O conteúdo substantivo e dialética na História Universal de Hegel | Itamar Freitas

Se a Ideia de História de um ponto de vista Cosmopolita, de Kant, incorporava elementos da Crítica da razão pura e as Lições de História Universal, de Hegel estavam apoiadas em princípios da sua Lógica e na sua Fenomenologia do espírito, é também importante registrar que não há consenso entre os especialistas de que a narrativa da História Universal hegeliana espelhasse a ideia de conhecer dialético (a história da consciência pensando a si e por si mesma), ou seja, que a escrita da História Universal (dos chineses aos germânicos) fosse a reprodução da auto-constituição do conceito, ou seja, da trajetória do saber-certeza ao saber absoluto.[1] Teshale Tibebu, contudo, afirma que o estabelecimento e a hieraquização entre as faculdades do conhecer (sensação, compreensão e razão), princípio básico da Fenomenologia, estaria diretamente relacionada à hieraquização das raças e à consequente criação do eurocentrismo. Ao compreender a representação do mundo concreto hegeliano (sociedade e natureza) como a expressão do movimento da consciência, o historiador etíope, radicado nos EUA, denuncia o eurocentrismo desse sistema mundo, demonstrando que o filósofo classificou os africanos, asiáticos e os europeus, respectiva e progressivamente, como povos das sensibilidades, povos da compreensão e povos da razão.[2]

E não parou por aí. O esquematismo lógico de Hegel, segundo Tibebu, fundamentou a classificação dos continentes africano e asiático como exemplos desviantes (contrários) de relevo: homogêneo o primeiro e heterogêneo e sem mediação, o segundo. O continente europeu, ao contrário, era a correção e a harmonia (síntese): possuía terras altas e terras baixas equilibradas por mediações [passagens, rios etc.]. [3] Embora denote ambiguidade (o físico determinando o espiritual ou o espiritual determinando o físico?), Hegel afirma que as marcas do terreno foram transferidas para as formas de organização política (o despotismo entre os africanos e a liberdade para todos, garantida por leis, entre os europeus), mediante as etapas de realização (dialética) da consciência: universalização, particularização e singularização. Assim, seguindo esse processo dialético de constituição do objeto Mundo, Hegel sentencia que os africanos não teriam avançado além da universalização (identidade de raça africana) devido à uniformidade do terreno em que habitavam. Os mongóis (asiáticos), sob fortes contrastes de relevo, teriam constituído apenas algumas nações. Quanto aos caucasianos (europeus), com seu terreno variado e equilibrado, seriam os únicos a migrar da universalização (identidade de raça) à particularização (diferenciação entre nações) e desta à singularização (o gozo da liberdade individual sob a organização de um Estado moderno).[4] O esquematismo também se dava em termos estéticos. Adotando modelos grego de beleza, Hegel interpretava o nariz afilado do caucasiano como indicador de “intelecto perspicaz” e o nariz largo do africano como indicador de “estupidêz”.[5]

A hierarquização hegeliana das raças, povos e continentes também valia para o interior da Europa, onde os Eslavos eram considerados povos inferiores aos germânicos e mais aparentados com os asiáticos.[6] A hierarquização valia, ainda, para os povos do mundo recém descoberto. A América do Norte era próspera, em relação à América do Sul (incluindo o México). A religião protestante, a ocupação por colonização e a liberdade civil, segundo Hegel, explicavam a [riqueza] do Norte, enquanto a religião católica, a ocupação por conquista e saque e a dominação militar (com revoltas constantes) caracterizavam e explicavam a inferioridade das repúblicas sul-americanas.[7]

Nas Lições de História Universal, em síntese, Hegel reforçou a supremacia europeia quando distribuiu historicidade aos povos segundo as determinações mesológicas e jurídicas anunciadas acima. Na figura 1, podemos acompanhar a representação desse atributo, onde o espaço entre as linhas paralelas horizontais corresponde à região propícia à experiência da liberdade e os espaços entre as paralelas verticais, lidos da esquerda para a direita, correspondem, respectivamente, ao futuro, presente, passado e à situação atemporal. Segundo tal distribuição, o “Velho mundo” mediterrâneo/greco-romano fôra “palco da História”, o “Velho Mundo” germânico era “palco da História”, a “América” [EUA] seria esse mesmo palco e o [Novo Mundo], constituído pela África, [Ásia] e América do Sul, estariam desprovidos de historicidade.

Historia Universal Hegel

Figura 1. Historicidade e territorialidade na História Universal de J. F. W. Hegel (1820-1830).

Fonte: Produzido pelo autor a partir de Hegel (2005).

Até aqui, oferecemos uma síntese do conteúdo substantivo, [8] ou seja, do objeto pensado como realidade, quando submetido prioritariamente aos princípios lógicos de representação do passado. Agora, é tempo de destacar a originalidade de Hegel em relação à Ideia de Kant, explorando as proposições de fins e as proposições de método para a escrita da História. […] 


Métodos e dialéticas

Conhecemos em largos traços a “divisão” (periodização) [9] e o “fundamento” geográfico da História Universal. Mas deixamos para o final a demonstração dos vários usos da dialética na construção daquele texto. Vamos explorar essa resposta, sob o ponto de vista dos conteúdos substantivos porque ela nos ajuda a entender as variações de objeto e propósito dos escritores quando anunciam Teorias da História e fornecem uma base para a comparação dos próximos teóricos explorados adiantee, como K. Marx, João Ribeiro e Karl Lamprecht.

O termo “dialética” (derivado de diálogo) é empregado em diferentes situações, gerando significações distintas na obra de Hegel.[10] Para o que nos interessa neste livro (e como sugere Nicola Abbagnano), é bastante retermos, em primeiro lugar, uma definição ideal-típica para o termo: “processo resultante do conflito ou da oposição entre dois princípios, dois momentos ou duas atividades quaisquer”. Em seguida, devemos buscar os significados e as relações estabelecidas entre esses “princípios”, “momentos” ou “atividades”[11] nos próprios textos de Hegel.

Nos textos que examinamos até aqui, as proposições de methodus variam em designação e definição, entre outras razões, por causa dos propósitos de cada escrito. Na Fenomenologia do Espírito (1812-1816), onde o propósito é captar os fins e os meios do desenvolvimento da consciência (p.11, 69), o methodus é compreender a experiência da consciência como um “movimento dialético” (71), explorando as sucessivas oposições: certeza sensível, percepção e entendimento (na primeira parte) e etnicidade, cultural e moralidade (na segunda parte) ou no interior de cada uma dessas partes, como ocorre na descrição da “liberdade da consciência de si” (Estoicismo, Ceticismo e Consciência infeliz). Nos Princípios da Filosofia do Direito, cujo propósito, já vimos, é definir o objeto desta ciência, o methodus empregado é abordar o conceito como desenvolvimento a partir de si mesmo. Essa orientação deve ser seguida para a abordagem da “vontade livre” (personalidade, moralidade subjetiva, moralidade objetiva) (35) e para o “Espírito Universal” (personalidade, moralidade subjetiva, moralidade objetiva e conciliação moralidade subjetiva/moralidade objetiva) (312).

São essas mesmas fases (ou princípios) que Hegel emprega na construção de sua História Universal. Cada povo histórico é portador de um desses princípios ou fases de desenvolvimento dialético (310). Contudo, os usos da palavra são raros.

As referências diretas – traduzidas por estágios, gradações, seriações e transformações – não encerram os empregos da dialética. A demonstração dos usos desse modo de conhecer, isto é, da mobilização de coisas que apresentam a dinâmica dialética ou o resultado dialético estão dispersos em quase todos os capítulos de modo tópico, em forma de elementos antagônicos dispostos em díades ou tríades, sendo estas também integráveis em sequências cronológicas. Um exemplo dos conflitos geofísicos, morais e étnicos, apresentados em díades, está na descrição do “espírito” grego, comparável, segundo Hegel, ao desenvolvimento dos vegetais: nada de calma e homogeneidade. A planta “só vive por meio da atividade antitética da luz, do ar e da água.” (p.192).

Quadro 1 – Demonstrações da Dialética na Filosofia da História de Wilhelm G. F. Hegel (I) 


Categorias Textos Dialética
Natureza

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Moralidade objetiva

 

 

Conflito

 

 

 

Os elementos do espírito grego

[…] O país em questão é uma terra que se espalha pelo mar de diversas maneiras; em uma série de ilhas e em uma terra firme que por si já apresenta semelhanças com uma ilha. Só por meio de uma estreita faixa de terra é que o Peloponeso se liga à terra; toda a Grécia é recortada várias vezes por baías. Tudo está retalhado em pequenas partes e ao mesmo tempo interligado pelo mar. Encontramos nesse país montanhas, pequenas planícies, vales e rios. Lá não existe nenhum grande rio, e nenhuma planície simples; o solo é diversificadamente constituído por montanhas e rios, de tal forma que nenhuma massa grandiosa aparece. Não encontramos aqui a exibição de grandiosidade física oriental; nenhum rio como o Ganges ou o Indo – em cujas planícies um povo entregue à monotonia não é estimulado a nenhuma mudança, porque seu horizonte sempre mostra a mesma forma –, mas sim aquela dispersão e diversidade que correspondem totalmente à diversidade dos povos gregos e à agilidade do seu espírito.

Este é o caráter elementar do espírito dos gregos que dá a entender a origem da cultura deles a partir de individualidades independentes; uma situação na qual cada um se mantém por conta própria, não estando unido desde o início por laços naturais, patriarcais; uma condição segundo a qual eles se associam por outro meio – pela lei e pelo costume, com a sanção do espírito, pois a nação grega é o resultado de um processo de crescimento. Na origem de sua unidade nacional está a própria divisão, o estranhamento interno, o elemento principal que deve ser considerado. A primeira fase da superação disso determina o primeiro período da cultura grega, e só por meio de tal estranhamento e de tal superação é que surgiu o belo e livre espírito grego. (Hegel, 1992, p.191-192).

 

 

 

 

 

Oposição de características geofísicas

 

 

 

 

 

 

 

Oposição de características morais

 

Oposição de características étnicas

 

 

 

Bom exemplo de conflito disposto em tríade (figura 2) está também no interior de um acontecimento, como a Guerra do Peloponeso, e na participação de um personagem, o filósofo Sócrates e na importância da Filosofia.

Por fim (figura 3), a dinâmica e o resultado dialéticos são apresentados em tríades progressivas, onde Hegel faz uso dos mesmos personagens, explorando diferentes acontecimentos na experiência de cada um. Os primeiros povos históricos, já vimos, são os Persas, os Gregos e os Romanos. Eles formam uma sequência (uma tríade) progressiva no que diz respeito à realização da liberdade. Em um momento da narrativa, Hegel aplica o mesmo modelo de desenvolvimento para cada um deles, sobretudo os gregos e os romanos. Assim, cada um deles teria passado pelos estágios da formação (unificação de povos), da autonomia política (expansão) e da decadência (desorganização interna). (p.189-190).

Em outra passagem, os mesmos povos são encaixados em outro modelo, onde cada um deles representa um princípio (estágio): o império persa e a sua unidade religiosa corresponde ao “Reino do Pai”, o mundo grego e a sua unidade jurídica corresponde ao “Reino do Filho” e o mundo romano, mediante a unidade universal entre Estado e religião (sustentados em conceitos) correspondem ao “Reindo do Espírito”.

Quadro 1 – Demonstrações da Dialética na Filosofia da História de Wilhelm G. F. Hegel (III) 


Categorias Textos Dialética
 

 

Pensamento-

realidade

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Pensamento/

realidade

 

 

A Guerra do Peloponeso

Na beleza, como princípio dos gregos, a unidade concreta do espírito estava ligada à realidade, à pátria, à família, etc. Nessa unidade, ainda não estava compreendida nenhuma posição definida no âmbito do espírito, e o pensamento que surgiu acima dessa unidade ainda tinha o arbitrário como traço determinante. […]

Foi em Sócrates que, no início da Guerra do Peloponeso, o princípio da interioridade, da independência absoluta do pensamento em si, obteve uma livre manifestação. Ele ensinou que o homem deve se descobrir e reconhecer em si mesmo o que é justo e bom, e que e isso, segundo a natureza do justo e do bom, seria universal. Sócrates ficou célebre com o mestre da moralidade; antes de mais nada, ele é o inventor da moral. Os gregos possuíram a moralidade objetiva; mas do que virtudes morais, deveres, etc., era isso que Sócrates queria ensinar. O homem moral não é aquele que apenas almeja e faz o que é justo, não é o homem inocente, mas sim aquele que tem consciência dos seus atos.

Sócrates colocou o sujeito como algo decisivo em oposição à pátria e aos costumes, pelo fato de que ele deixou ao juízo e à convicção a determinação da ação humana, tornando-se o oráculo no sentido grego. Dizia ele que teria dentro de si um [xxx] que o aconselhava sobre o que deveria fazer e lhe revelava o que era útil para os seus amigos. Com o nascimento do mundo interior da subjetividade, surgiu o rompimento com a realidade. Mesmo que o próprio Sócrates tenha cumprido seus deveres como cidadão, para ele não era esse Estado e sua religião, mas o mundo do pensamento, a verdadeira pátria. Questiona-se agora se existem deuses e o que eles são. Platão, discípulo de Sócrates, expulsou de seu Estado Homero e Hesíodo, os autores da representação religiosa dos gregos, pois ele exigia uma representação mais sublime, que admitisse o pensamento daquilo que deve ser venerado como Deus. Muitos cidadãos retiraram-se da vida prática e dos negócios públicos para viver o mundo ideal. O princípio de Sócrates comprovou-se revolucionário perante o Estado de Atenas, pois a característica desse Estado é que o costume constitui a sua forma, ou seja, a inseparabilidade do pensamento da vida real. Se Sócrates instiga seus amigos para a meditação, o diálogo é sempre negativo, isto é, ele os conscientiza de que eles não sabem o que é justo. Se agora ele é condenado à morte, porque enuncia o princípio do qual tem que se aproximar, encontram-se aí, ao mesmo tempo, uma justiça sublime – o povo ateniense condenou o seu inimigo absoluto – como também o fato mais trágico que os atenienses vivenciaram: o que eles condenaram em Sócrates já estava bastante enraizado neles, devendo eles, assim, ser igualmente julgados culpados ou inocentes. Foi com esse sentimento que consideraram os acusadores de Sócrates, declarando-o inocente. Em Atenas, desenvolveu-se cada vez mais esse sublime princípio, que era o próprio declínio da existência e da substância do Estado ateniense:  o espírito tinha tendência a se auto-satisfazer, a refletir.  (Hegel, 1999, p.228-229).

 

 

 

Antes de Sócrates e da Guerra do Peloponeso, a realidade constitui o pensamento.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Com Sócrates, o pensamento ganha autonomia em relação à realidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Depois de Sócrates, o pensamento autônomo [provoca a decadência da realidade [Estado] ateniense.

Periodização da História dos Povos Germânicos segundo Wilhelm G. F. Hegel


1º Período 2º Período 3º Período
Surgimento das nações germânicas no império romano (até Carlos Magno) Autonomia da Igreja para si como teocracia e autonomia do Estado para si como monarquia feudal (governo de Carlos Magno) Surgimento da consciência do direito de si mesmo pelo restabelecimento da liberdade cristã (governo de Carlos V)

 

3.1 A eclosão da Reforma (que surge da decadência da Igreja e prega que o homem está determinado por si mesmo a ser livre)

3.2 A instituição do Estado moderno (a transformação dos direitos das dinastias em funções estatais

3.3. Vitória das leis da natureza contra as superstições e da ideia de que o direito e a moralidade são fundamentados na vontade humana (interna) e não apenas no mandamento de Deus (imposição externa)

Fonte: Hegel (1999, p.292-294, p.343, p.361-362)

Uma outra possibilidade de uso da dialética está demonstrada na periodização de um indivíduo histórico – os Povos Germânicos. Observem que Hegel apresenta os conflitos em tríades, nos modos horizontal (em duração secular) e horizontal (em duração conjuntural). No modo horizontal, os estágios correspondem ao surgimento, autonomia da Igreja e a autonomia do Direito. De modo vertical, ele estabelece os estagios pelos quais os germânicos chegaram ao que são no tempo em que escreve a História Universal, o que vem a ser a síntese de todo o processo de realização da liberdade. Aqui podemos perceber os empregos anteriores em um único cenário: unificação e autonomia (com excessão da decadência) e tese, antítese e síntese (ou a realização do espírito de liberdade). […] 


Fontes

HEGEL, Filosofía de la historia. 2ed. Barcelona: Zeus, 1971.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Enciclopedia de las Ciências Filosóficas en compendio para uso de sus classes (1830). Madrid: Alianza, 2005.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Enciclopedia Filosófica para los últimos cursos de bachillerato (1808/1811). Tradução de Manuel Jiménez Redondo. Valéncia: Museu Valencià de la Illustració i de la Modernittat, 2007.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Filosofia da História. 2ed. Brasília: Editora da UnB, 1999.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo:  Martins Fontes, 1997.

HEGEL, Georg Wlhelm Friedrich. Acerca de la enseñanza de la filosofia en los Gimnasios – Informe al ministerio del Culto, la Enseñanza y la Sanidad del reino de Prusia. In: Escritos pedagógicos. Tradução e introdução de Arsenio Ginzo. México: Fondo de Cultura Económica, 1991. p.146-154.

HEGEL, Georg Wlhelm Friedrich. Discurso del 14 de septiembre de 1810. In: Escritos pedagógicos. Tradução e introdução de Arsenio Ginzo. México: Fondo de Cultura Económica, 1991. p.86-100.

HEGEL, Georg Wlhelm Friedrich. Discurso del 29 de septiembre de 1809. In: Escritos pedagógicos. Tradução e introdução de Arsenio Ginzo. México: Fondo de Cultura Económica, 1991. p.73-85.


Notas

[1] Por um lado, o espírito teria passado, presente e futuro no seu processo de autodesenvolvimento, constituindo, portanto, uma temporalidade. Por outro, a fenomenologia (um saber sobre o saber da consciência ou a história do desenvolvimento da consciência, desde o tempo das cavernas ao tempo da ciência), não coincidiria com a História do Mundo. Para Jean Hypollitte, na primeira parte da Fenomenologia do Espírito (que trata da consciência, autocosciência e razão), os fatos e períodos históricos são usados como ilustração e exemplos. Na parte posterior (que trata do Espírito, Religião e Saber absoluto), há coincidências (cidade antiga, Revolução Francesa), mas há muitas lacunas (como o Renascimento) e afirmações discutíveis sobre Reforma e Revolução Francesa. Hyppolitte (1974, p.35-37). José Carlos Reis reconhece a divergência sobre a relação entre dialética e História do mundo no conjunto da obra de Hegel: elas seriam independentes (dialética como método de conhecimento da verdade e História como vir a ser da experiência alemã e europeia na Idade Moderna) ou seriam elementos intercomplementares (a dialética como o método para compreensão da realidade presente alemã)? Reis (2011, p.59, p.64-65).

[2] Tibebu (2011, posição 40-45).

[3] Tibebu (2011, posição 1247).

[4] Tibebu (2011, posição 1282, 1409, 1447).

[5] Tibebu (2011, posição 1524).

[6] “Hegel articula a supremacia branca em tres níveis: Caucasianos são superiores aos aos não caucasianos; caucasianos europeus são superiores a caucasianos não europeus; e caucasianos europeus germânicos são superiores a caucasianos europeus não germânicos.” Tibebu (2011, posição 1468).

[7] Hegel (1971, p.107-108).

[8] Não encontramos comentários sobre suas posições acerca do ensino de História que indicassem se o seu pensamento sobre o componente curricular seguiria ao pé da letra o seu pensamento como filósofo especulativo, ao ponto de orientar o currículo do ensino secundário com suas ideias sobre o processo histórico. Nos escritos pedagógicos, série de discursos, cartas e relatórios que produziu como Reitor do Ginásio de Nuremberg e nos relatórios sobre ensino, remetidos ao Ministério do Culto, Ensino e Saúde da Prússia, ele concorda com o caráter secundário da História (e da Álgebra, Geometria, Geografia, Fisiografia e as Ciências Filosóficas) diante do aprendizado das línguas, literaturas e gramáticas do [grego] e do latim. (Hegel, [1809] 1991, p.84). Registra a doação de uma coleção de moedas, segundo ele, de utilidade ao ensino de História (Hegel, [1810] 1991, p.91) e informa a insuficiência dos candidatos, em História, que desejam frequentar a Universidade (Hegel, [1822] 1991, p.147), e denota ser o conteúdo básico do secundário que dirigia “a leitura dos antigos historiadores” (Hegel, [1810] 1991, p.172).

[9] Hegel sugere divisões em várias etapas: três, quatro ou mais períodos. Aqui, optamos pela indicação do percurso da liberdade. Hegel, 1999, p.93.

[10] “É muito importante o papel desempenhado pela dialéctica no sistema de Hegel. Contudo, são consideráveis as dificuldades para compreender o significado preciso da dialéctica neste filósofo. Com efeito, dialéctica significa, em Hegel, para já, um momento negativo de qualquer realidade. Dir-se-á que, por ser realidade total de carácter dialéctico—em virtude da prévia identidade entre a realidade e a razão, identidade que faz do método dialéctico a própria forma em que a realidade se desenvolve –, esse carácter afecta o mais positivo dela. [A dialéctica não é] a forma de toda a realidade, mas aquilo que lhe permite alcançar o carácter verdadeiramente positivo.” Mora (1978, p.72). Grifos nossos.

[11] Abbagnano (2014, p.315).


Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

BEISER, Frederick C. Hegel’s historicism. In: BEISER, Frederick C. (ed.). The Cambridge Companion to Hegel. Cambridge: Cambridge University, 1999. p.270-300.

BEISER, Frederick C. Trials and tribations of Clio. In: After Hegel – German philosophy 1840-1900. Princeton: Princeton University, 2014.p.133-157.

MORA, José Ferrater. Dicionário de Filosofia. Lisboa: Dom Quixote, 1978.

PINKARD, Terry. Does History make sense? Hegel on the historical schapes of justice. Cambridge: Harvard University, 2017.

PINKARD, Terry. Hegel – A biography. Cambridge: Cambridge University, 2000.

TIBEBU, Teshale. Hegel and the third World: The making of eurocentism in Word History. Syracuse: Syracuse University Press, 2011.

TOEWS, John Edward. Hegelianism – The path toward dialectical humanism, 1805-1841. Cambridge: Cambridge University Press, 1985.

STERN, Robert. Hegel contra Kant. In: Hegel, Kant and the structure of the object. London: Routledge, 1990. p.31-41.

 


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