América como ponto de inflexão e observação de experiências de escrita da História da Educação / Revista Brasileira de História da Educação / 2014
A historiografia da educação no Brasil tem afirmado uma preocupação crescente com a dimensão da circulação cultural. Um traço marcante que tem caracterizado os trabalhos na área se refere à análise dos regimes de referência que presidiram a produção e a disseminação de manuais de História da Educação, responsáveis por (re)ativar importantes circuitos culturais entre o Brasil e outras partes do mundo. Outro aspecto relevante diz respeito à análise da apropriação dos saberes e das representações veiculadas por esses manuais. Nessa linha, pretendemos esquadrinhar experiências de escrita elaboradas nos Estados Unidos, no Brasil e na Argentina – englobando sujeitos e temporalidades distintas – que lograram alcançar significativo sucesso editorial no país. Associado a esse objetivo, almeja-se também apreciar como as Américas comparecem nessas narrativas. A proposta está estruturada em quatro núcleos. O primeiro responde pelo objetivo de aquilatar a extensão e as representações do continente americano e dos Estados Unidos num determinado manual de ensino da História da Educação que circulou no Brasil no último século, com especial atenção para os modelos legitimados e os regimes de referência em que se amparou. Para esse efeito, selecionou-se para análise o textbook A Brief Course in the History of Education, de Paul Monroe, educador estadunidense. O segundo núcleo engloba adicionalmente a investigação acerca da circulação de pessoas, no caso autores de compêndios escolares de História e Filosofia da Educação. A lente procura focar os vínculos institucionais, as redes de sociabilidade, os pertencimentos teóricos e, precipuamente, a operação metodológica posta em prática por Thomas Ransom Giles – filósofo norte-americano estabelecido no Brasil – na escrita de seu livro História da Educação. Ao mesmo passo, trata-se de examinar as imagens de América emanadas e quais relações estabelecem acerca das experiências educativas nos Estados Unidos e no Brasil. O terceiro núcleo, composto por dois artigos, destina-se a analisar as condicionantes associadas à produção e circulação de História da Educação e da Pedagogia, manual escrito pelo pedagogo espanhol radicado na Argentina, Lorenzo Luzuriaga. Título que alcançou um considerável sucesso editorial e de aproveitamento nos cursos de formação de professores tanto no país platino quanto entre nós, essa obra, detentora de uma cosmovisão que bebe em tradições historiográficas ibéricas e sul-americanas, instiga a reflexão sobre o lugar reservado à América Latina nas narrativas que circularam na Argentina e no Brasil e as apropriações realizadas neste último quanto a manuais escolares estrangeiros, recortando para isso, notadamente, as inter-relações entre o mercado editorial, os cursos de formação docente e os dispositivos que estruturaram a disciplina História da Educação no país. Por fim, o dossiê apresenta uma tradução de artigo da historiadora norte-americana Kate Rousmanière, intitulado Historiography of American Education: Pragmatism, consensus, revisionism and new revisionism, o qual aborda os mais significativos temas de pesquisa e tendências apresentadas no periódico estadunidense The History of Education Quarterly, segundo a autora, o veículo que mais bem representa o estado do trabalho atual de história da educação nos Estados Unidos.
Em seu conjunto, portanto, as iniciativas aqui esboçadas lançam a questão de como os referentes europeu e americano aparecem nas diferentes experiências de escrita da História da Educação e como as traduções, a circulação e os usos de tais obras refletem estratégias de legitimação, difusão e apropriação internacional de tal saber.
Roni Cleber Dias de Menezes
MENEZES, Roni Cleber Dias de. Apresentação. Revista Brasileira de História da Educação. Maringá, v. 14, n. 3, set. / dez., 2014. Acessar publicação original [DR]