Estrutura e funcionamento da BNCC-Formação
Colegas, leiam o texto abaixo e o tomem como estímulo ao estudo sobre a as estrutura, as funções, as contradições, omissões e ambiguidades das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica – lei que institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores.
A orientação para a análise, problematização e posterior fichamento (resumo, mapa conceitual, citação direta etc.) é idêntica às aplicadas nas unidades I e II deste curso, ou seja, deve levar em conta habilidades mentais necessárias à interpretação da lei como um construto social (passível de diferentes interpretações).
Em geral, peço que privilegiem:
- Definição/finalidade
- Bases legais
- Estrutura
- Exemplos de competências gerais
- Exemplos de competências específicas
- As agências para a construção dos currículos de licenciatura
- A distribuição da carga horária em termos de conhecimentos, habilidades e valores
Antes de iniciar a leitura e o fichamento do dispositivo, leiam os dois textos abaixo e reflitam sobre o perfil docente demandado, partindo dos problemas anunciados pela jornalista. Em seguida (após a leitura da BNCC-Formação), tentem responder se o dispositivo em análise contribui para enfrentar as demandas apontadas pelo texto da jornalista e pelo texto dos pesquisadores do ensino.
Bom trabalho!
Texto 1 – Sem atrair jovens para profissão, Brasil pode ter apagão de 235 mil professores
Licenciaturas têm alta evasão e absorvem pessoas mais velhas que muitas vezes já estão na carreira docente, diz estudo
São Paulo, 29.set.2022 às 11h01 Atualizado: 29.set.2022 às 13h29 [Link da publicação original]
O Brasil não tem conseguido atrair os jovens para a profissão docente e, se mantido o ritmo atual de formados em cursos de licenciatura, a educação básica do país pode enfrentar um déficit de 235 mil professores até 2040.
A estimativa é de um estudo feito pelo Instituto Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior), com dados dos Censos do Ensino Superior e da Educação Básica coletados pelo MEC (Ministério da Educação).
O resultado foi apresentado na manhã desta quinta (29) no Fórum Nacional de Ensino Superior, com a presença do ministro da Educação, Victor Godoy, que disse que a responsabilidade pela valorização da educação brasileira e dos professores não é exclusiva do MEC.
“A educação brasileira é um grande sistema complexo. A responsabilidade não é exclusivamente do MEC ou das instituições de ensino ou das escolas públicas. É responsabilidade de toda a sociedade brasileira”, disse.
O estudo, intitulado “Risco de apagão de professores no Brasil”, identificou que, apesar do aumento de ingressantes nos cursos de licenciatura nos últimos dez anos, o número de concluintes não segue o mesmo ritmo. O perfil das graduações mais procuradas na área e também dos alunos indica que o aumento de calouros é puxado por pessoas que já atuam em sala de aula.
De 2010 a 2020, o país registrou um aumento de 61,15% de ingressantes em cursos de licenciatura —o crescimento só ocorreu pela maior procura por graduações a distância, já que os da modalidade presencial perderam alunos. Em 2010, o país tinha 298.390 ingressantes em cursos presenciais de formação de professores. Em 2020, o número caiu para 186.156.
No mesmo período, o número de ingressantes em cursos a distância triplicou no país, passando de 154.137 para 509.631. A cada dez estudantes que entram em graduações para a formação de professores, sete vão para a modalidade a distância.
O aumento nessa modalidade, em geral, não significa a futura ida de novos professores para a educação básica. Quem procura por esses cursos não são os jovens que acabaram de sair do ensino médio, mas sim pessoas mais velhas que estão em uma segunda graduação. Muitas vezes, professores que já trabalham em sala de aula.
Segundo o estudo, 58,3% dos concluintes de cursos de licenciatura responderam já atuar em sala de aula. “Ou seja, quem está indo para os cursos de formação de professores, não são novos professores. São aqueles mesmos que já estão na escola. O país não consegue atrair gente nova para a docência”, disse Lúcia Teixeira, presidente do Semesp.
Essa constatação fica mais evidente ao observar os cursos que tiveram maior crescimento de concluintes, que em geral são os que servem como uma complementação da formação inicial. Entre 2016 e 2020, a graduação em educação especial, por exemplo, registrou aumento de 1.583%, e o de formação pedagógica para professor da educação básica, de 63,6%.
As graduações que formam professores para dar aula de disciplinas específicas tiveram queda de formados nesse período. Por exemplo, licenciatura em biologia perdeu 21,3% de concluintes, química perdeu 12,8% e letras, 10,1%.
O estudo também destaca que a taxa geral de concluintes não seguiu o mesmo ritmo de ingressantes, o que indica grande evasão nos cursos de licenciatura. Apesar do aumento de calouros em dez anos ter sido de 61,15%, o número dos que se formaram cresceu apenas 4% de 2010 a 2020.
Os dados se refletem na estabilidade do total de professores que atuam nas escolas de educação básica do país. Em 2021, o Brasil tinha cerca de 2,1 milhões de docentes, patamar que se mantém estável desde 2014. Em média, o país tem um professor para cada 20,3 alunos de 3 a 17 anos.
Outro aspecto destacado pelo estudo é a queda de professores com menos de 29 anos atuando nas salas de aula do país. De 2016 a 2021, o número de docentes dessa faixa etária caiu 27,2% —passando de 341.660 profissionais para 248.745.
Já o de professores com mais de 55 anos cresceu 44% no período, subindo de 182.502 para 263.425.
Ainda que os dados analisados mostrem uma estabilidade no total de professores, diversas redes públicas de ensino do país têm enfrentado dificuldade para completar o quadro docente. A rede estadual de São Paulo, por exemplo, não conseguiu contratar professor em número suficiente para implementar o novo ensino médio.
Observando as taxas de concluintes em licenciatura e as aposentadorias nos próximos anos, o estudo calcula que, em 2040, serão necessários 1,97 milhão de professores para continuar atendendo a demanda de alunos na mesma proporção de hoje —já considerando a queda de natalidade. Assim, se mantida a taxa de crescimento de formados atual, a estimativa é de que o país terá um déficit de 235 mil docentes.
“Consideramos que esse ainda é um cálculo conservador sobre a falta de professores que o país deve enfrentar nos próximos anos se nada for feito para valorizar a carreira. Hoje, o país tem políticas para a educação básica que vão aumentar ainda mais a demanda por esses profissionais”, disse Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp.
O Brasil tem em andamento políticas como a ampliação de escolas em tempo integral e o novo ensino médio, que aumenta a carga horária de aulas dos alunos. Para que sejam implementadas, ambas políticas demandam mais professores.
A baixa atratividade da profissão é reflexo da desvalorização da carreira e da área de educação, percepção que é compartilhada inclusive pelos próprios estudantes. Um relatório da OCDE, entidade que reúne países ricos, de 2018 indicou que o Brasil era a nação com a menor proporção de jovens de 15 anos que pensavam em seguir a profissão: apenas 2,4%.
Menina de 5 anos, aluna de escola municipal de São Paulo, tenta escrever o próprio nome; pandemia causou queda na aprendizagem e elevou, de forma artificial, taxas de aprovação. Marlene Bargamo/Folhapress
O estudo do Semesp, que representa instituições privadas de ensino superior, indica que os motivos da desvalorização vão desde os baixos salários até as más condições de trabalho. Segundo dados da RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), em 2020, um professor de ensino médio no Brasil ganhava, em média, um salário de R$ 5,4 mil —quase 20% a menos do que a remuneração de outros profissionais com ensino superior completa.
Também destaca que, em 2021, 3,8% das escolas públicas brasileiras funcionavam sem ter banheiro e 2,6% sem nem sequer ter abastecimento de água.
Texto 2 – Base Nacional de Formação de Professores: diminuir retrocessos e construir futuros possíveis (Excerto)
Itamar Freitas (UFS) e Margarida Dias (UFRN) [Link para a publicação original]
Porta Grossa, 2022-03-03.
Quem não tem uma definição sobre o que seria um(a) bom(oa) professor(a)? É improvável que vivendo em sociedades que instituíram as escolas como formadoras das gerações futuras, cada um(a) de nós não tenha algo a dizer sobre isso.
Os governos expressam também suas opiniões em formas de leis, resoluções, prescrições, frutos por sua vez de camadas de diálogos e de disputas que reproduzem interesses de classes ou frações de classes sociais.
Consequentemente, também idealizamos a formação inicial de professores em nosso país. No início de novembro de 2019, foram exaradas as Diretrizes Curriculares Nacionais e Base Nacional Comum para a Formação Inicial e Continuada de Professores da Educação Básica. Desde a audiência pública a que foi submetido, ocorrida entre os meses de setembro e novembro de 2019,o documento recebeu uma nota -pedindo o arquivamento do Parecer – assinada por quase 40 entidades educacionais e de domínios científicos.
Entre nós, pesquisadores do ensino de história, faz dois anos que estamos discutindo o documento em eventos, reuniões, fóruns e em nossas entidades, revisitando novos e antigos desafios para a formação de professores de História. A consequência direta dessa nova Resolução é a revogação da resolução n. 02/2015 do mesmo Conselho Nacional de Educação, alterando composição das horas destinadas em um curso de Graduação a formação de professores.
Segundo essa nova composição, 800 horas seriam destinadas a componentes curriculares “de base comum de aprendizagem de conteúdos científicos, educacionais e pedagógicos que fundamentam a educação”;1600 horas para os componentes curriculares “dedicadas a aprendizagem dos conteúdos específicos das áreas e componentes da BNCC e do domínio pedagógico desses conteúdos”; e 800 horas divididas igualmente entre situações de prática em situação real de trabalho (estágios, residências, monitorias etc.) e o restante em conteúdo do item anterior. O que salta aos olhos nessa proposta é a tentativa, antiga e usada em outros países, de produzir um curso geral de formação de professores com uma introdução geral às ciências da educação e o empenho em traduzir para o ensino na Educação Básica os princípios da Base Nacional Comum Curricular.
E isso é entendido pelos seus críticos mais contundentes como uma restrição da formação de professores a um treinamento para aplicação do que determina a BNCC. Em linguagem abstrata, significa adotar a Tekné em detrimento da Paideia.
O que nos provoca neste momento não é dizer se essa interpretação está correta ou não. A lista de questões de princípios deixados à revelia do tempo (do Estado e do Mercado) é longa. Vejam exemplos: quem deve dar a última palavra sobre currículos de formação de professor: o Estado, os docentes da educação superior, os docentes da educação básica, os especialistas em domínio científicos–em uma realidade onde a administração pública é o maior agente empregador? Quais os limites da autonomia universitária diante de Ministérios e Secretarias de Educação que gerenciam o sistema, financiando, inclusive, a formação de professores de História? Se os departamentos de História das Universidades podem construir os seus currículos, porque os departamentos pedagógicos das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação não podem demandar formação específica para os seus professores, que atuam sob demandas também específicas, muito distanciadas daquelas imaginadas e fornecidas pelos conselhos departamentais universitários? Se a maior parte dos docentes brasileiros são formados, inicialmente, no setor privado, porque mirar os currículos universitários como a chaga social da formação?