o conhecimento histórico frente a um cenário desafiador, heterogêneo, diverso e múltiplo. Para os autores, essas variáveis são condições para refletir as práticas de pesquisa e o treinamento que os professores desenvolvem no campo do ensino e do conhecimento histórico. Na sequência, Miguel Jara, no seu artigo Los materiales didácticos en la enseñanza de la historia y de las ciencias sociales en argentina. Percepciones del profesorado, apresenta uma análise a partir da interpretação de um conjunto de professores de três cidades argentinas (Cipolletti, Bahía Blanca e Mar del Plata) no âmbito da formação de pós-graduação. O texto problematiza algumas questões que envolvem os materiais e recursos didáticos comumente usados nas aulas, e reflete sobre a avaliação que os professores fazem dos referidos materiais.

Por fim, temos a entrevista com a professora Marieta de Moraes, que recupera as memórias de seu percurso formativo e das discussões históricas e historiográficas nos diversos momentos de sua trajetória, e narra os bastidores de relações e debates sobre a construção do projeto do mestrado profissional em História, o ProfHistória.

Erinaldo Vicente Cavalcanti – Professor Adjunto da Faculdade de História e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará [Unifesspa], coordenador do laboratório e grupo de pesquisa iTemnpo e editor da Revista Escritas do Tempo. E-mail: ericontadordehistorias@gmail.com

Helenice Aparecida Bastos Rocha – Professora Adjunta na Faculdade de Formação de Professores, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro [UERJ/FFP]. E-mail: helarocha@gmail.com


CAVALCANTI, Erinaldo Vicente; ROCHA, Helenice Aparecida Bastos. Apresentação. Escritas do Tempo, Pará, v.2, n.5, 2020. Acessar publicação original [DR]

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História, Ciências, Saúde-Manguinhos. Rio de Janeiro, v.27, n.1, 2020.

Metrópole à beira-mar. O Rio moderno dos anos 20 | Ruy Castro

Terminei de ler Metrópole à beira-mar – o Rio moderno dos anos 20, de Ruy Castro, publicado pela editora Cia. das Letras em 2019.

Posso estar enganado, mas a impressão que o livro traz é a de que Castro se adiantou a provar que o Rio de Janeiro já era moderno antes de São Paulo e da Semana de Arte Moderna de 1922, antecipando-se, assim, às homenagens pelos 100 anos da dita Semana (para os distraídos, ocorrida em São Paulo em 1922). Leia Mais

Virginia Artigas. Histórias de arte e política | Rosa Artigas

Mais do que pode ser, a vida é maravilhosa! Tenho nas mãos agora um livro encantador escrito por Rosa Artigas sobre sua mãe: Virgínia Artigas, histórias de arte e política.

Armênio, nosso camarada sereno e cordial, instalou a amizade entre nós. O livro no qual celebramos sua memória – Nosso Armênio (1) – será lançado em São Paulo no dia 17 de março de 2020 (2). Trinta e um amigos, inclusive nós, derramam emoções e afeto no quanto escreveram a respeito do “Tio”, como o chamávamos. Mas o que agora me fascina, de verdade, é o livro da Rosa. Leia Mais

Vacina antivariólica: ciência/ técnica e o poder dos homens (1808-1920) | Tania Maria Fernandes

O livro de Tânia Fernandes, recentemente lançado pela Editora Fiocruz, é produto de sua dissertação de mestrado defendida na Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Aqueles que apenas passarem os olhos pelo título do livro e o tema tratado com certeza se lembrarão do também recente trabalho de Sidney Chalhoub, que aborda a questão da vacina antivariólica (Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial, São Paulo, Companhia das Letras, 1996). Entretanto, as semelhanças entre os dois livros terminam aí. As diferentes abordagens escolhidas pelos autores e a originalidade da trajetória e do enfoque de Tânia Fernandes tornam-se evidentes à medida que nos debruçamos sobre o livro da pesquisadora da Casa de Oswaldo Cruz. Enquanto o trabalho de Chalhoub está mais voltado para uma história cultural e procura resgatar as resistências da cultura popular carioca à prática da vacina, Fernandes volta sua atenção para a história da ciência, privilegiando a história da vacina propriamente dita, incluindo-se neste aspecto não apenas a história dos institutos encarregados de produzi-la e aplicá-la, mas também o conhecimento técnico e científico envolvido na sua produção.

Registre-se que, ao estudar as práticas científicas e as técnicas envolvidas na produção da vacina, Fernandes preocupa-se em mostrar como as concepções científicas não podem ser dissociadas das práticas políticas e dos interesses profissionais da comunidade médica, fugindo de qualquer compromisso com uma história ‘heróica’ da ciência. Esta perspectiva fica bastante evidente no capítulo três, onde analisa os conflitos políticos entre o barão de Pedro Affonso e Oswaldo Cruz em torno da concepção de a quem caberia o monopólio de produzir e aplicar a vacina: ao Estado ou à iniciativa privada. O barão de Pedro Affonso, primeiro médico a produzir com sucesso a vacina antivariólica animal e diretor do Instituto Vacínico Municipal do Rio de Janeiro entre 1894 e 1920, defendia seu monopólio privado conquistado ainda no final do Império, quando conseguiu reproduzir a vacina animal no país. Oswaldo Cruz, diretor do então Instituto Soroterápico e representante de uma tendência centralizadora e estatista, defendia a incorporação do Instituto Vacínico ao Instituto Soroterápico e o fim do monopólio privado de Pedro Affonso. Leia Mais

Cultura e democracia: convergências, conflitos e interesses públicos / Albuquerque: revista de história / 2020

Até ontem a palavra do alto César podia resistir ao mundo inteiro. Hoje, ei-lo aí, sem que ante o seu cadáver se curve o mais humilde. Ó cidadãos! Se eu disposto estivesse a rebelar-vos o coração e a mente, espicaçando-os para a revolta, ofenderia Bruto, ofenderia Cássio, que são homens honrados, como vós bem os sabeis. Não pretendo ofendê-los; antes quero ofender o defunto, a mim e a vós, do que ofender pessoas tão honradas. (Marco Antônio, em Júlio César de William Shakespeare)

O dossiê Cultura e Democracia: convergências, conflitos e interesses públicos, ainda que esteja ligado a temas e problemas temporais próximos ao que estamos vivendo no imediato presente, abrange uma temporalidade mais ampla que envolve os diversos meandros que compõe a estrutura do mundo e do Estado modernos. Desde as revoluções burguesas, que marcaram o surgimento de uma nova sociedade, homens e mulheres em vários espaços geográficos passaram por diferentes tipos de instabilidades políticas, o que gerou muitos debates intelectuais além de lutas e disputas frequentes pelas formas de entendimento sobre o poder de atuação das pessoas no espaço público.

O século XIX, por exemplo, é caracterizado no âmbito do continente europeu por numerosas lutas de trabalhadores que perceberam as possibilidades de transformação de suas condições de sobrevivência e de atuação política inaugurada pelo enredo liberal no final do século anterior. Um dos exemplos mais importantes nesse sentido ocorreu em Paris em 1848 quando a utopia da transformação atingiu inúmeras pessoas que incendiaram e subverteram as ruas da capital. A população invadiu e saqueou o Palácio das Tulherias, então residência do rei Luís Felipe. E antes que um governo provisório fosse formado e a Dinastia dos Orleans perdesse o poder, populares arrastaram o trono pelas ruas e o incendiaram na Bastilha. A força política e simbólica do que ocorreu a partir desse acontecimento foi retratada por imagens e palavras, mas nada mais forte que a análise produzida por Karl Marx em O 18 de Brumário de Luís Bonaparte.

Escrito entre dezembro de 1851 e fevereiro de 1852, Marx elaborou no calor dos acontecimentos uma análise cortante sobre a amplitude da atuação política de setores sociais explorados na vida democrática da França à época. O mesmo país que poucos anos antes havia legado ao mundo o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” e a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” utilizou o discurso da democracia para que as subversões e lutas de 1848 fossem acalmadas e conformadas. A derrota imediata dos trabalhadores que ocupavam as ruas de Paris ocorreu a partir de junho de 1848, quando a Assembleia Nacional Constituinte foi formada e começou a elaboração das bases da Segunda República Francesa. O trono queimado de 1848 foi calmamente reconstruído até que, em 1851, o sobrinho imitou o tio e fez do dia 2 dezembro o seu 18 de Brumário.

Esse é apenas um exemplo onde os temas da democracia e da cultura estiveram fortemente imbricados em um “momento de perigo” do século XIX. Nele podemos observar muitas coisas e tirar diversas conclusões, mas o mais importante é perceber que o discurso democrático, por si mesmo, não garante a ampla e profunda participação política de diferentes estratos sociais. Aqui é desnecessário realçar a habilidade de Marx em tratar desse tema, inclusive porque O 18 de Brumário é inquestionavelmente um clássico, mas é impressionante perceber que desde 1852, quando ele foi publicado, temos condições de desdobrar essa discussão principalmente para entender que a democracia não é um bem em si, mas um constructo social que depende de variáveis históricas e, portanto, de condições sociais que precisam ser cotidianamente pensadas e, claro, reescritas. Inclusive o próprio Marx nas linhas iniciais de seu texto chama a atenção para o fato de que “Os homens fazem a sua própria história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhes foram transmitidas assim como se encontram” (MARX, 2001, p. 25). A participação política requer responsabilidade de todos. As noções de cidadania, igualdade e direitos, entre outros, como todos os aparatos discursivos, possuem correspondentes na prática. O autor alemão nos mostrou no século XIX, que quando alguns grupos colocam em prática a igualdade, outros reagem, inclusive no campo do discurso lançando mão do vocabulário de participação política inaugurado pelas revoluções burguesas.

Tomando essa reminiscência do século XIX como referência, podemos buscar outras no século posterior. O que nos motiva nesse caminhar é o vocabulário político do Estado Moderno, lembrando sempre que nosso escopo são as convergências entre democracia e cultura.

Ao longo do século XX, as duas guerras mundiais foram acontecimentos que alteraram profundamente os debates sobre democracia. Se antes de começar, o primeiro conflito fora saudado em prosa e verso por inúmeras pessoas embaladas pelo nacionalismo e o imperialismo de fins de século na Europa, 1918 apresentou um quadro muito distinto. Além dos problemas econômicos decorrentes da guerra e do novo quadro de forças políticas mundiais, o nacionalismo adquiriu cada vez mais traços xenófobos e chauvinistas. Isso sem contar o peso que a Revolução Russa de 1917 teve para os debates ideológicos da época bem como a acentuada gravidade do processo de exploração do continente africano para a política internacional. Não por acaso, as derrotas mais duras para o campo democrático não tardaram a chegar. Em 1922, Benito Mussolini promoveu a conhecida Marcha sobre Roma, com isso o fascismo entrava triunfal na cena pública contemporânea e, em 1933, Adolf Hitler foi nomeado chanceler da Alemanha pelo presidente Paul von Hindenburg. Daí até a Segunda Guerra Mundial foi uma questão de tempo e novamente o mundo se viu diante de inúmeros debates sobre a questão democrática.

Muitos autores se dedicaram à discussão sobre democracia e espaço público nesse amplo contexto que abarca também o período posterior a 1945, quando inclusive se coloca em prática no ambiente europeu o Estado de bem estar social. Uma das reflexões mais marcantes da época surge das letras da filósofa Hannah Arendt, em especial por ela entender que o espaço da ação política é o espaço da ação pública por excelência. A política se efetiva onde os Homens se unem aos seus iguais, são capazes de assumir posicionamentos, persuadem, sofrem e aceitam derrotas.

Arendt se dedicou, desde As Origens do Totalitarismo (1951), amplamente às reflexões que envolvem “ação” e “pensamento” no ambiente dos autoritarismos inaugurados no século XX. Os leitores atentos encontram nos seus livros análises primorosas sobre as incongruências que o tema da democracia carrega, entre eles Sobre Revolução (1963), Entre o passado e o futuro (1968) e Crises da República (1969). Nesse último, tratando especificamente da realidade dos Estados Unidos, país que acolheu a autora quando ela fugira do Nazismo, a análise se volta para a revisão da ideia de representatividade política frente às questões da liberdade pública:

Queremos participar, queremos debater, queremos que nossas vozes sejam ouvidas em público, e queremos ter uma possibilidade de determinar o curso político do nosso país. Já que o país é grande demais para que todos nós nos unamos para determinar nosso destino, precisamos de um certo número de espaços públicos dentro dele. As cabines em que depositamos as cédulas são, sem sombra de dúvida, muito pequenas, pois só têm lugar para um. Os partidos são completamente impróprios; lá somos, quase todos nós, nada mais que o eleitorado manipulado. Mas se apenas dez de nós estivermos sentados em volta de uma mesa, cada um expressando a sua opinião, cada um ouvindo a opinião dos outros, então uma formação racional de opinião pode ter lugar através da troca de opiniões. (ARENDT, 2010, p. 200)

É perceptível pela ótica da autora, entre outras coisas, que a participação democrática ampla depende de fatores que vão além do depósito do voto nas urnas e inclui a ampliação dos espaços públicos, a capacidade de diálogo, o processo formativo cultural e educacional, daí a importância do ambiente escolar e da escolarização, discutidos de maneira tão contundente no texto A Crise na Educação. Ninguém nasce em um mundo livre de construções humanas, por isso cada nova geração tem responsabilidade com o passado e com o futuro. Portanto, sem o processo educacional, corremos o risco de ignorar o que as gerações anteriores construíram e, com isso, desprezamos os perigos autoritários inaugurados no passado. E isso, infelizmente, é possível sem o diálogo frequente e a expansão da esfera pública.

Com tantos e profundos autoritarismos no século XX percebemos, lendo autores diferentes e refletindo sobre momentos e sociedades distintas, que é impossível não ser constantemente vigilantes com o processo formativo das pessoas. É ele que minimamente pode garantir um debate mais consistente sobre os meandros democráticos e, principalmente, condições de sobrevivência onde existam conflitos e convergências de interesses públicos.

Apesar de termos percorrido apenas vinte anos do século XXI, está claro que a força autoritária recrudesce imensamente no mundo e no Brasil nos últimos anos. Há inclusive uma extensa bibliografia sobre o tema que vem colocando acentos interpretativos distintos e importantes sobre a ideia de democracia. Desde a publicação de Como as democracias morrem (2018), de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, temos acesso no Brasil aos livros Como a democracia chega ao fim (2018), de David Runciman; O povo contra a democracia (2019), de Yascha Mounk; Na contramão da liberdade (2019), de Timothy Snyder, entre outros. Já entre autores e pesquisadores brasileiros a situação não é diferente e merece destaque o livro do sociólogo Leonardo Avritzer, O pêndulo da democracia (2019).

Levando em conta toda essa discussão e entendendo, desde os escritos mais contundentes do século XIX, que a democracia é um tema sempre a ser discutido, construído e cultivado que estruturamos a proposição deste dossiê. Assim, a articulação entre Cultura e Democracia não é apenas um jogo de palavras que diz respeito às urgências intelectuais da época em que vivemos, mas é um retorno ao passado carregado de historicidade e de respeito aos contínuos movimentos das lutas de homens e mulheres que formaram nossa sociedade ao longo do tempo. Está também relacionada à constatação de que o conhecimento acadêmico é fundamental para uma época que despreza a ciência e a racionalidade como sintoma de autoritarismos políticos e sociais que desprezam a vida e a multiplicidade humana.

Abrindo o dossiê, Durval Muniz de Albuquerque Júnior no texto Narrar vidas, sem pudor e sem pecado: as carnes como espaço de inscrição do texto biográfico ou como uma biografia ganha corpo problematiza a noção de biografia histórica, trazendo à tona como o ato de escrever biografias maneja a dimensão temporal e carnal da existência. Para tanto, o historiador lança mão da obra Roland Barthes por Roland Barthes (2017) e permite que os leitores compreendam que o ato de narrar e ler sobre vidas é carregado de significados variados. No campo do debate sobre democracia, o texto adquire singularidade por nos permitir compreender que quando lidamos com agentes do passado por meio de biografias estamos diante de uma “potência carnal que corporifica a escrita biográfica”.

Na sequência, disponibilizamos as reflexões de Rosangela Patriota sobre as incertezas contemporâneas em torno de práticas democráticas, por meio do artigo A questão democrática em tempos de incertezas. Com essa preocupação, a autora realiza um mergulho no cenário político internacional das últimas décadas para, posteriormente, discutir o tema do antissemitismo em sociedades contemporâneas, a partir do revisionismo na historiografia do Holocausto e por intermédio da peça teatral Praça dos Heróis de Thomas Bernhard. Articulando diálogos entre passado / presente, Patriota problematiza dúvidas e impasses de nossa história imediata.

Ainda no contexto de elaboração de narrativas históricas, cabe destacar o artigo do historiador Antonio de Pádua Bosi, Trabalho, Imigrantes e Política em “Greve na Fábrica”: o maio de 68 para Robert Linhart. Homem público francês, que viveu um dos momentos mais intensos dos debates democráticos da segunda metade do século XX, Linhart produziu um texto revelador sobre identidades culturais e experiência de trabalho industrial a partir da vivência de operários de diferentes nacionalidades na linha de montagem da Citroën, em 1969. Bosi recupera esses escritos e dá dimensão histórica e crítica ao livro do autor francês. Ler o artigo nos ajuda a perceber o quanto a dinâmica do trabalho e o debate sobre democracia se alterou ao longo do tempo, ao mesmo tempo que trouxe consequências marcantes para a vida e a luta dos operários.

Caminhando para a compreensão das discussões da democracia no Brasil, o artigo Paulo Freire: el método de la concientización, em la educación, para analizar y compreender el contexto actual de la Globalización, escrito por José Marin Gonzáles, traz para o debate sobre democracia o tema da educação por meio do método de Paulo Freire no atual contexto de Globalização. O texto é fundamental para um momento em que muito se critica o educador brasileiro sem nenhum tipo de fundamentação acadêmica e mais ainda quando o processo educacional é pensado prioritariamente como corpo que oferece aos sujeitos, desvinculados de quaisquer coletividades, ferramentas exclusivas para o mercado de trabalho. Freire é um chamamento à coletividade, à noção de educação voltada para o bem comum e principalmente para a justiça social, temas caros às experiências democráticas.

Entrando especificamente no diálogo com linguagens artísticas no Brasil dos últimos anos, o dossiê conta com quatro artigos. Em O homem de La Mancha: aspectos da utopia no teatro musical brasileiro da década de 1970, André Luis Bertelli Duarte promove importantes discussões sobre o teatro brasileiro nos duros anos da repressão política brasileira, com destaque para as possibilidades do debate democrático promovido pela encenação musical de O homem de la mancha (Dale Wasserman, 1965), produzido por Paulo Pontes, sob a direção de Flávio Rangel, em 1972-1973. No ambiente de autoritarismos diversos e em especial contra a figura de artistas e intelectuais, a releitura de Quixote se apresentava como ideal de justiça e liberdade.

Ainda dialogando com o campo teatral, Rodrigo de Freitas Costa promove no artigo O teatro de rua e sua expressão política: os primeiros anos do Grupo Galpão de Belo Horizonte (1982-1990) reflexões sobre o teatro de rua no período logo após o processo de abertura política, tendo por referência o trabalho desenvolvido pelo conhecido grupo teatral da capital mineira. O texto contribui para a discussão sobre democracia e cultura no Brasil especialmente por problematizar e questionar a ideia de “vazio cultural” desenvolvida por inúmeros críticos teatrais que tratam da produção nacional pós Estado Autoritário. Nesse sentido, as primeiras peças escritas e encenadas pelo Galpão são o mote para compreender parte da complexidade do processo cultural brasileiro e a amplitude do teatro político nos anos 1980.

Já sobre a relação entre Cinema, Democracia e História, o artigo de Rodrigo Francisco Dias, Autoritarismo e democracia nos filmes “Jânio a 24 Quadros” (1981, de Luís Alberto Pereira) e “Jango” (1984, de Silvio Tendler), permite ao leitor compreender como os temas do autoritarismo e da democracia são reelaborados nos documentários de Luís Alberto Pereira e Silvio Tendler no início da década de 1980. Abordando aspectos formais, o autor mostra como as configurações estéticas carregam posicionamentos históricos e políticos. Com isso, une forma e conteúdo por meio da historicidade e promove considerações importantes capazes de elucidar as dinâmicas do debate democrático dos anos finais da Ditadura Militar.

Por fim, o dossiê se encerra com uma discussão sobre financiamento cultural nos dias atuais. Essa discussão é fundamental para o Brasil de hoje, onde a arte é menosprezada e diversos artistas e intelectuais são hostilizados publicamente. Em um país que investe pouco em educação e cultura, sabemos que as discussões democráticas são frágeis e que os espaços públicos são minados por discursos surdos e preconceituosos. O artigo Democracia e Arte: as percepções da Lei Rouanet e o financiamento da cultura de Jacqueline Siqueira Vigário e Anna Paula Teixeira Daher promove reflexões importantes recolocando essa discussão em bases acadêmicas inicialmente analisando a lei de incentivo à cultura e, por fim, utilizando como exemplo o caso da exposição “Queermuseu: Cartografia da diferença na arte brasileira” (2017).

Como parte do dossiê para este este número de albuquerque: revista de história, há uma entrevista da Professora Doutora Maria Helena Rolim Capelato. Historiadora atuante na esfera pública, árdua defensora do conhecimento histórico cientificamente elaborado e produtora de reflexões importantes sobre História e Imprensa no Brasil do século XX. Na entrevista, a professora fala de sua formação ainda na Ditadura Militar, destaca os principais debates que dizem respeito à sua pesquisa sobre imprensa no Brasil e na América Latina e, por fim, reflete sobre temas políticos brasileiros contemporâneos.

Esperamos que os leitores aproveitem as reflexões que o dossiê traz e que possam cada vez mais entender e divulgar que a democracia não é um bem em si, mas um processo que precisa constantemente ser reelaborado, inclusive quando o objetivo é favorecer o humanismo em tempos sombrios.

Referências

ARENDT, Hannah. Crises na República. Tradução de José Volkmann. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 2010.

AVRITZER, Leonardo. O pêndulo da democracia. São Paulo: Todavia, 2019.

LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. Como as democracias morrem. Tradução de Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

MARX, Karl. O 18 de Brumário de Luís Bonaparte. Tradução de Nélio Schneider. São Paulo: Boitempo, 2011.

MOUNK, Yascha. O povo contra a democracia. Tradução de Cássio de Arantes Leite e Débora Landsberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

RUNCIMAN, David. Como a democracia chega ao fim. Tradução de Sérgio Flaksman. São Paulo: Todavia, 2018.

SNYDER, Timothy. Na contramão da liberdade: a guinada autoritária nas democracias contemporâneas. Tradução de Berilo Vargas. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

Rosangela Patriota (Universidade Presbiteriana Mackenzie / CNPq)

Rodrigo de Freitas Costa (Universidade Federal do Triângulo Mineiro)

Thaís Leão Vieira (Universidade Federal de Mato Grosso)

Organizadores


PATRIOTA, Rosangela; COSTA, Rodrigo de Freitas; VIEIRA, Thaís Leão. Apresentação. Albuquerque: revista de história, Mato Grosso do Sul, v.12, n.24, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Interwoven. Andean Lives in Colonial Ecuador’s Textile Economy | Rachel Corr

En el siglo XVI, la conquista española de los territorios americanos propició su inserción a la dinámica de los mercados internacionales y, como parte de este proceso de globalización, las economías y sociedades regionales y locales experimentaron cambios significativos. Estos se reflejan en la implementación de un nuevo marco institucional colonial que permite reasignaciones en el uso y acceso a la tierra, recursos naturales y mano de obra local, así como la hegemonía de nuevos sectores económicos que redefinen la vida cotidiana de las familias y grupos en el poder, tanto nativos como españoles, y de la población esclava africana.

La organización social y económica de los Andes, durante el imperio incaico y el período previo a la conquista española, tuvo como eje central el trabajo. Pease (2011) concluye, a partir del análisis de los escritos de los primeros cronistas españoles y mestizos, que existía una estrecha relación entre parentesco, reciprocidad y riqueza. Al respecto y en base a una transcripción del Inca Garcilaso de la Vega, define a una persona rica como aquella que tiene hijos y familia que lo ayudan a que termine de forma rápida el trabajo relacionado con el tributo que está obligado a realizar. La importancia de las relaciones de parentesco en la sociedad Andina sobrevive al trauma de la conquista y la familia sigue siendo una institución fundamental para la población indígena en el nuevo escenario creado a partir del siglo XVI. Es en este contexto, que el libro de Rachel Corr analiza, desde un enfoque antropológico e histórico, las decisiones familiares de los pueblos indígenas que se enfrentaban a la obligación de trabajar en el obraje, así como los arreglos familiares que se pusieron en práctica con el objetivo de cumplir la cuota de producción asignada. La autora analiza también los mecanismos que implementaron la población indígena migrante y forastera para evitar el trabajo forzado en el obraje textil. Leia Mais

Políticas de Formação de Professores na América Latina / Formação Docente / 2020

A Revista Formação Docente – Revista Brasileira de Pesquisa sobre Formação de Professores (RBPFP) – é uma publicação do Grupo de Trabalho Formação de Professores (GT8), da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) publicada em parceria da Autêntica Editora. Esta publicação refere-se ao primeiro quadrimestre de 2020 – número 23, do volume 12 Janeiro-abril de 2020.

Este primeiro número de 2020 traz um dossiê sobre políticas de formação de professores na América Latina, organizado pelas Professoras Regina Magna Bonifácio Araujo e Célia Maria Fernandes Nunes que apresentam no primeiro artigo dessa publicação as motivações da organização do referido dossiê sobre temática tão relevante internacionalmente no campo da Formação de Professores.

As reflexões aqui contidas abrem perspectivas para pensarmos, em nível continental, uma pesquisa sobre o tema da “universitarização” como política da formação de professores na América Latina. Quais as contribuições que essas experiências já vivenciadas em alguns países trazem para o debate sobre o tema? Quais desafios dos demais países que ainda permanecem no modelo de formação por meio de instituições não- -universitárias enfrentam? As experiências na América do norte (Canadá e EUA) o que nos dizem sobre a formação de professores na universidade? Quais os avanços conquistados e quais retrocessos podem ser percebidos nessa caminhada? Certamente esse é um tema por demais relevante para o debate na Revista Brasileira de Pesquisa sobre Formação de Professores. Como tema emergente, esperamos de igual modo que ele seja alçado como demanda de pesquisa no campo da História da Formação de Professores, das Instituições formadoras e das Políticas de Formação no interior do GT 08 da Anped. Certamente, as várias experiências de Redes de Pesquisas sobre educação (Política, Formação, etc) nos países latino-americanos, incentivarão os pesquisadores do campo a se voltarem para pesquisas de referencias macro na área, a fim de nos indicar novas perspectivas sobre a Formação de Professores na América Latina y Caribe.

O Dossiê sobre políticas de formação de professores na América Latina apresenta seis (6) trabalhos que trazem uma reflexão sobre a temática desde um olhar da América do Sul: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Perú e Uruguai. Os artigos estão apresentados no primeiro antigo de introdução da lavra das professoras Regina Araujo e Célia Nunes.

Por se tratar de um dossiê do cone sul, a revista solicitou artigos, por meio de demanda induzidas a investigadores dos campos da História da Educação e da Formação de Professores dos países do da América do Sul. Recebemos em tempo para a publicação deste número, duas contribuições: a primeira vem do Perú, uma contribuição do experiente investigador do campo da História, Dr. Elmer Robles, que escreve sobre formação inicial de professores, uma experiência de uma Escola Normal Urbana no inicio do século XX, no norte do Perú. A segunda contribuição vem do Chile de um grupo de investigadores do campo da Formação de Professores, coordenado pelo Dr Ilich Silva-Peña, membro do Conselho Editorial Consultivo da RBPFP, e trata sobre a formação do professorado no Chile no século XX.

Para finalizar esse número, temos um artigo de demanda espontânea que aborda tema já iniciado nesse periódico em um dossiê organizado no ano de 2019; Trata-se da questão étnico-racial na formação de professores, no qual o professor Marcelo Donizete, traz elementos de uma pesquisa realizada com os professores que exercem sua docência na modalidade educacional de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil na Rede Municipal de Escolas de Mariana, MG.

Esperamos que este número que ora apresentamos da Formação Docente –Revista Brasileira de Pesquisa sobre Formação de Professores, seja relevante para o debate no campo, e possibilite a reflexão para os investigadores que atuam pesquisando sobre a Formação de Professores na América Latina.

Agradecemos atenção do leitor e o convidamos à leitura.

José Rubens Lima Jardilino – Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Belo Horizonte, Minas Gerais – Brasil.


JARDILINO, José Rubens Lima. Apresentação. Formação Docente. Belo Horizonte, v. 12, n. 23, p. 9-10, jan./abr. 2020. Acessar publicação original [IF].

Boletim de História e Filosofia da Biologia. [?] v.14, n.1, 2020.

VOLUME 14, NÚMERO 1
MARÇO DE 2020

História das Ideias do Ensino da Dança – VIEIRA (Urdimento)

VIEIRA M S História das ideias do ensino da dança TOPO Dialogue

VIEIRA M S História das ideias do ensino da dança DialogueVIEIRA, Marcilio de Souza. História das Ideias do Ensino da Dança na Educação Brasileira. Editora Appris, 2019. 183p. Resenha de: NASCIMENTO, Diego Ebling do; RICHTER, Sandra Regina Simonis.  Urdimento, Florianópolis, v.1, n.37, p. 456-462, mar/abr 2020.

No livro História das ideias do ensino da dança na educação brasileira, o professor, pesquisador e artista da dança Marcilio de Souza Vieira apresenta o resultado das investigações realizadas em seu pós-doutoramento na Universidade Federal da Paraíba. Na obra, o autor apresenta conteúdos de documentos – Leis, Resoluções, Minutas, Diretrizes, Parâmetros e Base Curriculares – com o objetivo de realizar uma reflexão crítica do pensamento pedagógico brasileiro a partir do percurso histórico da frágil presença da Dança na educação brasileira.

Como afirma o autor, ao destacar sua opção metodológica pela “nova história” como contraposição às grandes narrativas ou teorias de cunho positivista, há que “desfazer a mitologia do olhar isento e indicar o sentido e a intenção do olhar do estudioso em/da Dança” (Vieira, 2019, p. 20). Para tanto, propõe uma obra em três atos – As Bases da Arte, Os Sistemas e As Problemáticas: A crise revelada – compostos por 14 cenas que permitem situar distintas concepções de arte e políticas para o ensino da dança no pensamento educacional brasileiro, desde a Educação Infantil até o Ensino Superior, incluindo os Cursos Técnicos de Dança. As cenas propostas são pautadas por uma revisão analítica sustentada na perspectiva da historiografia da dança moderna brasileira e ocidental.

A relevância da investigação realizada por Vieira em torno da presença – ou não – da dança na educação brasileira está em contribuir para compreendermos com Jorge Larossa (2006) que a produção, legitimação e controle de determinados modos de pensar, acessar e constituir conhecimentos refletem, indistintamente, na formulação de políticas educacionais que favorecem certos modos do corpo linguageiro aprender a estar sendo no e com o mundo. Em outros termos, implica compreender que a legitimação e o controle educacional de distintas experiências de linguagem produzem diferença na corporalidade, na sensibilidade, nas possibilidades singulares de imaginar e sonhar, de perceber e agir na pluralidade mundana.

Nesta compreensão, em sua revisão analítica do ensino das artes no Brasil, sem a intenção de esgotar a amplitude do tema, o autor discorre sobre o lugar da dança nas instituições de ensino e demonstra que ela sempre esteve à margem nas políticas educacionais em nosso país até a implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n. 9.394/96, ou seja, apenas há pouco mais de duas décadas. Essa conquista, destaca Vieira, decorre da constituição de associações de arte no Brasil e dos movimentos em prol das artes na educação que emergiram na década de 1970.

Tais movimentos exerceram relevante força política para garantir o debate em torno da inserção do componente curricular “educação artística” nas escolas e na formação de professores, sendo os propulsores para a inclusão das diferentes dimensões das linguagens da arte nas LDBEN de 1971 (Lei n. 5692/71) e de 1996 (Lei n.

9394/96). Porém, se a formação em dança no ensino superior e técnico é garantida na LDBEN de 1971, é apenas com a LDBEN de 1996 que será afirmada como ensino obrigatório na educação básica brasileira. Mesmo assim, destaca o autor, não há hoje garantias satisfatórias para a presença da linguagem da dança nas escolas de educação básica e na formação superior.

Não há garantias para a presença da dança nos currículos escolares e na formação de professores de artes pois, de acordo com o autor, hoje, o ensino de Artes na Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017) “é relegado à subcomponente e à unidade temática, favorecendo uma aprendizagem polivalente da área e negando a produção de conhecimento de cada uma das linguagens que o aluno da educação básica tem direito” (Vieira, 2019, p. 135). O autor destaca que a implementação da BNCC, na especificidade do ensino das Artes/Dança, consiste em uma retroação que empobrece os currículos escolares e, consequentemente os de formação de professores, por equiparar-se “aos problemas não muito diferentes daqueles associados ao passado” (Vieira, 2019, p. 133). Ou seja, a histórica instabilidade do acesso à Dança na escola é dada pelas opções políticas voltadas para a formação específica de profissionais habilitados a exercerem o ensino das diferentes dimensões linguageiras da arte. As artes na escola continuam sendo um tenso campo de disputa.

Nesse sentido, a legitimidade da temática emerge do momento histórico da BNCC (Brasil, 2017) se encontrar em fase de implementação e o próprio contexto escolar se constituir como um espaço eficaz de resistência à permanência das artes nos currículos da Educação Básica. Resistência que aponta a relevância educacional de manter a insistência em fomentar uma educação estética e poética que potencialize a vida e os modos de existir.

A ausência da dança em diversos registros de diferentes períodos da história da educação brasileira faz com que até a “Cena 5” do livro o autor se debruce na discussão do encontro entre artes e educação escolar focalizando o ensino das artes do desenho e da música. Tal ênfase indica que o ensino da Dança ocorria prioritariamente em espaços não escolarizados, porém não explora como este ensino acontecia. A Dança, por inúmeras vezes, é tratada apenas como um “assunto” que de quando em quando é resgatado.

Neste sentido, é um livro que anuncia, pelo seu título, a especificidade da dança na educação, mas que muitas vezes não fala sobre ela, nela ou dela. A constatação decorre de um percurso histórico que demonstra, no resgate realizado pelo autor, a resistência à presença da dança nas políticas educacionais do país e, consequentemente, na escola e na formação de professores.

No “Terceiro Ato”, voltado para “As problemáticas: a crise revelada”, há uma tentativa de focalizar a Dança a partir da interrogação pelo “lugar reservado às Artes/ Dança na Base Nacional Comum Curricular” (Vieira, 2019, p. 129), porém, mais uma vez, muitos parágrafos são dedicados a trazer conceitos e discussões que evitam ou driblam a proposta da “História das Ideias do Ensino da Dança na Educação Brasileira” ao priorizar a diluição da área Arte – e suas consequências na formação de professores de Arte – com o campo da Dança.

Ainda neste Terceiro Ato, Vieira (2019) aponta diferentes políticas educacionais implementadas nos últimos anos para a garantia da Dança nos diferentes níveis de ensino: Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior. No entanto, esquece o Ensino Técnico. O que é bastante intrigante, pois em momentos políticos como o nosso discutir a formação técnica nos parece extremamente relevante.

Será que o Ensino Técnico em Dança também não estará em crise? Outro apontamento que consideramos importante sublinhar nesta resenha é a desconsideração pelos estudos contemporâneos em Arte e Educação os quais vêm, cada vez mais, legitimando modos de fazer/pensar/viver dos povos originários do Brasil. O que aqui questionamos é a manutenção da ampla tendência da abordagem eurocêntrica na história do encontro político entre artes e educação no Brasil – desencadeado pelos Jesuítas e reduzido à cognição pelo ensino pragmático de listagens de conteúdos formulados como “direitos e objetivos de aprendizagem” na terceira versão da BNCC (Brasil, 2017). Ao seguir tal tendência, o autor expõe não apenas a intencionalidade política no apagamento da forte presença popular das matrizes culturais africanas e indígenas como a tensão conceitual gerada pela opção educacional de conceber arte como cognição passível de ser formulada em prévios conhecimentos ou “objetivos de aprendizagem” a serem ensinados.

A tensão é dada pelo esquecimento de que “se pensa sempre com o corpo” (Zumthor, 2007, p. 77), ou seja, pela desconsideração conceitual de que, primordialmente, “arte não faz sentido, faz sentir” (Nancy, 2016, p. 18). Talvez, essa tensão ou imprecisão nas concepções de arte no processo formativo de crianças, jovens e adultos, antes de ser limitadora, possa impulsionar outras interrogações que permitam expor o esquecimento pedagógico de que o enigma da força poética da arte/dança emerge da impossibilidade de apreender a transfiguração do sensível pois, como já disse Merleau-Ponty (1999), esta emerge de uma intencionalidade do corpo que independe de “representações”. Aqui, o paradoxo da ludicidade e lucidez que traduz os perigos da linguagem (Richter, 2016).

A publicação do livro de Vieira contribui para fomentar o debate em torno das memórias de dança no meio acadêmico e artístico ao sistematizar documentos orientadores do ensino da arte. Sua escrita cria condições para que possamos compreender, de modo amplo, a constituição histórica das políticas públicas para a área da Arte e da Educação, na qual a dança ocupa um lugar periférico no texto, evidenciando que necessita encontrar o seu lugar na educação brasileira.

Por fim, a importância da análise histórica realizada por Vieira na especificidade da presença da arte/dança no país está em expor o tenso percurso da disputa política pelos modos como educacionalmente definimos quais saberes optamos em apresentar aos novos que chegam no mundo e com qual atitude pedagógica nos posicionamos frente a eles. Nesse sentido, a publicação contribui para ampliar uma bibliografia tão escassa quanto relevante para o inadiável debate em torno do encontro entre artes e educação.

O livro é recomendado para estudantes, professores, pesquisadores e artistas que têm por objetivo adentrar nos paradoxos dos percursos históricos do ensino da Arte no país. O texto é acessível ao possibilitar a todos e todas, independente de sua área de atuação, realizar uma instigante leitura sobre as políticas educacionais brasileiras e suas relações com o ensino da arte/dança na escola e no ensino superior.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Base Nacional Comum Curricular. Secretaria de Educação Básica e Conselho Nacional de Educação. Brasília: SEE/CNE, 2017.

LARROSA, Jorge. Uma lengua para la conversación. In: MASSCHELEIN, Jan; SIMONS, Maarten (Eds.). Mensajes e-ducativos desde tierra de nadie. Traducción de María Rosich. Barcelona: Laertes, 2006, p. 45-56.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. Tradução Carlos Alberto Ribeiro de Moura. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

NANCY, Jean-Luc. Demanda. Literatura e filosofia. Florianópolis: Ed. UFSC; Chapecó: Argos, 2016.

RICHTER, Sandra R.S. Educação, arte e infância: tensões filosóficas em torno do fenômeno poético. Revista Crítica Educativa, v. 2, n. 2, 2016, p. 90-106, Dossiê: Infância e Educação Infantil: abordagens e práticas.

VIEIRA, Marcilio de Souza. História das Ideias do Ensino da Dança na Educação Brasileira. Editora Appris, 2019.

ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

Diego Ebling do Nascimento – Doutorando em Educação na Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC); professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT). digue_esef@yahoo.com.br.

Sandra Regina Simonis Richter – Doutora em Educação, professora e pesquisadora da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC; Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Educação da UNISC, líder do grupo de pesquisa Estudos Poéticos: Educação e Linguagem UNISC/CNPq. srichter@unisc.br.

La Fura dels baus en quarentena. 40 anys de trajectória grupal: 1979-2019. Próleg per La Fura dels Baus – SAUMELL (Urdimento)

SAUMELL, Mercè. La Fura dels baus en quarentena. 40 anys de trajectória grupal: 1979-2019. Próleg per La Fura dels Baus. Barcelona: Angle Editorial, 2019. Resenha de GIMMLER NETTO, Maria Amélia. Urdimento, Florianópolis, v.1, n.37, p. 463-470, mar/abr 2020.

La Fura Dels Baus en Quarantena – 40 anys de trajectória grupal: 1979-2019 (ISBN: 978-84-17214-74-6), teve sua primeira edição lançada em outubro de 2019 em Barcelona pela Angle Editorial e La Fura Dels Baus. Com autoria de Mercè Saumell a publicação está no idioma catalão e é uma brochura de aproximadamente duzentas páginas com projeto gráfico/diagramação de Francisca Torres.

O livro dispõe de conteúdo interativo em formato de vídeo. Para ter acesso a este conteúdo é necessário baixar um aplicativo gratuito na App Store ou no Google Play e se necessita dispor de acesso à internet. Algumas das imagens do livro possuem um símbolo, que é uma seta preta ao lado ou abaixo, para identificar a presença do conteúdo interativo.

O índice, ou sumário do livro, apresenta sete capítulos acrescidos de Epílogo, Bibliografia, Discografia, Videografia e webs, além de um Histórico do La Fura Dels Baus. Há também uma breve apresentação da autora, além de uma sessão intitulada de Prólogo composta por trechos assinados por Àlex Ollé, Carlus Padrissa, Jurgen Muller, Miki Espuma, Pep Gall e Pera Tatiñá, artistas integrantes da companhia catalã.

Os sete capítulos do livro são: 1) Primeira Etapa: duas trilogias Fureiras; 2) Mudanças e permanências. Metodologias de criação; 3) O espaço público: propostas de rua e macroespetáculos; 4) La Fura Dels Baus e a Ópera; 5) Propostas de sala (indoor); 6) Transmissão de conhecimento. Formação e criação; 7) La Fura Dels Baus como objeto de estudo.

Esta resenha enfocará especificamente aspectos referentes à remontagem do espetáculo Manes (primeiro capítulo), às metodologias de criação (segundo capítulo) e às noções de formação e investigação em artes cênicas (sexto capítulo).

Repertório e Criação – A recriação de Manes Manes (1996) foi o último espetáculo da segunda trilogia Furera, ele fechou um ciclo criativo e, sendo assim, possuía referencias temáticas já desenvolvidas pela companhia, como a comida, o sexo, a vida e a morte. Manes é uma proposta cênica que não se baseia em um texto dramático, mas sim na ação em cena. A noção de tempo correspondia ao ritmo da peça e não a sua narrativa, e com essa peça o grupo colocava, mais uma vez, a expectativa do público frente a um aparente caos cênico.

O espaço onde se desenvolviam as ações era concebido de maneira assimétrica, de difícil controle pela percepção e olhar do público e a luz se diversificava em diferentes atmosferas, evocando em alguns momentos um ambiente Disco Club. Manes também vem a ser o primeiro espetáculo fureiro de autoria, assinado por Pera Tantiñá.

Esta encenação, de dimensões mais reduzidas que as anteriores da companhia, chamava a atenção por seu caráter mais artesanal e, para isso as dimensões da produção foram planejadas para que fosse possível se fazer uma turnê usando apenas uma caminhonete.

Na atualidade Manes é um caso singular de recriação no teatro catalão. A peça foi remontada em 2019, na ocasião da comemoração dos 40 anos do grupo. Para Tantiñá, voltar a levantar o espetáculo significa recuperar a essência do ritual fureiro para as novas gerações. Em Manes se destacam as emoções puras, primárias, a partir de uma proposta simples, muito energética e baseada na interpretação. Ela é arte sanal e analógica, sem a presença da tecnologia digital. A autora do livro considera que seria bem interessante fazer uma comparação entre a recepção da montagem de 1996 e a que foi feita depois de 2018.

Metodologias de criação – colaboradores, satélites e tecnologia O grupo, em seus projetos criativos, sempre pôs em tensão os limites entre as disciplinas ao buscar, por exemplo, a participação de filósofos na composição da dramaturgia, diretores de cinema, engenheiros robóticos e informáticos, ou chefs de cozinha. Para o artista Àlex Ollé, o trabalho do colaborador envolve uma especialização criativa e, também, a permeabilidade da equipe e exemplifica com a presença de um desenhador de luz que pode trazer uma ideia de matéria dramatúrgica, num processo de convivência criativa.

La Fura Dels Baus podem ser considerados criadores de teatro no sentido ontológico do termo, pois o entendem como uma vivência coletiva entre intérpretes e espectadores. Eles mesmos se afastam de uma possível polemica que os coloca fora do teatro pelo protagonismo da tecnologia em suas propostas. Em relação ao uso de tecnologias em cena o grupo é um dos pioneiros a introduzir recursos como aplicativos para uso do espectador, considerado multitasking, por sua atitude multitarefa identificada com as novas gerações. O grupo investe assim em um salto geracional considerando a percepção da nova geração que está habituada a manipular muita informação de maneira simultânea.

O convívio criativo entre colaboradores com suas diferentes especialidades, para a realização de um determinado trabalho cênico, abre espaço também para a criação de outros produtos. Os artistas do grupo denominavam Satélites a aqueles produtos que surgiam a partir de seu eixo criativo que são os espetáculos fureiros. Os satélites eram os concertos, as exposições, os discos, os vídeos. Esta ideia de criar satélites é a de traduzir o material cênico para outro suporte, uma prática habitual para o La Fura Dels Baus. Também, a incorporação da tecnologia digital mais sofisticada aos espetáculos, que ocorreu com o passar das décadas, significa um aumento do círculo de colaboradores e ao mesmo tempo novos desafios e possibilidades criativas inesperadas até então pelos diretores fureros. Ainda assim na atualidade, alguns membros do grupo continuam usando o desenho como ferramenta criativa. Porém a maioria das propostas já costuma ser preparada na frente do computador, para então se confeccionar um dossiê que apresenta a perspectiva criativa, a visualização dos elementos de cenário e de figurino e os detalhes técnicos da montagem.

No início dos trabalhos da companhia a autoria costumava ser compartilhada. O que importava era a livre circulação de ideias e de como elas se resolviam na prática criativa coletiva. O método de criação se assemelhava à criação coreográfica e se distanciava, portanto, dos procedimentos teatrais tradicionais de criação de cenas a partir de um texto escrito. O processo de criação do grupo era de caráter lúdico e compartido, sem assinaturas. Também não havia a necessidade de um discurso teórico elaborado: o discurso era a própria ação cênica. As ações que haviam sido escolhidas se sobrepunham com a finalidade de gerar narrativas mais complexas, criando estruturas e, ao mesmo tempo, uma metodologia própria baseada na experiencia. Os seus espectadores, desde os primórdios recordam haver experimentado uma forma de caos, uma sensação de risco. A autora do livro salienta que o que existia realmente era um risco estético, não físico e que a prova disso é o fato de que eles, os artistas fureros nunca sofreram um acidente grave em cena.

Depois de quarenta anos de trajetória, os diretores fureros são expertos em modelar o espaço de maneira muito orgânica e também de orquestrar as diferentes linguagens como a gestual, a sonora, a videográfica, entre outras, como se tudo fosse um processo sinestésico, friccionando os potenciais visuais, sonoros e espaciais de cada elemento que é incorporado ao processo. Os diretores fureros são quem marca o ritmo e os demais criadores vão se adicionando às dinâmicas já postas em marcha.

Sendo assim é o espaço cênico o primeiro suporte da ferramenta metodológica criativa, mais do que a geração de emoções por parte dos atores. Não é de se surpreender que o núcleo de colaboradores habituais da companhia tenha mais relação com o espaço do que com a interpretação, sendo eles escultores, engenheiros, cenógrafos, videoartistas, arquitetos, entre outros. Ainda assim, existem atores colaboradores que já trabalharam diversas vezes com a companhia, embora o mais habitual seja que eles contratem profissionais através de seleções de elenco. Dos artistas fundadores, Jurgen Muller foi o último a abandonar a cena como ator. Saumell considera que ele e Álex Ollé são, talvez, os artistas do grupo mais interessados no universo interpretativo, tanto no teatro como na ópera.

Investigação e Formação em artes cênicas Movidos pelo desejo de saber como funcionam os procedimentos de criação em arte, criadores, docentes, investigadores e estudantes rastreiam arquivos, indagam sobre o processo criativo, sobre os modos de fazer e pesquisam as genealogias artísticas. Talvez porque ferramentas criativas antes entendidas como segredos individuais, agora deixaram seu lugar para experiências de criação colaborativas e interdisciplinares.

Dentro desta realidade se está reformulando a educação e no centro deste debate estão as metodologias criativas, noção esta que ganha interesse até mesmo para o produto cênico final.

É inegável que algo está mudando na aprendizagem das artes cênicas e o mais interessante desta transformação é que a própria transmissão de conhecimentos passa a conter elementos performativos, de encenação e, no caso do teatro, a arte em si é forma final e método ao mesmo tempo. Desta maneira se podem estabelecer protocolos de transmissão de conhecimento que formam parte de projetos criativos, como se fossem catalizadores poéticos e, também, ativadores de diálogo entre gerações.

Sendo assim, estas novas formas de entender as artes cênicas repercutem, igualmente na forma de ensiná-las. As metodologias teatrais se aplicam reincidentemente a outros campos de estudo.

Atualmente se estabelecem áreas de colaboração entre teatro e educação, teatro e medicina, teatro e tecnologia ou teatro e urbanismo, entre outras. Conceitos como emoção, ficção, jogo e empatia, vinculados secularmente ao teatro, são maleáveis para a transmissão fora de seu contexto original por abrirem-se a outras disciplinas. Estes projetos colaborativos estimulam a criatividade e a inovação e o enriquecimento mútuo entre áreas de conhecimento. E não somente são uteis para o desenvolvimento profissional no ambiente das artes cênicas, mas sim para todos os participantes, provenientes de outros setores, através da aprendizagem experiencial, a experiência vivida.

A partir da prática da fricção furera – ou seja, do aprendizado que se dá pelo atrito da troca de experiencias entre colaboradores – desde a época inicial do coletivo, os seus membros expandiram aquele genuíno método de criação para outros artistas, colaboradores habituais ou ocasionais, a partir de um frutífero princípio de contaminação mútua. Princípios estes que contam também com um genuíno respeito aos processos de aprendizagem que se dão em ambiente criativo, abrindo-os aos participantes de worshops ou oficinas, seminários e outras iniciativas de formação.

A companhia percorreu uma larga trajetória neste sentido, desde os primeiros workshops iniciais, ministrados por seus diretores em festivais e seminários, até recente inauguração da Fundació Epica, em 18 de dezembro de 2018. Uma entidade sem fins lucrativos que se constitui em um espaço de aprendizagem multidisciplinar voltado para as artes cênicas, situada na antiga fábrica de móveis Rojas de Baladona. O trabalho a ser desenvolvido por esta recente fundação busca entender o processo criativo como um catalizador entre arte, ciência e tecnologia.

Muito vinculado à aprendizagem experimental, o conceito de laboratório vinculado às artes cênicas se forma ao longo do século XX. Segundo Saumell, a associação entre teatro e laboratório não é nova. Ela invoca aquele lugar onde se pode falhar e ao mesmo tempo se aprender com os erros. Esta atitude de experimentação e de transmissão de metodologias criativas próprias também vai acompanhar o trabalho de algumas companhias teatrais importantes surgidas na Europa nas décadas de sessenta e setenta. O Thèatré du Soleil, dirigido por Ariane Mnouchkine na França, Jerzy Grotowski com seu Teatro Laboratório na Polônia e depois na Itália, ou ainda o Odin Theatre, liderado por Eugenio Barba, na Dinamarca. A autora considera natural que o catalão La Fura Dels Baus, depois de quarenta anos, crie um laboratório que vise transmitir sua prática teatral abrindo-a para outras disciplinas.

A companhia catalã, de maneira intuitiva, sempre baseou suas propostas docentes e de investigação na experiencia como veículo de conhecimento. A colaboração e o trabalho em equipe, fatores que favorecem a criatividade e que foram postos em prática pela companhia desde sua origem, são conceitos fundamentais para esta metodologia.

Estas características alinham-se, também, com as correntes metodológicas mais inovadoras de ensinamentos artísticos. A ferramenta básica nesta perspectiva é a ação corporalizada, ao que os anglo-saxões denominam por embodiment.

Esta maneira de compreender a transmissão de conhecimento a partir da experiencia se enlaça com a prática artística como metodologia de investigação, também aplicada à docência e conectada internacionalmente com a noção de Practice as Research que, conforme Saumell nasceu na Escandinávia nos princípios dos anos vinte e começou a ser praticada, quase em paralelo, na Grã-Bretanha, nos EUA e no mundo acadêmico anglo-saxão. Nesta metodologia, ainda pouco desenvolvida na Espanha, se busca uma continuidade entre fazer-refletir-articular-fazer, em um ciclo que se inicia e acaba na ação. Assim sendo, a experiencia e o feito de experimentar se incluem dentro do saber, já que se incorporam conceitos como imaginação, jogo ou prazer em termos de igual para igual com a pesquisa de documentação, o desenvolvimento de visão crítica e a reflexão.

A autora do livro e seus futuros leitores Mèrce Saumell é doutora em História da Arte com uma tese sobre as companhias teatrais catalãs. Já deu aulas nas Universidades de Salamanca e Girona e agora é professora do Instituto de Teatro de Barcelona. Ela participa de diversos projetos de pesquisa de âmbito internacional e regional, é autora de livros e artigos especializados na área das artes cênicas e já participou de cursos e conferências na Finlândia, Lituânia, Brasil, Chile, Alemanha e Irlanda. O grupo catalão La Fura Dels Baus é um de seus temas de estudos principais.

O livro La Fura Dels Baus em quarentena (1979-2019) além de estudar as metodologias coletivas de criação, enfoca a consolidação de novos discursos cênicos. Ele também não deixa de ser uma biografia do grupo, lidando com acontecimentos cênicos como o impacto de suas primeiras propostas artísticas, a sua passagem pelas cerimonias olímpicas e as suas encenações de óperas e produções online. Seis de seus primeiros membros continuam desenvolvendo suas próprias linhas de trabalho e suas capacidades de risco e de contágio criativo proporcionaram a eles um amplo reconhecimento internacional entre público, critica e, também, para a pesquisa acadêmica.

Para tanto, a leitura deste livro é altamente recomendada para todos profissionais das artes cênicas, professores, estudantes e espectadores, enfim para todas pessoas que reconhecem na experiencia das artes cênicas a sua potência de prazer e empatia, de emoção, conhecimento e aprendizagem.

Referências

SAUMELL, Mercè. LA FURA DELS BAUS EN QUARENTENA. 40 anys de trajectória grupal:1979-2019. Próleg per La Fura dels Baus. Barcelona: Angle Editorial, 2019.

Recursos Eletrônicos

https://www.lafura.com (visitado em novembro de 2019)

Diccionario Español by Farlex. App compatible with Iphone. Versión: 2.0. Copyright 2003-2019.

Traductor Softcatalà. Marcos Grau developer. App compatible with Iphone. Versión: 3.2. Copyright Softcatalà 2011.

Maria Amélia Gimmler NettoProfa. Ms. Curso de Teatro Licenciatura – Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Investigadora visitante no Centro de Ciências Humanas e Sociais de Madrid/ Espanha e Bolsista capes Print/UFBA 2019/20. mamelianetto@gmail.com.

História & Luta de Classes. [?], v.15, n.29, mar. 2020.

Marxismo, Luta Armada e Revolução

Apresentação

Escritas do Tempo. [Marabá], v. 1, n.3, 2019.

Dossiê – Religiosidades e Intolerâncias: reflexões e problemáticas do Mundo Moderno à Contemporaneidade

Editorial

Apresentação de Dossiê Temático

Artigos

Entrevistas

Expediente

Publicado: 2020-02-29

Estudios de Filosifía Práctica e Historia de las Ideas. Mendonza, Vol. 22, 2020

Editorial

Dosier

Artículos

Entrevistas

Traducciones

Publicado: 2020-02-26

Em Tempo de Histórias. Brasília, n.35, 2019.

Editorial

  • ·                  Editorial
  • Artur Nogueira Santos e Costa
  • PDF

Artigos

Publicado: 2020-02-23

History of Education in Latin America. Natal, v.3, 2020.

DOSSIÊ

ARTIGOS

PUBLICADO: 21-02-2020

EaD em Foco. Rio de Janeiro, v.10, n.1, 2020.

Artigos Originais

Estudos de Caso

Revisões

Publicado: 2020-02-20

 Le baptême de Clovis (24 décembre 505 ?) – DUMÉZIL (APHG)

DUMÉZIL, Bruno. Le baptême de Clovis (24 décembre 505 ?). Paris: Gallimard, coll. « Les journées qui ont fait la France », 2019. 320p. Resenha de: PROUVOST, Yveline. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 20 fev. 2020. Disponível em: <https://www.aphg.fr/Le-bapteme-de-Clovis-24-decembre-505>Consultado em 11 jan. 2021.

Le pari du livre de Bruno Dumézil, comme celui de la collection dans lequel il est publié, est d’inscrire le baptême de Clovis parmi ces journées particulières qui ont pu participer, d’une façon ou d’une autre, à la construction de la France.

L’auteur, qui part des commémorations de 1996, nous projette ensuite au tournant du VIe siècle. Il se place dans la continuité et l’utilisation des travaux précédemment rédigés autour de cet événement, ceux de Georges Tessier, Michel Rouche, Laurent Theis ou encore Stéphane Lebecq par exemple.

Bruno Dumézil commence par présenter tout ce que l’on peut savoir de ce baptême en le comparant à ceux de cette époque, analysant pour cela la source principale de cette information, tant dans sa forme que dans son contenu : la lettre d’Avit de Vienne dont il montre aussi les limites.

Afin de tenter de comprendre ce baptême, ce sont les sociétés de l’Antiquité tardive que l’auteur fait revivre : l’ethnogenèse franque, les Francs, et leur rapport à l’Empire romain, l’apparition de la « dynastie » mérovingienne : tout est évoqué, analysé, mis en question.

Cette approche montrant ses limites, dans un second temps, Bruno Dumézil replace le baptême dans le contexte religieux des Ve– VIe s. : il nous présente le christianisme de la fin de l’Empire romain, son expansion progressive, mais aussi ses divisions et querelles nombreuses. Il distingue ainsi classiquement les tendances religieuses ariennes et nicéennes, mais aussi la croyance homéenne qui domine un temps largement l’Occident européen, jusqu’à la bataille d’Andrinople en août 378. La question des schismes est fondamentale. Le schisme d’Acace d’abord qui divise profondément la communauté chrétienne entre Orient et Occident de 484 à 519 et contraint chaque chrétien à prendre position. Mais aussi le schisme de 498 au sein de l’Eglise de Rome, issu de la double élection pontificale de Symmaque et Laurent. Dans ces querelles : quelles positions Clovis a-t-il tenu ? L’enquête va jusqu’à scruter les cadeaux envoyés par Clovis au Saint Siège pour tenter de cerner ses fidélités. Bruno Dumézil replace ainsi la religion chrétienne, son expansion et son imprégnation dans toute l’épaisseur de la société gallo-romaine de ce tournant du VIe siècle. Cependant, et malgré certaines hypothèses convaincantes, la question du choix religieux de Clovis demeure irrésolue.

Face à cette nouvelle impasse, Bruno Dumézil tente alors de reconsidérer la place de ce baptême dans le règne du Franc. Il montre alors ce que les sources nous permettent de comprendre du règne de Clovis, ainsi que sa portée pour les générations suivantes. Il met à jour la quasi amnésie mérovingienne concernant Clovis… et, a fortiori, son baptême. Là encore les sources, comme l’œuvre de Grégoire de Tours, sont finement analysées et critiquées, montrant bien leur peu de fiabilité quant à l’évènement considéré, ce qui n’enlève rien à leur intérêt.

On découvre rapidement comment jusqu’au début du règne des Carolingiens, Clovis ne resurgit que de façon très opportune dans la mémoire : comme modèle ou anti-modèle, afin de montrer les défauts des rois régnants sans s’en attirer les foudres. La figure de Clovis est utilisée, modifiée, transformée selon les besoins politiques du temps.

S’ensuit alors une tentative de datation du baptême elle-même conçue tel un jeu : l’auteur scrute chaque possibilité de date, la critique, avant de se risquer à en proposer une, dont il ne manque pas non plus de montrer les limites. C’est au travail de fond de l’historien, à sa démarche réflexive, qu’on est alors confronté, même si, avec une grande honnêteté intellectuelle, aucune réponse nette et définitive n’est apportée.

Enfin, il remonte le cours du temps jusqu’à nos jours pour mesurer la portée et surtout l’utilisation (ou non) de cet événement au fil du temps : s’attardant autant sur les périodes de construction et d’utilisation du mythe que sur celles de sa disparition tout aussi édifiantes. Il nous montre les querelles suscitées autour de Clovis et de son baptême, contribuant au passage à la réhabilitation de certains historiens tels Aimoin de Fleury ou l’abbé Dubos.

Bruno Dumézil, face à cet exercice particulièrement périlleux d’évocation d’un sujet largement traité et dont la sensibilité resurgit périodiquement, s’en tire donc avec brio et humour, redonnant de l’épaisseur à la période traitée, envisagée sous tous ses aspects, mettant au jour l’essentiel de la démarche historique et ses éventuelles limites. Il fait véritablement œuvre ici d’historien mesurant la place d’un évènement (on pourrait presque dire d’un « non-événement » au VIe s.) dans la construction de la France, à partir d’une analyse précise et même impitoyable de notre maître absolu : les sources.

Il nous livre ainsi tout au long de cet ouvrage la riche histoire d’un « détournement de fonts » (sic).

Yveline Prouvost

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[IF]

[História em Curso. Belo Horizonte] Caderno de Resumos; Semana de História – Travessias: Recantos, contos e cantos de nossa gente.

Caderno de Resumos da Semana de História – Travessias: Recantos, contos e cantos de nossa gente, organizado pelo Departamento de História da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), realizado entre os dias 2 e 5 de abril de 2019.

Edição completa

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  • Apresentação .
  • Simpósio Temático – Cultura de nossas gerais: Cinema, Literatura, Arquitetura e Música
  • Resumo das Comunicações do ST – Cultura de nossas gerais: Cinema, Literatura, Arquitetura e Música
  • Simpósio Temático – Arte de nossas gerais: Folclore, Pintura, Fotografia e Dança
  • Resumo das Comunicações do ST – Arte de nossas gerais: Folclore, Pintura, Fotografia e Dança
  • Simpósio Temático – Educação e ensino de história em Minas Gerais
  • Resumo das Comunicações do ST – Educação e ensino de história em Minas Gerais
  • Simpósio Temático – Economia e política nas Minas
  • Resumo das Comunicações do ST – Economia e política nas Minas
  • Simpósio Temático – Religiosidade nas Minas .
  • Resumo das Comunicações do ST – Religiosidade nas Minas .
  • Simpósio Temático – Ofícios e relações de trabalho nas Minas
  • Resumo das Comunicações do ST – Ofícios e relações de trabalho nas Minas 89
  • Simpósio Temático – Movimento de resistência em Minas Gerais
  • Resumo das Comunicações do ST – Movimentos de resistência em Minas Gerais

Publicado: 19-02-2020

Cadernos de História da Educação. Uberlândia, v. 19 n. 1, 2020.

Capa: Batalhão da Escola Estadual Honório Guimarães (Arquivo João Quituba do CDHIS/UFU, JQ 189)

Editorial

Dossiê: História e memória da EJA nas universidades brasileiras e portuguesas

Artigos

Resenha

Publicado: 2020-02-14

Outros Tempos. São Luís, v.17 n. 29, 2020.

Dossiê: Feminilidades e Masculinidades em Foco

Apresentação

  • APRESENTAÇÃO
  • ELIZABETH ABRANTES, ELIZANGELA CARDOSO, PEDRO VILARINHO CASTELO BRANCO
  • PDF

Artigos

Dossiê – Feminilidades

Dossiê – Masculinidades

Dossiê – Relações de e entre gêneros

Estudo de caso

Entrevista

  • ELIZANGELA CARDOSO
  • PDF

Resenhas

Publicado: 2020-02-12

Mundos do Trabalho. Florianópolis, v.12, 2020.

Editorial

Artigos

Resenhas

Expediente

ED Equipe Editorial

D2 “Trabalhadores de construção: por estradas, ferrovias, açudes e outras obras”

 

Ponta de Lança. São Cristóvão, v.13, n.25, 2019.

Ponta de Lança: Revista Eletrônica de História, Memória & Cultura.

Dossiê Temático

Artigos – Fluxo Contínuo

Publicado: 2020-02-09

Boletim do Tempo Presente. Recife, v.8, n.4 / v.8, n.1, 2019.

Boletim do Tempo Presente. Recife, v.8, n.4, 2019.

Out – Dez 2019

Boletim do Tempo Presente. Recife, v.8, n.03, 2019.

Jul – Set 2019

Publicado: 2020-01-13

Boletim do Tempo Presente. Recife, v.8, n.02, 2019.

Edição Abr./Jun. 2019

Publicado: 2020-01-13

Boletim do Tempo Presente. Recife, v.8, n.1, 2019.

Edição Jan-Mar/2019

Publicado: 2019-07-31

Em defesa da liberdade: libertos, coartados e livres de cor nos tribunais do Antigo Regime português (Mariana e Lisboa, 1720- 1819) | Fernanda Pinheiro Domingos

Desde a década de 1980, o estudo das chamadas “ações de liberdade” se consolidou na historiografia da escravidão brasileira. Muitos foram os trabalhos publicados sobre a luta judicial pela liberdade e também foram recorrentes estudos sobre crime, família escrava, tráfico e outras questões que se valeram desses processos judiciais como fontes fundamentais para a análise do cotidiano e da agência de escravos, libertos e pessoas livres de cor. O livro de Fernanda Domingos Pinheiro, Em defesa da liberdade: libertos, coartados e livres de cor nos tribunais do Antigo Regime português (Mariana e Lisboa, 1720-1819), insere-se nesse campo já consolidado da história da escravidão, apresentando inúmeras informações que ainda não eram de amplo conhecimento dos pesquisadores do campo e levantando novas questões e perspectivas de análise sobre as relações entre direito, liberdade e escravidão. O livro apresenta uma pesquisa rigorosa e minuciosa sobre os significados e a precarização da liberdade no Império português, baseada, sobretudo, na análise de processos judiciais ajuizados em Mariana e Lisboa. Nessa análise, a autora não deixa de lado nem os argumentos e formas jurídicas específicas que constituíram esses documentos, nem o debate acerca da vivência das pessoas de cor em sociedades escravistas em um sentido mais amplo. Leia Mais

The fearless Benjamin Lay: the Quaker dwarf who became the first revolutionary abolitionist | Marcus Rediker

A memória do antiescravismo por seus agentes

Em 1808, logo após o Parlamento britânico aprovar a extinção do tráfico transatlântico de escravos, o famoso abolicionista Thomas Clarkson publicou o livro The history of the rise, progress and accomplishment of the abolition of the African slave trade by the British parliament. Era o momento ideal para dar início à construção da memória do antiescravismo.2 Clarkson narrou a história do movimento a partir de um ponto de vista fortemente alinhado aos ideais do grupo que assumiu a frente da luta contra a escravidão, que, por sua vez, exprimiam suas concepções políticas e classistas de homens da “middle class” britânica, comprometidos com o credo da religião oficial anglicana. Nessa obra, Clarkson apresentou uma alegoria fluvial para ilustrar o crescimento e fortalecimento do movimento contra o tráfico e a escravidão na Europa e América do Norte. A despeito de seu etnocentrismo, que desconsiderou quase todas as iniciativas antiescravistas ibéricas anteriores, sua alegoria (ou mapa) é um registro valioso da concepção iluminista de progresso, que norteou essa vertente antiescravista. Na alegoria, numa distribuição espaço-temporal, vê-se, por volta de 1650, as primeiras iniciativas antiescravistas. São pequenos regatos e riachos, que trazem nomes de indivíduos ou pequenos grupos, simbolizando as vozes isoladas que se opuseram à escravidão, mas que acabavam desaguando numa única direção e num mesmo rio; com o passar dos anos, apareceram afluentes mais numerosos, que, por sua vez, foram tornando mais encorpado o rio principal; a partir de aproximadamente 1750 as iniciativas se multiplicaram e esses tributários já desaguavam num grande rio que se dirigia ao oceano. Apesar de Clarkson deixar sugerida a conexão existente entre essas iniciativas, ele tomou o cuidado de destacar dois grandes rios separadamente, um da Europa e outro da América do Norte, que virtualmente se encontrariam no oceano da liberdade (CLARKSON, 1808, v. 1, entre as págs 258 e 259). Leia Mais

Tiempo de política, tiempo de constitución: la monarquía hispánica entre la revolución y la reacción (1780-1840) | Ivana Frasquet e Encarna García Monerris

É recorrente o interesse tido pela historiografia em estudar temas relativos à transição do Antigo Regime para a ordem liberal, entendida como o alvorecer da modernidade política. Trata-se de um dos períodos de maior relevância para a história – não só do continente europeu, como também de boa parte da América – em que são compreendidas as transformações do início do século XIX no interior de uma espacialidade Atlântica. Tal aspecto tem profundo destaque também pela historiografia ibero-americana. Nesse caso em específico, busca-se compreender as dinâmicas em torno da ascensão do regime liberal, visto a partir da crise das monarquias espanhola e portuguesa e, consequentemente, da fragmentação dos antigos impérios ibéricos. O livro aqui resenhado trata-se exatamente de uma obra que, de maneira bastante original, se insere nessa lógica. Leia Mais

Diálogos Makii de Francisco Alves de Souza: manuscrito de uma congregação católica de africanos Mina, 1786 | Mariza de Carvalho Soares

A publicação de fontes históricas não é algo muito comum no mercado editorial brasileiro. Neste sentido, é mais do que bem-vinda esta narrativa sobre uma congregação religiosa católica formada por africanos que originalmente vieram para o Brasil escravizados do Golfo do Benim (atual Togo, Benim e Nigéria). Este documento, guardado na seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, foi apresentado ao público através do trabalho de Mariza de Carvalho Soares, uma das mais destacadas africanistas em atividade no Brasil. Partes dele tinham sido exploradas em trabalhos anteriores da pesquisadora, mas somente agora uma edição crítica do documento, com notas explicativas, veio a lume.

Antes deste livro, a autora já havia publicado Devotos da cor, obra que trata da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia no Rio de Janeiro durante o século XVIII (SOARES, 2000). Ademais, ela também organizou um livro sobre a diáspora da Costa da Mina para o Rio de Janeiro (SOARES, 2007). Em outras palavras, é uma conhecedora desta região africana e da diáspora no Brasil dos povos desta área (conhecida pelos linguistas como “área dos gbe-falantes”). A iniciativa contou com o apoio da Chão, editora nova no mercado e que já tinha publicado documentos sobre Jovita Feitosa, uma voluntária para a Guerra do Paraguai, com comentários de José Murilo de Carvalho (CARVALHO, 2019). Leia Mais

A classe trabalhadora: de Marx ao nosso tempo | Marcelo Badaró Mattos

Marx não dedicou um escrito exclusivo sobre classes sociais. Sobre o tema tratado explicitamente, restou apenas um fragmento de um texto inacabado. Já no Livro I de O Capital o termo “classe operária” aparece dezenas de vezes, porém sem uma conceituação precisa que a defina. Contudo, a despeito de apenas referir-se a elas de forma marginal ou indireta (por vezes proletariado, movimento operário, produtores), por certo constituem um fio condutor que atravessa toda sua obra. Mais que isso, possivelmente, e de forma contraditória, constituam-se de sua categoria mesma de maior alcance, sua “ultima thule2” (MARX, 2011, p. 306-307) um precepto heurístico capaz de transcender as bordas do mundo que ele próprio conheceu. É seguramente ancorado nessa percepção que o professor de História do Trabalho e Sindicalismo, Marcelo Badaró Mattos, da Universidade Federal Fluminense, nos entrega o texto A classe trabalhadora: de Marx ao nosso tempo. Uma sofisticada análise que põe em tela a estrutura e a dinâmica da classe trabalhadora desde sua gênese até sua expressão contemporânea. Leia Mais

Forças Armadas e Política no Brasil | José Murilo de Carvalho

Em 2015, o historiador José Murilo de Carvalho chamou a atenção para um episódio cuja gravidade havia passado despercebida no âmbito da opinião pública. O General Hamilton Mourão celebrou o golpe de 1964 sem despertar reação dos seus superiores ou da presidência da República. Uma luz amarela acendeu-se. Um sinal de alerta a desfazer a crença na reclusão dos militares às suas atividades profissionais. Significava a retomada do envolvimento das Forças Armadas na política brasileira?

Com a redemocratização do Brasil e a aprovação da Constituição de 1988, a agenda política foi tomada por outros assuntos mais urgentes, passando os militares a um papel secundário no quadro das preocupações dos analistas, da imprensa e das forças partidárias. Entretanto, a atuação dos militares nos recentes acontecimentos do País modificou tal percepção, restaurando a questão do protagonismo político dos militares. O livro de José Murilo é mais do que oportuno. Recoloca uma vez mais não só a necessidade, mas a urgência do estudo dos militares no passado e no presente da vida nacional. Trata-se de uma reedição ampliada, disponível em versão impressa e em formato digital, que oferece aos leitores, novos capítulos tanto sobre a história dos militares quanto da sua atuação recente. Leia Mais

Políticas da inimizade | Achille Mbembe

Saiu em português de Portugal pela Antígona, com o título Políticas da inimizade, a tradução de Politiques de l’inimitié, publicado em 2016 pela Éditions La Découverte, do professor de história e de ciência política Achille Mbembe. Nascido em 1957 em Otété, Camarões, um dos mais importantes intelectuais cosmopolitas da atualidade, o autor leciona no Witwatersrand Institute for Social and Economic Research e já publicou títulos importantes como Crítica da razão negra (MBEMBE, 2014) que também tem tradução em Portugal, original, Critique de la raison nègre (MBEMBE, 2013a), Sortir de la grande nuit (MBEMBE, 2013b) e De la postcolonie (MBEMBE, 2000).

O livro tem cinco capítulos, alguns deles já publicados em revistas em edições anteriores, uma introdução e uma conclusão. Além do profundo e crítico diálogo com os estudos pós-coloniais, o chamado pós-estruturalismo e a historiografia e teoria política contemporâneas, familiar para quem conhece o autor, os ensaios possuem um interlocutor principal: o martiniquenho Frantz Fanon. Leia Mais

Revista de História. São Paulo, n.179, 2020.

Imagem da capa:

Brasil Ilustrado, n. 10, p. 148, 1887. Fonte: Biblioteca Nacional.

EDITORIAL

HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA

HISTÓRIA E ARTES

A IMPRENSA NA HISTÓRIA

HISTÓRIA DAS CIÊNCIAS, HISTÓRIA NAS CIÊNCIAS

PORTUGAL, ESPANHA

AMÉRICA, AMÉRICAS

RUMOS DO BRASIL

ECOS DA ESCRAVIDÃO

ANTIGOS, MEDIEVAIS, CONTEMPORÂNEOS

DOSSIÊ: UMA HISTÓRIA GLOBAL ANTES DA GLOBALIZAÇÃO?

RESENHAS

PUBLICADO: 2020-02-06

Revista História e Culturas. Fortaleza, v.7, n.14, 2019.

Simone de Beauvoir | Cadernos Pagu | 2019

Há vinte anos Mariza Correa (1999) iniciava a apresentação do dossiê Simone de Beauvoir e os feminismos do século XX , publicado pela cadernos pagu , comentando que sua primeira reação foi pensar que talvez Simone não gostasse de homenagens, mas, frente à importância de sua obra, mais que as merecia.

Este dossiê parte dessa introdução, tão no estilo de Mariza e da convicção de que essa senhora, Simone de Beauvoir, continua merecendo muitas homenagens, pois sua obra multidisciplinar permite sempre novas leituras. Afinal, de fato ser mulher não é um fato da natureza e sim o resultado de uma história, como Simone reafirma em sua primeira entrevista televisiva, em 1975.1 Contudo, o maior interesse da entrevista é por ser esta a primeira em que Simone, então com 68 anos de idade, se declara inequivocamente feminista. Também é interessante notar que a própria entrevista de Simone provavelmente tinha relação com o fato de a questão da mulher ter entrado na pauta da ONU – e 1975 ter sido declarado o Ano Internacional da Mulher. No entanto, Simone, na sua modéstia, não se deu conta de que as lutas feministas que tornaram possível o Ano Internacional da Mulher resultavam, em grande medida, de sua obra teórica, especialmente de O Segundo Sexo (1949). Leia Mais

Mnemosine. Campina Grande, v.10, n.2, 2019.

Política e Administração Colonial

Política e Administração Colonial

APRESENTAÇÃO……………………………………………………………………………………………………………………………….7

  • Carmen Alveal
  • “Faço Preito e Homenagem a Sua Majestade e a Vossa Senhoria em Suas Mãos”: a Cerimônia De Preito e Ménage e as jurisdições nas capitanias do Norte (1654-1700)..10-47
  • Marcos Arthur Viana da Fonseca
  • O mito das capitanias anexas: aspectos da política colonial e da administração das conquistas no norte do Estado do Brasil, séc. XVII e XVIII……………………………………………….48-83
  • Thiago Alves Dias
  • Capitães-mores em movimento: perfil e trajetória dos governantes das capitanias do Rio Grande e Ceará (1656 – 1754)………………………………………………………………………………………………..82-105
  • Leonardo Paiva de Oliveira Ouvidores, capitães-mores e governadores no esquadrinhamento do território colonial (Sertões do Norte, século XVIII) ………………………………………………………………………………………… 106-134
  • Leonardo Cândido Rolim
  • A Restauração portuguesa e a guerra no reino: entre a corte lisboeta e a província do Alentejo (1642-1643). ……………………………………………………………………………………..134-153
  • Érica Lôpo de Araújo
  • Uma cidade entre porcos, maganos, becos, rios e casas de taipa: administração e políticas urbanas camarárias na cidade do Natal (primeira metade do século XVIII)153-194
  • Kleyson Bruno Chaves Barbosa
  • “Entre o péssimo e o bom governo de Pedro Monteiro de Macedo”: a administração da Capitania Da Paraíba (1734 – 1744)……………………………………………………………………………………..191-228
  • Lana Camila Gomes de Araújo Juciene Ricarte Apolinário
  • ARTIGOS
  • De um gol anulado à incompatibilidade de gênios: crônicas de amores terminados ……230- 243
  • Severino Cabral Filho
  • “Nossa rua não tinha nome de planta, mas crescia em nosso jardim, um pé de ipê”: trajetos e afetos no bairro das Malvinas em Campina Grande- PB (1983- 2019)……. 244-268
  • Maria Aparecida Figueirêdo Pereira
  • Eronides Câmara de Araújo

Publicado: 2020-02-03

Descobrindo padrões em mosaicos | Ruy Madsen Barbosa

Por trás da beleza, da complexidade e das cores dos mosaicos, encontram-se as relações geométricas, os padrões, a matemática. No livro Descobrindo padrões em mosaicos, Ruy Madsen Barbosa revela os conceitos que estruturam a pavimentação do plano, fazendo emergir a matemática oculta desses padrões.

Repleto de definições, fórmulas, ilustrações, demonstrações e um pouco de história, o livro possibilita uma leitura em vários níveis de profundidade, sendo igualmente atraente para leitores curiosos sobre o assunto com para matemáticos. Os conhecimentos apresentados no livro permitem ao leitor não só descobrir como também desenvolver seus próprios padrões visuais, aplicáveis em projetos de pavimentações ou até mesmo de padronagens, tornando essa leitura de interesse para arquitetos e designers. Leia Mais